Recordações de um 11 de Setembro: impossível esquecer
Paulo Roberto de Almeida
Todos os americanos, ou
praticamente todos, sabem o que estavam exatamente fazendo na manhã do dia 11
de setembro de 2001, quando o primeiro avião, e depois o segundo, foram
lançados contra as duas torres gêmeas do World Trade Center, em Manhattan, New
York. Todos sabem porque a vida parou naquele instante, e os Estados Unidos, o
mundo, nunca mais foram os mesmos. Todos se recordam o que estavam fazendo
quando sua atenção foi chamada, na rádio ou na televisão, pelas primeiras
imagens do fogo e fumaça saindo das duas torres, e o pânico instantaneamente
criado. Todos se recordam, pois que seria impossível não tomar conhecimento, e
mesmo hoje, catorze anos depois, é impossível esquecer o que houve, o que
estávamos fazendo, o que fizemos em seguida, o que pensamos naquele momento, o
que pensamos depois, como reagimos, e como passamos a viver a partir de então,
com um pouco de medo, e uma imensa tristeza pela dimensão da tragédia humana, e
pelo choque político então criados, e que nunca mais se desfizeram. Todos se
recordam, todos se lembram.
Eu me lembro exatamente do
que estava fazendo naquela manhã ensolarada, tendo saído de carro, com Pedro
Paulo ao lado, para deixa-lo na Universidade de Maryland, em College Park, onde
ele cursava arquitetura, para depois voltar a Washington, DC, onde iria direto
para a Embaixada do Brasil, na Massachusetts Avenue. Como sempre faço, estava
conectado na National Public Radio, ou alguma outra rádio, mas sempre em um
programa de notícias, e o mais provável é que fosse a NPR. Tínhamos recém saído
de nosso apartamento no norte da Virgínia, bem perto do Aeroporto de
Alexandria, e atravessávamos a ponte da 495, que entra em DC, antes de se
dirigir a Maryland.
No meio da ponte, o
radialista anunciou que um avião havia acabado de se chocar com um prédio em
Nova York, e se imaginava naqueles primeiros momentos que pudesse ser algum
acidente involuntário, algum erro de pilotagem ou algo do gênero. Eu me lembro
de ter comentado com Pedro Paulo: “Não, isso não me parece acidente”, e
imediatamente pensei no terrorismo islâmico, pois já estávamos há muito tempo
com o Al Qaeda no Afeganistão, sob abrigo dos talibãs. Ficamos sintonizados na
rádio, mas continuando em nossa rota, quando a notícia fatídica pipocou
novamente na rádio: um segundo avião havia se chocado contra o que já era
identificado como a segunda torre gêmea do World Trade Center. Não havia mais
dúvida possível: era um ataque terrorista. No intervalo já tínhamos telefonado
para Carmen Lícia, para que ela ligasse na CNN, para acompanhar a história.
Dessa parte eu não me lembro se consegui falar com ela imediatamente, ou
depois, em todo caso, ainda no carro, a caminho da Universidade de Maryland.
Mais alguns minutos, outra
fatalidade: um ataque tinha sido feito nas imediações de nosso apartamento, na
Virgínia do norte, muito perto de Washington. Carmen Lícia disse, depois, que
os vidros do nosso apartamento tremeram, no momento do choque, mas ela não
sabia o que era, até tomar conhecimento do terrível ataque ao Pentágono, pelos
imensos rolos de fumo que começaram a se elevar, e ficaram imediatamente
visíveis da janela do nosso apartamento. O cheiro de incêndio se tornou
perceptível, e as sirenas começaram a emitir seus sons lancinantes de todos os
lados. E todos os meios de comunicação ficaram absolutamente focados nos dois
acidentes, nos dois atentados, nas duas grandes cidades americanas. Não se
sabia ainda do quarto avião, que caiu na Pensilvânia, notícia que veio um pouco
mais tarde, mas ainda nessa mesma manhã.
Nessa altura, eu já havia
deixado Pedro Paulo na universidade, recomendado que não saísse até eu vir
novamente busca-lo, mas que provavelmente eles não teriam aula nesse dia.
Corri, ou voei, para a Embaixada, liguei a TV e telefonei para casa. Carmen
Lícia estava falando com sua mãe, em Porto Alegre. O mundo todo parou para
acompanhar o incêndio nas torres gêmeas, e as imagens do Pentágono,
imediatamente cercado pela segurança. Todos estávamos atônitos, quando uma das
torres começou a cair, levantado aqueles rolos imensos de fumaça e poeira. Logo
em seguida a outra. E o Pentágono ainda em chamas, o cheiro de queimado se
espalhando paulatinamente pelos arredores, a despeito de toda a água e produtos
químicos lançados pelos bombeiros. O cheiro persistiu durante praticamente três
dias em casa. Impossível esquecer.
Todo o resto é história, e
tudo o que se escreveu, tudo o que se disse, tudo o que se investigou e que se relatou,
desde os primeiros dias, tudo isso apenas acrescenta sobre a memória das
primeiras horas, daquele dia, daquelas imagens. Na verdade, nunca pudemos ver o
Pentágono semidestruído: os militares cobriram o ponto de impacto e imensos painéis
de madeira interditavam uma visão adequada daquele imenso prédio horroroso, de
estilo stalinista, mas imponente. Assim foi. Impossível esquecer.
Hartford, 11 de setembro de 2015, 2 p.
Nenhum comentário:
Postar um comentário