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terça-feira, 1 de setembro de 2015

Voto "destituinte" (recall), uma solucao 'a crise atual? - Jorio Dauster

Transcrevo, tal como recebi do Professor David Fleischer, da UnB:

Date: Monday, August 31, 2015, 10:35 PM
Repassando :De: Jorio Dauster, embaixador e ex-presidente da Vale

Amigos,
Inconformado com o debate em curso sobre as saídas para a crise política, exponho abaixo uma solução 100 por cento democrática porque respeita a legitimidade dos votos dados em outubro passado à presidente Dilma Rousseff mas devolve ao povo a decisão de mantê-la ou não até o fim do mandato.
Agradeço seus comentários e peço que, se concordarem com a ideia, a passem aos amigos. Abraços,Jorio Dauster    

Para todos nós, a palavra “recall” traz à mente o pedido público de devolução feito pelo fabricante de um produto defeituoso a fim de que possam ser sanadas falhas que podem até representar risco de morte. Poucos sabem, contudo, que o mesmo termo tem longa tradição jurídica, significando a revogação do mandato de políticos através da manifestação direta dos eleitores. Esse mecanismo de democracia participativa soma-se ao plebiscito, ao referendo e à iniciativa popular, sendo também conhecido como “voto destituinte”. Originado na Grécia, esse instrumento de manifestação da vontade popular está inscrito na constituição de alguns países (inclusive na Venezuela), mas tem sua aplicação mais intensa nos estados norte-americanos, onde já serviu para derrubar dois governadores e inúmeros ocupantes de cargos eletivos, inclusive prefeitos. Interessante observar que algumas de nossas primeiras constituições estaduais republicanas adotaram tal mecanismo, como as do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Goiás. Mais recentemente, registram-se algumas propostas de emenda constitucional no Senado que cuidam do recall além de outras matérias, em especial as PECs 80/03, 73/05 (de autoria do ex-senador petista Eduardo Suplicy), 8/2015 (senador Reguffe) e 21/2015 (senador Antonio Carlos Valadares). 

O recall político pode levar à destituição do Presidente da República assim como o impeachment, mas dele se distingue por não exigir uma acusação criminal, bastando a perda de confiança da maioria dos eleitores no mandatário diante de sua inépcia ou incapacidade de governar. Por outro lado, enquanto o impeachment é decido pelo Legislativo, no recall ocorre a plena expressão da vontade popular. O que se tem hoje no Brasil seria um caso típico de uso do recall: as pesquisas de opinião assinalam profunda rejeição do Presidente da República e do partido que a apoia; manifestações de rua reivindicam a mudança de comando inclusive por meios totalmente inaceitáveis numa democracia madura; a base de apoio parlamentar do governo se esfacela, gerando um clima de anomia institucional e potencializando a já grave crise econômica.

Em contraste, como é natural até mesmo por seu espírito combativo, a Presidente se diz disposta a resistir ás pressões e invoca sua legitimidade com base nos 54 milhões de votos que recebeu em outubro passado, enquanto o PT recorre às surradas teses da conspiração da direita mancomunada com a imprensa “monopolista”. Não obstante, enquanto o povo brasileiro aplaudiu o impeachment de Collor pela evidência da corrupção que entrara até pelos portões da Casa da Dinda, é extremamente improvável que se encontre um malfeito pessoal de Dilma Rousseff, com o que seu afastamento da presidência, eliminada a hipótese também improvável da renúncia, haveria que basear-se no crime de responsabilidade fiscal  caso o TCU rejeite suas contas.

Embora formalmente válida, tal acusação teria o grave defeito político de ser de difícil compreensão por grande parte do eleitorado, para o qual as tecnicalidades das “pedaladas” poderiam soar como meros pretextos dos donos do poder. Consequentemente, a eventual destituição de Dilma Rousseff por um impeachment fundamentado em regras de difícil entendimento, sobretudo conduzido por um Parlamento que também não conta com a aprovação de largas camadas da população, tenderia a gerar conturbações sociais e criar a figura de mártires políticos com uma sobrevida política que hoje não possuem. A solução 100% democrática para esse dilema estaria na adoção do instituto do recall mediante a aprovação em regime de urgência de uma PEC que simplificasse as propostas anteriores e se concentrasse exclusivamente na revogação dos mandatos de Presidente da República e governadores.

A realização da consulta popular poderia basear-se em decisão do Congresso Nacional, por voto qualificado de 3/5 dos senadores e deputados em dois turnos de votação (similar à da adoção de reformas constitucionais), e/ou por iniciativa popular, seguindo os preceitos do art. 13 da lei 9.709/1998 (subscrição por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles). Essa segunda via, da iniciativa popular, é de fato a mais saudável, pois poderia, inclusive, promover uma mobilização efetivamente democrática em substituição aos protestos desorganizados de rua, com altos índices de risco social e pequena eficácia política. Havendo vontade política e uma boa dose de bom senso, seria perfeitamente possível que em janeiro  de 2016, tendo a presidente completado um ano de mandato e após longo  período de reflexão nacional, os eleitores voltassem às urnas para dizer, por maioria absoluta, se querem ou não confirmar a escolha que fizeram catorze meses antes. Sem traumas e sem cheiro de golpe graças à livre manifestação da vontade popular. Ou, no linguajar futebolístico tão em voga no país, decidindo a parada no gramado e não no tapetão.
                                                                                                        
 Jorio Dauster, embaixador e ex-presidente da Vale    

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