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terça-feira, 7 de novembro de 2023

Por que a Argentina não foi uma Austrália? - Fernando Nogueira da Costa, Pablo Gerchunoff, Pablo Fajgelbaum

Pablo Gerchunoff e Pablo Fajgelbaum:

 ¿Por qué Argentina no fue Australia?

A Argentina não se tornou uma Austrália basicamente por uma diferença nas instituições, não apenas pela mecânica do protecionismo e da oferta de commodities. Uma análise meramente econômica não dá conta da perda de oportunidades da Argentina no século XX. (PRA)

Argentina e Austrália

Imagem: Jan van der Zee

Por FERNANDO NOGUEIRA DA COSTA*

A Terra é Redonda, 6/11/2023

https://aterraeredonda.com.br/argentina-e-australia/?utm_source=newsletter&utm_medium=email&utm_campaign=novas_publicacoes&utm_term=2023-11-06


Comentário sobre o livro que identifica os fatores que determinaram caminhos diferentes para países que tinham no início características em comum

A Argentina e a Austrália tinham características comuns. Desse modo, permitiam a comparação por historiadores, mas economistas e politicólogos tiveram de identificar os fatores determinantes da bifurcação posterior a 1930.

Um terceiro objeto de comparação – um terceiro país idealizado – é ao qual Pablo Gerchunoff e Pablo Fajgelbaum, no livro ¿Por qué Argentina no fue Australia?, se dedicam à descrição. Buscam extrair do emaranhado enredo da história os elementos presentes (convergentes e divergentes) em ambos os países.

Para fins puramente pedagógicos, apelam à licença para chamar Argentália para este país imaginário. Nessa mistura, ela possui uma variedade de climas, com predominância de temperaturas temperadas.

Na longa história do planeta, é uma nação jovem, pertencente àquele raro grupo conhecido como “regiões de colonização recente”, localizado no hemisfério Sul (Buenos Aires e Sydney estão no paralelo 34) e a grande distância dos centros de poder (Buenos Aires fica a 11.082 quilômetros de Londres e a 8.454 quilômetros de Nova York; Sydney, 16.997 e 15.989, respectivamente). Mas a Austrália está mais próxima da Ásia…

Argentália, desde a sua origem, teve uma pequena população e terras abundantes – em 1896, Argentina e Austrália eram os dois países com menor número de habitantes por quilometro quadrado de terras produtivas. Como consequência desta dotação de fatores de produção, com escassez de trabalhadores, teve salários relativamente elevados em relação à média mundial.

Como produtor de matérias-primas, Argentália viu os dois lados da moeda: durante décadas estabeleceu uma relação privilegiada com a potência dominante, exportando os produtos da terra necessitados pela Inglaterra para facilitar a sua industrialização e importando os insumos, bens de capital e mão de obra da qual necessitava para seu progresso. Contudo, desde a Grande Depressão na nova potência (Estados Unidos), o país sofreu em primeira mão o declínio do comércio de bens primários.

No calor da expansão do mercado interno e da evolução tecnológica dos processos produtivos, surgiram algumas manufaturas dentro de suas fronteiras, principalmente aquelas transformadoras das matérias-primas exportadas. Mas limitada como era pela escassez de mão de obra, Argentália não era um país bem equipado para enfrentar um processo de industrialização sustentado e diversificado.

Enquanto o intercâmbio global continuasse a ser vigoroso e a beneficiar à Argentália, o comércio livre seria conveniente para ambos os países, porque impulsionava o crescimento. Mas o protecionismo passará a ser conveniente para os seus trabalhadores porque, dadas as condições estruturais do país, a proteção econômica aumentará o emprego e os salários reais, e melhorará a distribuição de rendimentos.

O protecionismo melhorará o preço relativo daquilo importado. Considerando, devido à sua dotação original de fatores de produção – abundância de terras e escassez de trabalhadores –, Argentália importar bens relativamente intensivos em mão-de-obra, medidas protecionistas melhorariam o rendimento relativo do trabalho.

As políticas econômicas mais eficazes do ponto de vista do crescimento, por exemplo, comércio livre ou quase livre, determinariam uma distribuição de rendimento favorável os proprietários do fator de produção mais abundante, ou seja, a terra.

Essa lógica específica liga a dotação original de fatores à política econômica, tal como existe uma lógica ligando esta política à dinâmica do crescimento. Este conflito distributivo é característico de Argentália.

Quanto mais agudo for o conflito, mais distributivo será o protecionismo. E quanto mais protecionista for distributivo, mais intensivos em trabalho serão os setores industriais nascidos sob sua proteção, maior será a proporção do emprego total explicada pelas atividades protegidas e maior será a participação dos alimentos e lãs exportadas, componentes da cesta de consumo popular.

Quando o protecionismo distributivo já foi instalado como regime de política econômica, o risco é o stop and go, um termo familiar para argentinos e australianos. Quando se expandem, os setores industriais protegidos exigem importações (insumos e bens de capital) e não fornecem exportações, daí a sua contribuição para as exportações líquidas é baixa e pode até ser negativa.

Se as exportações de matérias-primas crescerem fracamente, haverá desequilíbrios recorrentes no balanço comercial e os governos tentarão corrigir com desvalorizações nominais. Mas, desta forma, os salários reais antes crescentes, devido ao protecionismo distributivo, serão reduzidos.

Enquanto os trabalhadores mantiverem a sua capacidade de resistência, isso resultará em aumento da volatilidade do crescimento e da inflação. Esta só será atenuada se as exportações de matérias-primas forem reavivadas ou os setores industriais começarem a dar uma contribuição positiva para as exportações líquidas.

Na fase de divergência, a Austrália teve um conflito distributivo e um ciclo de stop and go mais moderados diante dos da Argentina. Embora na Argentália o protecionismo seja distributivo, isso não implica as políticas distributivas terem necessariamente origem no protecionismo.

Na Austrália, assim como na Argentina, isto é, na Argentália, se existirem políticas distributivas não emergentes do protecionismo, o protecionismo será necessário para sustentá-las. Enfrenta, portanto, um conflito distributivo e um ciclo de stop and go, derivados da sua própria arquitetura econômica, moldada em grande parte pela natureza e pela geografia – e sobre ela a política tem influência: para o mal, para o bem.

Cada um desses dois países é uma versão de Argentália, mas em algo eles diferem desse mix e em algo eles diferem um do outro.

Historiadores e economistas australianos concentraram-se no declínio da Austrália em relação aos países mais desenvolvidos do planeta. Em 1900, o país tinha o maior rendimento por habitante do mundo. Em 1950, caiu para o terceiro lugar. Em 1970, era o oitavo e na década de 1990 já não estava entre os vinte primeiros.

Exceto em períodos esporádicos, durante o século XX, o produto per capita dos dois países cresceu mais lentamente diante o do painel das nações desenvolvidas. Na Austrália, a relação começa nos 170%, quando os seus poucos habitantes eram “os mais ricos do mundo”, em renda per capita, e termina nos 90%. A Argentina começa com 75%, mas no fim da série o seu produto relativo por habitante é de 35%. Só.

Mesmo depois da grave crise económica do início do século XXI, a Argentina continuou a ter uma economia de rendimento médio. De um total de 179 países, segundo dados do FMI, em 2016, a Argentina ocupava a 61ª posição no ranking de renda per capita.

Embora longe dos padrões de vida da Europa Ocidental ou dos Estados Unidos, o rendimento por habitante argentino de 20.000 dólares (em PPC de 2016) era muito superior ao de quase todos os países africanos, e superior ao dos não-petroleiros do Médio Oriente, do Leste Europeu e as nações do Sul da Ásia.

Em 2021, com US$ 9.997 e em 66º lugar, Argentina já não era o país mais rico da América do Sul como foi durante a maior parte do século XX. Ficou abaixo do Uruguai (49º. US$ 17.029), Chile (53º. US$ 15.399) e Brasil (63º. US$ 11.136). O seu rendimento per capita era consideravelmente inferior ao de Portugal (37º. US$ 23.030) – o país mais pobre da Europa Ocidental – e ao das economias mais ricas da Europa Oriental.

Alerto: não se deve comparar renda per capita sem apresentar a população de cada país. Quaisquer commodities com alta cotação de mercado, dada por fatores exógenos ao país exportador de pequena população, pode lhe propiciar elevada renda per capita – sem ser ela bem distribuída.

Em 2008, dos quase 7,2 bilhões de habitantes do planeta, aproximadamente 5,8 bilhões viviam em países com rendimentos inferiores a US$ 18 mil, e quase um bilhão em países com rendimentos superiores a US$ 34 mil, considerados ricos. Em 2021, os países de renda média do mundo – 30 na faixa de renda per capita entre US$ 11.355 (média mundial) e US$ 27.871 (31º.) – eram poucos com população superior a 10 milhões.

Há cinco grandes grupos principais de commodities: petróleo, mineração, celulose, proteína animal e agrícolas. Em geral, as mais lucrativas, devido à demanda global e à volatilidade de preços, são na ordem: petróleo, minério de ferro, ouro, prata, cobre, café, soja, gás natural, milho. Falta ainda o gasoduto para conectar vaca muerta até o Brasil…

Conectaria essa região com grandes reservas de gás não convencional por 467 km a outro gasoduto já existente por meio de financiamento com o BNDES. Além disso, a Argentina possui 21% das reservas mundiais de lítio (a 3ª. maior do mundo) e é a 4ª. maior produtora mundial do mineral, “o petróleo branco”…

*Fernando Nogueira da Costa é professor titular do Instituto de Economia da Unicamp. Autor, entre outros livros, de Brasil dos bancos (EDUSP). [https://amzn.to/3r9xVNh]

Referência


Pablo Gerchunoff e Pablo Fajgelbaum. ¿Por qué Argentina no fue Australia? México, Siglo XXI Editores, 2019, 108 págs. [https://amzn.to/49m6pgV]

segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Os "sonâmbulos" da nova Guerra Fria: os paranóicos da contenção militar - entrevista com ex-primeiro ministro da Austrália

 Pelo meu título dá para perceber que eu considero esses paranóicos um bando de malucos, pois estão construindo, deliberadamente, uma nova Guerra Fria.

Paulo Roberto de Almeida

Der Spiegel, Hamburgo – 27.9.20921

Former Australian Prime Minister Kevin Rudd

"A Cold War with China Is Probable and Not Just Possible"

China presents a significant threat, believes former Australian Prime Minister Kevin Rudd. Which is why, he says, the West must work together rather than engage in the kind of bickering triggered by the recent submarine deal between Australia and the United States.

Interview Conducted by Bernhard Zand

 

Kevin Rudd, born in 1957, was prime minister of Australia from 2007 to 2010 before becoming foreign minister and, in 2013, prime minister again for a brief stint. During his first and second terms in office, he was the leader of the Australian Labor Party.

Today, Rudd is president of the Asia Society, a non-governmental organization based in New York, which is focused on deepening ties between Asia and the West.

Last week, Canberra, Washington and London reached agreement on a military pact reminiscent of the era of nuclear standoffs. The alliance, known as AUKUS, foresees Australia being outfitted with nuclear-powered submarines from the U.S. and Britain. It is a reaction to China’s rise to becoming the dominant economic and military power in the Indo-Pacific region.

 

Australia, located in the Far East but politically part of the West, lies on the fault line of the largest conflict of our times, the growing rivalry between China and the U.S.

With its close economic ties to China as a supplier of raw materials and foodstuffs, Australia recognized earlier than other countries the opportunities presented by Beijing's rise – and the risks. As early as the beginning of the last decade, the Australian government concluded that it needed to bolster its maritime power. The country tendered a multibillion-dollar contract for the construction of 12 conventionally powered submarines.

The deal, for which the German arms manufacturer ThyssenKrupp also submitted a bid, ultimately went to the Naval Group in France, with the first submarines scheduled for delivery in 2027. Officially, Canberra remained committed to the deal until just a few weeks ago, even as technical delays and spiraling costs threatened it with collapse. Then, last Thursday, Australia pulled the plug, announcing its alliance with Washington and London and backing out of the contract with the French.

The political consequences have been significant. Paris feels as though it has been hoodwinked by Australia and its NATO allies, the U.S. and Britain. France temporarily recalled its ambassadors from Washington and Canberra. In Brussels, meanwhile, the debate over Europe's "strategic autonomy" has been reopened and new questions have arisen regarding the efficacy of NATO, which French President Emmanuel Macron already referred to back in 2019 as "brain dead."

DER SPIEGEL: Mr. Rudd, the 20th century was ravaged by two world wars, both of which began in Europe. Might we be facing a massive confrontation in the Pacific in the 21st century?

Kevin RuddIt is quite possible. It is not probable, but it is sufficiently possible to be dangerous. And that is why intelligent statesmen and women have to do two things. First, identify the most effective guardrails to maintain the course of U.S.-China relations, to prevent things from spinning out of control altogether. And second, find a joint strategic framework, which is mutually acceptable in Beijing and Washington, to prevent crisis, conflict and war.

DER SPIEGEL: Germany was on the front lines of the Cold War. Now, in the current confrontation between the U.S. and China, Australia is exposed. Is today’s China as formidable and serious an adversary as the Soviet Union was 60 years ago?

Rudd: If we degenerate into a Cold War – which at this stage is probable and not just possible – then China looms as a much more formidable strategic adversary for the United States than the Soviet Union ever was. At the level of strategic nuclear weapons, China has sufficient capability for a second strike. In the absence of nuclear confrontation, the balance of power militarily, but also economically and technologically, is much more of a problem for the United States in the pan-Asian theater than was the case in Europe.

DER SPIEGEL: Your country, the U.S. and Britain have now entered into a new military alliance, which will provide Australia with a fleet of nuclear-powered submarines. What are the strategic considerations behind this decision?

Rudd: On the question of moving from conventional to nuclear-powered submarines, I have yet to be persuaded by the strategic logic. First, there is a technical argument that has been advanced about the range, detectability and noise levels of conventional submarines versus nuclear powered submarines. This is a technical debate which has not been fully resolved. If it is resolved in favor of nuclear-powered submarines, however, then another question arises.

DER SPIEGEL: Namely?

Rudd: We do not have a domestic civil nuclear industry, so how do we service these submarines? Which then leads to a third problem: If they have to be serviced in the United States and by the United States, does this lead us to a point where such a nuclear-powered submarine fleet becomes an operational unit of the U.S. Navy as opposed to belonging to a strategically sovereign and autonomous Royal Australian Navy? These questions haven't been resolved yet in the Australian mind, which is why the alternative government from the Australian Labor Party, while providing in principle support for the decision, insists that these questions have to be resolved.

DER SPIEGEL: What are the risks?

Rudd: We already knew in 2009 that it was important from an Australian national security perspective to have a greater capability of securing the air and maritime approaches to the Australian continent. So I launched a new defense white paper as prime minister, which recommended the construction of a new fleet of 12 conventionally powered submarines, which would make the Australian conventional submarine fleet the second largest in East Asia. The sudden change to a nuclear-powered option comes fully eight years after the conservative government of Australia inherited that defense white paper, commissioned tenders for it to be filled – which were won by the French contractor Naval Group in 2016 – and then proceeded to cancel the contract in the middle of the night in 2021. The Australian government has yet to provide a convincing strategic rationale for that decision. Nor has it been frank about the unspecified cost of building nuclear-powered boats through some sort of Anglo-American duopoly.

DER SPIEGEL: Either way, France has lost the contract. Do you understand their indignation?

Rudd: Absolutely. Australians take pride in the fact that we are people of our word. Such a U-turn is alien to our character. We don’t do these things. Secondly, if you reach a technical decision to commission nuclear-powered boats as opposed to conventional boats, then you have a duty to tell the French that the project specifications have changed and to invite them to retender for the new projectThe French are perfectly capable of building and servicing nuclear-powered submarines. That is why the French, in my judgment, have every right to believe that they have been misled.

DER SPIEGEL: The German company ThyssenKrupp also submitted an offer to build the conventional submarines. In retrospect, was it a blessing for the Germans that they didn't win it?

RuddI regret to say that the current Australian government seems to exhibit what I would describe as a level of Anglophone romance which puzzles the rest of us in this country who are more internationalist in our world view.

DER SPIEGEL: Are you fundamentally in favor of Europe becoming involved militarily in the Indo-Pacific? Britain and France have warships in the region, and Germany has now joined them, with the frigate Bayern.

Rudd: These are obviously sovereign decisions in Berlin and Paris and London, and it depends on the aggregate naval capabilities of our European friends and partners. The more important question is that of developing a common strategy across the board – military, diplomatic, economic – to deal with the problematic aspects of China's rise. Not all the aspects of China's rise are problematic, but in a number of them, China is seeking to change the international status quo. The current Australian government's torpedoing of the submarine contract with France actually renders the possibility of a common, global allied strategy for dealing with China's rise more problematic and more difficult rather than less.

DER SPIEGEL: Australia, the United States, Japan, and India are members of a loose group of four nations concerned about China's rise. Is this "Quad" the nucleus of an Indo-Pacific NATO?

Rudd: I think this is a false analogy. NATO has mutual defense obligations. That is not the case with Japan and Australia because we are part of separate bilateral security arrangements with Washington, not a multilateral arrangement. And India is not an ally because it has no formal alliance structure. I think it is unlikely for the foreseeable future that the Quad would evolve into a NATO-type arrangement. However, the Chinese take the Quad seriously because it is becoming a potent vehicle for coordinating a pan-regional strategy for dealing with China's rise.

DER SPIEGEL: Australia and Germany have extremely close economic ties with China. Have our countries become too dependent on Beijing?

Rudd: Any modern economy does well to diversify. Under Xi Jinping, China's economic strategy has become increasingly mercantilist. If you are the weaker party in dealing with a mercantilist power, then you will increasingly have terms dictated to you. Another point is this: China's domestic economic policy is moving in a more statist and less market-oriented direction. We have to ask ourselves whether this will begin to impede China's economic growth over time and whether China will be as robust in the future. All these are reasons for not pinning all global growth, all European and German export growth, on the future robustness of this one market.

DER SPIEGEL: Australia has been economically punished by China, in part because your government has called for an independent investigation into the origin of the coronavirus pandemic. What can other countries learn from Australia’s experience?

Rudd: The critical lesson in terms of China's coercive international diplomacy is that it's far better for countries to act together rather than to act independently and individually. If you look at Beijing’s punitive sanctions against South Korea, against Norway and now against Australia, the Chinese aphorism can be applied everywhere: "sha yi jing bai,” kill one to warn 100. Therefore, the principle for all of us who are open societies and open economies is that if one of us comes under coercive pressure, then it makes sense for us all to act together. And if you want a case study to see how that could be effective, look at the United States. When was the last time you saw the Chinese adopt major coercive action against the U.S.? They haven't because the U.S. is too big.

DER SPIEGEL: A few days ago, the European Union announced its strategy for the Indo-Pacific. Brussels plans to rely less on military means against China and more on closer cooperation with China's neighbors – on secure and fair supply chains, and on economic and digital partnerships. What do you think of this approach?

Rudd: In the recent past, the logic in Brussels and many European capitals was pretty simple and went like this: First, China is a security problem for the United States and its Asian allies, but not us in Europe. Second, China presents an economic opportunity for us in Europe, which should be maximized. And third, China represents a human rights problem, which occasionally we'll engage in with some appropriate forms of political theater. That was the logic, if I may summarize recent history in such a crude Australian haiku.

DER SPIEGEL: You may!

Rudd: But now, this has evolved. Europeans have experienced cyberattacks of their own. Germany in particular has experienced the consequences of Chinese industrial policy and the aggressive acquisition of German technology, as well as the strategic collaboration between China and Russia, which is now almost a de facto alliance. When I see this evolution reflected in the posture of the G-7, of NATO and of the of the European Union, it's pointing in a certain direction. The Europeans have finally concluded that China represents a global challenge. The Asia-Pacific region has now evolved westwards, to the Indo-Pacific, through the Suez Canal and into the Mediterranean and Europe itself. China is a global phenomenon, both in terms of opportunities and challenges. There's not a single country from Lithuania to New Zealand which is not being confronted with the reality of China. China cannot simply be put to one side and regarded as someone else's problem.

"When it comes to China, Germany is not just another country."

DER SPIEGEL: German Chancellor Angela Merkel has geared her China policy to Germany's economic interests and has often been criticized for doing so. Do you agree with this criticism? And what advice would you give Merkel's successor?

Rudd: I know Angela Merkel reasonably well; she was chancellor when I was prime minister. She is a deeply experienced political leader, respected around the world. And to be fair, the China that she encountered when she first became chancellor under Hu Jintao was a quite a different China to the one which has evolved since the rise of Xi Jinping. In fact, the China of Xi’s first term was different to the China after the 19th Party Congress …

DER SPIEGEL: … when term limitations for his presidency were eliminated.

Rudd: Since then, I have detected some change in the German position. Germany could have vetoed the approaches adopted by the G-7, NATO and the EU. But it chose not to. So if there is some skepticism in the world about German foreign policy under Merkel, it is because Germany has been robust multilaterally in its response to China and much more accommodating bilaterally.

DER SPIEGEL: What does this mean for the next government?

Rudd: Our German friends need to know that the rest of the world observes German politics very closely. And there's a reason why we do that: Of all Western countries outside the United States, China has the deepest respect for Germany. This has to do with the economic miracle after World War II, the depth of German manufacturing, and the remarkable living standards Germany has been able to generate while still maintaining a posture of environmental sustainability. So when it comes to China, Germany is not just another country. It is the one Western country, outside the United States, which the Chinese predominantly respect.

DER SPIEGEL: After the recent announcement of AUKUS, the security pact between Australia, the UK and the U.S., former British Prime Minister Theresa May warned of the consequences of a military escalation, specifically in the Taiwan Strait. How do you rate this risk?

Rudd: I do not think either Beijing or Washington want a war over the Taiwan Strait as a matter of deliberate policy. Certainly not Beijing in this decade, since it is not yet ready to fight and is still in the middle of a reorganization of its military regions and its joint command structures. Another question is whether an accident could happen, similar to what happened in 1914 after the assassination of the Austrian archduke, which led to the outbreak of World War I.

DER SPIEGEL: What exactly do you have in mind?

Rudd: There are multiple possibilities. A collision of military aircraft or naval vessels, for example. Or some unilateral act by an incoming Taiwanese government – not the current one – taking a much more decisively independent view, could trigger a crisis.

DER SPIEGEL: How could such a crisis be prevented?

Rudd: Crisis management in 2021 may not be that much better than in July of 1914. Therefore, the danger is not war as a consequence of intentional policy action. It's war as a consequence of miscalculation.

DER SPIEGEL: In his book "The Sleepwalkers,” your compatriot, the historian Christopher Clark, described how Europe's alliances mobilized each other into World War I in 1914. Is such a scenario really still conceivable today?

Rudd: Those of us who are looking carefully at the evolution of East Asia began rereading the history of World War I long ago. The possibility of an open, land-based missile conflict between Chinese and American forces in the East Asian Pacific is as real now as an escalation was then. Even worse, because the mobilization times, in terms of getting people on trains back then, were far longer than now.

DER SPIEGEL: What about the danger that military alliances will put pressure on each other?

Rudd: We do have an aggregation of alliances even today. China may have no formal allies, but Russia, in the event of a conflict, could well take action on behalf of its Chinese friends. We cannot over-study World War II in terms of the warnings it sends to all of us about unintended consequences. For that reason, I have written a book which will come out early next year. I've just sent it to the publishers. The title is "The Avoidable War.”

DER SPIEGEL: Mr. Rudd, we thank you for this interview.

sábado, 21 de julho de 2018

Licoes da Australia para o agro brasileiro - Marcos Sawaya Jank

Lições da Austrália para o agro brasileiro

Jornal “Folha de São Paulo”, Caderno Mercado, 21/07/2018

Marcos Sawaya Jank (*)

Temos muito a aprender em organização, regulação, comunicação e presença internacional.

Estive recentemente na Austrália, um dos países com os quais mais temos a aprender na área de organização de cadeias produtivas, regulação adequada e política comercial competente.

Apesar de ser o sexto maior país em área do mundo, logo atrás do Brasil, a Austrália padece de um imenso déficit hídrico. Ela se posiciona entre os países mais áridos do planeta, além de ser vítima frequente das mudanças do clima e de eventos extremos. 

Sem água para expandir a produção agropecuária e com um mercado interno bastante limitado (o país possui apenas 25 milhões de habitantes), a Austrália decidiu investir na organização das suas cadeias de commodities, buscando adição de valor e diferenciação no exterior.

Para começar, o país assinou dezenas de acordos comerciais que cobrem virtualmente toda a sua pauta exportadora, principalmente na Ásia, garantindo acesso privilegiado e menores problemas e surpresas.

A Austrade, agência de promoção de comércio e investimentos semelhante à nossa Apex, tem 83 escritórios no exterior, dos quais 48 apenas na Ásia.

No agronegócio, chama a atenção a sólida cultura enraizada no governo e no setor privado em temas como qualidade e segurança do alimento, rastreabilidade, inovação e capacitação. São notáveis o sistema de classificação e tipificação de produtos e o trabalho subsequente de marketing e fixação da marca-país. Isso dá à Austrália uma alta reputação e credibilidade principalmente na Ásia, traduzida em maiores preços dos produtos vendidos.

No setor privado, a organização da cadeia das carnes vermelhas é um bom exemplo. A principal organização do setor —a Meat and Livestock Australia (MLA)— tem um orçamento anual de US$ 154 milhões (R$ 585 milhões), dos quais US$ 40 milhões (R$ 152 milhões) bancados pelo governo, para serem gastos basicamente com programa de inovação tecnológica no país e de comunicação no exterior. A entidade já montou sete escritórios no exterior.

Sem poder contar com a opção confortável de um grande mercado doméstico e tendo de encarar custos mais elevados em razão da carência de água e de mão-de-obra do país, a Austrália não pode falhar na consistência das suas exportações.

O sistema de vigilância para evitar a entrada de doenças no país é sofisticado e eficaz, visível para qualquer um que desembarca nos aeroportos do país.

A legislação sanitária é simples e objetiva, focada nas necessidades dos reguladores e dos clientes do exterior. No Brasil, a legislação sanitária é ultrapassada (data dos anos 1930!), complicada e engessada, sendo que muitos agentes e empresas não conhecem o ambiente regulatório e as exigências do mercado externo. Não são raros os casos em que as respostas que são dadas não atendem ao que foi pedido no exterior.

É quase um milagre termos chegado a quase US$ 100 bilhões em exportações no agronegócio brasileiro, sem contar com o suporte de acordos comerciais, sem logística adequada, com legislações anacrônicas e presença ínfima no exterior. O que nos salvou foi a disponibilidade de recursos naturais do Brasil, aliada ao desenvolvimento tecnológico e, principalmente, à bravura dos agricultores e das agroindústrias que desbravaram os nossos trópicos. 

Mas nos quesitos organização, regulação, comunicação e presença internacional temos muito a aprender com países como a Austrália.

(*) Marcos Sawaya Jank é especialista em questões globais do agronegócio. Escreve aos sábados, a cada duas semanas.

terça-feira, 26 de abril de 2016

Defesa: Australia encomenda 12 submarinos franceses - Le Monde

Marinheiros brasileiros devem ficar babando quando leem notícias como essa:

Le constructeur naval militaire français DCNS a remporté un appel d’offres pour 12 sous-marins pour la marine australienne, un contrat de cinquante ans évalué à plus de 34 milliards d’euros, a annoncé mardi le premier ministre de l’Australie. # Comme en France, le monde du travail est en Belgique trop hiérarchisé, et la participation des travailleurs y est insuffisante.
Par Edouard Pflimlin   

Australie : DCNS gagne un contrat géant de sous-marins
Un sous-marin français de type Barracuda Block 1A, dessiné par DCNS pour la Royal Australian Navy.

Un sous-marin français de type Barracuda Block 1A, dessiné par DCNS pour la Royal Australian Navy. HANDOUT / REUTERS

Le groupe français DCNS a remporté mardi face à ses concurrents allemand et japonais un mégacontrat estimé à 50 milliards de dollars australiens (34,5 milliards d’euros) en vue de la construction de la prochaine génération de sous-marins australiens. Malcolm Turnbull, le premier ministre de l’Australie, a annoncé mardi lors d’une conférence de presse l’issue d’un processus d’appel d’offres de plusieurs années, après en avoir informé le président François Hollande.
La recommandation du panel chargé d’étudier les offres était « sans équivoque », a déclaré M. Turnbull. « L’offre française présentait les meilleures capacités pour répondre aux besoins uniques de l’Australie. » Ce contrat est la plus importante commande militaire passée par l’Australie. Il porte sur 12 sous-marins océaniques qui devront remplacer les sous-marins de la classe Collins fonctionnant au diesel et à l’électricité. Le spécialiste français du naval de défense détenu par l’Etat et Thales était en concurrence avec l’allemand ThyssenKrupp Marine Systems (TKMS) et un consortium emmené par Mitsubishi Heavy Industries et soutenu par le gouvernement japonais. DCNS proposait une version à propulsion classique de son Barracuda, ThyssenKrupp défendait le Type-216, et le Japon le Soryu.
Le processus d’appel d’offres a été politiquement délicat en Australie, avec en toile de fond les craintes pour l’avenir de l’industrie navale australienne. Canberra cherchait à obtenir l’assurance qu’une grande partie du processus de fabrication se ferait en Australie, de façon à maximiser la participation et l’emploi de l’industrie du pays. « C’est un grand jour pour notre marine, un grand jour pour l’économie australienne du XXIe siècle, un grand jour pour l’avenir de l’emploi », a déclaré M. Turnbull à Adelaïde, en Australie-Méridionale, où les sous-marins seront construits. « Ce nouveau succès sera créateur d’emplois et de développement en France comme en Australie », a assuré l’Elysée. « Il marque une avancée décisive dans le partenariat stratégique entre les deux pays, qui vont coopérer durant cinquante années sur l’élément majeur de souveraineté que représente la capacité sous-marine. » Les sous-marins devraient être mis en service en 2027. Le contrat prévoit une enveloppe comprenant notamment les infrastructures, la maintenance et la formation des équipages. Les 12 sous-marins, a assuré M. Turnbull, seront « les vaisseaux les plus sophistiqués construits dans le monde ». L’Australie a annoncé en février une rallonge de 29,9 milliards de dollars australiens (19,4 milliards d’euros) du budget de la défense sur les dix années à venir pour faire face aux enjeux géopolitiques en Asie-Pacifique. Alliée des Philippines, l’Australie s’inquiète notamment de l’attitude de la Chine en mer de Chine méridionale, objet d’âpres contentieux territoriaux entre Pékin et les capitales régionales.