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domingo, 11 de novembro de 2018

Paulo Guedes: o custo do aprendizado - Pedro Paulo Zahluth Bastos

Normal que quem nunca trabalhou no governo tenha certa dificuldade em adentrar nos arcanos na burocracia governamental, que tem seus ritos, procedimentos, dificuldades e peculiaridades dos processos próprios a cada área, sem necessariamente coordenação entre elas.
Vai ser um duro processo de aprendizado, embora possam ocorrer surpresas no meio do caminho.
Vamos aguardar e dar um crédito de confiança.
Paulo Roberto de Almeida

Gestão

Em que mundo vive Paulo Guedes?

Carta Capital, 09/11/2018 16h53
O “superministro” não sabe como se prepara um OrçamentoShare
Fernando Frazão/Agência Brasil
Em que mundo vive Paulo Guedes?
Guedes desafia a lógica
Não acreditei, confesso, quando li a mensagem de WhatsApp: só pode ser fake news. Um técnico do IPEA informava que o futuro ministro da Economia do governo Jair Bolsonaro, Paulo Guedes, tinha acabado de ter uma reunião com integrantes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada.
Os técnicos discutiam a LOA e foram interrompidos pelo futuro ministro: o que mesmo é a LOA? Sério? Não pode ser. Como é possível que um economista experiente prestes a assumir o Ministério da Economia não saiba que a LOA é a Lei Orçamentária Anual? Só pode ser brincadeira de petista infiltrado.
Só que não. A jornalista Cristiana Lobo revelou anteontem em rede nacional que o presidente do Senado, Eunício Oliveira, convidou Guedes para discutir o orçamento e sua lei. A LOA. Guedes não se interessou, respondendo que faria o orçamento de 2019 só depois de tomar posse, no ano que vem. O senador precisou explicar que a LOA era o orçamento “do ano que vem”.
Os sinais de desorientação na cúpula econômica do novo governo não são novos, diga-se de passagem. Na entrevista em que destratou uma jornalista do El Clarín da Argentina apenas por lhe perguntar se o Mercosul seria prioridade do novo governo, Guedes revelou desconhecer o básico.
Afirmou que “o Mercosul quando foi feito foi totalmente ideológico...Eu só vou comercializar com Argentina? Não. Eu só vou comercializar com Venezuela, Bolívia e Argentina?... Não, não é prioridade. É isso o que você quer ouvir?”
Guedes precisa de algumas informações básicas. Número 1: o Mercosul foi assinado por Fernando Collor e Carlos Menem em 1991, e não por Lula e Kirchner em algum ano da década passada. Se “quando foi feito foi totalmente ideológico”, a ideologia do Mercosul era a de neoliberais como Guedes.
De fato, não há regras trabalhistas, ambientais ou fiscais comuns no Mercosul, o que permite que as empresas se desloquem em busca de normas mais “amigáveis” (livre poluição, por exemplo), ou salários e impostos menores.
Era exatamente por isso que o pai do neoliberalismo, Friedrich Hayek, era um entusiasta do livre mercado europeu, como Quinn Slobodian nos lembrou recentemente. O ex-embaixador Rubens Barbosa, que de nacionalista parece ter muito pouco, adora certas coisas no Mercosul.
Ex-sócio da firma da insuspeita secretária de Estado dos EUA no governo Bill Clinton, Madeleine Albright, Barbosa é presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da FIESP desde 2013. Nesta condição, promoveu seminário para estimular industriais brasileiras a se deslocarem para o Paraguai.
Em português claro: na fronteira do lado de lá, podem pagar salários de fome e impostos, digamos, paraguaios, montando bens finais reexportados para o mercado brasileiro. Ah, como se sabe, também podem poluir com menores custos de controle ambiental “xiita”.
Informação básica número 2: nem Bolívia nem Venezuela, dois dos três países citados por Guedes, são integrantes originais do Mercosul. Foi apenas em maio de 2018 que a Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, com relatoria de deputado neoliberal do PRB, aprovou a adesão da Bolívia ao Mercosul, ainda pendente.
E desde 2016 a Venezuela está suspensa porque, felizmente, o bloco tem uma “cláusula democrática” entre seus participantes.
Informação básica número 3: o Brasil tem superávit comercial com o Mercosul e com a América do Sul em geral. As exportações industriais são parte importante deste saldo comercial favorável. Muitas delas são feitas por filiais de grandes grupos multinacionais que tecem cadeias produtivas globais, exportando insumos e bens finais entre plantas produtivas. O Brasil é o principal centro regional delas basicamente porque tem o maior mercado interno e porque o Mercosul facilita as trocas regionais.
Alguém tem que fornecer outras informações básicas sobre o mundo em que vivemos para os futuros ocupantes do Planalto. Nem Clinton, nem George Bush nem Barack Obama aceitaram abrir o mercado agrícola local para os exportadores brasileiros apesar da insistência de FHC e Lula. Trump, o protecionismo-mor, é quem vai fazê-lo?
Avisem por favor que Trump incluiu a chamada “pílula de veneno” na renegociação do NAFTA do Canadá e México. Assim, ele pode retaliar caso os “parceiros” fechem acordos com a China, com a qual, aliás, Trump está em guerra comercial aberta.
Alguém tem de avisar Bolsonaro e Guedes que a China é o principal destino das exportações brasileiras. E é bom que Bolsonaro pense duas vezes antes de voltar a visitar Taiwan, considerada uma província rebelde em Pequim.
Alertem por gentileza que sair do Acordo de Paris para o clima sujeitará o Brasil a retaliações comerciais da União Europeia. E que os árabes vão deixar de importar carnes halal do Brasil caso mudemos nossa embaixada para Jerusalém por pressão não da comunidade judaica, mas de igrejas evangélicas que apoiaram Bolsonaro. Torçamos para que fanáticos do outro lado não passem a ver a camisa brasileira com ódio nas praias do Egito ou na Copa do Mundo no Catar.
Talvez alguns industriais tenham apoiado Bolsonaro por  imaginarem que, com ele, não seria mais necessário transferir empresas para o Paraguai para pagar salários e impostos paraguaios. Tudo bem, talvez não saibam que os trabalhadores gastam seus salários antes do fim do mês, transformando-os em lucros de outros empresários aqui mesmo no mercado interno.
Talvez não saibam também que o corte prometido do gasto público vai afetar vendas e lucros das empresas, pois o governo não compra em Marte e sim no Brasil. Mas ao menos alguns estão arrependidos por terem apoiado um presidente cujo “Posto Ipiranga” disse que vai “salvar a indústria apesar dos industriais”.
Não vou dizer bem-feito porque, apesar da Fiesp, sou nacionalista. Não proponho rebatizar a Fiesp de Federação das Importadoras do Estado de São Paulo. Só aviso que os níveis de provincianismo e desinformação em Brasília vão aumentar perigosamente no ano que vem. A Barra da Tijuca, apesar da réplica da Estátua da Liberdade, não é Nova Iorque.

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido? - Paulo Roberto de Almeida

Meu trabalho mais recente: 

“Por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido?”, Brasília, 8 novembro 2018, 11 p. Ensaio de caráter histórico para o Simpósio Interdisciplinar Farroupilha 2018, a ser realizado em Santa Maria, RS, nos dias 9 e 10 de novembro. Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/28ed0af501/por-que-o-brasil-ainda-nao-e-um-pais-desenvolvido).

Por que o Brasil ainda não é um país desenvolvido?

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: Exposição e síntese de argumentos sobre a condição social, econômica, política e educacional do Brasil atual, com o oferecimento de razões gerais e algumas particulares, que explicam, embora não justifiquem, nosso atraso relativo em relação a vários outros países de trajetória mais bem sucedida no último meio século; finalidade: Auto-esclarecimento; exposição pública; debate especializado] 

1. Progressos econômicos e sociais: o lento caminhar da humanidade
Perguntas complexas – como a clássica, de como e porque alguns países são desenvolvidos e outros não o são – não podem receber respostas simples, ou simplistas. Por isso, começo por simples constatações de fato, gerais, que podem ser facilmente observadas empiricamente, ou que podem ser comprovadas documentalmente pelos registros históricos. A partir dessas constatações de fato, vou então passar a discutir o caso particular do Brasil, tentando justamente não ser simples ou simplista.

Nove décimos da história da humanidade são uma sucessão de tragédias e de triunfos, mas em meio a grandes sofrimentos para a maior parte. Desnutrição, inanição e morte precoce, pela extrema fragilidade dos recursos alimentares, da intervenção de fatores naturais ou mesmo daqueles criados inteiramente pela mão do homem: invasões, guerras, dominação, escravidão, servidão, exploração, quando não matança pura e simples dos potenciais inimigos e apropriação de suas riquezas, de suas mulheres e crianças. Durante nove décimos da história humana, a escravidão foi um fato corriqueiro na trajetória de muitos povos, seja como dominadores, ou seja, escravocratas, seja como objetos da servidão forçada, pela dominação, pelas dívidas, pela submissão sob qualquer outro pretexto. A fonte de energia natural, original, primordial sempre foi, antes de mais nada e acima de tudo, a humana, seguida pela dos animais reduzidos à servidão pela domesticação humana: bovinos, equinos, muares e outras espécies. A força do fogo, dos ventos, das águas foram domesticadas pouco a pouco, e a história humana se tornou um pouco menos miserável.
(...)

Ler a íntegra neste link: 

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

O que Margaret Thatcher teria a ensinar ao Brasil? - Paulo Roberto de Almeida (Instituto Millenium)

O que Margaret Thatcher teria a ensinar ao Brasil?

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: gravação de podcast; finalidade: Convite do Instituto Millenium]
Podcast do Instituto Millenium em 6/11/2018, disponível no seguinte link: https://www.institutomillenium.org.br/destaque/o-que-o-brasil-pode-aprender-com-margaret-thatcher/


Em 1 de novembro de 2018 concedi uma entrevista em áudio, sob a forma de podcast, para o Instituto Millenium, a propósito da figura da falecida primeira ministra britânica Margaret Thatcher e os ensinamentos que sua experiência como estadista poderiam ter para o novo governo brasileiro. 
Relaciono abaixo as perguntas efetuadas, e as simples notas que eu havia tomado para desenvolver oralmente no momento da gravação, de aproximadamente meia hora no total. O podcast foi editado e recebeu uma introdução-resumo pelo jornalista Frederico Portella, editor de conteúdo do IM, cujo texto transcrevo ao final. O link para a gravação do áudio também está disponível.

(A) Notas rápidas preliminares de Paulo Roberto de Almeida: 

1) Quem foi Margaret Thatcher e por que ela era conhecida como “a dama de ferro”?
Formação em trabalho de mercearia; estudos universitários, com leituras de obras de Friedrich Hayek, Adam Smith, Milton Friedman, entre outros autores liberais. 
Situação da Grã-Bretanha nos anos 1970: declínio industrial, crises fiscal e monetária, aprofundamento do sindicalismo agressivo, Inglaterra quase país do Terceiro Mundo, com PIB per capita inferior ao de sua colônia Hong Kong.
Ela só passou a ser chamada de Dama de Ferro depois de ter sido elevada ao cargo de primeira-ministra e ter se mostrado inflexível na sua resolução de reformar a Inglaterra num sentido liberal, e também ter enfrentado o desafio da reconquista das ilhas Falkland/Malvinas, que haviam sido tomadas pela ditadura militar argentina.

2) Quais foram as medidas liberais que o thatcherismo implantou na Inglaterra durante o tempo em que ela ocupou o cargo de primeira ministra? 
Em primeiro lugar, as privatizações de quase todas as companhias públicas, dominadas pelo sindicalismo militante e pela ineficiência, sob a forma de ações oferecidas ao grande público, uma forma de devolver o poder às pessoas; nisso ela teve de enfrentar batalhas duríssimas contra os sindicatos, sobretudo os mineiros de carvão, tendo a Inglaterra passado um inverno no frio, por causa da falta de aquecimento.
Ademais de sua batalhar pela abertura econômica, ela também passou a defender os valores e ideais do Ocidente democrático e capitalista, podendo ser apontada, junto com o Papa João Paulo II e o presidente americano Ronald Reagan, como um dos estadistas responsáveis pelo desmantelamento final do sistema comunista, uma vez que soube dialogar firmemente com o último SG-PCUS Mikhail Gorbatchev.

3) O Brasil tem ao longo da sua trajetória uma postura estatista, onde medidas liberais não prosperaram. A própria Thatcher já afirmou que o país era o contrário do que ela defendia: um estado grande e fraco. Como o novo governo eleito pode se inspirar em Margaret Thatcher para implantar aqui medidas similares? 
A receita é exatamente a mesma: privatizações de todas as empresas públicas, abertura econômica, liberalização comercial, redução do peso do Estado na economia e enfrentamento das corporações que conquistaram o Estado em seu benefício exclusivo.

4) O corte da inflação também era uma meta do governo Thatcher e pra isso, ela cortou radicalmente gastos. Conter o gasto público também é uma urgência no Brasil? 
Certamente, e como tarefa urgente, imediata, de caráter fiscal, mas ao lado disso já empreender as tarefas de médio prazo de novos investimentos privados em setores importantes da economia, ademais de cuidar da tarefa de longo prazo de melhorar os índices de produtividade do país.

5) Em um país que destina bilhões de reais a partidos e campanhas, a responsabilidade com o uso do dinheiro dos impostos, que também era defendida por Thatcher, deve estar entre as prioridades? 
Certamente, isso faz parte da reforma política e do ataque à fragmentação e dispersão do sistema partidário. Seria preciso extinguir imediatamente o Fundo Eleitoral e depois também completamente o Fundo Partidário. Essas duas medidas permitiriam reduzir radicalmente o número de partidos políticos existentes no país.

6) Perguntada sobre Collor em uma entrevista, ela disse que o Brasil não havia tido um bom governo capaz de atuar com base em princípios, na defesa da liberdade, sob o império da lei e com uma administração profissional. Tivemos outros presidentes depois disso, mas de maneira geral, o que o senhor acha das administrações públicas que tivemos até aqui no sentindo de buscar desinchar o país e impor medidas liberais? 
Foram poucos os presidentes que enfrentaram efetivamente a obesidade do Estado, e praticamente nenhum conseguiu vencer o corporativismo estatal.

7) Qual é a sua expectativa para os próximos anos? 
Um longo período de adaptação, a curto, a médio e a longo prazo.

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(B) Apresentação-resumo do áudio-gravado pelo jornalista Frederico Portella: 
     O podcast recebeu edição do jornalista Frederico Portella, editor de conteúdo do Instituto Millenium; transcrevo a seguir o seu resumo do podcast.

O que podemos aprender com Margaret Thatcher?
A Inglaterra não vivia os seus melhores dias nos anos 1970. A ilha britânica não só havia sido ultrapassada por outros países desenvolvidos, como por sua própria colônia Hong Kong, que chegou a ostentar uma renda per capita superior à da metrópole ao adotar uma economia aberta. Esse cenário mudou após 1979, quando Margaret Thatcher assumiu o cargo de Primeira-Ministra do Reino Unido. À frente do Estado, a Dama de Ferro conseguiu reconquistar o caminho de prosperidade ao travar uma batalha para implementar medidas liberais.
Do outro lado do oceano, o Brasil de 2018 muito se parece com a Inglaterra de algumas décadas atrás. Desde o pós-guerra, partidos com programas marxistas, socialistas e intervencionistas se alternavam no poder. Recursos da sociedade eram dominados por sindicatos e corporações, e a economia sofria com o retrocesso no âmbito das liberdades e a decadência nos planos industrial e de negócios. O diplomata Paulo Roberto de Almeida, Doutor em ciências sociais e Mestre em planejamento econômico, lembra que muitas das medidas impostas por Thatcher poderiam ser colocadas em prática aqui no Brasil. O especialista do Instituto Millenium destaca que o Brasil aparece na 144ª posição do relatório sobre as liberdades econômicas do mundo, produzido pelo Fraser Institute. “A China comunista está em 108º lugar no ranking. Isso significa que ela tem uma postura mais capitalista do que nós! Somos dominados pela república sindical, corporações, sindicatos de funcionários públicos... Valores que estavam presentes na Inglaterra pré-Thatcher”.
As privatizações estão entre as principais medidas adotadas pelo Thatcherismo. A Primeira-Ministra privatizou a maior parte das estatais britânicas de diferentes setores e a população teve acesso à compra de ações das empresas. “Nós temos ainda 146 estatais, das quais a maioria produz déficit público que é alimentado por todos os brasileiros. Acredito que o governo eleito começaria bem se fizesse uma privatização radical, inclusive as consideradas estratégicas. Elas são estratégicas unicamente para os políticos, que as usam para cargos, verbas e outras medidas políticas”, alerta Paulo Roberto.
Outra medida importante apontada pelo especialista é a necessidade de quebrar o poder das corporações e grupos organizados que promovem verdadeiros “assaltos aos recursos da população”. O diplomata lembra que, para devolver o poder às pessoas, Thatcher travou uma longa batalha contra sindicatos que dominavam empresas estatais e a política britânica. Longas greves foram deflagradas na época e os mineiros de carvão chegaram a paralisar as atividades por um ano, deixando a Inglaterra gelada no rigoroso inverno europeu.

O alerta ao gasto público
A contenção do gasto público também era amplamente defendida por Margaret Thatcher, que governou até 1990. Em seus discursos, a dama de ferro salientava que não há “dinheiro público”, existe apenas o dinheiro dos pagadores de impostos. Paulo Roberto  acrescenta que o Brasil vive um crescimento desenfreado de suas receitas, e além disso possui uma carga grande de subsídios destinados a quem já é rico:
“A Thatcher costumava dizer que o socialismo acaba quando acaba o dinheiro dos outros. É um fato. Os gastos públicos na era do lulo-petismo subiram sistematicamente, sempre acima do crescimento do PIB, da produtividade e da taxa de inflação. É uma conta para o futuro que se reverteu no que a gente viu nos anos de 2014 a 2017. Nenhum país, família ou indivíduo pode viver acima do que ganha. O Brasil chegou em 2015 a ter um déficit orçamentário de 10% de PIB. É um suicídio! É condenar os nossos filhos e netos a uma conta de dívida pública impagável”.

O futuro
Ao longo da sua história, o Brasil teve governos com diferentes níveis de centralização, mas de maneira geral, ideias desestatizantes e liberais nunca prosperaram. Para Paulo Roberto, temos pela frente uma longa trajetória para recuperar a destruição das contas públicas. O especialista lembra que em 2022, quando comemoramos os 200 anos de independência, teremos uma renda per capita igual a de uma década atrás.
“A destruição das contas públicas foi de tal ordem que vai exigir três ou quatro anos apenas para tapar o buraco, diminuir o déficit orçamentário e restabelecer as bases de um superávit primário. Acredito que apenas em 2022 ou 2023, teremos restabelecido o equilíbrio. Isso a curto prazo. No médio, temos um problema de investimento que depende de mudança na regulação para atrair investidores estrangeiros e nacionais. E no longo prazo, temos um problema de produtividade, que está muito vinculada à educação. Será preciso trabalhar duro para fazer o Brasil enveredar por um processo de crescimento sustentado”, prevê.

Podcast do Instituto Millenium em 6/11/2018 disponível no seguinte link: https://www.institutomillenium.org.br/destaque/o-que-o-brasil-pode-aprender-com-margaret-thatcher/


Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 1 e 6 de novembro de 2018


quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Reservas internacionais do Brasil: qual o melhor uso? (jornais)

Matérias da imprensa nesta quarta-feira, 31/10/2018:

O Estado de S. Paulo – Guedes e as reservas / Coluna / Monica de Bolle


Em junho deste ano escrevi nesse espaço artigo intitulado “Reservas, para que te quero”. Tratava do volume de nossas reservas internacionais e de propostas sobre como utilizá-las caso houvesse julgamento de que estavam em patamar além do considerado “adequado”. O FMI tem uma metodologia para calcular o nível adequado de reservas para cada país, levando em conta diversas variáveis, inclusive os juros internacionais e o ambiente para os mercados emergentes. De acordo com as contas mais recentes, aponta o Fundo que o nível das reservas brasileiras está cerca de 1,6 vez mais elevado do que o patamar que o FMI consideraria adequado. Isso significa que já podemos começar a usar os US$ 140 bilhões para alcançar algum objetivo?

Na época em que escrevi o artigo supracitado, argumentei que as reservas poderiam ser usadas para recomprar uma parte da dívida brasileira, o que ajudaria a reduzir seu custo de carregamento. Contudo, alertei que tal medida não poderia ser feita de forma isolada: importante seria pensar no uso das reservas para esse propósito como um dos elementos de uma agenda mais ampla de ajustes que incluísse as medidas fiscais cabíveis para reduzir o déficit público e as reformas que não podem mais esperar, como a da Previdência. Evidentemente, sair vendendo reservas antes de consertar os graves problemas fiscais que tem o Brasil seria medida absolutamente inconsequente, sobretudo tendo em vista o ambiente externo menos favorável para mercados emergentes e a crise que se abateu sobre a vizinha Argentina.

Por que se fala em um nível adequado de reservas? A razão é que há um cálculo de custo-benefício para mantê-las: de um lado, volumes maiores de reservas servem como um seguro contra crises externas e episódios de extrema turbulência nos mercados internacionais. De outro, quanto mais reservas tem um país, maior o custo de carregá-las – isso porque, para que sirvam como um seguro em momentos de fortes oscilações externas, é preciso investi-las em ativos de alta liquidez, que naturalmente têm taxas de rendimentos menores. A alternativa seria investir esses recursos em ativos com taxas de retorno mais elevadas, porém abrindo mão da possibilidade de usálos em qualquer momento, isto é, da liquidez.

Há diversos estudos interessantes sobre o nível adequado das reservas internacionais. Em um deles (Kim e Lee, 2017, Asymmetric Stabilizing Impact of International Reserves), os autores mostram como muda o nível adequado em função do ambiente interno e externo.

Durante períodos de calmaria, o patamar adequado poderia ser menor, pois predomina o impacto do custo de carregar reservas sobre o benefício de tê-las. Em momentos de turbulência, seja externa ou interna, predomina o efeito do benefício – o seguro – sobre o custo potencial de carregar mais reservas. O Brasil não enfrenta calmaria alguma, por mais que tenham reagido bem os mercados à eleição de Jair Bolsonaro. Ainda temos um ambiente de instabilidade política interna, um presidente eleito que pouca clareza deu aos seus planos econômicos, e uma equipe econômica que não parece ainda estar falando com uma só voz.

Desde domingo, por exemplo, proliferaram informações contraditórias sobre o posicionamento de diferentes membros do círculo íntimo de Bolsonaro sobre a reforma da Previdência. Além disso, o ambiente externo exige cautela, não apenas por causa das dúvidas sobre os efeitos da guerra comercial

Surgem as consequências de uma campanha sem qualquer discussão sobre a agenda de medidas e reformas

entre China e Estados Unidos, como também em razão da maior desconfiança de investidores estrangeiros em relação aos países emergentes, haja vista a situação da Argentina e da Turquia. Some-se a isso o quadro de elevação das taxas de juros nos EUA e a falta de clareza sobre o ajuste fiscal brasileiro e o que temos é um ambiente em que qualquer discussão sobre o uso das reservas deveria estar, no mínimo, postergada.

Contudo, noticiou o jornal Valor Econômico que Paulo Guedes e sua equipe flertam abertamente com a ideia de usar as reservas para reduzir os juros da dívida sem que exista qualquer condição de fazer isso agora. Estão aí as primeiras consequências de termos passado por campanha inteira sem nenhuma discussão sobre a agenda de medidas e reformas econômicas para o País. O resultado disso é muito ruído e pouco sinal em uma economia que exige clareza para se reerguer, evitar uma crise mais profunda, e dar algum consolo aos cerca de 13 milhões de desempregados.

ECONOMISTA, PESQUISADORA DO PETERSON INSTITUTE FOR INTERNATIONAL ECONOMICS E PROFESSORA DA SAIS/JOHNS HOPKINS UNIVERSITY

Valor Econômico – Guedes usaria reserva em caso de ataque à moeda


Por Cristiane Agostine | Do Rio

Futuro ministro da Economia de Jair Bolsonaro (PSL), o economista Paulo Guedes disse ontem que o governo poderia vender hipoteticamente US$ 100 bilhões das reservas internacionais, aproveitando para, com isso, reduzir a dívida interna. "Se [o dólar] chegar a R$ 4,20, R$ 4,30, R$ 5, vai ser muito interessante, porque vamos vender US$ 100 bilhões de reservas, que são R$ 500 bilhões", afirmou o economista, ressaltando a importância de um "regime fiscal robusto" para se adotar essa estratégia. Isso permitiria ao país ter um volume menor de reservas - hoje, elas estão na casa de US$ 380 bilhões, e têm um custo fiscal elevado.

"Se houver especulação e jogarem o dólar para cima, não tem problema nenhum, não temos receio nenhum", reiterou Guedes, por diversas vezes, em entrevista ontem no Rio. "Pode vir, pode especular contra, não tem problema nenhum", repetiu. "Se tiver crise e botarem o dólar lá em cima, a R$ 4, R$ 5, será ótimo. Quem quiser dólar nós vamos vender e depois vamos reduzir a dívida interna."

Guedes deu essas declarações ao comentar a manchete do Valor de ontem, que relata que ele havia proposto a redução das reservas em discussões internas com a equipe que elabora o plano econômico de Bolsonaro. O futuro ministro da Economia disse que o tema surgiu quando o dólar bateu em R$ 4,10, há cerca de um mês, e acrescentou a informação de que falou num valor de US$ 100 bilhões.

Em entrevista a jornalistas, Guedes deu ontem mais detalhes sobre o assunto. "Eu comentei com o time [que elabora as propostas econômicas para Bolsonaro]: É interessante como faz falta o ajuste fiscal. Quando existe um regime fisal robusto, não existe essa necessidade de carregar tantas reservas, porque isso é um seguro muito caro", afirmou ele. "Quando entra dinheiro de fora, você acumula reservas e emite reais. Depois você emite dívida interna para esterilizar esse dinheiro que entrou de fora." O volume elevado de reservas e o baixo déficit em conta corrente são fatores que reduzem a vulnerabilidade da economia brasileira, num momento em que a situação das contas públicas é delicada.

Segundo Guedes, a venda de reservas seria feita apenas em um cenário de crise. "O dólar está a R$ 3,60. Para que vou vender dólar? Para derrubar exportação? Para empurrar para baixo?", disse ele, ao chegar à casa do empresário Paulo Marinho, no Rio. De acordo com ele, não haverá meta para câmbio.

"Se houver uma crise especulativa, não tem problema nenhum. Isso vai acelerar o ajuste fiscal", disse Guedes. Ele enfatizou que, se o dólar chegar a R$ 5 e forem vendidos US$ 100 bilhões das reservas, isso equivale a R$ 500 bilhões, que seriam usados para abater a dívida interna. "Eu vendo as reservas, reduzo a dívida de R$ 3,5 trilhões para R$ 3 trilhões e depois sigo a vida. Isso já é um ajuste fiscal em si. Isso já me economiza", afirmou Guedes, que tem como um de seus objetivos principais reduzir o endividamento público e, com isso, diminuir os gastos com juros.

"Qualquer economista bem preparado conhece o que nós chamamos de política de esterilização. Há um ataque cambial, você reduz um pouco as reservas e esteriliza esse efeito recomprando a dívida interna", disse Guedes aos jornalistas.

O futuro ministro afirmou ainda que o próximo governo vai aprovar um projeto que garanta autonomia ao Banco Central, com mandatos não coincidentes com o de presidente da República. De acordo com ele, a permanência de Ilan Goldfajn no BC seria natural. No entanto, disse que ainda não conversou com o atual presidente do BC. Guedes ressaltou que não quer falar com alguém que não tenha o desejo de ficar. "A motivação é fundamental." Guedes citou ainda que Ilan assumiu o cargo "por acidente".

"Ilan ficou dois anos com Temer. O desenvolvimento natural qual seria? Eu defendo há 30 anos um BC independente. O Ilan tem uma proposta de BC independente. O que seria a coisa mais natural do mundo? Eu dar um abraço no Ilan e falar que defendo há 30 anos BC independente. Ele falaria que tem um projeto de BC independente. A gente vai junto, aprova o projeto, você ficou dois anos e ficaria mais dois anos", afirmou ele. De acordo com Guedes, essa eventual permanência do presidente do BC teria que ser combinada com a equipe de Bolsonaro e com Ilan.

Guedes destacou a relevância do projeto de independência do BC para eliminar as incertezas em relação à autoridade monetária em época de eleição. Com mandatos não coincidentes para a diretoria do BC, essa fonte de indefinição seria eliminada.

Ao comentar a ideia de vender reservas para abater a dívida pública, o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto, diz que qualquer mudança a respeito precisa ser feita com muito cuidado. "Teoricamente faz sentido, mas é necessário avaliar o risco macroeconômico", afirma Salto, ressaltando a importância de o governo se concentrar em medidas para melhorar o resultado primário (que não inclui gastos com juros), com prioridade para o controle das despesas. É preciso avaliar com muita cautela o impacto que a medida teria sobre o câmbio, diz ele. A venda de um volume muito expressivo de reservas pode causar uma valorização muito rápida do real, ao colocar "uma montanha de dólares na economia", diz Salto.

Há um ganho fiscal, que se daria com a redução das operações compromissadas, pelas quais o BC vende no mercado títulos do Tesouro com o compromisso de recomprá-los depois de um prazo determinado, afirma Salto. Elas fazem parte da dívida bruta, tendo um prazo médio inferior a 30 dias. O fundamental, segundo ele, é avançar na melhora estrutural das contas públicas. Uma eventual venda das reservas para reduzir a dívida deve ser muito cuidadosa, sendo "precedida ou acompanhada" por mudanças no gasto primário, diz Salto. (Colaborou Sergio Lamucci, de São Paulo)

Valor Econômico – Mercado mostra dúvidas sobre a venda de reservas


Por Cristiane Agostine, Estevão Taiar, Lucinda Pinto, Lucas Hirata, Silvia Rosa e Ribamar Oliveira | Do Rio

A ideia do governo Jair Bolsonaro de vender parte das reservas internacionais para reduzir a dívida pública, antecipada ontem pelo Valor, provocou discussões no mercado financeiro. O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, explicou que a venda de reservas, hoje em US$ 380 bilhões, será feita apenas em um cenário de crise especulativa sobre o câmbio no país. "Se botarem o dólar lá em cima, a R$ 4 ou R$ 5, será ótimo. Vamos reduzir dramaticamente a dívida interna". Segundo ele, seria possível vender US$ 100 bilhões com o dólar a R$ 5, o que reduziria a dívida interna em R$ 500 bilhões.

Cândido Bracher, presidente do Itaú, disse que a ideia é interessante, porque teria impacto fiscal positivo. Mas sugeriu que a venda teria de ser gradual. Carlos Kawall, economista-chefe do Banco Safra, tem a mesma opinião, com a ressalva de que antes de vender reservas é preciso aprovar as reformas e "mostrar uma trajetória de sustentabilidade fiscal". Gustavo Loyola, ex-presidente do BC, lembrou que essa discussão não é muito relevante no momento, porque as reservas representam "um seguro" para o país, cujo custo diminuiu em função da redução da diferença entre o juro brasileiro e o americano. Para Luis Costa, do Citi em Londres, o ideal seria reduzir reservas apenas depois de o Banco Central zerar o estoque de swaps cambiais, hoje em US$ 68,8 bilhões.

Há no mercado relativo consenso sobre o excesso de reservas no momento, em razão do custo fiscal que elas impõem. Mas entende-se que sua redução seria arriscada, porque poderia piorar a percepção de risco do investidor em relação ao país. Argumenta-se, também, que vender reservas num momento de ataque especulativo, com o dólar em disparada, seria o mesmo que "discutir o seguro quando a casa estiver pegando fogo".

As explicações de Guedes também deixaram duas perguntas no ar: haverá no novo governo um teto para o câmbio? Qual seria essa cotação?

terça-feira, 23 de outubro de 2018

Brasil: indice mediocre de competitividade - Forum de Davos

Brasil assume lanterna dos BRICS em índice de competitividade global

Publicado anualmente pelo Fórum Econômico Mundial, o chamado "Relatório Global de Competitividade" trouxe o Brasil três posições abaixo no comparativo com o ano passado. Ranking apresenta China em 28º, Rússia em 43º, Índia em 58º e África do Sul em 67º lugar. Brasil é apenas o 72º na lista liderada por Estados Unidos, Cingapura, Alemanha e Suíça.

Agência (russa) Sputniks, 23/102018

documento analisa 140 nações e pondera fatores como instituições, infraestrutura, estabilidade macroeconômica, saúde, qualificação profissional, capital humano, dinamismo em ambiente de negócios e inovação. A lanterna geral é ocupada pelo Chade, Iêmen e Haiti, três países que passaram ou passam por conflitos bélicos recentemente.
Para o economista e professor da Fundação Dom Cabral, Gilberto Braga, se levados em consideração os indicadores ponderados pelo levantamento, a colocação do Brasil é justa. O especialista avalia que "burocracia administrativa elevada e a carga tributária alta" são os principais fatores que impedem o país de subir no ranking.
"Quando comparado com países desenvolvidos e os BRICS, o Brasil é aquele que é mais difere. Tem mais burocracia e não possui marco jurídico e regulatório fixo. Aqui se modificam as regras em uma velocidade muito grande, o empreendedor quando abre um negócio, ás vezes antes de começar funcionar vê que a regra já mudou. Não se trata de capacidade ou criatividade, mas de má condição para se fazer negócios quando comparado com outras nações", critica.
Braga aponta que o Brasil usa de 7 a 8 vezes mais funcionários em comparação com a Inglaterra apenas para atender a funções administrativas e governamentais. "No Brasil uma empresa costuma ocupar de 35 a 40% dos seus funcionários administrativos dedicados a trabalhos governamentais como preenchimento de guias, montam arquivos, transmitem informações para órgãos regulares, autoridades tributárias e governamentais", pontua.
Além de trâmites legais complicados, somam-se, na visão do economista, fatores de cunho social como a "má educação [da população], a violência urbana e a corrupção".
"Tudo isso faz com que o o investidor, sobretudo o estrangeiro, quando vai direcionar os empreendimentos para determinado país pondere esses fatores. Muitas vezes [o investimento] poderia ser no Brasil, por conta das nossas tradições e potencialidades, e acaba sendo dirigido para outra nação", diz.
No recorte dos BRICS, o ranking traz a China em 28º, Rússia em 43º, Índia em 58º e África do Sul em 67º lugar. O Brasil é apenas o 72º na lista liderada por Estados Unidos, Cingapura e Alemanha.

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Trade liberalization in Brazil - World Bank

A conversa é sempre a mesma: o Brasil ganharia muito com a liberalização comercial, mas a despeito disso nunca se abre. Por que? Só pode ser pela ação dos capitalistas predatórios do Brasil, que se opõem a essa simples medida de eficiência...

WORLD BANK POLICY RESEARCH WORKING PAPER ABSTRACTS

This paper describes how different policy distortions have been impeding better integration of Brazil's external and internal product markets and discusses how these distortions have prevented domestic firms from benefiting from multiple sources of efficiency gains. The paper first focuses on the costs of barriers to global integration, followed by an overview of policy induced stringencies hampering domestic integration. Drawing from general and partial equilibrium analyses, the paper also provides evidence of potential impacts of removing some of those distortions and discusses policy options to promote better allocation of resources across the economy. The main conclusion of the paper is that Brazil could gain significantly from opening to foreign trade. Yet, for Brazil to take full advantage of the opportunities that external integration offers, domestic markets also need to function better, so it is key to ensure that the removal of external barriers to integration is coordinated with the removal of internal distortions to domestic market integration.

sábado, 6 de outubro de 2018

Brasil: quadro economico complicado em 2019 - Zeina Latif (OESP)


Zeina Latif

Para muitos players do mercado financeiro o cenário econômico é binário, a depender do resultado das eleições. Julgam Jair Bolsonaro equipado para fazer reformas, enquanto Fernando Haddad representaria um risco de retrocesso. No entanto, ambos enfrentarão grandes dificuldades para governar e aprovar reformas estruturais, pois carecem de experiência política e administrativa, e não têm projeto para o País ou agenda econômica bem definida.

A situação é grave e demandaria um presidente com maior envergadura política. O Brasil vive a mais grave crise fiscal da história, o que implica risco de shutdown de serviços públicos e de o presidente incorrer em crime fiscal nos próximos anos. Isso vale também para os governadores.

A recuperação cíclica da economia poderá frustrar, tendo em vista a provável alta da inflação e dos juros pelo Banco Central. Tudo isso em meio a uma sociedade indignada e instituições fragilizadas. Os desafios de cada candidato são diferentes, já de largada. Para Haddad, será renegar a equivocada agenda econômica petista e montar uma equipe econômica competente e com credibilidade. Será necessária grande dose de coragem e humildade.

Atributos raros.

Bolsonaro precisará enfrentar o desafio da política para construir uma base de apoio sólida e com partidos que exerçam liderança no Congresso, cedendo espaço no governo. O deputado é pouco hábil politicamente, a julgar pelas frequentes mudanças de partido e pela pobre performance na Câmara, onde é associado ao “baixo clero”, apesar de estar em seu sétimo mandato parlamentar.

Pelas projeções dos analistas do mercado financeiro, o próximo governo será um sucesso, apesar de não sabermos qual a probabilidade atribuída ao cenário traçado. De acordo com o boletim Focus, a taxa Selic subirá para apenas 8% ao ano em 2019 (atualmente está em 6,5%), a inflação ficará em 4,2%, a cotação do dólar em R$3,83 no final do ano e o crescimento do PIB de 2,5%.

Essas previsões, com pequenos ajustes, seguem para os anos seguintes. Traduzindo, os analistas apostam na continuidade de reformas fiscais, tal que a inflação fique em torno da meta, sem exigir um aperto monetário pelo BC, bem como o avanço de reformas estruturais que elevem o potencial de crescimento do País. Este cenário não é impossível, mas sua probabilidade, por ora, é baixa.

O ambiente se manterá incerto mesmo após o resultado das eleições, e incerteza é veneno para investidores, produtores e consumidores. Teremos, ao menos, de aguardar a descida do palanque: o aceno de Haddad ao setor privado, após seus discursos antiajuste fiscal, e o aceno de Bolsonaro à política, após o discurso antipolítica.

A ironia é que apesar dos discursos cheios de personalidade de ambos os lados e com críticas ao governo Temer, o próximo governo terá de ser de continuidade do atual para o País voltar a crescer. É recomendável preservar ao máximo os times na Fazenda, no Planejamento e no Banco Central. Para tanto é necessário o presidente ter compromisso com uma agenda responsável e modernizante.

Com a urgência de reformas, o País não pode perder tempo aguardando o aprendizado de um novo time. Já basta a inexperiência do próximo presidente. É importante avançar com as várias propostas de reforma, que são importante contribuição do atual governo e também do Congresso.

A lista é extensa: reforma da Previdência, tributária, agenda BC+, marcos regulatórios dos setores de energia, privatização da Eletrobrás, para citar as de maior visibilidade. A mais urgente é a reforma da Previdência. Este sim é o divisor de águas do cenário binário. Não que sendo aprovada tudo se resolve, mas ela é central para o País afastar um cenário caótico.

E tanto para Haddad como para Bolsonaro, será desafiador aprovar tempestivamente uma boa reforma. Que venha a continuidade da agenda econômica. Quanto menos inventar, melhor.

ECONOMISTA-CHEFE DA XP INVESTIMENTOS

Desafios externos ao Brasil em 2019 - Johanns Eller (JB)

Uma agenda certamente carregada no plano diplomático, que não sabemos como será enfrentada, por quem será enfrentada – presidente e chanceler – e quais decisões serão tomadas em nome de todos os brasileiros, com todos os riscos envolvidos em termos de credibilidade externa e de responsabilidade em face de organismos, tratados, obrigações do Brasil.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 6 de outubro de 2018

Brasil assume presidência do Brics, Mercosul e da Unasul no mandato do próximo presidente

O Brasil, cuja política externa independente é uma referência tradicional em todo o mundo pelo importante papel de mediação e cooperação exercido historicamente pelo país, terá um novo presidente a partir de janeiro de 2019. O futuro ocupante da cadeira mais alta da República terá pela frente uma extensa e desafiadora agenda diplomática que, à exemplo de pleitos anteriores, escapou dos debates e sabatinas de presidenciáveis. As responsabilidades do futuro dirigente nas diretrizes do Itamaraty prometem ser testadas já no primeiro mês de governo.
O Brasil deve assumir a liderança de blocos e entidades multilaterais e sediar um evento de grande porte das Nações Unidas. A decisão da eleição presidencial de amanhã, que pode ser submetida a um segundo turno no próximo dia 28, converge na ocorrência de importantes eventos diplomáticos, especialmente no próximo ano, após um longo período de marasmo. A faixa presidencial passará para o primeiro presidente eleito desde o início de uma crise política que contribuiu para o isolamento do Ministério das Relações Exteriores (MRE) durante os governos de Dilma Rousseff e Michel Temer. O vencedor da disputa eleitoral, ainda cercada de incertezas, conduzirá as diretrizes do Itamaraty, conforme prevê a Constituição.
Macaque in the trees
O Ministério das Relações Exteriores foi colocado em segundo plano nas gestões Dilma e Temer, mas agenda impõe papel de destaque no governo do futuro presidente (Foto: Reprodução) 
A primeira agenda internacional do novo presidente deverá ser o Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, no fim de janeiro. Nos últimos anos, o Brasil se comportou como figurante no evento que reúne chefes de Estado, investidores e empresários. Temer só esteve na cidade suíça neste ano em uma participação tímida. A última viagem de Dilma para Davos ocorreu em 2014. Nos demais anos, o país foi representado por ministros.
Outra instância econômica incluída no roteiro do MRE já no próximo ano é a cúpula anual do G20, bloco que reúne as 20 principais economias mundiais. O encontro de 2019 ocorrerá em junho e será sediado em Osaka, no Japão, e o próximo presidente estará lado a lado com lideranças mundiais como Donald Trump, Angela Merkel e Emmanuel Macron.
Os dois fóruns seriam vitrines naturais para o novo dirigente, que teria a oportunidade de se apresentar para a comunidade internacional e dar acenos quanto à política econômica do novo governo da nona maior economia do planeta.
A 25ª Conferência da ONU sobre o Clima (COP-25), também chamada de Conferência das Partes, prevista para ser sediada no Brasil em novembro de 2019, também tem o potencial de abrir as janelas da diplomacia brasileira. A cidade sede ainda não foi definida, segundo o Itamaraty. Ontem, o Grulac, bloco de países latino-americanos e caribenhos na ONU, anunciou ao secretariado da conferência que não há objeções à candidatura brasileira. O processo estava estacionado há meses graças a um veto da Venezuela.
No âmbito da integração multilateral, Brasília assumirá papeis de destaque já no ano que vem. O dirigente eleito pelas urnas assumirá a presidência do Brics, grupo que também reúne Rússia, Índia, China e África do Sul. O Brasil também sediará a 11ª cúpula do bloco e receberá os líderes Vladimir Putin, Narendra Modi, Xi Jinping e Cyril Ramaphosa.
O país também assumirá a presidência do Mercosul em duas ocasiões até 2023, quando expira o próximo mandato presidencial - a primeira delas no segundo semestre do próximo ano. Na agenda está a crise na Venezuela, suspensa do bloco desde agosto de 2017, e as negociações com a União Europeia (UE), mantidas em estado de latência.
“Nós sabemos que o período eleitoral no Brasil ou em qualquer democracia do mundo não é o momento ideal para se tomar decisões fundamentais sobre a economia”, explicou o embaixador da UE no Brasil, João Gomes Cravinho, que considera as negociações com o bloco avançadas, porém incompletas. “Isso vai requerer mais algumas rodadas de negociação quando o Brasil estiver pronto”, disse.
A Unasul, iniciativa pela integração multilateral na América do Sul que se tornou alvo do debate sobre a crise venezuelana, promete ser um desafio para o próximo presidente. O Brasil é o próximo na fila da presidência rotativa da entidade, sediada no Equador, mas suas atividades diplomáticas estão suspensas desde abril. Boa parte dos trabalhos estão paralisados desde o impasse em torno da sucessão da secretaria-geral. Caberá ao próximo presidente decidir sobre o futuro da entidade.
O plano de governo de Jair Bolsonaro (PSL), líder das pesquisas, é enxuto no campo da política externa. Crítico ao modelo de integração conduzido pelos governos do PT, o documento fala apenas em aprofundar relações com os “irmãos da América Latina que estão livres de ditaduras”. Fora do material apresentado ao Tribunal Superior Eleitoral, o candidato disse ter a pretensão de tirar o Brasil do Acordo de Paris, seguindo o exemplo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A proposta pode gerar fortes tensões na COP-25.
Já Fernando Haddad (PT) elogia o legado petista e defende o fortalecimento de blocos como Mercosul, Unasul e Brics. Na mesma linha, Ciro Gomes (PDT) defende mecanismos de integração multilateral como “instrumentos poderosos” para a redefinição da ordem mundial sem que o Brasil exerça “hegemonia” sobre outras nações como “líder da América do Sul”.
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Venezuela é tema central
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Nicolás Maduro discursa durante Assembleia Geral das Nações Unidas este ano (Foto: Angela Weiss/AFP) 
A crise humanitária e política na Venezuela, que se estende há três anos e já levou ao êxodo de dois milhões de pessoas segundo as Nações Unidas, representa hoje o principal dilema geopolítico da América Latina. Depois da reeleição de Nicolás Maduro há quatro meses, em uma eleição contestada pela comunidade internacional, os fluxos de imigrantes cresceram e o nível de tensão nos países vizinhos, incluindo o Brasil, subiu. Para especialistas, os dois candidatos mais bem colocados nas últimas pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), representariam políticas radicalmente opostas quanto à questão venezuelana.
Para o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) e doutorando em Ciência Política, Danillo Bragança, um eventual governo Bolsonaro traria rupturas com entendimentos históricos da diplomacia brasileira. “O Itamaraty defende a solução da crise da Venezuela através da Carta da ONU e da OEA”, explica o professor. “O Brasil pode se tornar o líder de uma coalizão contra a Venezuela, o que lidaria com o problema da pior forma. O presidente da Colômbia, Iván Duque, já demonstrou interesse pela solução não pacífica, e o Brasil poderia chancelar isso. Os outros países, sobretudo a Argentina, não teriam condições econômicas de embarcar nessa aventura”, opina Bragança. Recentemente, Donald Trump, não descartou uma intervenção dos EUA ou o suporte a um golpe militar contra o regime de Maduro.
Já no cenário em que Haddad ou mesmo Ciro Gomes (PDT) cheguem ao poder, o acadêmico avalia que a saída seria por meio de soluções democráticas. “O Brasil, ao lado do México (sob o governo Obrador), seria o carro-chefe da resistência às políticas intervencionistas dos EUA. “Temos o poder de resolver a questão com nossos mecanismos internos”, assegura.