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domingo, 6 de novembro de 2022

Brasil, um país de corruptos? Aparentemente sim: Auditoria do TCU revela fraudes no Auxílio emergencial

 TCU atualiza balanço da fiscalização do Auxílio Emergencial

 

Relatório aponta que houve uma economia de mais de R$ 12 bilhões aos cofres públicos a partir da detecção de pagamentos irregulares a 4,9 milhões de pessoas

 

Por Secom TCU

 

14/09/2022

 

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O Tribunal de Contas da União (TCU) divulgou a atualização do Balanço da Fiscalização do Auxílio Emergencial. O relatório trata das fiscalizações das medidas de implementação do auxílio às pessoas em situação de vulnerabilidade, previstas no Plano Especial de Acompanhamento das Ações de Combate à Covid-19.

 

Com base em informações demográficas, o TCU estima que cerca de R$ 45 bilhões foram pagos indevidamente. O montante abrange 7,4 milhões de pessoas que teriam recebido de forma irregular ao menos uma parcela e outros 6,4 milhões de mães que ganharam indevidamente uma cota excedente. 

 

O relatório também consolida resultados de cruzamentos de dados de órgãos de controle, a partir de cadastros administrativos. Informações da Controladoria-Geral da União, dos tribunais de contas nos estados e das controladorias-gerais subnacionais identificaram 4,9 milhões de beneficiários indevidos até julho de 2021. O número reflete uma economia de despesas da ordem de R$ 12,3 bilhões. 

 

O material, que pode ser consultado aqui, também aborda as causas dos pagamentos indevidos e como o Tribunal contribuiu para aprimorar o Auxílio Emergencial. Ainda é possível acompanhar as propostas não implementadas por órgãos competentes e as oportunidades para discussões técnicas e aprimoramentos.

 

Clique aqui e acesse o documento na íntegra

https://portal.tcu.gov.br/balanco-da-fiscalizacao-do-auxilio-emergencial.htm

 

domingo, 22 de novembro de 2020

Fundo Monetário da América Latina?: uma idéia discutível (2000) - Paulo Roberto de Almeida

 Fundo Monetário da América Latina?: uma idéia discutível

 

Paulo Roberto de Almeida

Doutor em ciências sociais. Autor de

O Brasil e o multilateralismo econômico

(Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999)

pralmeida@brasilemb.org  http://pralmeida.tripod.com

Publicado no boletim Network (Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudo das Américas, v. 9, n. 2, abr/jun. 2000, p. 1 e 2). Relação de Publicados n. 255.

 

 

Representantes de países andinos, em encontro preparatório à reunião de Cúpula do Grupo do Rio, realizada em junho último em Cartagena de Índias, na Colômbia, voltaram a tocar numa idéia que já tinha sido aventada por eles mesmos quando dos efeitos mais desestabilizadores do vendaval financeiro que agitou o mundo entre 1997 e 1999: a criação de um “Fundo Monetário da América Latina”, supostamente destinado a oferecer opção alternativa (ou complementar) de crédito aos países da região.

Tal como apresentada pelo presidente do Fundo Latino Americano de Reservas (Flar), Roberto Guarnieri, o novo organismo, se constituído, seria o resultado da ampliação do Flar, do qual participam atualmente apenas os países do chamado grupo andino. Segundo ele, os presidentes dos países andinos teriam dado seu apoio à proposta, que seria em seguida levada a conhecimento dos demais participantes do Grupo do Rio. Na verdade, tratava-se de velha sugestão, repetidamente apresentada ao longo dos anos aos responsáveis monetários e financeiros dos demais países da região.

A iniciativa, velha conhecida dos funcionários do Banco Central do Brasil, vem sendo sugerida de maneira recorrente como uma espécie de “FMI latino” e assim foi imediatamente caracterizada pela imprensa. Matéria da correspondente especial do Jornal do Brasil ao encontro de presidentes do Grupo do Rio, Sonia Carneiro, fazia a chamada em sua edição de 16 de junho: “Países andinos pedem FMI latino”, completando-se o subtítulo da seguinte forma: “Apresentada na reunião de governantes latino-americanos, plano é parte de reformulação da arquitetura financeira mundial”. Altamente especulativa, a reportagem chegou a confundir zona de livre-comércio com união monetária, num contexto de reforma do sistema financeiro internacional. Segundo a repórter, “O primeiro passo para a criação de uma zona de livre comércio latino-americana e de uma moeda única, foi dado ontem [isto é, 15/06/2000] por representantes de 19 países latino-americanos – 15 presidentes e 4 chanceleres – no primeiro dia de reunião da XIV reunião de Cúpula do Grupo do Rio, convocada para analisar a revisão do sistema financeiro internacional, o papel da ONU no próximo século e medidas para aumentar a segurança humana. Os presidentes aceitaram discutir a proposta encaminhada pelos representantes do grupo andino – Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela – para a criação de um Fundo Monetário do continente (já batizado de FMI latino-americano), idealizado para permitir aos países em desenvolvimento enfrentar os desafios da globalização.”

Levada à fase final da reunião de cúpula do Grupo do Rio, a idéia foi devidamente expurgada de seus aspectos mais comprometedoras e reduzida a uma fórmula genérica, sem qualquer conteúdo vinculatório mais explícito. De fato, o parágrafo 34 da Declaração de Cartagena de Índias, intitulada “Um compromisso para o Milênio”, assim rezou: 

Proponemos complementar el fortalecimiento del sistema financiero global con un mayor desarrollo de las instituciones financieras regionales y subregionales, aprovechando sus ventajas comparativas, promoviendo la coordinación de sus actividades y evitando la duplicación de funciones.

 

Tendo prevalecido o bom senso, imaginemos contudo como seria se o projeto tivesse prosperado e levado adiante em seus compromissos práticos. Para isso, antes de apresentar as respostas previsíveis ou esperadas pelos seus proponentes, é preciso fazer as perguntas adequadas. Com que capital trabalharia o suposto FMI latino? Quem, ou quais países, mais exatamente, seriam chamados a integralizar as cotas da subscrição básica e que relação teria o capital operacional com o exigível? Em que moedas trabalharia a nova instituição, em quais manteria reservas, como seria administrado o fundo rotativo? Como se definiria seu processo decisório e como seriam escolhidos seus dirigentes e funcionários? Em que condições atuaria essa instituição de crédito e que tipo de política se aplicaria para situações de “simples” desequilíbrio de balanço de pagamentos ou uma de risco sistêmico? Haveria condicionalidades na utilização dos recursos, determinação de políticas de ajuste, recomendações de ordem fiscal, monetária, macroeconômica? Enfim, como faria esse “FMI latino” para ser um pouco mais latino e bem menos FMI?

Conhecendo-se o registro histórico de inadimplências periódicas e de crises financeiras regionais, não é difícil imaginar os limites e as peculiaridades, bem como antecipar os prováveis resultados de uma tal instituição regional. Consideremos, antes de mais nada, a ordem de magnitude dos valores envolvidos. Quando da crise do Tequila, entre dezembro de 1994 e janeiro de 1995, o pacote montado sob a liderança dos Estados Unidos para salvar o México de uma completa débacle financeira representou a mobilização de mais de 50 bilhões de dólares, dos quais foram efetivamente utilizados pouco mais da metade. Da mesma forma, quando o Brasil corria o risco imediato de se apresentar como o “next one”, no seguimento da moratória russa de agosto de 1998, o pacote de apoio financeiro constituído pelo dinheiro do FMI, dos bancos multilaterais (BIRD e BID) e por vinte países membros do BIS, ultrapassou 41 bilhões de dólares, dos quais o Brasil sacou pouco mais da metade igualmente. O pacote foi dispensado em abril de 2000, quando o Banco Central efetuou pagamento de 10 bilhões de dólares, retendo ainda algumas linhas de crédito do FMI, de custo mais aceitável para o país.

Com quanto poderia contar o FMI latino? Atualmente, o Flar conta com um capital de US$ 1 bilhão e pretenderia, segundo seu dirigente, dobrar o valor em cinco anos. Recentemente, o organismo ajudou o Equador a lidar com sua crise, dando-lhe socorro de US$ 411 milhões. Em outros termos, o FMI latino precisaria pelo menos quintuplicar o seu capital num horizonte razoável de tempo para poder hipoteticamente vir a prestar ajuda aos países maiores da região, adicionalmente aos mecanismos de apoio financeiro já existentes no âmbito do Fundo Monetário Internacional. De onde supostamente sairia o dinheiro? Como se imagina mal o FMI de Washington ou os países desenvolvidos correrem em socorro de uma entidade puramente regional, a conclusão é a de que ele teria de vir da própria América Latina.

A idéia não é nova e de fato ela retoma iniciativas anteriores de criação ou ampliação de fundos regionais, que mais recentemente surgiram na Ásia, quando do início da crise financeira em 1997. O Japão, potência financeira regional, até se dispôs a ajudar a constituição desse fundo, mas foi discretamente dissuadido pelos Estados Unidos e pelos países europeus. Na América Latina, entretanto, na ausência de uma verdadeira potência financeira regional, supõe-se que os países maiores – Argentina, Brasil, México – seriam chamados a cumprir esse papel. Em resumo, o Brasil seria chamado a contribuir para um fundo ao qual ele não administraria totalmente e do qual não poderia realisticamente esperar grande socorro numa situação de emergência. A iniciativa pode até ser generosa, para países como o Equador, mas trata-se certamente de um mau negócio para países como o Brasil.

 

Network Cândido Mendes [739: Washington, 21/06/2000]

 

quarta-feira, 19 de agosto de 2020

O insustentável peso do auxílio - Miriam Leitão

O insustentável peso do auxílio

Fila para saque do Auxílio Emergencial
A Petrobras valia ontem a preço de mercado R$ 300 bilhões. O auxílio emergencial custa o dobro disso em um ano. Se fosse mantido por doze meses, seriam R$ 600 bilhões. Vinte vezes mais do que o Bolsa Família, que no mesmo período consome R$ 30 bilhões. O auxílio que tem tal peso nas contas é o que encanta o presidente Bolsonaro. O ministro Paulo Guedes oferece um prêmio de consolação: o Renda Brasil. Ele será insuficiente para manter a sensação dada a quem recebeu o auxílio nesta pandemia.
Esse é o centro de um dos dilemas de Paulo Guedes. O auxílio reduziu o peso da recessão e aumentou a popularidade do presidente. Contudo, tem um custo impagável. O outro dilema são os investimentos pedidos pelos militares e as obras defendidas pelos ministros setoriais. Separadas podem ter boas justificativas, todas juntas serão a pá de cal no programa que o ministro vendeu ao mercado como aquele que seria aplicado durante o governo Bolsonaro. Resta pouca coisa do programa original. Não foi feita a privatização, a reforma administrativa mofa na gaveta presidencial, a capitalização foi derrubada pelo Congresso, a abertura comercial virou um acordo com a União Europeia de incerta homologação. Se descarrilhar o gasto, nada restará.
Agosto é mês em que todo ministro da economia fica sob pressão porque fecha-se o orçamento e cada área quer evitar cortes. Desta vez é pior porque a situação é muito mais complicada. A pandemia elevou espantosamente os desafios fiscais do país. Luta-se pelo gasto imediato e pela despesa do ano que vem.

Há uma velha lei da selva brasiliense. Toda vez que o presidente tem que dizer que alguém está prestigiado é porque este alguém está sob ataque. Quem está forte não precisa ser fortalecido. No caso de Paulo Guedes, ele sentiu necessidade de reforçar a si mesmo e disse que Bolsonaro tem confiança nele e ele tem confiança no presidente.
O maior ataque ao ministro vem do próprio presidente. Guedes pode vencer as quedas de braço parciais contra os ministros Rogério Marinho, Tarcísio de Freitas ou até o general Braga Netto. Mas não será possível vencer um presidente em campanha eleitoral, enamorado de si mesmo, e com ouvidos abertos aos que prometem que todo aquele eleitorado será dele se ele continuar gastando, dando auxílios e inaugurando obras, mesmo as que não foram feitas por ele.

Bolsonaro não sabe governar. Sua agenda se resume à defesa dos clubes de tiro, onde seus filhos gostam de brincar, ao desregramento do trânsito, às vantagens corporativas de militares e policiais. Presidentes assim em épocas difíceis costumam criar falsos adversários, mentir sobre a realidade e entrar em campanha. Bolsonaro usou as três técnicas e com elas tenta encobrir sua incapacidade administrativa.
Entre Bolsonaro e seu objetivo há o tempo e os limites dos cofres públicos. Mesmo que o ministro da Economia aceite ceder, ele sabe que não pode ser por muito tempo. O Renda Brasil não terá o mesmo valor, nem a mesma amplitude do auxílio. Vai decepcionar muita gente. Para ter recursos precisará acabar com benefícios que tem defensores. O abono salarial, recebido por trabalhadores que ganham até dois pisos salariais, o seguro defeso, dado a pescadores em época de desova dos peixes, e a farmácia popular, que reduz o preço dos remédios para determinada faixa da população. Para acabar com esses programas será preciso travar batalhas difíceis.

Paulo Guedes é um defensor dos cofres públicos incomum. Ele cede mais facilmente aos argumentos do presidente. Bolsonaro pode dizer a ele que em 2023, depois de se reeleger, ele então privatizará, diminuirá o tamanho do Estado, abrirá a economia, mas que agora não dá porque precisa lutar contra os inimigos da esquerda que atacam seu governo. O ministro é inteligente, mas cairá nesta conversa facilmente.

Entretanto, chegará o dia em que o mercado verá que o rei está nu. Bastará olhar os números. A despesa primária este ano está indo para R$ 1,98 trilhão, o que é 27,6% do PIB. No ano que vem, terá que ser reduzida para 19,6% do PIB, em 2022, para 19,2%. Isso acontecerá por força do teto de gastos. Parte do governo quer que essa queda seja mais lenta. Mas a dívida está indo para 98% do PIB. E os juros futuros já ligaram o pisca-alerta.
Com Alvaro Gribel (de São Paulo)