Meu amigo Maurício David me manda esta matéria do Valor Econômico, precedida de uma bela historieta, que já é bastante conhecida, a tal dos "juízes em Berlim", ou seja, uma fábula moral contra o arbítrio dos governantes e a existência -- algumas vezes -- de juízes que simplesmente cumprem a lei, o que nem sempre é o caso no Brasil.
Transcrevo primeiro seus comentários, acrescento meus comentários logo em seguida, e finalmente transcrevo a matéria do Valor.
Paulo Roberto de Almeida
Ainda há Juízes em Berlim !
Maurício Dias David, 29/05/2015
Nas minhas andanças pelo exílio, tocou-me viver um tempo em Potsdam, na então Alemanha Oriental. Em Potsdam fica o castelo de Sans-Souci, residência de verão dos então Kaisers da Alemanha imperial. Magníficos jardins cercam o belo palácio... Uma coisa curiosa : a época, Potsdam e Berlim (que são cidades contíguas, quase geminadas) estava separada de Berlim pelo incrível muro. Como resultado, para chegar a Berlim estávamos obrigados a tomar o trem em Potsdam, dar a volta em torno de toda Berlim (o lado ocidental da cidade estava ao lado de Potsdam, o lado oriental estava do outro lado da cidade) e, depois de uma longa viagem, chegávamos ao centro da capital da chamada República Democrática Alemã ( que de "democrática" só tinha o nome...). Era assim com todas as linhas de trem ( o famoso DB - Deutsche Bahn alemão) e também com as linhas de metrô...
Mas porque estou contando isso, amigo leitor ? Porque veio-me à cabeça a história que me contaram quando visitei o Castelo de Sans Souci. É uma história bonita, por isto a repito aqui...
Certo poderoso imperador alemão, que adorava os jardins do seu palácio, resolveu um belo dia expandi-los. Mas ao lado estavam as terras de um pequeno agricultor, que não se inclinou ante a pressão do todo-poderoso Kaiser... Houve ameaças, mas o camponio ficou firme e recorreu aos tribunais de Berlim. Para surpresa geral, os juízes deram ganho de causa ao camponio que, ao saber do resultado do julgamento, deu uma declaração que ficou célebre : "Ainda há Juízes em Berlim"... Ao Kaiser nada mais restou que senão inclinar-se ante a decisão dos juízes berlinenses...
Ao tomar ciência das recentes decisões dos juízes do Supremo Tribunal Federal determinando aos tecnocratas autocratas que dirigem o BNDES que abram os dados referentes aos empréstimos questionáveis com que tem irrigado os cofre das "empresas amigas" - ditas "as campeãs nacionais do prof. Coutinho"..., parece interessante comentar como o camponês de Potsdam : " Ainda há Juízes em Brasília !"...
Maurício David
Enviado do meu iPad
==========
Comentário em resposta (PRA):
Um pouco tarde e apenas parcialmente.
Eu diria assim: sob pressão da sociedade, e em face de constantes, continuadas, incontáveis denuncias de inacreditáveis malversações com o seu, o meu, o nosso dinheiro entregue ilegal e abusicamente pelo Tesouro a essa Caixa Preta que também responde pelo nome de BNDES, juizes encomendados, e apenas e tão somente pressionados pela opinião pública, resolvem, finalmente, e depois de anos de tergiversaçõdoes e enrolações, finalmente, decidir liberar parcialmente (e não sabemos quanto das falcatruas será realmente liberado), alguns poucos dados relativos a uma única empresa da selva de contratos suspeitos e operações obscuras do malfadado banco, que deveria ser simplesmente colocado sob gestão independente, e ter diminuídas todas as suas operações que não correspondem estritamente a seus objetivos estaturários.
Acho que assim fica mais fiel ao que ocorreu, de verdade (e ainda não temos garantia de que o dinheiro entregue a ditaduras criminosas e a capitalistas promíscuos será realmente revelado).
O abraço do
----------------
Paulo Roberto de Almeida
==========
Planalto teme avanço do TCU sobre BNDES
Por Murillo Camarotto | De Brasília
Valor Econômico, 28 de maio de 2015
A resistência do governo em detalhar as operações entre o Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o grupo frigorífico JBS
esconde o receio de que o Tribunal de Contas da União (TCU) use essa
abertura para avançar sobre outros negócios polêmicos da instituição de
fomento, como o financiamento de obras de empreiteiras brasileiras no
exterior.
De acordo com ministros do TCU ouvidos pelo Valor, a
auditoria sobre o BNDES não vai se limitar aos R$ 7,5 bilhões despejados
no JBS, que foi o principal doador de campanha nas eleições do ano
passado. "O governo sabe que depois disso vêm o Porto de Mariel [em
Cuba] e os negócios feitos na África e na América Latina", disse um
ministro, que pediu para não ter seu nome publicado.
Anteontem, a 1ª
Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o BNDES é obrigado a
fornecer as informações para o TCU. A decisão foi celebrada por vários
integrantes da Corte de contas presentes à sessão plenária de ontem.
Muitos questionaram os argumentos do BNDES, que vinha insistindo que o
teor dos contratos com o gigante frigorífico estaria sujeito a sigilo
bancário.
"Recursos públicos não estão sujeitos a sigilo e devem
estar à disposição desta Casa", disse o relator do processo no TCU, o
ministro-substituto Augusto Sherman. "O sigilo é uma garantia do cidadão
frente ao Estado, e não do Estado junto ao Estado", afirmou o ministro
Bruno Dantas, referindo-se à troca de informações entre TCU e BNDES.
"Não cabe sigilo bancário para financiamento com recursos subsidiados no
âmbito de uma política pública", ratificou o ministro Raimundo
Carreiro.
Relator das contas do governo referentes a 2014, o ministro
Augusto Nardes também comemorou a decisão. Segundo ele, o
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se
favoravelmente à posição do TCU. "Foi uma soma de esforços e quem vence é
a república", disse Nardes.
Sherman lamentou a judicialização do
caso, mas acredita que a decisão do Supremo irá ajudar o TCU "em outras
auditorias no BNDES". No caso específico do JBS, há suspeita de que a
empresa não estaria enquadrada nos critérios do banco para algumas
operações que foram realizadas, motivo pelo qual foram solicitadas
informações como o rating de crédito, o saldo devedor das operações e a
situação cadastral do frigorífico. O tribunal, no entanto, também pode
avançar sobre os financiamentos concedidos para projetos feitos por
empresas brasileiras na África e na América Latina, como portos,
estradas, aeroportos e hidrelétricas, entre outros.
No plenário, o ministro Benjamin Zymler afirmou ter sido procurado pelo
presidente do BNDES, Luciano Coutinho, que se disse "aliviado" com o fim
do imbróglio em torno do tema e se comprometeu a "fazer chegar" aos
gabinetes do TCU todas as informações solicitadas assim que o acórdão do
STF for publicado. "Para ele, como ser humano, foi um grande alívio",
disse Zymler.
Relator do caso no STF, o ministro Luiz Fux entendeu
que o BNDES é obrigado a entregar todos os documentos ao TCU. "Por mais
que se diga que o segredo seja a alma do negócio, quem contrata com o
poder público não pode ter segredos, especialmente se a divulgação for
necessária para o controle do gasto dos recursos públicos", declarou em
seu voto. "A recusa do fornecimento das informações é inadmissível, pois
imprescindível para o conhecimento sobre o uso dos recursos",
acrescentou.
A celeuma em torno dessas operações levou quase dois
anos, com o banco sempre demonstrando maior preocupação do que o
frigorífico com a possibilidade de o teor das operações vir a público. O
caso chegou ao STF em março, quando o TCU rejeitou os recursos do BNDES
e determinou prazo para o fornecimento de todos os dados requeridos.
Até então, Coutinho sustentava a tese de que havia uma intenção de
"devassar o coração do sigilo bancário e a intimidade das empresas". Já
os empresários, quando questionados, não demonstravam grande
preocupação. "Quer abrir, abre", disse em novembro de 2014 o presidente
do JBS, Wesley Batista.