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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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domingo, 9 de outubro de 2022

A segunda locomotiva econômica do mundo reduz sua marcha (BBC)

 Não creio que o pior venha a ocorrer, seja para a China, seja para o mundo, mas a perspectiva de uma recessão mundial é cada vez mais clara...

5 razões pelas quais a economia da China está em apuros

  • Suranjana Tewari
  • Da BBC News, 9/10/2022
Uma família usando máscaras come ao lado de uma barraca em Wuhan, na província central de Hubei, na China

CRÉDITO, GETTY IMAGES

Legenda da foto, 

Covid afetou fortemente a China, a segunda maior economia do mundo

A economia da China está desacelerando à medida que se adapta a uma estratégia de covid zero e enfraquece a demanda global.

Os números oficiais de crescirmento para o trimestre de julho a setembro são esperados para breve - se a segunda maior economia do mundo se contrair, isso aumenta as chances de uma recessão global. A meta de Pequim - uma taxa de crescimento anual de 5,5% - está agora fora de alcance, embora as autoridades tenham minimizado a necessidade de atingi-la. 

A China evitou, por pouco, a contração no trimestre de abril a junho (teve um crescimento de 0,4%). Para este ano, alguns economistas não esperam expansão econômica.

O país pode não enfrenta alta inflação, como é o caso dos Estados Unidos e do Reino Unido, mas tem outros problemas: a "fábrica do mundo" de repente encontrou menos clientes para seus produtos, tanto no mercado interno quanto no internacional. As tensões comerciais entre a China e as principais economias, como os Estados Unidos, também estão prejudicando o crescimento.

E a moeda chinesa, o yuan, está a caminho de ter seu pior ano em décadas, uma vez que despenca em relação ao dólar americano. Uma moeda fraca assusta os investidores, alimentando a incerteza nos mercados financeiros. Também torna difícil para o Banco Central injetar dinheiro na economia.

Tudo isso acontece em um momento em que as apostas são especialmente altas para o presidente chinês, Xi Jinping - ele deve garantir um terceiro mandato, algo sem precedentes, no Congresso do Partido Comunista (PCC), que começa em 16 de outubro.

Então, o que exatamente deu errado?

1. Política de covid zero está causando estragos

Podcast
Logo: As Estranhas Origens das Guerras Culturais

Fim do Podcast

Os surtos de covid-19 em várias cidades, incluindo centros de manufatura como Shenzhen e Tianjin, estão prejudicando a atividade econômica em todos os setores.

As pessoas também não estão gastando dinheiro em coisas como alimentos e bebidas, varejo ou turismo, colocando os principais serviços sob pressão.

Do lado da manufatura, a atividade fabril parece ter voltado a subir em setembro, de acordo com a Agência Nacional de Estatísticas. Essa recuperação pode ter ocorrido porque o governo está gastando mais em infraestrutura.

No entanto, isso veio depois de dois meses em que a manufatura não se expandiu. E levantou questões, especialmente desde que uma pesquisa privada mostrou que a atividade fabril realmente caiu em setembro, com a demanda atingindo a produção, novos pedidos e empregos.

A demanda em países como os Estados Unidos também diminuiu por causa das taxas de juros mais altas, da inflação e da guerra na Ucrânia.

Especialistas dizem que Pequim poderia fazer mais para estimular a economia, mas que há poucas razões para fazer isso até que a pandemia termine. "Não há muito sentido em injetar dinheiro em nossa economia se as empresas não puderem se expandir ou as pessoas não puderem gastar o dinheiro", disse Louis Kuijs, economista-chefe da S&P Global Ratings para a Ásia.

2. Pequim não está fazendo o suficiente

O presidente chinês Xi Jinping acena depois de falar durante uma cerimônia para homenagear as contribuições para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Inverno de Pequim 2022 no Grande Salão do Povo em 8 de abril de 2022 em Pequim, China.

CRÉDITO, GETTY IMAGES

Legenda da foto, 

Xi Jinping deve garantir um terceiro mandato sem precedentes no Congresso do Partido Comunista

Pequim interveio - em agosto anunciou um plano de 1 trilhão de yuans (R$ 733 bilhões) para impulsionar pequenas empresas, infraestrutura e imóveis.

Mas as autoridades podem fazer muito mais para estimular os gastos de forma a atingir as metas de crescimento e criar empregos.

Isso inclui investir mais em infraestrutura, facilitar as condições de empréstimo para compradores de imóveis, promotores imobiliários e governo local e isenções fiscais para famílias.

"A resposta do governo à fraqueza da economia foi bastante modesta em comparação com o que vimos durante crises econômicas anteriores", disse Kuijs.

3. O mercado imobiliário da China está em crise

A fraca atividade imobiliária e o sentimento negativo no setor, sem dúvida, desaceleraram o crescimento.

Isso atingiu duramente a economia porque o mercado imobiliário e outras indústrias que contribuem para ela respondem por até um terço do Produto Interno Bruto (PIB) da China.

"Quando a confiança é fraca no mercado imobiliário, isso faz com que as pessoas se sintam inseguras sobre a situação econômica geral", disse Kuijs.

Os compradores de casas têm se recusado a fazer pagamentos de hipotecas em prédios inacabados e alguns duvidam que suas casas sejam concluídas. A demanda por novas residências diminuiu, e isso reduziu a necessidade de importação de commodities usadas na construção.

Apesar dos esforços de Pequim para sustentar o mercado imobiliário, os preços das casas em dezenas de cidades caíram mais de 20% neste ano.

Com os construtores imobiliários sob pressão, analistas dizem que as autoridades podem ter que fazer muito mais para restaurar a confiança no mercado imobiliário.

4. As mudanças climáticas estão piorando as coisas

O clima extremo está começando a ter um impacto duradouro nas indústrias da China.

Uma intensa onda de calor, seguida por uma seca, atingiu a Província de Sichuan, no sudoeste do país, e a cidade de Chongqing, no cinturão central, em agosto.

A demanda por ar-condicionado pressionou a rede elétrica em uma região que depende quase inteiramente de energia hidrelétrica.

Fábricas, incluindo grandes empresas como a fabricante de iPhones Foxconn e a Tesla, foram forçadas a reduzir a produção ou fechar completamente.

O departamento de estatísticas da China disse em agosto que apenas os lucros da indústria de ferro e aço caíram mais de 80% nos primeiros sete meses de 2022, em comparação com o mesmo período do ano passado.

Pequim promoveu então um resgate de dezenas de bilhões de dólares para apoiar empresas de energia e agricultores.

5. Os gigantes da tecnologia da China estão perdendo investidores

Uma repressão regulatória aos titãs da tecnologia da China - que já dura dois anos - não está ajudando.

Tencent e Alibaba relataram sua primeira queda na receita no trimestre mais recente - os lucros da Tencent caíram 50%, enquanto o lucro líquido do Alibaba caiu pela metade.

Um empreendimento imobiliário em Nanjing, província de Jiangsu, China, em 1º de setembro de 2022.

CRÉDITO, GETTY IMAGES

Legenda da foto, 

A crise no mercado imobiliário da China está prejudicando o crescimento

Dezenas de milhares de jovens trabalhadores perderam o emprego - somando-se a uma crise profissional em que uma em cada cinco pessoas de 16 a 24 anos está desempregada. Isso pode prejudicar a produtividade e o crescimento da China no longo prazo.

Os investidores também estão sentindo uma mudança em Pequim - algumas das empresas privadas mais bem-sucedidas da China estão sob maior escrutínio à medida que o poder de Xi Jinping cresce.

Enquanto as empresas estatais parecem estar ganhando popularidade, os investidores estrangeiros estão tirando dinheiro da mesa.

O Softbank, do Japão, retirou uma enorme quantidade de dinheiro do Alibaba, enquanto a Berkshire Hathaway, de Warren Buffet, está vendendo sua participação na fabricante de veículos elétricos BYD. A Tencent teve mais de US$ 7 bilhões (R$ 36,5 bilhões) em investimentos retirados apenas no segundo semestre deste ano.

E os Estados Unidos estão reprimindo as empresas chinesas listadas no mercado de ações americano.

"Algumas decisões de investimento estão sendo adiadas e algumas empresas estrangeiras estão buscando expandir a produção em outros países", disse a S&P Global Ratings em nota recente.

O mundo está se acostumando com o fato de que Pequim pode não ser tão aberta aos negócios quanto costumava ser - mas Xi Jinping está arriscando o sucesso econômico que impulsionou a China nas últimas décadas.

Este texto foi publicado originalmente em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-63143394

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

“No llores por mi, Argentina”, outra vez? - El País, La Nación

 As coisas vão mal no hermano país; não bastasse uma linda crise econômica— os argentinos têm pós-doc em crises —, eles agora também não têm governo, pois como se sabe era a vice-presidente quem presidia. Nem ela conseguiu evitar a derrota eleitoral… (PRA)

El País, Madri – 18.9.2021

La pelea entre Alberto Fernández y Cristina Kirchner paraliza a Argentina

Federico Rivas Molina y Mar Centenera

 

Buenos Aires - La pelea abierta entre Alberto Fernández y Cristina Fernández de Kirchner tiene paralizada a Argentina. Un día después de la renuncia de todos los ministros y altos cargos que representan a la vicepresidenta en el Gabinete, el presidente publicó este jueves un largo hilo en Twitter donde advierte de que es él quien toma las decisiones. “La gestión seguirá desarrollándose como yo estime conveniente”, escribió, y “no es tiempo de plantear disputas”. Cristina Kirchner le recordó más tarde en una carta pública que fue ella quien lo postuló para presidente en 2019. “Sólo le pido que honre aquella decisión”, le dijo.

La debacle electoral en las primarias del domingo, en la que los precandidatos del peronismo unido perdieron en 18 de los 24 distritos del país, terminó por catalizar una crisis soterrada de palacio que condiciona la marcha del Gobierno, agrava la crisis económica, espanta a los votantes y da alas a la oposición conservadora. Cristina Kirchner exigió el lunes tras la derrota cambios en el Gabinete como primera medida para recuperar al electorado perdido. La crisis escaló cuando el Fernández se negó.

Nunca hasta ahora las cabezas del Ejecutivo argentino se habían enfrentado tan abiertamente. Alberto Fernández se refirió a la “altisonancia y la prepotencia” de algunos dirigentes, sin nombrar a su rival, e hizo una defensa de su Gobierno. “Seguiré garantizando la unidad del Frente de Todos a partir del respeto que nos debemos”, dijo. Kirchner se tomó apenas unas horas para responderle.

 “Al día siguiente de semejante catástrofe política [por las elecciones del domingo], uno escuchaba a algunos funcionarios y parecía que en este país no había pasado nada, fingiendo normalidad y, sobre todo, atornillándose a los sillones. ¿En serio creen que no es necesario, después de semejante derrota, presentar públicamente las renuncias y facilitarle al Presidente la reorganización de su Gobierno?”, escribió Cristina Kirchner. “No soy yo la que jaquea al presidente, es el resultado electoral”, agregó.

Argentina es espectadora ahora del pulso de las dos fuerzas en pugna. El origen de las tensiones hay que buscarlo en la decisión de Cristina Fernández de Kirchner de promover a su exjefe de gabinete Alberto Fernández como candidato a presidente en 2019, con ella como vice. Se sumó a aquel binomio Sergio Massa, un dirigente que había vencido al kirchnerismo en la provincia de Buenos Aires y que ahora completaba la unidad total del peronismo. La estrategia resultó, y Alberto Fernández impidió en las urnas la reelección de Mauricio Macri. Pero la tensión entre un presidente sin votos pero con el poder formal y una vicepresidenta sin poder formal pero con votos lastraron los dos primeros años de Gobierno. Hasta que todo estalló por los aires con la debacle en las primarias del 12 de septiembre, una elección que elige a los candidatos que disputarán una banca en el Congreso el 14 de noviembre próximo.

 

*

 

La Nación, Buenos Aires – 18.9.2021

La carta de Cristina Kirchner que dinamita al Frente de Todos

Rompió toda negociación, al reprobar sin atenuantes la política económica de Alberto Fernández y acusarlo de operar contra ella; el repunte electoral que el peronismo soñaba parece hoy una utopía

Martín Rodríguez Yebra

 

Aturdida por el voto popular que desnudó los límites de su poder, Cristina Kirchner cometió un acto de autodestrucción política bajo el imperio de una emoción violenta. La idea de plantearle el miércoles un ultimátum público a Alberto Fernández para que se sometiera a su voluntad fue dinamita pura en los cimientos del Frente de Todos. La carta que publicó esta noche en medio de la crisis parece la carga definitiva sobre la coalición peronista que los argentinos eligieron para gobernar hasta 2023.

Dejó todo a la luz. “No podíamos ganar”, confiesa. Lo atribuye a una “política de ajuste fiscal equivocada” que ella, en sus palabras, se cansó de advertir ante un Presidente que se negaba a verlo. La fuerza de la palabra escrita agiganta el impacto de su acusación de que el entorno de Fernández hace operaciones mediáticas en su contra, la revelación de los nombres que pidió para asumir como ministros y el desdén con el que alude, sin nombrarlo, al jefe de Gabinete, Santiago Cafiero, cuando pone: “Al día siguiente de semejante catástrofe política, uno escuchaba a algunos funcionarios y parecía que en este país no había pasado nada, fingiendo normalidad y, sobre todo, atornillándose a los sillones”.

La reacción de la vicepresidenta sucede a unas declaraciones previas de Fernández en Página 12, en las que alude a un supuesto acuerdo por la reforma del Gabinete que ella habría incumplido con las renuncias en masa que inició el miércoles Wado de Pedro. “Con presiones no me van a obligar”, fue la frase desafiante que le dedicó su criatura presidencial.

Los intentos de alcanzar un acuerdo para desescalar la crisis en marcha parecían un mal chiste al caer la noche en Buenos Aires. Cristina acelera hacia lo desconocido, sin reparar ni en lo inverosímil que resulta ahora un repunte electoral en noviembre ni en las condiciones en que deja al Gobierno. Ya es una cuestión personal.

En las trincheras del albertismo retumba desde ayer la palabra “traición”. De Pedro propició una cascada de renuncias que llegaron a los medios de comunicación antes que al despacho presidencial. En el manual del kirchnerismo eso constituye una declaración de guerra: así se lo habían hecho saber a Martín Guzmán en mayo, cuando quiso echar a través del periodismo al subsecretario de Energía Eléctrica, Federico Basualdo.

El estupor es indisimulable en la Casa Rosada y en la quinta de Olivos en estas horas de indefinición y versiones cruzadas. Sus habitantes le gritaban “destituyente” a Mauricio Macri porque dijo sin mucho cuidado aquello de “o cambian o se van a tener que ir”.

 

Los hechos propios ridiculizan las palabras ajenas.

 

Cristina habló con Alberto el martes, en una reunión hermética en Olivos, sobre una reformulación urgente del gabinete y de la política de Guzmán. Fernández retrata ese episodio sin testigos como un encuentro fructífero. Cristina transmite algo distinto. “Habían transcurrido 48hs sin que se comunicara conmigo y me pareció prudente llamarlo y decirle que tenía que hablar con él. Deje pasar 48hs deliberadamente, para ver si llamaba”, relata, en una frase que expone cómo concibe su relación con el Presidente. Blanquea ahí que pidió al gobernador de Tucumán, Juan Manzur, alguien que no cuenta con su cariño, en lugar de Cafiero. Fernández se resistía a cesar a su mano derecha.

El desencuentro a puertas cerradas derivó en un escandaloso espectáculo público. El Gobierno se desayunó el miércoles con las renuncias en bloque del gabinete de Santa Cruz y de Buenos Aires, los dos territorios donde Cristina ejerce sin limitaciones su voluntad (en la Provincia finalmente Axel Kicillof no le aceptó a nadie la dimisión). Al mediodía, Fernández reivindicó a Guzmán en un acto en la Casa Rosada y le cedió la palabra para que diera un discurso amablemente provocador, en el que dijo que todas las medidas que tomó contaban con el respaldo de Cristina, Kicillof, Máximo y Sergio Massa. El dedo en la llaga. Por eso la vicepresidenta se encargó en la carta de recordar que ella viene marcando desde hace meses su desacuerdo con el rumbo económico.

De Pedro disparó la primera renuncia apenas después. El sacudón puso a Fernández ante una encrucijada apremiante. Se rinde y entrega los últimos jirones de su autoridad presidencial o se sumerge a la dimensión desconocida de gobernar sin el kirchnerismo, en un estado de minoría angustiante. Decidió parar el reloj. En parte es su costumbre patear los conflictos para adelante. Pero en este caso -casualidad o estrategia- el tiempo podía jugarle un poco a su favor: el Frente de Todos es una familia mal ensamblada en la que la amenaza de ruptura toca los intereses de muchos actores relevantes. Más que nunca cuando hay elecciones legislativas en el horizonte cercano. Con el correr de las horas empezaron a llegar apoyos de gobernadores, diputados, intendentes y sindicalistas. La sangría de renuncias se detuvo, en un impasse dramático. ¿Cuánto más podría demorar una definición?

Cristina Kirchner nunca imaginó que justo ahora Alberto fuera a empacarse. En su entorno, consideran que debe “allanarse”. Lo culpan de llenar el gabinete de amigos sin capacidad de conducción política (apuntan sobre todo pero no únicamente a Cafiero) y de validar el ajuste del gasto que promovió Guzmán en su camino por pactar con el FMI. El impactante audio viral de la diputada Fernanda Vallejos, en el que trata al Presidente de “enfermo”, “mequetrefe” y “okupa”, retrata la virulencia que condimenta el desacuerdo. La pluma de Cristina ratifica que no se trató de un exabrupto aislado. Le recordó sin piedad que es presidente gracias a ella: “Le pido que honre esa decisión”.

El durísimo audio de una diputada kirchnerista sobre Alberto Fernández

La presión kirchnerista para hacer cambios urgentes respondía al miedo a que en noviembre fuera demasiado tarde para torcer el rumbo. Vislumbraban dos caminos contradictorios, igual de preocupantes:

* Que sin una reacción clara el resultado de las legislativas fuera otra paliza que dejara al Gobierno en minoría en las dos cámaras, maniatado y con el “boleto picado” de cara a 2023.

* Que con algunos ajustes en la campaña, ciertas medidas de estímulo y un mayor compromiso militante de la dirigencia peronista el Frente de Todos pudiera mejorar algo sus números y que eso pudiera ser interpretado por Fernández como una validación de su equipo y sus políticas. Es decir, que todo siguiera más o menos igual, en vuelo crucero hacia un fracaso dentro de dos años.

La lógica de Cristina el miércoles fue atacar en caliente para forzar los cambios ahora. ¿Midió las consecuencias de arrojar semejante misil? El silencio presidencial, las reacciones peronistas y la perplejidad de la opinión pública descolocaron a los promotores de la ofensiva. La vicepresidenta intuyó que el Gobierno le estaba tirando a la gente en contra. Lo acusa sin eufemismos al vocero presidencial, Juan Pablo Biondi. Ya el miércoles había sido llamativo el interés de la propia vicepresidenta por difundir que había llamado a Guzmán para explicarle que no pedía su cabeza. Temía que la señalaran ante un eventual temblor financiero. Lo ratificó en su texto, cuando señala que confía “sinceramente” que Fernández y Guzmán se van a sentar a revisar los números del presupuesto para moderar el ajuste. Y se encargó de aclarar que no pide cosas irracionales, como sugieren sus rivales internos: “No estoy proponiendo nada alocado ni radicalizado”.

Los caminos posibles

Emisarios de distintos sectores intentaron una mediación entre Alberto y Cristina, de momento trabada por el orgullo. “La gestión de gobierno seguirá desarrollándose del modo que yo estime conveniente. Para eso fui elegido”, tuiteó al mediodía el Presidente. Como quien dice “mando yo”. Edulcoró el mensaje al enfatizar su vocación de mantener unida la coalición.

 

Para acessar a íntegra: https://www.lanacion.com.ar/politica/la-debilidad-de-cristina-kirchner-y-el-peligro-de-una-implosion-del-frente-de-todos-nid16092021/

 

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

O Estado da Nação no Limiar de um Novo Governo (1994) - Paulo Roberto de Almeida

 O Estado da Nação no Limiar de um Novo Governo

 

Paulo Roberto de Almeida

Publicado, sob o título de “No Limiar do Novo Governo”, em O Estado de São Paulo (19/12/1994, p. 2). Relação de Publicados n. 171.

 

No triplo aspecto de sua situação econômica, de sua estrutura política e de suas condições sociais, o Brasil aparece, no cenário internacional, como um país complexo e contraditório, de acordo aliás com a própria leitura interna que dele se faz. Do ponto de vista econômico ele é considerado, com razão, como plenamente industrializado e dotado de um grande potencial de crescimento econômico, mas que permanece ainda largamente subutilizado em vista de uma persistente recusa a um modelo de desenvolvimento de tipo interdependente. Alguns consideram que se trata, melhor, de um incompreensível fechamento numa era de globalização econômica, outros de uma saudável rejeição à perda de soberania que decorreria de uma “internacionalização” precoce de sua economia.

Do ponto de vista político, ele é visto, externamente, como decididamente pacífico no contexto das relações internacionais e como razoavelmente democrático no plano institucional interno, ainda que apresentando um sistema político-partidário suscetível de aperfeiçoamentos e adaptações aos novos requisitos e exigências da ordem democrática (integração de novos atores sociais, ética e transparência na vida pública). Na área internacional, o Brasil quer ser visto como um fator de paz e estabilidade, suscetível portanto de ser integrado à estrutura  macro política de decisão (Conselho de Segurança).

Do ponto de vista social, contudo, à parte uma extraordinária capacidade de criação cultural, sobretudo no campo musical, o Brasil é visto também, como injustificadamente injusto em termos de distribuição de riqueza e socialmente perverso no terrenos dos direitos humanos e sociais, em proporção maior talvez ao que seria razoavelmente esperado de um processo de “acumulação para o crescimento”. Em outros termos, o Brasil acumula um grau de miséria incompreensivelmente alto e a todos os títulos não necessário para os objetivos de acumulação e crescimento capitalistas.

O que é, afinal, o Brasil? Um país desenvolvido pobre, um gigante com pés de barro, uma potência cultural emergente? Tudo isso ao mesmo tempo e algo mais ainda? Essas diferentes percepções têm muito a ver com o que a Nação considera como suas prioridades fundamentais em termos de crescimento e de desenvolvimento social. Sempre houve, a partir dos anos 30, um compromisso básico com um projeto nacional de desenvolvimento e de progresso social, mas, a despeito de um culto irrestrito e disseminado à noção de industrialização (considerada como o sustentáculo central desse projeto), todos os demais instrumentos de conquista daqueles objetivos foram perseguidos de maneira bem menos engajada, para não dizer de forma insuficiente: educação primária e técnica, investimentos em ciência e tecnologia, reforma agrária e repartição da renda, reforma administrativa, racionalização do aparelho do Estado, inserção internacional.

Cada inauguração de um novo governo representa, de certa forma, uma espécie de contrato social que a Nação estabelece consigo mesma para, a médio prazo, repensar globalmente sua estratégia de desenvolvimento, reorientar suas escolhas táticas e decidir sobre suas prioridades de investimento. O próximo, encabeçado por um sociólogo e contando sobretudo com economistas e planejadores em sua equipe dirigente, não foge à regra, ao contrário: quando candidato, Fernando Henrique Cardoso, buscou detalhar suas ideias em um programa de governo, muitas vezes quantificando objetivos e proclamando metas precisas a serem atingidas. Seu discurso de posse, em janeiro, e sua primeira mensagem ao Congresso, em fevereiro, deverão esclarecer um pouco melhor suas prioridades de curto e médio prazo.

Caberia, no entanto, superar a discussão sobre os projetos de curto prazo em torno dos quais se concentrou a campanha eleitoral e o debate sobre seu ministério para refletir de maneira ampla sobre as escolhas da Nação, aquilo que em linguagem hoje fora de moda se designa por “objetivos nacionais permanentes”. Estes são, evidentemente, o desenvolvimento material (econômico e tecnológico) do país, o progresso social e cultural da nação, a segurança interna e externa da sociedade, a participação, enfim, nas grandes decisões que afetam a comunidade internacional.

Para atuar em todas essas frentes, a Nação brasileira dispõe, como todas as outras, de um aparelho de Estado, mas apresentando este, como parece óbvio, certas disfunções e insuficiências, algumas típicas de um país ainda em transição para a completa modernidade, outras construídas nestes últimos anos de equívocos administrativos. Deixando de lado, no momento, o funcionamento dos poderes legislativo e judiciário, alguns grandes desafios se colocam atualmente ao novo Executivo para alcançar os objetivos definidos acima de forma muito geral.

O Estado brasileiro, em sua vertente operacional, compõe-se basicamente de três grandes núcleos de atuação institucional e de implementação de políticas, nas frentes interna e externa: uma “ferramenta” militar, um estamento diplomático e uma burocracia civil. As duas primeiras são instrumentos da política externa do país, muito embora possam participar igualmente da formulação da política nacional. O estado atual e as perspectivas de atuação de cada uma dessas duas corporações – a militar e a diplomática – podem obviamente causar preocupações quanto à qualidade de seu recrutamento em face dos baixos níveis de remuneração prevalecentes, mas não em excesso.

O instrumento militar, que teve uma preeminência política no passado, encontra-se hoje relegado a segundo plano, ocupando uma fração relativamente menor da despesa nacional. De certa forma, esse rebaixamento da função propriamente militar da atividade do Estado é normal, considerando-se que o Brasil não enfrenta a qualquer risco externo podendo colocar em perigo a soberania do país, não necessita afirmar seus interesses através do vetor dissuasório ou da ameaça do uso da força, nem apresenta, para sermos claros, um problema de defesa nacional. Tendo renunciado voluntariamente à posse da arma atômica e outras de destruição de massa, o Brasil pode legitimamente colocar-se como candidato a membro permanente do Conselho de Segurança assumindo plenamente sua condição de desnuclearizado e orgulhoso de sê-lo.

Na vertente do serviço exterior, não há muito o que observar, uma vez que o estamento diplomático é reconhecidamente de grande qualidade e profissionalismo. A corporação já forneceu, aliás, muitos quadros a diversos governos. No que concerne, contudo, a máquina do Estado, enquanto tal, a situação é reconhecidamente muito grave, com uma erosão brutal de sua eficiência e capacidade de intervenção. Desde meados dos anos 80, mas com o choque brutal introduzido pela desorganização administrativa do Governo Collor, o setor público enfrenta um de seus mais profundos desafios desde sua primeira estruturação na era Vargas e seu aperfeiçoamento sob o regime militar de 64. 

Pode-se dizer que o sucesso político e administrativo do Governo Fernando Henrique Cardoso se coloca na estrita dependência de sua capacidade em fazer funcionar a pleno vapor uma máquina pública corroída pelas pressões corporatistas e fragilizada pelos baixos níveis de remuneração e de treinamento especializado. Se a continuidade do processo de estabilização macroeconômica parece assegurada, considerando-se a boa qualidade das burocracias do Banco Central e do subsistema fazendário, é de temer-se pela implementação das demais políticas setoriais (inclusive em termos de segurança pública) em vista da inoperância atual da máquina do Estado. Será que o Governo FHC se verá obrigado a passar os próximos quatro anos tentando recompor um aparato estatal destruído pela incúria administrativa de seus antecessores?

 

Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais e funcionário público federal.

[Paris, 396: 08.12.94]

 

465. “O Estado da Nação no Limiar de um Novo Governo”, Paris, 8 dezembro 1994, 4 pp. Artigo jornalístico sobre a agenda de temas do próximo Governo, nas frente interna e externa. Publicado, sob o título de “No Limiar do Novo Governo”, em O Estado de São Paulo (19.12.94, p. 2). Relação de Publicados n° 171. 

 

 

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Affonso Celso Pastore: "Quando há um governo de má qualidade, é preciso impor a restrição fiscal de fora pra dentro" - Estadão

 Affonso Celso Pastore não tem medo de colocar o dedo na ferida: se os políticos e o governo central não fizerem o dever de casa, urgentemente, em 2021 o Brasil caminhará rápido para um "buraco negro" fiscal, com consequências imprevisíveis em várias áreas.

Paulo Roberto de Almeida

‘QUANDO HÁ UM GOVERNO DE MÁ QUALIDADE, É PRECISO IMPOR A RESTRIÇÃO FISCAL DE FORA PRA DENTRO’

Entrevista: Affonso Celso Pastore

Segundo o ex-presidente do Banco Central, para evitar uma crise completa nas contas públicas, será preciso uma reforma administrativa que pegue todo mundo e uma reforma tributária que acabe com as distorções; a dúvida é se o governo tem coragem para articular isso com o Congresso

Adriana Fernandes

O Estado de S. Paulo, 19 de novembro de 2020

Para o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore, um dos economistas mais respeitados do País, o Brasil não vai conseguir andar muitos metros se não resolver urgentemente a questão das contas públicas. O País chega ao final deste ano com uma dívida próxima a 100% do PIB, após gastos bilionários para conter os efeitos da pandemia da covid-19. E as perspectivas não são boas – a projeção, segundo Pastore, é continuar crescendo até pelo menos 2028 ou 2029, quando chegaria a 110% do PIB. Em resumo, uma grande crise fiscal.

Para o economista, não há outra solução para esse problema que não seja fazer uma transferência de renda cortando gastos – ou seja, deixar de gastar com benefícios a servidores e subsídios ineficientes para que sobrem recursos. Para isso, é preciso que as reformas estruturais, como a tributária e a administrativa, saiam do papel. Mas o seu grande temor é que nada disso aconteça – e, pelo contrário, o governo simplesmente eleve os gastos, por conta das pressões que devem vir no ano que vem.

Pastore, colunista do Estadão, inaugura a série de entrevistas que vão discutir saídas para a crise fiscal que ronda o País.  


● Qual tem sido o impacto da pandemia da covid-19 para a economia brasileira?

A pandemia pegou o Brasil numa situação fiscal muito frágil. O Brasil, como todos os países, teve de gastar e gerou um déficit primário (despesas superiores às receitas) que levou a dívida para próximo de 100% do PIB. Isso é uma restrição importante ao crescimento econômico. Não podemos fugir de fazer um ajuste fiscal sério, e a pandemia ainda não terminou. O País entrou em uma recessão, curta, e agora estamos saindo dela. 


● Está em curso uma recuperação rápida?

Não tenho dúvida de que foi rápida, mas a questão aqui não é o ano de 2020, mas o de 2021. A recuperação foi rápida porque se desligou a economia, a máquina parou e depois foi ligando de novo e voltou a funcionar. Só que nos três anos anteriores o Brasil crescia a 1% ao ano e a perspectiva que temos para 2021 é de um crescimento muito lento. Se é que vamos ter algum. Se tirar o “carry over” (efeito estatístico pelo qual o nível de atividade de um ano passa para o seguinte), que pode ser de 2,5%, 3%, a perspectiva para 2021 é de uma economia estagnada.

● Pode, na prática, não ter crescimento em 2021?

Se tiver crescimento, é muito pequeno. Olhando hoje o cenário é muito mais na direção de ter uma economia parada ao longo de 2021. O auxílio emergencial foi fundamental para fazer a recuperação rápida. Pegou 66 milhões de pessoas, garantiu a renda delas, que compraram bens. O lado positivo é que a recuperação foi rápida. O lado negativo é que isso levou a dívida pública para perto de 100% e gerou um problema fiscal que herdamos de 2020 e 2021. Mesmo cumprindo o teto de gastos (regra prevista na Constituição que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação), ela ainda vai crescer até 2028, 2029, quando vai chegar perto de 110% do PIB.  


● Quais serão as consequências desse cenário?

Uma dívida muito maior e com uma dinâmica muito pior. Subiu o prêmio de risco dos títulos públicos. Isso torna a administração da dívida mais difícil, aumenta a incerteza, o que reduz investimento em capital fixo (edifícios, máquinas e equipamentos) e o crescimento do PIB potencial (a capacidade de produção de uma economia utilizando todos os recursos disponíveis, sem pressionar a inflação). Gera também uma depreciação cambial (aumento do dólar), na qual o câmbio fica muito acima da taxa de equilíbrio.


● A vitória do Joe Biden nas eleições americanas melhorou os indicadores. O que pode se esperar?

A eleição de Biden ajuda.  Mas nosso problema não é bem internacional. É doméstico. Com toda a ajuda internacional advinda da vitória de Biden, se o Brasil não resolver o seu problema doméstico, não vai andar muitos metros. Refluiu um pouco por causa da euforia com a eleição do Biden. Mas é um movimento transitório. Não é permanente. Para botar o câmbio de novo num nível mais forte, menos depreciado, tem que tirar o risco fiscal, garantir que essa trajetória  seja sustentável. Para isso, é preciso uma âncora fiscal. A âncora que existe hoje é do teto de gastos. O governo tem um dilema que é voltar para o teto de gastos ainda que a pandemia continue.  Se não mantiver o teto, o prêmio de risco vai depreciar mais o real e alta do dólar acaba migrando para os preços domésticos e produzindo subida de inflação, que em certo sentido já vem ocorrendo.


● Esse movimento, que seria transitório, dá um tempo maior para o Banco Central?

O BC não tem de agir agora. Roda o filme para frente. Se o câmbio para de depreciar ou valoriza, não tem problema de inflação. Agora, desde o começo do ano, ele não parou de depreciar porque existem dúvidas sobre a ancoragem fiscal. O problema não é do BC. É do Ministério da Economia e do governo. Eles têm de enfrentar para que o País saia dessa armadilha fiscal na qual estamos. Se sairmos, o câmbio talvez até valorize e esses sinais de inflação que estão começando a acontecer murcham. O BC não teria de subir os juros. Mas, se ficar validada uma certa teoria que existe dentro do governo, principalmente de alguns ministros, de que deveria aumentar gasto...


● Qual a saída para se evitar a crise fiscal?

Fazer uma transferência de renda cortando gastos. Não significa aumentar gastos. Se o governo fizer reformas que economiza outros gastos e, com isso, transferir renda para quem estiver desempregado, não é um erro. É remanejamento de gastos.


● Não poderia haver um ajuste no teto, um meio termo? Uma flexibilização transparente do teto para permitir mais investimento ao mesmo tempo em que são feitas as reformas, como defendeu o economista Armínio Fraga em entrevista ao “Estadão”?

O Armínio é um sujeito respeitável, mas eu discordo do que ele está dizendo. Se tivéssemos um governo com uma agenda de reformas, que tivesse enfrentando seriamente, corrigindo as distorções que existem no Brasil com um programa bem feito, talvez aquilo que o Armínio está propondo funcione. Agora, nós não temos um governo com essa qualidade. Eu discordo do Armínio porque ele está supondo que nós temos um governo.  A minha hipótese é que temos um governo muito fraco. Um presidente da República que não tem um programa. Um ministro da Economia que não tem um programa e vários outros ministros gastadores que têm programas demais. E em vez de pensar em resolver o problema do País, o nosso presidente pensa na sua eleição em 2022 para manter a sua popularidade. Isso faz que o esquema proposto pelo Armínio não tenha qualquer chance de frutificar e dar bom resultado.


● Por quê?

Quando há um governo de má qualidade, é preciso impor a esse governo a restrição fiscal de fora para dentro. Essa restrição está implantada na Constituição. Se esse governo resolver mudar de roupagem, de ideologia, de forma de pensar sobre o Brasil e disser “não, desculpe, eu cometi um erro, vou sim fazer uma reforma administrativa dura, que pega os funcionários atuais e os que vão entrar” e, com isso, abrir espaço no teto para fazer transferência para as famílias de renda mais básica, eu retiro as minhas críticas. Mas o que eu estou vendo esse governo fazer não é isso. O que se discute é uma forma de flexibilizar o teto para, no fundo, continuar gastando. Um País que já gastou tudo que podia gastar. Nas condições de governo que temos, não podemos deixar de exigir que se mantenha a âncora fiscal.

● Há risco de o governo tentar segurar a inflação com intervenção maior no câmbio?

A única coisa que eu digo é: o risco é fiscal. Ele se manifesta nos mercados. Ou ele se manifesta no mercado de juros, e se manifestou e inclinou a curva, ou se manifesta no mercado de câmbio, e se manifestou e depreciou (o real). Se intervier no mercado de juros achatando a curva de juros, não elimina o risco. O risco vai para o câmbio e aumenta a pressão sobre o câmbio. Se intervier no mercado de câmbio e evitar uma depreciação, o risco não foi eliminado, ele migra para o mercado de juros. Você não escapa. Não tem capacidade se segurar esse câmbio.


● O ambiente político, com uma disputa ferrenha pela eleição da Câmara, atrapalha?

No passado, tínhamos uma coisa que se chamava presidencialismo de coalizão. Ela existiu no governo FHC, quando tinha três partidos, o PMDB, PSDB e PFL, que fizeram um acordo prévio. A reeleição foi um erro que trouxe consequências. Depois, tivemos a derrubada da cláusula de  barreira pelo Supremo (exigência para que partidos atinjam desempenho mínimo na votação para continuar tendo direito à propaganda gratuita e ao fundo partidário). De lá para cá, liquidou-se com a possibilidade de ter um presidencialismo de coalizão. A pulverização partidária aumentou e hoje temos vinte e poucos partidos e o governo tem de fazer uma coalizão em torno de interesses pessoais e de facções dos partidos. O que estou fazendo é uma crítica direta ao Centrão, que dá suporte o presidente no Congresso. O Centrão não é um grande partido de centro, mas uma coalizão de partidos fisiológicos que só aprovam à custa de transferência de renda para o seu Estado, uma determinada estatal, o que no fundo torna extremamente difícil fazer reformas que cortem gastos.


● Mas o presidente também não mostra disposição de perder a popularidade com medidas duras de corte de gastos…

Não, não tem da parte do presidente simpatia por um modelo que produz mais austeridade fiscal. E não há da parte do Congresso o desprendimento de saber que o Brasil precisa de apoio. Numa situação como esta, vamos chegar ao fim deste ano com desemprego em 16%. É só fazer conta. Não é o pico. No começo de 2021, vai subir ainda mais. Vira o ano com zero de ajuda emergencial para os 66 milhões que recebiam e um desemprego de 16%. Olha a pressão que vem para aumentar gasto!


● Como se responde a essa pressão?

Fazer uma transferência de renda cortando gastos. Não significa aumentar gastos. Se o governo fizer reformas que economiza outros gastos e, com isso, transferir renda para quem estiver desempregado, não é um erro. É remanejamento de gastos.


● Há um movimento nessa direção?

Não. Então, vemos pressão sobre o câmbio, inflação e o coitado do BC tendo de conviver com esse tipo de dilema.


● O BC vai responder como?

Já vimos algumas reações. Estamos vendo o Roberto Campos Neto (presidente do BC) lutando e conseguindo uma vitória importante quando convenceu o Davi Alcolumbre  (presidente do Senado) a votar a autonomia do BC. Ele tem de ter autonomia. Ele pode mexer na taxa de juros à vontade, mas se o presidente quiser demitir o presidente do BC , ele põe alguém mais dócil e está tudo feito. O BC sabe que corre o risco de subir juros. Se ele não tiver as condições adequadas e o câmbio começar a depreciar, vai ser compelido a subir. Se ele subir a taxa, precisa ter independência política. Se a parte fiscal falhar, o risco de subir é muito alto.


● O presidente do BC estaria, então, se preparando, com a autonomia, para pressões futuras no caso de ter de subir os juros?

Isso. Ele jamais vai confessar. Se eu estivesse no lugar dele, estaria fazendo a mesma coisa.


● Há condições de avançar até final do ano a votação das propostas econômicas?

Eu gostaria que pelo menos a PEC emergencial (com medidas de cortes de despesas, principalmente relacionadas a servidores) fosse aprovada até o final do ano. Não tenho esperança que saia a reforma tributária, administração, nada disso.


● Como a economia do Brasil entra 2021?

Entra com muita incerteza, entra com investimento lá embaixo, economia andando de lado, pressão sobre o câmbio e o risco da inflação subir em 2021. É um cenário muito feio.


● A equipe econômica do ministro Paulo Guedes está negando essa visão?

Não consigo ver uma estratégia que faça sentido para resolver o problema. Não sei o que eles estão querendo ganhar de tempo. Mas sou crítico à forma como estão conduzindo a situação. Ela vem falhando muito na concepção da agenda de reformas e está com timing e  objetivos errados.


● O que pode ajudar a melhorar a economia?

Uma reforma administrativa bem feita que abranja tudo e uma reforma tributária que tire as distorções, a PEC 45 (proposta de reforma tributária que tramita na Câmara). Essas duas coisas ajudam muito.


● Há risco de dominância fiscal?

É uma situação na qual, devido à expansão fiscal muito forte, a eficácia da política monetária desaparece. A capacidade da política monetária controlar a inflação,  no limite, pode até desaparecer. Se o governo ficar preso ao teto, não vejo esse risco. Vejo a potência da política se mantendo e a capacidade de o BC controlar a inflação. Mas, se abandonar e furar o teto, aí sem dúvida ficamos sujeitos à dominância fiscal.