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terça-feira, 6 de julho de 2021

Retomando uma agenda racional, em 2023 - Felipe Salto (OESP)

 Feliz 2023!

    Felipe Salto

    01:03:55 | 06/07/2021 | Economia | O Estado de S. Paulo | Espaço Aberto | BR


    Estamos em janeiro de 2023. O Brasil comemora a eleição do novo governo e o programa coeso apresentado para o País. Surge uma oportunidade real para retomarmos a tendência histórica de melhoria das condições sociais. Há espaço para discutir a ampliação da igualdade de oportunidades por meio do crescimento econômico e da atuação eficiente do Estado.

    A redução da pobreza, o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), a preservação da Amazônia, a reinserção do Brasil no mundo, a educação de qualidade para todos, o aumento dos investimentos, a garantia dos direitos humanos, a reforma do aparelho do Estado, a simplificação do sistema tributário e a responsabilidade com as contas públicas são as bases do novo discurso oficial.

    O desafio é enorme em todas as áreas. A desigualdade social e a dinâmica medíocre de aumento do produto interno bruto (PIB) per capita precisam ser transpostas. Há muito por fazer.

    Uma premissa central do governo eleito vem das ideias de John Rawls, importante filósofo falecido em 2002. Ele defendia a tese de que, sob um "véu de ignorância", as pessoas jamais desejariam políticas públicas concentradoras de renda, que excluíssem os setores menos favorecidos. A ideia é instigante: se você não soubesse em que família nasceria, com qual situação financeira, em que região geográfica, com quais capacidades biológicas, almejaria ter condições mínimas de igualdade.

    Na mesma linha, o economista Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia, defende a chamada igualdade de oportunidades.

    Sen mostra que para ter uma sociedade economicamente desenvolvida e socialmente justa o Estado precisa garantir o acesso equitativo às políticas públicas de educação, emprego, renda, saúde, etc.

    No programa do governo eleito lê-se que o Brasil avançou muito com a Constituição cidadã, desde 1988. Os direitos sociais foram expandidos e tornaram-se obrigação do Estado, assim como a busca pela transparência e pela impessoalidade no processo orçamentário.

    A promessa é resgatar esses princípios norteadores e elaborar políticas que lhes atendam de maneira eficiente.

    Na economia, o programa mostra que o Brasil conquistou certo espaço na cena internacional nos anos 1990 e na primeira década dos 2000, e ampliou suas vantagens comparativas na exportação de produtos primários. No entanto, não superou, mesmo nos melhores momentos, o desafio de expandir permanentemente suas taxas de crescimento.

    O governo eleito para comandar o País de 2023 a 2026 parece ter percebido que a saída para a economia passa por uma combinação de políticas.

    De um lado, zelar pela responsabilidade fiscal, pelo equilíbrio da dívida pública em relação ao PIB, pela transparência no processo orçamentário, pela qualidade do gasto público e pela manutenção do controle inflacionário. De outro, abrir espaço orçamentário para políticas de incentivo â desde que bem desenhadas e avaliadas â em momentos de alto desemprego e elevada ociosidade na economia.

    Também estão no plano de governo a abertura comercial, o aumento da competitividade e a busca de acordos que favoreçam o setor produtivo nacional.

    O acordo entre o Mercosul e a União Europeia tem grandes chances de prosperar, finalmente, a partir do compromisso efetivo do Brasil com a preservação da Amazônia e de políticas ambientais responsáveis.

    A reforma do Estado começa a ser discutida a sério: busca-se a eficiência na provisão de serviços públicos, a valorização da burocracia estatal e a adoção das práticas de gestão e de remuneração por resultados.

    Preconiza-se a adoção de um sistema de avaliação de políticas públicas, com planos pilotos para testar novas ideias e evitar o desperdício de dinheiro público.

    O plano de governo é acompanhado de estimativas para o espaço orçamentário nos próximos anos. Traz simulações para o ganho derivado da extinção de políticas ineficientes, a exemplo de certos incentivos tributários carregados por décadas nas contas públicas.

    Contém, ainda, cálculo minucioso para uma proposta de reforma tributária com dois objetivos: simplificação e redução da regressividade.

    Na área social, pretende-se ampliar o Bolsa Família por meio de programa de renda básica, mas unificando programas que deram pouco resultado e nunca foram avaliados a contento. Na educação, a ministra anunciada é experiente, conhece o setor como ninguém, tem ciência dos avanços do passado e apresentou uma lista de prioridades para sua pasta.

    Na saúde, o programa proposto considera que a população brasileira está envelhecendo e a demanda por serviços do SUScrescerá. Abre-se espaço orçamentário para isso em três frentes: aumento de receitas, corte de gastos e realocação de recursos.

    Parece um sonho, não é? Depois do horror, da incompetência, da falta de sensibilidade social das hostes oficiais, da crise pandêmica, do luto não vivido, do luto evitável, da tristeza geral destes anos, poderemos ter um novo horizonte. Convidoos a imaginar, desde já, o Brasil que queremos ter a partir de 2023. O futuro é logo ali!

    *

    DIRETOR EXECUTIVO E RESPONSÁVEL PELA IMPLANTAÇÃO DA IFI.

    AS OPINIÕES NÃO VINCULAM A INSTITUIÇÃO.

    quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

    O Estado da Nação no Limiar de um Novo Governo (1994) - Paulo Roberto de Almeida

     O Estado da Nação no Limiar de um Novo Governo

     

    Paulo Roberto de Almeida

    Publicado, sob o título de “No Limiar do Novo Governo”, em O Estado de São Paulo (19/12/1994, p. 2). Relação de Publicados n. 171.

     

    No triplo aspecto de sua situação econômica, de sua estrutura política e de suas condições sociais, o Brasil aparece, no cenário internacional, como um país complexo e contraditório, de acordo aliás com a própria leitura interna que dele se faz. Do ponto de vista econômico ele é considerado, com razão, como plenamente industrializado e dotado de um grande potencial de crescimento econômico, mas que permanece ainda largamente subutilizado em vista de uma persistente recusa a um modelo de desenvolvimento de tipo interdependente. Alguns consideram que se trata, melhor, de um incompreensível fechamento numa era de globalização econômica, outros de uma saudável rejeição à perda de soberania que decorreria de uma “internacionalização” precoce de sua economia.

    Do ponto de vista político, ele é visto, externamente, como decididamente pacífico no contexto das relações internacionais e como razoavelmente democrático no plano institucional interno, ainda que apresentando um sistema político-partidário suscetível de aperfeiçoamentos e adaptações aos novos requisitos e exigências da ordem democrática (integração de novos atores sociais, ética e transparência na vida pública). Na área internacional, o Brasil quer ser visto como um fator de paz e estabilidade, suscetível portanto de ser integrado à estrutura  macro política de decisão (Conselho de Segurança).

    Do ponto de vista social, contudo, à parte uma extraordinária capacidade de criação cultural, sobretudo no campo musical, o Brasil é visto também, como injustificadamente injusto em termos de distribuição de riqueza e socialmente perverso no terrenos dos direitos humanos e sociais, em proporção maior talvez ao que seria razoavelmente esperado de um processo de “acumulação para o crescimento”. Em outros termos, o Brasil acumula um grau de miséria incompreensivelmente alto e a todos os títulos não necessário para os objetivos de acumulação e crescimento capitalistas.

    O que é, afinal, o Brasil? Um país desenvolvido pobre, um gigante com pés de barro, uma potência cultural emergente? Tudo isso ao mesmo tempo e algo mais ainda? Essas diferentes percepções têm muito a ver com o que a Nação considera como suas prioridades fundamentais em termos de crescimento e de desenvolvimento social. Sempre houve, a partir dos anos 30, um compromisso básico com um projeto nacional de desenvolvimento e de progresso social, mas, a despeito de um culto irrestrito e disseminado à noção de industrialização (considerada como o sustentáculo central desse projeto), todos os demais instrumentos de conquista daqueles objetivos foram perseguidos de maneira bem menos engajada, para não dizer de forma insuficiente: educação primária e técnica, investimentos em ciência e tecnologia, reforma agrária e repartição da renda, reforma administrativa, racionalização do aparelho do Estado, inserção internacional.

    Cada inauguração de um novo governo representa, de certa forma, uma espécie de contrato social que a Nação estabelece consigo mesma para, a médio prazo, repensar globalmente sua estratégia de desenvolvimento, reorientar suas escolhas táticas e decidir sobre suas prioridades de investimento. O próximo, encabeçado por um sociólogo e contando sobretudo com economistas e planejadores em sua equipe dirigente, não foge à regra, ao contrário: quando candidato, Fernando Henrique Cardoso, buscou detalhar suas ideias em um programa de governo, muitas vezes quantificando objetivos e proclamando metas precisas a serem atingidas. Seu discurso de posse, em janeiro, e sua primeira mensagem ao Congresso, em fevereiro, deverão esclarecer um pouco melhor suas prioridades de curto e médio prazo.

    Caberia, no entanto, superar a discussão sobre os projetos de curto prazo em torno dos quais se concentrou a campanha eleitoral e o debate sobre seu ministério para refletir de maneira ampla sobre as escolhas da Nação, aquilo que em linguagem hoje fora de moda se designa por “objetivos nacionais permanentes”. Estes são, evidentemente, o desenvolvimento material (econômico e tecnológico) do país, o progresso social e cultural da nação, a segurança interna e externa da sociedade, a participação, enfim, nas grandes decisões que afetam a comunidade internacional.

    Para atuar em todas essas frentes, a Nação brasileira dispõe, como todas as outras, de um aparelho de Estado, mas apresentando este, como parece óbvio, certas disfunções e insuficiências, algumas típicas de um país ainda em transição para a completa modernidade, outras construídas nestes últimos anos de equívocos administrativos. Deixando de lado, no momento, o funcionamento dos poderes legislativo e judiciário, alguns grandes desafios se colocam atualmente ao novo Executivo para alcançar os objetivos definidos acima de forma muito geral.

    O Estado brasileiro, em sua vertente operacional, compõe-se basicamente de três grandes núcleos de atuação institucional e de implementação de políticas, nas frentes interna e externa: uma “ferramenta” militar, um estamento diplomático e uma burocracia civil. As duas primeiras são instrumentos da política externa do país, muito embora possam participar igualmente da formulação da política nacional. O estado atual e as perspectivas de atuação de cada uma dessas duas corporações – a militar e a diplomática – podem obviamente causar preocupações quanto à qualidade de seu recrutamento em face dos baixos níveis de remuneração prevalecentes, mas não em excesso.

    O instrumento militar, que teve uma preeminência política no passado, encontra-se hoje relegado a segundo plano, ocupando uma fração relativamente menor da despesa nacional. De certa forma, esse rebaixamento da função propriamente militar da atividade do Estado é normal, considerando-se que o Brasil não enfrenta a qualquer risco externo podendo colocar em perigo a soberania do país, não necessita afirmar seus interesses através do vetor dissuasório ou da ameaça do uso da força, nem apresenta, para sermos claros, um problema de defesa nacional. Tendo renunciado voluntariamente à posse da arma atômica e outras de destruição de massa, o Brasil pode legitimamente colocar-se como candidato a membro permanente do Conselho de Segurança assumindo plenamente sua condição de desnuclearizado e orgulhoso de sê-lo.

    Na vertente do serviço exterior, não há muito o que observar, uma vez que o estamento diplomático é reconhecidamente de grande qualidade e profissionalismo. A corporação já forneceu, aliás, muitos quadros a diversos governos. No que concerne, contudo, a máquina do Estado, enquanto tal, a situação é reconhecidamente muito grave, com uma erosão brutal de sua eficiência e capacidade de intervenção. Desde meados dos anos 80, mas com o choque brutal introduzido pela desorganização administrativa do Governo Collor, o setor público enfrenta um de seus mais profundos desafios desde sua primeira estruturação na era Vargas e seu aperfeiçoamento sob o regime militar de 64. 

    Pode-se dizer que o sucesso político e administrativo do Governo Fernando Henrique Cardoso se coloca na estrita dependência de sua capacidade em fazer funcionar a pleno vapor uma máquina pública corroída pelas pressões corporatistas e fragilizada pelos baixos níveis de remuneração e de treinamento especializado. Se a continuidade do processo de estabilização macroeconômica parece assegurada, considerando-se a boa qualidade das burocracias do Banco Central e do subsistema fazendário, é de temer-se pela implementação das demais políticas setoriais (inclusive em termos de segurança pública) em vista da inoperância atual da máquina do Estado. Será que o Governo FHC se verá obrigado a passar os próximos quatro anos tentando recompor um aparato estatal destruído pela incúria administrativa de seus antecessores?

     

    Paulo Roberto de Almeida é Doutor em Ciências Sociais e funcionário público federal.

    [Paris, 396: 08.12.94]

     

    465. “O Estado da Nação no Limiar de um Novo Governo”, Paris, 8 dezembro 1994, 4 pp. Artigo jornalístico sobre a agenda de temas do próximo Governo, nas frente interna e externa. Publicado, sob o título de “No Limiar do Novo Governo”, em O Estado de São Paulo (19.12.94, p. 2). Relação de Publicados n° 171. 

     

     

    sexta-feira, 26 de outubro de 2018

    Uma nova travessia do deserto? - Paulo Roberto de Almeida

    Uma nova travessia do deserto? O Brasil nos próximos quatro anos

    Paulo Roberto de Almeida
     [Objetivo: nova especulação sobre o futuro; finalidade: previsões imprevidentes]
    Ouro Preto, 26 de outubro de 2018

    Introdução: uma aposta feita ao início do regime lulopetista
    Em 2003, ao iniciar-se o primeiro governo do lulopetismo, fiz uma aposta com um amigo acadêmico sobre como seriam os quatro anos seguintes da nova orientação governamental. Ele era naturalmente propenso a encarar positivamente a administração que recém começava; eu, de conformidade com minha habitual postura desconfiada, de ceticismo sadio como eu a chamo, mantinha um moderado pessimismo quanto aos resultados efetivos do novo governo. O objeto eram as políticas sociais: se elas seriam favoráveis aos objetivos proclamados, de melhorias significativas para a população mais pobre, como pretendia o meu amigo, ou se, como eu antecipadamente suspeitava, não teriam efeitos significativos na vida das camadas mais humildes da população. 
    Não que eu fosse um pessimista absoluto. Ao contrário. No decorrer do ano eleitoral de 2002, já antevendo meses antes a vitória companheira, eu até me dediquei a escrever uma série de artigos saudando as boas perspectivas, textos que coletei ainda antes do final de outubro para integrar um livro que intitulei, de modo sugestivamente otimista, A Grande Mudança: consequências econômicas da transição política no Brasil(São Paulo: Códex, 2003). Nele eu mantinha a confiança de que o PT pudesse fazer, uma vez chegado ao poder, uma espécie de Bad Godesberg, de revisão à la New Labour, e de inaugurar uma administração resolutamente moderna, bem mais parecida com a de Felipe González, na Espanha, do que com a de Salvador Allende, no Chile, esta, aliás, terminada em desastre. Na verdade, não tinha esse tipo de preocupação, pois no livro eu antecipava que os companheiros iriam manter a mesma política econômica “neoliberal” da administração anterior. Eu achava que eles poderiam aprender alguma coisa exercendo tais altos cargos, ainda que cometessem alguns desatinos econômicos.
    Mas, conhecendo quão péssimos eram os economistas do PT, como também quão profundos eram os equívocos conceituais, doutrinais e práticos dos dirigentes do partido – mais afeitos ao keynesianismo tosco dos latino-americanos, ao peronismo de botequim dos sindicalistas, ao neobolchevismo dos seus guerrilheiros reciclados e a uma imitação do desenvolvimentismo estatizante do regime militar, com um stalinismo industrial já anacrônico, que eles, no entanto, admiravam –, eu previa resultados pífios para a sua gestão, que imaginava encerrada ao cabo desses únicos quatro anos. Minha aposta com meu amigo acadêmico era muito simples: eu especulava que, ao contrário das promessas grandiloquentes dos dirigentes petistas, ao término do mandato, em 2006, a redução das desigualdades e a prosperidade prometidas pelo PT aos mais pobres não se materializariam, e que, ao fim e ao cabo, os maiores benefícios seriam recolhidos por quem já era rico e privilegiado, pois tudo na política econômica do partido indicava a continuidade do modelo estatizante admirado por eles. Meu amigo recusava essa minha visão pessimista de que o PT daria mais dinheiro à burguesia do que aos pobres, e acreditava que haveria uma grande inversão nas tendências tradicionalmente concentradoras do modelo brasileiro de crescimento e desenvolvimento.
    Ambos nos enganamos redondamente, como se pode constatar: a situação dos mais pobres conheceu alguma melhora durante os anos de euforia mantidos a custa de uma alta demanda chinesa por nossas commodities de exportação e de um exacerbado incentivo ao consumo e ao crédito subsidiado, situações não sustentáveis, portanto, uma vez que o crescimento só pode se sustentar à base de investimentos produtivos e de empregos criados pelo setor privado, Mesmo o decréscimo no índice de Gini (que mede o grau de concentração da renda) ocorrido na era Lula foi inferior ao registrado no governo anterior de FHC. Por outro lado, eu estava absolutamente correto quanto a minha principal previsão – a de que o PT beneficiaria mais os ricos do que os pobres – mas os dados estatísticos disponíveis em 2006 não permitiam (naquele momento) trazer evidências nesse sentido. O fato é que todos os grandes programas concebidos e implementados exclusivamente pelo PT – Fome Zero, Primeiro Emprego, políticas industriais e tecnológicas, parcerias público-privadas, etc. – se revelaram um rotundo fracasso. O único programa bem sucedido consistiu, apenas e tão somente, na junção no Bolsa Família de vários programas setoriais já existentes, criados no governo anterior, mas que sob a administração companheira – e assim foi concebido pelos apparatchiks que conceberam o novo expediente político – tinha como real objetivo criar um grande curral eleitoral: ele sempre foi incapaz de eliminar a pobreza, já que sua principal função consiste, única e exclusivamente, em subsidiar o consumo dos mais pobres.
    Tanto é assim, e continua cada vez mais sendo assim, que o mapa eleitoral do PT deslocou-se gradativamente das regiões mais urbanizadas, industrializadas e já “desenvolvidas”, para as regiões rurais, mais pobres e educacionalmente atrasadas, ou seja, aquilo que se chama “grotões”, antigamente dominados pelo voto de curral dos coronéis e oligarcas latifundiários, modernamente colocados sob a influência mentirosa da propaganda petista (ao associar a figura do chefão do partido a distribuição das benesses sob a forma de subsídio direto ao consumo). Cabe, no entanto, reconhecer que, naquele primeiro mandato não se tinha ainda começado a deformar a política econômica em vigor no governo anterior, e vários “tucanos” participavam do regime lulopetista, o que pelo menos assegurou alguma racionalidade a certas medidas implementadas. A demanda chinesa, a valorização da moeda, a retomada do crescimento – preparada por todas as políticas seguidas até 2002 – a taxas mais elevadas do que na década anterior, todas as boas notícias econômicas, e a enorme propaganda petista, trouxeram enorme sustentação ao regime, que conseguiu a reeleição mesmo enfrentando o mais grotesco, apenas o primeiro, caso de corrupção na história política do país: o Executivo, por meios escusos, comprando, literalmente, parlamentares e bancadas inteiras, à custa de recursos públicos roubados descaradamente de entidades públicas (Banco do Brasil, ao que se soube, nessa primeira fase), o que, em circunstâncias normais deveriam redundar num pedido de impeachment do presidente, claramente o responsável pela prática delituosa. Por razões diversas, o chefão mafioso escapou das garras da lei.
    A oposição, acovardada ou castrada por práticas similares em outras instâncias e circunstâncias, não teve coragem para conduzir um processo de impeachment, assim como eximiu-se, na prática, de fazer oposição, demonstrando pusilanimidade, covardia, ou total falta de percepção sobre a natureza do regime criminoso que começava a se consolidar no país. O Mensalão não foi senão um pequeno aperitivo para coisas ainda mais grotescas que estavam sendo montadas clandestinamente no coração do Estado: o assalto total aos recursos públicos pela quadrilha mafiosa travestida de partido político. A partir do Mensalão, eu tomei consciência de que os companheiros não eram apenas ineptos na condução dos negócios públicos, mas profundamente corruptos e criminosos.

    O começo do meu longo exílio de mais de uma década sob o lulopetismo
    Antes mesmo do início do regime companheiro eu já tinha escrito e publicado artigos demonstrando como o PT era um típico partido esquerdista latino-americano, com um anti-imperialismo infantil e um antiamericanismo anacrônico, e como suas propostas de política externa eram totalmente inadequadas do ponto de vista de uma diplomacia servindo de modo equilibrado ao interesse nacional. Durante os primeiros três anos do regime não deixei de expressar tais ideias, minha contrariedade com certas posições tomadas na frente externa, em artigos publicados em boletins digitais ou em revistas impressas. Tampouco deixei de expressar publicamente minha opinião sobre certas opções de “alianças estratégicas”, como a preferência míope por uma diplomacia “Sul-Sul”, a parceria com atores “não-hegemônicos” e iniciativas de constituição de novas entidades de coordenação ou de integração regional num sentido claramente anti-imperialista e mesmo antiamericano. Em suma: fiquei contra o lulopetismo diplomático.
    Não recebi nenhuma punição explícita por parte do regime companheiro, a não ser um veto, completo mas não declarado, a qualquer cargo na Secretaria de Estado, a despeito de oferecimentos feitos em uma ou outra área do Itamaraty. Tendo recusado uma oferta para dirigir uma embaixada no exterior, fiquei reduzido, durante anos e anos seguidos, ao chamado “DEC”, o Departamento de Escadas e Corredores, fazendo então da Biblioteca o meu gabinete de trabalho. Não preciso dizer que minha carreira ficou totalmente prejudicada por esse ostracismo informal, ainda que eu possa, sinceramente, agradecer aos meus algozes a oportunidade assim dada a uma dedicação quase integral à leituras e aos escritos que passaram a ocupar meu tempo útil na Biblioteca do Itamaraty. 
    A travessia do deserto, iniciada no primeiro mandato lulopetista, prolongou-se por todo o segundo mandato, um isolamento completo de quaisquer atividades na carreira, o que a rigor constituía uma irregularidade administrativa, e poderia ter dado ensejo a um processo contra a instituição, o que no entanto nunca considerei fazer, embora tenha buscado informação a respeito. Afinal de contas, eu continuava recebendo um salário – reduzido ao vencimento mínimo, que me equiparava a escalões inferiores da carreira – sem qualquer contrapartida que seria devido ao serviço público. Foi apenas no último ano do segundo mandato, com a aposentadoria compulsória do Secretário Geral do Itamaraty – o mesmo que me tinha vetado para um cargo no Instituto Rio Branco ao início do regime lulista –, me foi finalmente oferecido um serviço provisório no Consulado em Xangai, mas para trabalhar no pavilhão do Brasil por ocasião da Exposição Universal de 2010 naquela cidade chinesa. Foram quase oito meses de estada na China, um país em profundas transformações, quando aproveitamos, Carmen Lícia e eu, para viajar para diferentes cidades do país – aproveitando também para visitar Hong Kong, Macau e Japão –, conhecendo um pouco mais as imensas mudanças em curso numa das regiões mais dinâmicas do planeta.
    Enquanto eu atravessava solitariamente o meu deserto funcional, não por vontade própria mas por imposição dos companheiros no controle da diplomacia, o lulopetismo diplomático conhecia o seu momento de maior glória, aparentemente gozando da aprovação unânime dos grandes formadores de opinião, nos meios de comunicação, entre os acadêmicos, na imprensa internacional, junto aos principais interlocutores estrangeiros, em especial nos vínculos com os parceiros estratégicos. A diplomacia lulopetista conheceu, de fato, um grande prestígio junto a todos esses observadores, estudiosos e dirigentes estrangeiros. Cabe, no entanto, proceder a um exame detalhado quanto às fontes e sustentáculos dessa fama, num determinado momento representada pela imagem do Cristo Redentor disparando em direção das alturas, como figurando numa capa da Economist: não importa, aqui, que essa imagem fosse substituída, posteriormente, pelo mesmo Cristo caindo vertiginosamente dos céus, ou que, no ano seguinte, aparecesse o desenho de uma passista de Carnaval, presa num pântano sombrio. Essa foi a trajetória do lulopetismo, do triunfo ao fracasso.
    A fase especialmente positiva no crescimento da economia mundial – que se manteve até a crise de 2008 – favoreceu igualmente o Brasil, mas numa velocidade inferior ao da média mundial, à da própria taxa de crescimento da América Latina (na qual países fizeram mais e melhor do que o Brasil) e sobretudo no confronto com o ritmo mais vigoroso da expansão econômica em curso na região da Ásia Pacífico. O bom conceito da diplomacia lulopetista se deveu muito mais à transpiração do que à inspiração, sempre apoiada em doses maciças de autopropaganda e de mistificação. Ocorreu um investimento exacerbado na promoção da imagem do presidente, com um enorme volume de recursos públicos aplicados nos meios de comunicação, nacionais e estrangeiros, inclusive com a mobilização do apoio do formadores de opinião nesses meios e entre os progressistas acadêmicos para a concessão, exageradamente ridícula, de dezenas de doutorados honoris causaea quem não tinha, numa teve, e nunca terá, manifestamente, nenhum contribuição relevante aos anais da ciência, segundo os critérios relevantes que deveriam guiar a concessão desse tipo de honraria. 
    Até aquele momento, nem a opinião pública, de forma geral, nem os meios de comunicação do Brasil e do exterior tinham sido alertados para o imenso rol de crimes econômicos, ou de crimes comuns, que estavam sendo cometidos pelos companheiros no comando do Estado brasileiro, a despeito de investigações e denúncias que já tinham sido formuladas esporadicamente em relação a casos que apareciam como estranhos, para dizer o mínimo: construção superfaturada de grandes obras no Brasil, aquisição suspeita de uma ou duas refinarias no exterior, utilização delituosa da principal empresa pública – a Petrobras – em operações potencialmente prejudiciais à própria companhia e ao Brasil, além de dezenas de outros casos apenas “bizarros”, e que só seriam revelados alguns anos à frente, por investigações policiais e judiciais. Tampouco se tinha então conhecimento perfeito da mobilização do BNDES no apoio financeiro a governos corruptos e a várias ditaduras da região e de outros continentes, países com os quais os dirigentes brasileiros mantinham relações muito “acima” dos vínculos diplomáticos “normais”, indo a um mundo obscuro de transações comerciais e de investimentos muito distantes de normas técnicas, para encobrir operações altamente prejudiciais aos povos de todas as partes envolvidas, pois que redundando em fartas propinas encaixadas por esses dirigentes envolvidos em gigantescos atos de corrupção. 
    Conhecedor razoável do modo de funcionamento dos assuntos de governo, logo percebi que o extremo ativismo dos lulopetistas com parceiros selecionados envolvia um lado encoberto, não devidamente registrado em documentação oficial ou em despachos diplomáticos. A partir de certo momento – tão cedo quanto contemporâneo ao Mensalão, em 2005 – tive plena consciência de que a gestão companheira encobria um grau inusitado de corrupção, muito além e acima dos níveis geralmente “aceitáveis” de corrupção nos meios políticos. Também conhecedor do submundo da esquerda – por ter mantido relações com várias tribos de opositores do regime militar, e por isso mesmo ter passado sete anos num autoexílio europeu durante os anos 1970, quando continuei a conviver, e a conhecer melhor vários representantes dessa esquerda que depois voltaria ao Brasil com a anistia de 1979 –, também tinha plena consciência da corrupção em que sempre viveu o meio sindical no Brasil, bem como dos instintos “neobolcheviques” de muitos dos guerrilheiros reciclados que depois se associaram ao PT na redemocratização. Isso me levou rapidamente à conclusão de que estávamos em face de uma mudança qualitativa na natureza da corrupção política, inclusive porque já tinha ficado meridianamente claro, durante o Mensalão, que o PT colocou a corrupção geral do sistema político (e junto aos meios empresariais também) a serviço de um projeto monopólico do poder, deformando o funcionamento das instituições.
    Desde então me tornei um opositor resoluto da organização criminosa que se travestia de partido político, e deixava transparecer tal certeza disfarçadamente em vários dos meus escritos, publicados em veículos disponíveis ou divulgados através de minhas ferramentas sociais (meu site pessoal e o blog Diplomatizzando, que se tornou praticamente uma espécie de quilombo de resistência intelectual que prevalecia quase inconteste nos meios acadêmicos e jornalísticos). Esses foram os motivos que sem dúvida estiveram na base de minha continuada estada no deserto do ostracismo funcional durante todo o decorrer do regime companheiro, até, precisamente, o ato de impeachment da mandatária fantoche do quarto e último governo lulopetista. Apenas quando houve a derrocada oficial do nefando regime, fui novamente convocado a ocupar uma função no âmbito do Ministério das Relações Exteriores. Esse meu segundo exílio, não voluntário, havia durado exatamente o dobro do exílio voluntário durante o regime militar, e nas duas oportunidades fui levado a assinar artigos em meu próprio nome, arriscando, possivelmente, alguma retaliação formal, mas também a publicar outros textos de forma anônima, ou sob “noms de plume”. 

    Estamos a caminho de uma nova travessia do deserto? Depende...
    No momento em que escrevo estas linhas – antes do segundo turno das eleições presidenciais – não temos certeza de nada, não exatamente de quem será o presidente eleito, pois parece estar pacificado, mas de quais serão as políticas a serem praticadas nesse próximo governo, quais serão os seus dirigentes, como o Brasil se relacionará com os demais países e como reagirá a uma agenda internacional que não depende exatamente da vontade ou das preferências dos dirigentes do país, mas que já está posta na mesa, por meio de acordos, conferências e reuniões programadas, em caráter bilateral, regional ou multilateral, e em relação aos quais o país precisa tomar uma posição, que não pode ser apenas reativa, passiva, defensiva.
    Como sempre ocorreu, durante toda a minha vida intelectual, e no exercício de minhas atividades profissionais, pretendo preservar meu ceticismo sadio em face de todas as políticas e medidas a serem implementadas pelo novo governo. Pretendo, como sempre fiz, examinar cada orientação, cada iniciativa, cada política com olhar crítico, avaliar aquilo que os economistas chamam de custo-benefício – mais fácil, em todo caso, de estimar, do que um vago custo-oportunidade, que envolve variáveis que não podemos medir com precisão –, para contribuir em prol de uma boa gestão de governo, dizendo, claramente, aquilo que me parece correto e apropriado, em face dos problemas e questões que afligem o país e a sociedade. Como também sempre fiz, quero formular minhas observações em total independência de pensamento, ainda que não em completa autonomia de ação (pois ainda sou funcionário de Estado, eventualmente servindo a um governo determinado). Essa última condição não me impedirá, por certo, de pensar, e de expressar a minha opinião, salvo naqueles temas e circunstâncias muito sensíveis, que envolvem questões de segurança nacional ou de confidencialidade negociadora. 
    Imaginando que estamos ingressando numa fase de novas grandes mudanças – não sei avaliar ainda se serão tão importantes quanto aquelas a que assistimos, e outras que sequer percebemos, a partir de 2003 –, pretendo uma vez mais, e sempre, utilizar o meu quilombo de resistência intelectual como uma espécie de fortaleza da livre expressão e do livre pensamento, a partir do qual vou continuar exercendo meu espírito crítico, independentemente do que possam pensar, ou reagir, gregos e troianos, ou seja, amigos e inimigos do novo governo. Prefiro manter uma postura independente, como corresponde a um espectador engajado nos debates de ideias do tempo presente, sem concessões ao politicamente correto, ou a qualquer oportunismo funcional. Não sei, nessas circunstâncias, se serei levado a me exilar novamente num outro tipo de limbo, uma nova jornada através do deserto, que pode durar alguns anos, uma espécie de ostracismo auto-assumido, imposto unicamente pelas circunstâncias ou pela minha percepção do que teremos pela frente na próxima gestão governamental. 
    Como já disse várias vezes, não sou homem de partido, de facções ou de tribos, não me filio a seitas ou correntes, mas sou sim uma pessoa capaz de tomar partido por certas causas, que eu mesmo escolho como sendo prioritárias em função de minhas preferências intelectuais. Minha área prioritária de atividades, independentemente das atribuições profissionais, sempre esteve ligado ao estudo, ao ensino, à pesquisa, à reflexão, aos escritos, à divulgação de ideias e ao debate em torno de questões relevantes da vida nacional. É o que sempre fiz e é o que continuarei fazendo enquanto o ânimo persistir e as condições externas assim o permitirem. 
    Não pretendo, não desejo, não é o meu feitio, assumir funções e encargos executivos, ainda que eu não relute em cumprir tarefas que estejam dentro de minhas competências e atribuições profissionais; mas é porque tais atividades requerem certa submissão a princípios de autoridade, a imposições hierárquicas, que se coadunam mal com meu espírito libertário, talvez até anárquico. Prefiro continuar livre de pensamento e de ação, tanto quanto for possível dentro das restrições burocráticas às quais estou adstrito. Assumo responsabilidade pelo que escrevo e divulgo voluntariamente, e já não sou obrigado a escrever textos para outros assinarem, como era o caso em fase precoce da carreira. Vivo minha vida intelectual unicamente em função daquilo que eu mesmo decido que me é interessante, no plano do prazer intelectual e da liberdade pessoal. 
    Não farei nenhuma aposta desta vez, com quem quer que seja, apenas confiando em que os novos líderes políticos e dirigentes do governo que se instalará no Brasil a partir de janeiro de 2019 saibam pacificar o país, empreender as reformas necessárias, e conduzir o Brasil a um novo processo de crescimento sustentado, com base numa macroeconomia estável, numa microeconomia competitiva, numa boa governança – e aqui a responsabilidade maior incumbe ao poder judiciário, atualmente estraçalhado pelas más escolhas petistas durante o seu regime e por desagradáveis surpresas vindas de anos anteriores –, numa alta qualidade dos recursos humanos – embora eu seja singularmente pessimista quanto às possibilidades reais de se corrigir as imensas distorções da educação brasileira em prazo razoável – e, finalmente, numa plena abertura econômica e integração à interdependência global, com liberalização até unilateral ao comércio e aos investimentos internacionais. Essa seria a minha aposta comigo mesmo e contra o próprio país, mas confesso que a considero extremamente ambiciosa nas circunstâncias presentes. Em todo caso, minhas próximas atividades se concentrarão na realização desses objetivos.
    Em qualquer hipótese, permanecerei atento aos novos desenvolvimentos em meu quilombo de resistência intelectual e de observação crítica, que é constituído pelo blog Diplomatizzandoe pelas demais ferramentas sociais. De certa forma, meu deserto sou eu mesmo quem determina sua extensão e feitio: ele é uma dimensão de minha própria liberdade. Veremos quando terá começo e quanto tempo durará...

    Paulo Roberto de Almeida
    Ouro Preto, 26 de outubro de 2018

    terça-feira, 3 de maio de 2016

    Critica aos 15 pontos sugeridos pelo PSDB ao novo governo - Paulo Roberto de Almeida


    Crítica aos 15 pontos sugeridos pelo PSDB ao novo governo

    Paulo Roberto de Almeida
     [Para debate público]

    O PSDB apresentou, ao que parece, uma lista de 15 requerimentos para poder apoiar um governo Michel Temer, tal como revelado pelos jornais de 2/05/2016. Sem fazer uma análise detalhada neste momento, considero esse documento, globalmente, como medíocre; escrevo outra vez, destacando: MEDÍOCRE.
    Um partido que está há mais de treze anos na oposição, e não tem ideia do que fazer em áreas cruciais das políticas públicas no Brasil, é um partido medíocre. Vou fazer alguns comentários rápidos e depois analisar com maior detalhe se, e quando, o PSDB, que não merece nem o ministério da Pesca, decidir realmente apoiar o novo governo, e pretender defender as quinze sugestões abaixo alinhadas.

    São os seguintes os 15 pontos relacionados no documento do PSDB:

    1. Combate irrestrito à corrupção. Que se assegure expressamente que todas as investigações, em especial a Operação Lava Jato, com foco no combate à corrupção, tenham continuidade. E que seja garantida a independência funcional da Controladoria Geral da União e do Tribunal de Contas da União, da Polícia Federal e do Ministério Público.
                PRA: Não faz mais do que a sua obrigação, e isso não é função do Partido e sim do MPF, da PF, da PGR, do TCU, CGU e outros órgãos do Estado. O PSDB só proclama isso em primeiro lugar por puro oportunismo e demagogia. 

    2. Reforma política imediata. Imposição de cláusula de desempenho eleitoral mínimo para o funcionamento dos partidos políticos e adoção do voto distrital misto e do fim das coligações proporcionais. Além disso, que se volte a discutir a implementação do parlamentarismo a partir de 2018.
                PRA: Não vai ser feita, e o PSDB sabe disso, o assunto vai arrastar-se longamente no Congresso e não vai sair nada. Eu também sou favorável ao sistema parlamentarista, mas tenho total consciência de que, numa primeira fase, esse sistema significará a exacerbação de TODOS os piores vícios do sistema político-partidário.

    3. Renovação das práticas políticas e profissionalização do estado. Combate incessante ao fisiologismo e à ocupação do estado por pessoas sem critérios de competência.
                PRA: Isso não quer dizer quase nada. Deveria propor, imediatamente, a redução dos ministérios a menos da metade, a eliminação, COMPLETA, de pelo menos 20 mil cargos de confiança no âmbito do Executivo, e depois uma redução geral do tamanho do Estado, e se possível proposta de redução da estabilidade do funcionalismo. Mas o PSDB não tem coragem de pedir isso.

    4. Manutenção e qualificação dos programas sociais. Em especial o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida, o Pronatec, o Fies e o Prouni.
                PRA: Mais demagogia: deveria dizer que vai revisar todos os programas sociais no sentido de oferecer portas de saída para o BF, redução do Minha Casa, Minha Vida, e atuação no setor imobiliário via mercado, com apenas garantias de seguros de hipotecas, não subsídios à aquisição de casas. Os programas educacionais devem ser mantidos, com ênfase no primeiro e segundo grau, e no ensino-técnico profissional.

    5. Revisão dos subsídios fiscais para fomentar o crescimento.
                PRA: Revisão, não, eliminação, e evolução para um mercado de capitais dominado basicamente pelo setor privado (a ser completamente aberto), não pelo Estado, como é hoje.

    6. Responsabilidade fiscal. Governo não pode gastar mais do que arrecada. O executivo deverá apresentar em no máximo 30 dias um conjunto de medidas para a recuperação do equilíbrio das contas públicas.
                PRA: Demagogia: isso já está na legislação e não precisa do apoio do PSDB. O governo não vai conseguir apresentar um plano de equilíbrio de contas públicas em 30 dias. Se o PSDB tem sugestões, deveria apresentar agora. Por que não o faz?

    7. Combate à inflação, preservando o poder de compra dos salários.
                PRA: Outra bobagem, pois isso é tão evidente, que nem deveria fazer parte de um programa de governo. 

    8. Simplificar o sistema tributário, torná-lo mais justo e progressivo. Apresentar nos primeiros 60 dias de governo uma proposta de simplificação radical da carga tributária.
                PRA: Concordo, mas o PSDB já deveria ter apresentado, há PELO MENOS DEZ ANOS ATRÁS, essa reforma do sistema tributário, que não é apenas, e não pode ser, para simplificar, e sim para REDUZIR A CARGA FISCAL em cinco ponto de PIB em cinco anos, e mais cinco em outros cinco, de forma que em dez anos nossa carga fiscal se alinharia com países de nosso nível de renda. O PSDB já deveria ter feito isso, e se não fez é porque não dá importância ao assunto, além da demagogia habitual.

    9. Reformas para a produtividade
                PRA: Bonito, mas isso não quer dizer nada, absolutamente nada. Por que o PSDB não apresenta suas sugestões, imediatamente. Ficaram dormindo nos últimos treze anos?

    10. Maior integração com o mundo, reorientando a política externa e comercial.
                PRA: Muito genérico e não quer dizer nada, além de uma intenção muito vaga. O PSDB quer reduzir as tarifas brasileiras, abrir mais o Brasil aos investimentos estrangeiros, reformar a legislação de comércio exterior, diminuir o stalinismo industrial de nossas atuais políticas? Deveria ser muito mais explícito.

    11. Colocar em prática a sustentabilidade.
                PRA: Bobagem e demagogia politicamente correta. Quem pode ser contra? Por que o PSDB não propõe medidas concretas em energia e recursos naturais?

    12. Reformulação das políticas de segurança pública.
                PRA: Ah, que bonito! Alguma medida concreta, além do blá, blá, blá?

    13. Educação para cidadania. Apoio a estados e municípios que cumprirem metas rigorosas de cobertura e melhoria da qualidade e equidade nos sistemas de ensino.
                PRA: “Educação para cidadania” não quer dizer absolutamente nada. O Paulo Freire tem a mesma posição. Sistemas de ensino é muito vago. O PSDB não tem vergonha de ser absolutamente inócuo nessa pauta, que é a mais importante do país?

    14. Mais saúde para salvar vidas.
                PRA: Ufa! Cansativo esse PSDB: alguém quer saúde para eliminar vidas? Por que eles não vão catar coquinho?

    15. Nação solidária, com mais autonomia para estados e municípios.
                PRA: My God: esses tucanos continuam genéricos, vagos, medíocres, nulos em matéria de políticas concretas.
                Acho melhor fechar o partido atual e começar um outro.

                Vamos ver o que o Partido NOVO tem a dizer sobre essas questões...
                PS.: Não sou do Partido NOVO, não pretendo ser, mas imagino que o NOVO tenha ideias mais concretas sobre os problemas referidos.

    Paulo Roberto de Almeida 
    Brasília, 3 de maio de 2016

    sexta-feira, 12 de setembro de 2014

    Pensando no novo governo - Carlos Pio e Paulo Roberto de Almeida

    Meu amigo Carlos Pio, professor no IRel da UnB, andou pensando numa forma de tornar o governo mais funcional, mais enxuto, mais compatível com as necessidades de governança efetiva, no Brasil.
    Fez um projeto tão bom, que acho difícil ser aplicado, pois para isso seria preciso ter a cooperação do Congresso, que veria com maus olhos -- não o Congresso, mas os partidos e os políticos que o compõem -- a redução de cargos e o enxugamento de despesas inúteis.
    Em todo caso, reproduzo aqui o organograma que ele elaborou para um novo governo, decente, responsável, e mais abaixo os seus comentários iniciais sobre algumas reformas necessárias.
    Por fim, como eu já tinha pensado também nessa mesma questão, o que fiz foi elaborar uma primeira mensagem do novo presidente ao Congresso, tratando das mesmas medidas, só que não em forma de organograma e sim como proposta de redução da máquina ministerial, trazendo-o ao que considero estritamente necessário, com extinção de vários órgãos, absorção de outros, e assemblagem do que nunca deveria ter sido fragmentado (para o esquartejamento partidário, o que os italianos chamam de lotizzazione, mas que tem o mesmo sentido, de prebendas partidárias oportunistas).
    O esquema do Carlos Pio é muito mais completo do que o meu, e eu o cumprimento por isso, mas também acho, como já disse, que será mais difícil de ser implementado, pois isso obrigaria o novo governo a passar pelo menos seis meses (senão mais), negociando com o Congresso, entre projetos de lei e medidas provisórias, toda essa reformulação complexa, e depois mais seis meses na acomodação interna de ministros, funcionários, locais, aspones, gastos de adaptação, etc.
    Nossas duas propostas talvez pudessem ser combinadas, para evitar que o governo perca um ano inteiro de burocracia administrativa, quando ele terá imensos ajustes econômicos a fazer.
    O debate está lançado.
    Paulo Roberto de Almeida
    Vancouver, 11/09/2014

    Projeto de organograma do novo governo, por Carlos Pio: 


    Propostas de reforma administrativa e medidas econômicas de Carlos Pio:

    PACTO DE ARACAJÚ
    UMA AGENDA DE REFORMAS ECONÔMICAS.
    Segue uma lista muito preliminar do que se pretende fazer — que, em homenagem ao Gustavo Franco, eu chamaria de "Pacto de Aracajú". Sugestões são sempre bem-vindas!
    1) Estabelecimento de compromissos de superávit nominal das contas públicas por um longo período, algo como 8 anos (2 mandatos presidenciais);
    2) Abertura unilateral da economia brasileira — gradual e programada (como foi feito entre 1990-93), porém sem excetuar qualquer setor —, tanto para permitir maior concorrência no plano doméstico e viabilizar a redução de custos associados à importação de insumos (promovendo-a), como para estimular a que empresas localizadas no País passem a fazer parte de densas cadeias transnacionais de produção — nos moldes do que faz a Embraer e do que se faz no México e no sudeste da Ásia há 25 anos. O ponto de chegada desejável é uma estrutura tarifária simples, com valores específicos módicos, transparente e reconhecida como único instrumento de proteção comercial (fim dos regimes especiais);
    3) Desregulamentação da atividade econômica — redução de processos administrativos requeridos e de custos associados à abertura e fechamento de empresas, quebra de monopólios, venda gradual de todas as participações do BNDESPar em empresas públicas e privadas, simplificação de processos aduaneiros e alfandegários;
    4) Simplificação da estrutura tributária e redução consistente da carga, especialmente tributos que incidem sobre uma cesta básica ampliada, sobre a folha de pagamentos e em cascata;
    5) Aumento do grau de conversibilidade da moeda nacional — de forma gradual, mas consistente, com vistas a permitir um trânsito muito mais livre e ágil de recursos entre as fronteiras nacionais e de beneficiar não apenas os grandes poupadores, mas também os poupadores médios e pequenos. No limite, a conversibilidade implica garantir a cada indivíduo a máxima liberdade para comprar moeda estrangeira e depositá-la nos bancos localizados no País, o que reforçará a pressão por uma política econômica consistente com a estabilidade cambial — por sua vez dependente de baixa inflação, queda sustentável dos custos de produção, elevação contínua da produtividade do conjunto da economia, redução da carga tributária, etc ;
    6) Independência do Banco Central, com estabelecimento de mandatos fixos para a diretoria, escalonados ao longo do tempo e, no caso do presidente da instituição, dissociado do mandato da/o presidente da República;
    7) Garantias institucionais à independência das agências regulatórias criadas nos anos '90, com transferência de funcionários e dotações orçamentárias dos respectivos ministérios com vistas a assegurar sua operação livre de pressões partidárias;
    8) Redução significativa do subsídio financeiro implícito na TJLP do BNDES e sua gradual transformação num financiador de programas abrangentes de elevação da produtividade geral dos fatores;
    9) Ampla revisão da estrutura de gastos orçamentários da União, de todos os ministérios, tendo como meta o corte de programas inteiros que sejam considerados arcaicos e não mais desejáveis a fim de viabilizar os propósitos de redução da carga tributária com simultâneo compromisso de superávites nominais das contas públicas por 2 mandatos;
    10) Restabelecimento da transparência fiscal, perdida nos anos recentes, especialmente das transferências entre instâncias do Executivo Federal -- Tesouro, Bacen, BNDES, Petrobrás, BB, CEF, Eletrobrás, entre outras.


    A primeira mensagem ao Congresso: Paulo Roberto de Almeida 


    Origem: Casa Civil da Presidência da República (2015-2018)

    Senhoras e Senhores Parlamentares,
    É com grande honra e justificada satisfação que cumpro, neste momento, o dever constitucional de dirigir-me ao Congresso Nacional para, pela primeira vez em meu mandato, trazer-lhes as primeiras medidas administrativas que têm por objetivo dotar o meu governo de condições para efetuar as mudanças que hão de caracterizar a fase promissora de modernização e de racionalidade que se abre agora para o Brasil.
    Pretendo reformular inteiramente as bases da governança neste país, depois de mais de uma década de caos administrativo, de inchamento desmesurado do governo e de emissão de medidas que engessaram ainda mais a gestão pública e que converteram a administração das empresas privadas num inferno burocrático, paralisadas que foram por medidas contraditórias, por leis irracionais e por decretos irresponsáveis, que aumentaram exageradamente o chamado “custo Brasil”, mas que também minaram, do lado do setor público, a confiança dos brasileiros no Estado e em suas instituições.
    Devo alertá-los desde já que este esforço não será concretizado sem a parceria do Congresso Nacional, uma vez que é minha intenção associar cada uma das senhoras e dos senhores às propostas de legislação que pretendo trazer para discussão nesta Casa. Minha disposição é a de recorrer o menos possível a medidas provisórias ou a decretos executivos, uma vez que entendo ser da responsabilidade desta Casa o debate aberto e esclarecedor sobre cada uma das propostas que pretendo submeter-lhes.
    Estão atualmente sob a responsabilidade do chefe do Executivo nada menos do que 39 ministérios ou secretarias de Estado com status de ministérios, numa estrutura de gestão pública que se afigura exagerada para qualquer padrão administrativo que se possa conceber. Esta foi uma das muitas heranças inconvenientes que recebemos dos governos anteriores, uma máquina superdimensionada de administração. Pretendo, com a colaboração das senhoras e dos senhores, reformulá-la com sentido de racionalidade.
    Portanto, se este Congresso aprovar – e entendo que ele há de respeitar o direito do chefe do Executivo de definir a organização da administração direta que ele julga a mais adequada ao País –, pretendo trabalhar com o ministério seguinte:

    1)    Justiça
    2)    Defesa
    3)    Relações Exteriores
    4)    Fazenda
    5)    Educação
    6)    Saúde
    7)    Indústria e Comércio
    8)    Agricultura
    9)    Ciência e Tecnologia
    10) Trabalho
    11) Transportes
    12) Comunicações
    13) Interior e Infraestrutura
    14) Desenvolvimento Social
    15) Minas e Energia
    16) Planejamento
    17) Previdência Social
    18) Casa Civil
    19) Casa Militar

    As seguintes áreas administrativas passam a ser vinculadas, enquanto secretarias de Estado, aos ministérios aqui especificados:

    1)    Cultura e Esporte ao ministério da Educação;
    2)    Integração Nacional ao ministério do Interior e Infraestrutura;
    3)    Cidades ao ministério do Desenvolvimento Social;
    4)    Meio Ambiente ao ministério da Ciência e Tecnologia;
    5)    Turismo ao ministério da Indústria e Comércio;
    6)    Desenvolvimento Agrário, Pesca e Aquicultura ao ministério da Agricultura;
    7)    Advocacia-Geral da União e Controladoria-Geral da União à Casa Civil;
    8)    Gabinete de Segurança Institucional à Casa Militar;
    9)    Portos e Aviação Civil ao ministério dos Transportes;
    10) Assuntos Estratégicos ao ministério do Planejamento;

    Ficam extintas as seguintes Secretarias de Estado com status de ministério, passando suas responsabilidades respectivas a serem exercidas pelas áreas que se indica:

    1)    Comunicação Social, nomeando-se um Porta-Voz da Presidência da República, e encarregando-se a Casa Civil de dispor dos demais serviços;
    2)    Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Políticas para as Mulheres e Direitos Humanos para o ministério da Justiça
    3)    Micro e Pequena Empresa para o ministério da Indústria e Comércio;

    Ficam extintas a Secretaria-Geral e a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, sendo as atribuições da primeira passadas para a Casa Civil.
    O Presidente do Banco Central do Brasil não mais terá status de Ministro de Estado, sendo de nomeação da Presidência da República após sua aprovação pelo Congresso, dispondo de mandato fixo e de autonomia administrativa e operacional, e passando a responder ao Congresso Nacional, no cumprimento das funções que lhe forem atribuídas pelo Conselho Monetário Nacional.
    A Presidência da República disporá, ainda, em caráter experimental, de uma Secretaria de Comércio Exterior, que trabalhará em estreita conexão com os ministérios das Relações Exteriores, da Fazenda, da Indústria e Comércio, da Agricultura e demais áreas que se afigurem pertinentes. Suas atribuições e a própria manutenção serão objeto de discussão e avaliação pelo Congresso, após três anos de funcionamento.
    Meu governo não pretende dispor de comunicação institucional. Necessidades tópicas de informação de relevante interesse público serão afetas ao órgão interessado – como, por exemplo, campanhas de vacinação no âmbito da Saúde – abrindo-se amplo espaço para que a própria sociedade, através de empresas privadas de comunicações, cuide de sua informação, sem qualquer orientação ou aconselhamento do governo.
    Meu governo seguirá o princípio de que cabe ao Estado regular apenas as áreas e atividades que lhe são precipuamente devidas, deixando todas as demais para a livre organização da sociedade. São extensas, incontáveis essas áreas e dou, neste momento, um único exemplo de como o governo pretende atuar. Entendo que não cabe ao Estado determinar os horários de funcionamento dos bancos comerciais, inclusive os públicos: cada estabelecimento bancário permanecerá aberto, segundo seu próprio interesse de atender ao público. A legislação laboral já dispõe sobre os direitos dos trabalhadores; os bancos serão livres para negociar horários de funcionamento com seus empregados.
    Novas propostas de reformas administrativas serão encaminhadas ao Congresso, sempre sob esta orientação geral: as atividades privadas vão se libertar da mão pesada do Estado, e os brasileiros reterão os frutos do seu trabalho na maior extensão possível. As prioridades do meu governo são as de reduzir o peso indevido do Estado sobre o setor privado, em todas as esferas. Dessa forma, construiremos um Brasil mais rico.

    Presidência da República, janeiro de 2015

    [Com a assessoria técnica de Paulo Roberto de Almeida (Hartford, 12/07/2014)]