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quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Lista consolidada de trabalhos, 2023 - Paulo Roberto de Almeida (4297 a 4540)

 Lista consolidada de trabalhos, 2023

Paulo Roberto de Almeida

4297 a 4540

 

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

Total de 243 trabalhos (média de 20 por mês; 1,5 por dia)

Atualizado em 7/02/2024:

 

4297. “Meus melhores votos de sucesso em 2023 vão para...”, São Paulo, 1 janeiro 2023, 3 p. Saudando o terceiro mandato, com diversos alertas e sugestões de políticas. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/01/meus-melhores-votos-de-sucesso-em-2023.html) e novamente em 26/12/2023 (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/o-que-eu-tramava-para-lula-ao-inicio-de.html).

4298. “Trabalhos publicados de Paulo Roberto de Almeida, 27 (2022)”, São Paulo, 1/01/2022, 11 p. Lista dos trabalhos publicados em 2022 (55, ou um por semana). Postado no blog Diplomatizzando (1/01/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/01/trabalhos-publicados-em-2022-por-paulo.html).


(...)


4539. “Relação de trabalhos 37, de janeiro a dezembro de 2023”, Brasília, 31 dezembro 2023, 35 p. Fechamento da lista anual, trabalhos de 4297 a 4539 (ou seja, 242 trabalhos, de dimensões diversas, notas, artigos, ensaios e livros, com algumas milhares de páginas no total). Divulgado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/relacao-parcial-dos-trabalhos-relativos.html); disponível em Academia.edu (link: https://www.academia.edu/112649808/4539_Relação_de_trabalhos_originais_de_2023).

4540. “Trabalhos publicados de Paulo Roberto de Almeida, 28 (2023)”, Brasília, 31 dezembro 2023, 9 p. Relação dos trabalhos publicados entre janeiro e dezembro de 2023, do n. 1489 ao n. 1539, ou seja, 50 trabalhos, ou cerca de 4 por mês. Divulgada preliminarmente em 31/12/2023, no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/lista-parcial-n-28-trabalhos-publicados.html); divulgado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/112688782/4540_Trabalhos_Publicados_n_28_Jan_Dez_2023).

 

2024: 

4541. “Uma reflexão sobre o mundo real e o mundo acadêmico dos nossos tempos”, Brasília, 1 janeiro 2024, 1 p. Nota sobre uma das alienações mais frequentes no espaço acadêmico. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2024/01/uma-reflexao-sobre-o-mundo-real-e-o.html).

       (...)

 

Lista completa neste link da plataforma Academia.edu: 

https://www.academia.edu/114576535/Lista_consolidada_de_trabalhos_2023_Paulo_Roberto_de_Almeida


domingo, 31 de dezembro de 2023

Lista parcial n. 28: trabalhos publicados por Paulo Roberto de Almeida em 2023

 Trabalhos publicados de Paulo Roberto de Almeida, 28 

2023: Do n. 1.489 ao n. 1.539

  

Pau1o Roberto de Almeida

Atualizada em 31 de dezembro de 2023

Publicação parcial provisória

  

Número de trabalhos publicados: 50 (ou aproximadamente 4 por mês)

 

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1489. “O esmagamento da direita civilizada e a ascensão desinibida da extrema direita”, revista Insight Inteligência (ano. xxv, n. 99, janeiro de 2023, p. 34-48; ISSN: 1517-6940; disponível no link: https://inteligencia.insightnet.com.br/o-esmagamento-da-direita-civilizada-e-a-ascensao-desinibida-da-extrema-direita/); divulgado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/104637827/A_caixa_de_Pandora_da_pol%C3%ADtica_brasileira_ocorreu_um_esmagamento_da_direita_tradicional_e_uma_ascens%C3%A3o_da_extrema_direita_2023_). Relação de Originais n. 4265. 

 

1490. “De repente, o mundo descobre um brasileiro pouco cordial”, revista Crusoé (9/01/2023; link: https://crusoe.uol.com.br/diario/de-repente-o-mundo-descobre-um-brasileiro-pouco-cordial/); reproduzido no blog Diplomatizzando (9/01/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/01/de-repente-o-mundo-descobre-um.html). Relação de Originais n. 4300.

 

(...)


 

1537. “O Brasil em 2023: avanços e retrocessos”, Brasília, 5 dezembro 2023, 3 p. Artigo de síntese conjuntural, para o Livres e a revista Crusoé. Revisto em 17/12/2023. Encaminhado a Duda Teixeira. Publicado em 22/12/2023 (link: https://crusoe.com.br/edicoes/295/o-brasil-em-2023-avancos-e-retrocessos/); divulgado parcialmente no blog Diplomatizzando (23/12/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/o-brasil-em-2023-avancos-e-retrocessos.html). Relação de Originais n. 4523.

 

1538. O Brasil no contexto regional e mundial: artigos sobre nossa dimensão internacional (Brasília: Diplomatizzando, 2023, 167 p.; ISBN: 978-65-00-89870-5; ASIN: B0CR1Z682R). Livro organizado a partir de artigos preparados e publicados na revista Crusoé. Disponível na Amazon.com.br (link: https://www.amazon.com.br/dp/B0CR1Z682R/ref=sr_1_1?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&crid=2525JS64IRCBA&keywords=O+Brasil+no+contexto+regional+e+mundial&qid=1703782535&s=books&sprefix=o+brasil+no+contexto+regional+e+mundial%2Cstripbooks%2C228&sr=1-1); divulgado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/novo-livro-publicado-paulo-roberto-de.html). Relação de Originais n. 4533.

 

1539. “Marxismo e socialismo: trajetória de duas parábolas na era contemporânea (1ª ed.; Brasília: Edição do autor, 2019, 200 p.; ISBN: 978-65-00-05969-4; 2ª edição do livro, incorporando Apresentação, “Continuando a estudar o fenômeno do marxismo”, em 28/12/2023. Publicado no formato Kindle (ASIN: B0CR31C5YG), na Amazon.com.br (link: https://www.amazon.com/dp/B0CR31C5YG/ref=sr_1_1?crid=19G43NWZ4AOCD&keywords=Paulo+Roberto+de+Almeida%2C+Marxismo+e+socialismo&qid=1703776816&s=books&sprefix=paulo+roberto+de+almeida%2C+marxismo+e+socialismo%2Cstripbooks-intl-ship%2C217&sr=1-1); divulgado no Diplomatizzando (28/12/2023; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/novo-livro-em-publicacao-o-brasil-no.html). Relação de Originais n. 4535.

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 31 dezembro 2023, 9 p.

Divulgação parcial provisória.


Lista completa disponível na plataforma Academia.edu: 


https://www.academia.edu/112688782/4540_Trabalhos_Publicados_n_28_Jan_Dez_2023

terça-feira, 26 de dezembro de 2023

O que eu "tramava" para Lula ao início de seu terceiro mandato, em 1 de janeiro de 2023 - Paulo Roberto de Almeida

Quase um ano atrás, em viagem de férias entre o final de 2022 e o começo de 2023, eu fazia meus votos de sucesso ao presidente no início do seu terceiro mandato. Vejamos quais eram meus prognósticos.

Meus melhores votos de sucesso em 2023 vão para…

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(diplomatizzando.blogspot.com)

Nota saudando o terceiro mandato, com diversos alertas e sugestões de políticas.

  

... Lula, como presidente pela terceira vez, algo inédito na história política brasileira, por ser pela via democrática e não como certos “presidentes” ou chefes de governos, eternizados em eleições fraudadas em diversos países latino-americanos, africanos e em outros países, inclusive europeus, como por exemplo na Hungria de Orban e na Rússia de Putin, assim como na China de Xi Jinping (que acaba de romper um modelo de alternância na autocracia do partido leninista, ao “eleger” pela terceira vez o seu novo imperador).

Lula merece ter sucesso no que é o seu marco distintivo na frágil democracia brasileira, a diminuição, ainda que relativa e altamente instável, da iniquidade da distribuição de renda no país, que sempre a concentrou em favor de nossas medíocres elites patrimonialistas. 

Não tenho nenhuma ilusão que essa pequena redução na concentração de renda se faça em favor dos realmente pobres e miseráveis e que ela seja feita pelos bons méritos de políticas macroeconômicas e setoriais adequadas, pois carregam os sinais distintivos do velho populismo eleitoreiro da subvenção ao consumo dos mais pobres, e não pela via correta e necessária de redução das fontes estruturais da pobreza, que são a não educação de maneira geral e a baixa capacitação técnico-profissional da população economicamente ativa, necessária para a elevação dos níveis de produtividade do capital humano e social, em particular.

Sempre fui, a despeito de ser bastante crítico a esse personagem singular do velho populismo brasileiro, um apoiador sincero de suas medidas redistributivas, que corrigem, ainda que minimamente e modestamente, a tremenda injustiça do eterno patrimonialismo oligárquico do Brasil, uma nação que se caracteriza por séculos de injustiças contra os mais pobres, em primeiro lugar contra os africanos e indígenas escravizados e oprimidos, e que ainda se ressentem da persistência de formas disfarçadas de escravismo e de servidão na pobreza generalizada de seus descendentes.

Continuarei ao longo de 2023, e mais além, meu apoio crítico a tais medidas de redução da miséria abjeta e da pobreza absoluta por parte de um governo que dispõe de um legítimo apoio popular, ao lado de uma convivência incômoda com as “elites” extratoras de sempre, as classes econômicas eternamente privilegiadas, que não são apenas os velhos e novos  proprietários fundiários e os grandes capitalistas, empresários industriais e banqueiros, mas também os mandarins do Estado, a começar pela aristocracia do judiciário e outros altos servidores do Estado, que se servem do Estado para si próprios. 

Manterei, ao longo de 2023 e mais adiante, meu ceticismo sadio em relação a políticas públicas e medidas estatais que atuam apenas nos estoques de riqueza, e não na criação de seus novos fluxos, assim como naquelas iniciativas redistributivas que impactam apenas os muitos efeitos da iniquidade distributiva (entre elas um sistema tributário regressivo), e não exatamente suas múltiplas fontes de criação dos canais de reconcentração de renda, com modestos resultados nas estruturas sólidas do nosso vergonhoso coeficiente de Gini.

Serei especialmente crítico em relação a uma política externa feita de muitos equívocos conceituais (como a velha e anacrônica visão “classista” da divisão do mundo) e de sua primeira diplomacia partidária, com vergonhosos apoios a execráveis ditaduras supostamente de esquerda (e algumas de direita também). 

Sou, em particular, um opositor talvez isolado e de primeira hora do BRIC-BRICS, que considero um grande erro estratégico da diplomacia lulopetista, por nos unir, sem qualquer convergência sólida de objetivos compartilhados, a duas grandes autocracias e a duas outras democracias de baixíssima qualidade (como é a nossa aliás), apenas pela ilusão de que se trataria da construção de uma ordem mundial alternativa à velha dominação de antigas potências colonialistas ou do novo hegemonismo americano, o que é um programa meramente oposicionista, sem qualquer conexão com propostas visando a melhoria da qualidade de políticas públicas de desenvolvimento econômico e social, ou com a elevação dos padrões de governança democrática e de defesa dos direitos humanos e das liberdades individuais.

Também sou um opositor declarado do estatismo desmesurado desse terceiro governo economicamente intervencionista do grande líder populista, e de sua megalomania na política externa, o que nos envolve num certo aventureirismo diplomático, sem grandes efeitos no objetivo que deveria ser essencial num projeto nacional, que é a redução dos níveis exageradamente altos de miséria e de pobreza inaceitáveis.

Com todas essas ressalvas, alertas e sugestões, desejo um bom 2023 a Lula e um bom governo até 2026, esperando que escapemos de uma nova e catastrófica recessão (como a de 2015-16) e que em 2027 estejamos melhor do que agora e livres de qualquer ameaça golpista e de um retorno do destruidor desgoverno desse infeliz último quadriênio, marcado pelo reforço do patrimonialismo oligárquico e do autoritarismo militar, ilegítimo em sua essência. 

Vamos lá Brasil, seja feliz de novo, como nos bons tempos de JK, que viram o nascimento da Bossa Nova e do Rei Pelé!

Com os melhores votos de

Paulo Roberto de Almeida

São Paulo, 1/01/2023

 

Paulo Roberto de Almeida

São Paulo, 4297: 1 janeiro 2023, 3 p.


quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

O ano de 2023 na politica externa e na diplomacia: discurso do chanceler na CREDN-CD

 Ministério das Relações Exteriores

Assessoria Especial de Comunicação Social 

Nota nº 601

13 de dezembro de 2023 

Discurso do Ministro Mauro Vieira na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados (CREDN) 

Excelentíssimo Senhor Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, Deputado Paulo Alexandre Barbosa,

Excelentíssimas Senhoras Deputadas,

Excelentíssimos Senhores Deputados,

Senhoras e Senhores, 

É uma satisfação retornar a esta Comissão e a esta Casa.

Esta é a quarta vez neste ano que tenho o prazer de me dirigir diretamente aos membros do Legislativo nacional, contando minha última participação nesta Comissão, em maio passado, e as duas vezes em que estive na Comissão de Relações Exteriores do Senado, também em maio e depois em outubro.

Gostaria, inclusive, de ter estado nesta Comissão em outubro, o que não foi possível por dificuldades de agenda.

Por outro lado, essa minha vinda um pouco mais tardia me dá a oportunidade de apresentar um quadro mais amplo e consolidado do conflito israelo-palestino, das posições assumidas pelo Brasil, das ações empreendidas pelo Governo em diversos temas da nossa política externa, inclusive durante nossa presidência rotativa no Conselho de Segurança da ONU no último mês de outubro.

Estar aqui neste momento também me dá a oportunidade de fazer um balanço geral da política externa do Governo brasileiro encaminhada pelo Presidente Lula neste primeiro ano de governo.

 

Caros deputados,

É lamentável que o conflito entre Israel e Palestina, que se arrasta há mais de sete décadas, tenha voltado ao topo da agenda internacional da forma como ocorreu, com grau inédito de violência, destruição e mortes, colocando em risco a estabilidade regional e global.

Já na primeira hora, o Governo brasileiro, a começar pelo Presidente da República, manifestou o repúdio e a condenação aos atos terroristas realizados pelo Hamas em 7 de outubro contra a população civil em Israel, a partir da Faixa de Gaza, com grande número de mortos e feridos.

Na ocasião, transmitimos oficialmente, tanto por nota do Itamaraty, quanto por meio de telefonema do Presidente Lula ao Presidente de Israel, Isaac Herzog, bem como por telefonema meu ao chanceler de Israel, Eli Cohen, nossas condolências aos familiares das vítimas e nossa solidariedade ao povo de Israel.

Manifestamos, também, por nota do Itamaraty e por contatos pessoais diretos, nossas condolências e solidariedade aos familiares dos nacionais brasileiros Ranani Glazer, Bruna Valeanu e Karla Stelzer Mendes, que foram vítimas fatais desses atos terroristas quando participavam de festival de música eletrônica no território de Israel. Estendemos também condolências aos familiares de três filhos de brasileiros, igualmente vitimados: Gabriel Yishay Barel, Tchelet Zaarur e Noam Rotemberg. Quero aqui renovar nossas condolências e sublinhar que a Embaixada do Brasil em Tel Aviv segue à disposição para ajudar no que for necessário.

Nada, absolutamente nada justifica o recurso à violência, sobretudo contra civis. Foi por isso que, desde o primeiro momento, fizemos um chamamento a todas as partes para que exercessem a máxima contenção a fim de evitar uma escalada da situação. Defendemos que o Hamas libertasse os reféns, especialmente as crianças, que foram sequestradas de suas famílias. Pedimos a Israel cessar os bombardeios para que as crianças palestinas e suas mães tivessem condições de deixar a Faixa de Gaza através da fronteira com o Egito e de receber ajuda humanitária.

Destacamos, desde o princípio, a urgência de um cessar fogo humanitário e exortamos as partes a respeitarem o Direito Humanitário Internacional. É inadmissível que a população civil da Faixa de Gaza tenha sido submetida a tamanha destruição de sua infraestrutura mais básica, desde redes de eletricidade, saneamento e esgoto até o ataque ao Hospital Batista de Gaza, que resultou na morte de mais de 500 pessoas.

Podemos dizer que pelo menos uma parte das demandas que defendíamos pôde ser atendida durante a vigência da recente trégua humanitária, quando foi libertado número significativo de reféns de Gaza e de prisioneiros palestinos em Israel (quase todos mulheres e crianças).

Infelizmente, como as senhoras e os senhores sabem, o conflito entre Israel e Palestina não é algo novo, que começou agora, nem é fato isolado, existente em um vazio de contexto. É um conflito que remonta ao fim do Império Otomano, após a Primeira Guerra Mundial, e ao término do subsequente Mandato Britânico da Palestina, logo após a Segunda Guerra Mundial, sempre com muitas disputas sobre como aqueles territórios deveriam ser compartilhados.

A Resolução 181 da ONU, aprovada na Segunda Sessão Especial da Assembleia Geral, em 29 de novembro de 1947, que estabeleceu as regras para a Partilha da Palestina, jamais foi integralmente respeitada por nenhuma das partes. Isso resultou em graves consequências para a população civil local. Já em maio de 1948, após uma guerra civil entre israelenses e árabes, foi declarada a Independência de Israel, seguida da Primeira Guerra Árabe-Israelense. Os sentimentos mútuos de revanche vêm desde então, e desaguaram em guerras como a de 1956, em Suez, a dos Seis Dias, em 1967, e a do Yom Kippur, em 1973, além das seguidas invasões, retaliações e intifadas desde então. É sintomático que esta guerra de hoje tenha ocorrido no momento do 30º aniversário dos Acordos de Paz de Oslo, de 1993, quando surgiram expectativas de uma solução pacífica que jamais foi implementada pelas partes.

Mais recentemente, a violência envolvendo a Faixa de Gaza já havia eclodido em 2006, 2009, 2011, 2014, 2018 e 2021. O bloqueio a Gaza já dura 16 anos, com sérias consequências humanitárias para a vida de seus dois milhões e trezentos mil habitantes.

Nos anos mais recentes, a dinâmica entre Israel e Palestina se tornou cada vez mais insustentável, sem avanços concretos no front político-diplomático. A ONU aponta que assentamentos ilegais israelenses aumentaram na Cisjordânia. Persistem violações ao “status quo” dos sítios sagrados de Jerusalém, com destaque para a Esplanada das Mesquitas, também conhecida como Monte do Templo, terceiro lugar mais sagrado do Islamismo, que é custodiado pelo Reino Hachemita da Jordânia.

As duras condições econômicas a que os palestinos são submetidos, especialmente em Gaza, leva à absoluta falta de perspectivas para a população, composta majoritariamente de crianças e jovens, contribuindo para o desespero e para a espiral de violência.

Por ocasião da primeira pausa humanitária, no fim de novembro último, após os 1.186 israelenses mortos no ataque de 7 de outubro e os 48 dias consecutivos de bombardeios incessantes que o seguiram, o número de vidas civis perdidas em Gaza ultrapassava naquele momento os 14 mil, sendo 70% mulheres e crianças. Agora, o número de mortos já passa de 18 mil.

Os números de deslocados internos são impressionantes, atingindo quase 1 milhão e oitocentas mil pessoas, equivalentes a 80% da população de Gaza, ou seja, 4 em cada 5 habitantes estão deslocados de suas cidades de origam. Estima-se que cerca de 41.000 casas foram destruídas totalmente ou gravemente danificadas. Dezoito hospitais foram fechados. O número de caminhões com assistência humanitária que puderam acessar a Faixa mostrou-se insuficiente para atender às necessidades básicas da população, como alimentos, água, medicamentos e combustível. A população de Gaza passou a sofrer com a fome crônica, a falta de água e com o aumento em 45 vezes da incidência de doenças sanitárias. O cenário é desolador.

 

Senhoras e senhores deputados,

Como país amigo de Israel e do Estado da Palestina, a posição e compromisso do Brasil é, como historicamente tem sido, em favor do diálogo e de negociações que conduzam a uma solução de dois Estados, com Palestina e Israel convivendo em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas.

O Brasil tem um compromisso histórico com o Estado de Israel. E temos também um compromisso histórico com a legítima aspiração nacional do povo palestino de estabelecer o seu próprio Estado.

Tivemos papel decisivo, como todos sabem, no processo que levou à criação do Estado de Israel quando, em 29 de novembro de 1947, como já mencionei, a Assembleia Geral das Nações Unidas, sob a presidência do brasileiro Oswaldo Aranha, aprovou o plano de partilha da Palestina, que previu a criação de um Estado judeu, mas também um Estado palestino, além de um regime especial para a cidade de Jerusalém.

No auge da Crise de Suez, em 1957, enviamos os primeiros capacetes azuis brasileiros em uma das primeiras missões de Força de Emergência da ONU. Eles ajudaram a garantir e supervisionar a cessação das hostilidades, incluindo a retirada de forças armadas de França, Israel e Reino Unido do território egípcio.

E quis o destino que coubesse ao Brasil a presidência rotativa do Conselho de Segurança das Nações Unidas justamente no mês de outubro último, quando eclodiu o atual conflito.

Temos orgulho de nossa posição equilibrada sobre o conflito israelo-palestino, que respeita o direito internacional, as resoluções do Conselho de Segurança e da Assembleia Geral das Nações Unidas. Graças ao diálogo que retomamos desde o início do Governo com todas as partes, bem como às posições tradicionalmente equilibradas do Brasil, pudemos dar nossa contribuição como interlocutor confiável e qualificado a essa complexa questão.

E foi assim que buscamos proceder durante nossa presidência no Conselho de Segurança, visando ao exercício da contenção entre as partes e buscando ajudar a construir posições comuns no Conselho, que segue paralisado pelas disputas entre os membros permanentes há um bom tempo. O dossiê israelo-palestino é, por sinal, o tema com o maior número de vetos na história do Conselho de Segurança: mais de 40, desde 1945.

O Brasil foi instado, na qualidade de presidente do Conselho, a facilitar um texto de consenso com foco em assegurar uma pausa humanitária, que permitisse a entrada de insumos de primeira necessidade aos civis de Gaza, e a saída de estrangeiros e outros cidadãos para o Egito.

É preciso ficar claro, portanto, que o Brasil, na qualidade de presidente do Conselho de Segurança, foi instado a facilitar e articular um projeto de resolução, com base em uma série de contatos e consultas de alto nível em Nova York e nas principais capitais do mundo, em busca de um mínimo denominador comum entre interesses tão díspares.

Desde a eclosão da crise em Gaza, fui a Nova Iorque  quatro vezes, presidi sete sessões do Conselho de Segurança, e participei do Debate aberto sobre Oriente Médio no dia 29 de novembro último, sempre nesse espírito construtivo e de facilitação para a formação de consensos.

O projeto de resolução, que ajudamos a construir a partir dessa articulação com todos os demais membros do Conselho, foi posto em votação no dia 18 de outubro. Como os senhores sabem, recebeu 12 votos positivos dentre 15 possíveis – portanto foi formalmente aprovado –, apenas duas abstenções e um voto negativo de um dos membros permanentes do Conselho de Segurança, que nessa circunstância se transforma em veto.

Foi uma oportunidade perdida que postergou a ação do Conselho de Segurança em quase um mês, até que foi finalmente aprovada proposta de Malta, em 15 de novembro, já na presidência chinesa do Conselho de Segurança. A resolução, que se assemelhava àquela articulada anteriormente pelo Brasil, instou a libertação de todos os reféns e o estabelecimento de pausas humanitárias para apoio à população civil, o que finalmente vimos acontecer em 24 de novembro. A pausa era prevista para durar inicialmente por quatro dias, mas seu prazo foi estendido por duas vezes. Infelizmente, os combates recomeçaram na manhã do dia 1º de dezembro.

 

Senhoras e senhores deputados,

O Brasil construiu, ao longo de décadas, uma capacidade de diálogo e interlocução com israelenses e com palestinos. Isso é um patrimônio diplomático que transcende governos. Essa nossa postura de equilíbrio é um patrimônio do povo brasileiro, que muitas vezes serve como uma espécie de escudo protetor dos cidadãos brasileiros no exterior que se vejam repentinamente afetados por uma situação de conflito.

Desde a eclosão do conflito, o Governo trabalhou incessantemente para garantir o retorno ao Brasil, em segurança, dos nossos cidadãos que assim desejassem e que estivessem em Israel e na Palestina. Segundo os números que tínhamos naquele momento, eram cerca de 14 mil brasileiros ou binacionais residentes em Israel e cerca de 6 mil na Palestina, a grande maioria na Cisjordânia, mas alguns na Faixa de Gaza, que enfrentavam uma situação maior de risco e vulnerabilidade.

Em 7 de outubro, eu estava ainda no início de uma viagem que fazia à Ásia, em Jacarta, na Indonésia, quando determinei a convocação urgente de uma reunião, já no domingo, dia 8, com a participação da Ministra, interina, das Relações Exteriores, Embaixadora Maria Laura da Rocha, convidando o Ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, o Comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Marcelo Damasceno, e o Assessor Especial da Presidência da República, Embaixador Celso Amorim.

Essa primeira reunião permitiu a tomada de importantes decisões e resultou na criação de um gabinete de crise no Itamaraty, reunindo o Ministério da Defesa, com o objetivo de acompanhar, em tempo real, os desdobramentos do conflito tanto na seara política quanto na assistência aos brasileiros.

Esse gabinete de crise ainda está em funcionamento, produzindo informações diárias sobre o andamento do conflito, que são transmitidas ao Senhor Presidente da República, e teve papel fundamental no apoio aos nossos cidadãos naquela região, trabalhando inicialmente em regime de plantão de 24 horas, 7 dias por semana, atendendo às famílias e coordenando o processo de repatriação.

Como os senhores sabem, o Brasil foi o primeiro país a anunciar e organizar uma missão de repatriação de nacionais, sem custos para as pessoas atendidas, após a eclosão do conflito. A Operação Voltando em Paz foi executada com altíssima eficiência, graças ao trabalho conjunto do Ministério das Relações Exteriores, em especial de seus funcionários nas Embaixadas em Tel Aviv, Ramalá e Cairo, e graças ao apoio do Ministério da Defesa e ao profissionalismo da Força Aérea Brasileira, que atenderam imediatamente ao chamado do Presidente Lula de não deixar nenhum cidadão para trás. Quero agradecer, igualmente, o apoio de muitos parlamentares que entraram em contato conosco e nos ajudaram a identificar pessoas que precisavam de ajuda tanto em Israel quanto na Palestina.

Foram, ao todo, 11 voos da Força Aérea que ocorreram em ritmo quase diário, a partir de 10 de outubro, tendo oito deles partido de Israel, um da Jordânia, para retirar cidadãos que estavam na Cisjordânia e, também, um voo em novembro, partindo do Egito, para repatriar os 32 brasileiros registrados que estavam na Faixa de Gaza. Foi com grande alegria que recebemos em Brasília, na madrugada desta última segunda-feira, 11 de dezembro, o 11º voo de repatriação com mais 47 brasileiros e familiares que estavam em Gaza. No total, a Operação Voltando em Paz concluiu com êxito a repatriação de 1,524 brasileiros e familiares que estavam na região do conflito.

Como os senhores sabem, atenção especial precisou ser dedicada ao atendimento dos cidadãos brasileiros que estavam na Faixa de Gaza, em decorrência do bloqueio físico à passagem de pessoas para Israel ou para o Egito. O Escritório de Representação do Brasil em Ramalá manteve contato constante com as famílias e conseguiu, inicialmente, alojar o grupo em uma escola católica na Cidade de Gaza, até que fosse possível sua passagem para o Egito. Um ônibus foi fretado para essa missão, e ficou à disposição junto das famílias, na escola. Vale lembrar que Ramalá fica na Cisjordânia, afastada fisicamente da Faixa de Gaza, o que tornava a comunicação sempre mais difícil.

Com a determinação, por parte de Israel, de evacuação da população do norte de Gaza – onde fica a Cidade de Gaza – para o sul, esses cidadãos foram, inicialmente, transportados para a cidade de Khan Younis, e depois para Rafah, na fronteira com o Egito, até que foi possível, finalmente, inclui-los na lista de cidadãos estrangeiros autorizados a cruzar a fronteira, em 11 de novembro.

Ao longo do processo, foram encaminhadas às autoridades militares israelenses, por meio de nossa embaixada em Tel Aviv, endereços, telefones e “pins” de identificação geográfica dos locais em que se encontravam as famílias aguardando repatriação, na tentativa de evitar que fossem bombardeadas pela aviação de guerra.

Durante todo esse tempo, o Presidente Lula e eu próprio mantivemos uma série de contatos de alto nível para facilitar a repatriação dos nacionais brasileiros, criar um corredor para levar ajuda humanitária, libertar os reféns e criar espaços para a retomada do processo de solução política para o conflito.

O Presidente Lula conversou por telefone com o Presidente de Israel, com o Presidente do Egito, com o Presidente da Autoridade Palestina, com o Presidente da Turquia, com o Presidente do Irã, com o Emir do Catar e com o Primeiro Ministro da Jordânia, entre outros. Eu conversei com o Chanceler do Egito duas vezes por telefone e pessoalmente, no Cairo. Também falei com os chanceleres de Israel, Arábia Saudita, Rússia, França, Irã e Catar.

A partir desse trabalho intenso, criaram-se as condições necessárias para avançar o esforço de repatriação. Creio que, com isso, concluo aqui esse panorama sobre nossa atuação a respeito do conflito israelo-palestino. Gostaria agora de fazer um breve balanço do primeiro ano de governo no que tange à política externa.

 

Senhoras e Senhores deputados,

Como tem dito o Presidente Lula, o Brasil voltou. Isso não é mera figura de linguagem. Ao longo deste ano, tivemos mais de 200 interações mantidas pelo Presidente da República e por mim mesmo, na forma de participação em cúpulas, reuniões bilaterais, visitas realizadas e recebidas, telefonemas e videoconferências. O Brasil também se reencontrou consigo mesmo, em um movimento de resgate dos princípios fundamentais que sempre nortearam a política externa brasileira. Princípios, por sinal, consolidados na Constituição Federal.

Fundamentos como a independência nacional, a prevalência dos direitos humanos, o respeito à autodeterminação dos povos, a não intervenção, o reconhecimento da igualdade entre os Estados e a defesa da paz e da solução pacífica das controvérsias estão na base da política externa brasileira em seus melhores momentos. A cooperação entre os povos para o progresso da humanidade e a busca pela integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina são também princípios constitucionais que o Brasil buscou em seus momentos de maior projeção internacional. São esses fundamentos, aliados à vocação universalista brasileira de diálogo com todos os parceiros, sem noções pré-concebidas, e à busca incessante pelos melhores resultados possíveis para o interesse nacional, que buscamos aplicar ao longo deste primeiro ano de governo e que seguirão informando a política externa do governo Lula nos próximos anos.

O ponto de partida, como não poderia deixar de ser, foi a integração regional. Uma das primeiras medidas formais tomadas pelo governo, logo no início de janeiro, foi a reincorporação plena e imediata do Brasil à Comunidade de Países Latino-Americanos e Caribenhos, a CELAC, que é o único mecanismo de diálogo e cooperação que inclui todos os 33 países da América Latina e do Caribe. A CELAC é um espaço privilegiado para a construção de iniciativas concretas de cooperação em áreas nas quais temos desafios comuns, como saúde, segurança, cooperação científico-tecnológica, entre tantas outras.

Em julho, o Presidente Lula participou da Cúpula CELAC-União Europeia, em Bruxelas, que além de reforçar a cooperação entre os dois grupos e servir de ocasião para diversas reuniões bilaterais, resultou em um comunicado conjunto muito positivo, reafirmando princípios como a promoção do trabalho decente e da igualdade de gênero, bem como a condenação a medidas unilaterais com efeitos extraterritoriais, ao embargo a Cuba e ao tráfico negreiro transatlântico histórico, reconhecido como um crime contra a humanidade.

Com relação à América do Sul propriamente, o Brasil anunciou o seu regresso ao Tratado Constitutivo da União de Nações Sul-Americanas, a UNASUL, como forma de sinalizar nossa determinação de trabalhar com nossos vizinhos pela revalorização da América do Sul como um espaço de diálogo, paz e cooperação. Sempre fomos conscientes de que há diferentes expectativas e visões na região com relação à integração, mas mantemos também a convicção de que há denominadores comuns entre nós, a começar pelo reconhecimento da necessidade de trabalhar conjuntamente com nossos vizinhos imediatos para fazer frente aos múltiplos desafios comuns que compartilhamos.

Foi com esse espírito que o Presidente Lula convocou a Reunião de Presidentes dos Países da América do Sul, a Cúpula de Brasília, que ocorreu aqui na Capital Federal em 30 de maio. A cúpula foi muito bem-sucedida: conseguiu reunir todos os presidentes sul-americanos e o Primeiro-Ministro do Peru. A reunião serviu de plataforma para a discussão de assuntos e interesses muito concretos da região e resultou em um comunicado conjunto muito importante, denominado “Consenso de Brasília”, consolidando esse objetivo geral de revitalizar o processo de integração regional. Foi criado um grupo de contato, em nível ministerial, que eu mesmo já presidi por duas vezes, a primeira em julho, durante a Cúpula CELAC-União Europeia, realizada em Bruxelas, e a segunda vez em setembro, em Nova York, à margem da Assembleia Geral da ONU. Foi também definido um calendário de encontros regionais, como, por exemplo, a Reunião de Chanceleres e Ministros da Defesa – a chamada “reunião 12+12” –, que ocorreu aqui em Brasília, no dia 22 de novembro.

O esforço de retomada da integração regional se dá também na Amazônia. Em 8 e 9 de agosto, realizamos a Cúpula da Amazônia, em Belém do Pará, reunindo os presidentes de todos os oito países signatários do Tratado de Cooperação Amazônica. Tivemos por objetivo fortalecer institucionalmente a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, a OTCA, que tem sede aqui em Brasília, e estabelecer uma nova agenda comum de cooperação regional em favor do desenvolvimento sustentável e compartilhado da Amazônia, conciliando a proteção da floresta e da bacia hidrográfica, inclusão social, o fomento à ciência, à tecnologia e à inovação, o estímulo à economia local e a valorização dos povos indígenas e dos conhecimentos ancestrais das comunidades locais. A Declaração de Belém, resultante da Cúpula, consolida essas ideias em 113 objetivos e princípios transversais.

Ao longo do ano, o Presidente Lula manteve contatos com todos os mandatários da América do Sul. Visitou a Argentina, por duas vezes, em janeiro (para a Cúpula da CELAC) e em julho (para a Cúpula do Mercosul). Ainda em janeiro, o Presidente também visitou o Uruguai. Em julho, esteve na Colômbia para uma reunião preparatória da Cúpula da Amazônia. No caso do Paraguai, o Presidente Lula reuniu-se em março, em Foz do Iguaçu, com o então presidente Mario Abdo Benítez e, em agosto, em Assunção, com o atual Presidente Santiago Peña.

Com relação à Venezuela, reabrimos nossa embaixada em Caracas e designamos uma diplomata experiente, a embaixadora Glivânia Oliveira, para assumir a chefia da nossa representação. Isso contribui não apenas para que avancemos nossos interesses junto a um vizinho importante, como também para que possamos prestar a devida assistência consular aos cerca de 20 mil brasileiros que residem naquele país. Procederemos, por sinal, em futuro próximo, à reabertura das quatro representações consulares do Brasil que foram fechadas em 2020.

Relançamos, também, nossa relação com Cuba, país onde também temos interesses importantes, e que o Presidente Lula visitou em setembro, por ocasião da Cúpula dos Países do Grupo dos 77 e China, logo antes da Assembleia Geral das Nações Unidas.

Para além dos parceiros regionais, esse ano também foi de retomada do trabalho junto a parceiros tradicionais do Norte desenvolvido, como Estados Unidos, Alemanha, França, Portugal, Espanha, União Europeia e Japão, com os quais mantemos agenda ampla de comércio, investimentos e cooperação, inclusive em setores estratégicos para o Brasil.

Ainda em janeiro, o Presidente Lula visitou os Estados Unidos. O encontro com o Presidente Joe Biden sinalizou o compromisso das duas maiores democracias do continente de voltar a trabalhar conjuntamente em uma gama de questões, como o combate ao extremismo político, o enfrentamento à mudança do clima, a luta contra a discriminação racial e a reforma da governança internacional. Em setembro, em um evento à margem da Assembleia Geral das Nações Unidas, Brasil e Estados Unidos, com a presença dos Presidentes Lula e Biden, lançaram a Parceria Global pelos Direitos dos Trabalhadores e Trabalhadoras e a Promoção do Trabalho Digno, que foi saudada pela OIT e deverá contar com a adesão de vários outros países.

O Presidente Lula visitou, ainda, Portugal e Espanha, em abril, acompanhado de importante delegação empresarial. Em maio, esteve no Reino Unido para a coroação do Rei Carlos III, quando manteve reunião com o Primeiro-Ministro Rishi Sunak. Ainda em maio, o Presidente Lula viajou ao Japão como convidado da Cúpula do G7, em Hiroshima, mantendo reuniões bilaterais com o Primeiro-Ministro do Japão e com os líderes dos demais países membros desse grupo. Recordo que, com o Japão, foi assinado um inédito acordo para isenção recíproca de vistos.

Em junho, o Presidente fez visita à Itália e à França, sendo um dos convidados de honra da Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global, em Paris. Além disso, em julho, esteve em Bruxelas, na sede da União Europeia, para a já mencionada Cúpula CELAC-União Europeia. Na semana passada, o Presidente Lula liderou numerosa comitiva em visita à Alemanha para participar da Reunião de Consultas Intergovernamentais de Alto Nível com aquele país.

Ao longo do ano, buscamos ainda valorizar a tradição universalista e ecumênica da nossa política externa, por meio do aprofundamento e da ampliação das nossas relações com parceiros do Sul Global, na Ásia, na África e no Oriente Médio.

Como as senhoras e os senhores sabem, o Presidente Lula realizou, em abril, a bem-sucedida Visita de Estado à China, nosso principal parceiro comercial, principal destino de nossas exportações agrícolas e uma das principais fontes de investimentos estrangeiros diretos no Brasil. A visita, que contou com a participação de ampla delegação empresarial (e também parlamentar) foi marcada pela obtenção de resultados concretos, tanto políticos – como o aprofundamento da cooperação bilateral em setores estratégicos – quanto econômico-comerciais: foram assinados acordos que, juntos, somam mais de R$ 50 bilhões em investimentos.

Na mesma ocasião, o Presidente visitou também os Emirados Árabes Unidos, gerando acordos que somam mais R$ 15 bilhões em investimentos potenciais no Brasil.

Em julho, o Presidente esteve no Cabo Verde. Em agosto, visitou a África do Sul, para participar da Cúpula do BRICS. Em seguida fez visita bilateral a Angola e esteve em São Tomé e Príncipe por ocasião da Cúpula da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Agora em dezembro, o Presidente visitou a Arábia Saudita e o Catar, dirigindo-se em seguida, aos Emirados Árabes Unidos, para participar da COP28 de Mudança do Clima.      

Em todos esses compromissos, eu normalmente acompanhei o Presidente, além de participar de outras reuniões, preparatórias ou de coordenação multilateral, em nível ministerial. O ano foi, portanto, bastante intenso para a Presidência da República e para o Ministério das Relações Exteriores.

 

Senhoras e senhores deputados,

Se, por um lado, como pude comentar, o Brasil voltou para si mesmo e para o mundo, por outro também o mundo voltou para o Brasil. E isso se dá não apenas pela retomada do volume de visitas bilaterais recebidas, como também pelo número de incumbências globais e multilaterais que o Brasil voltou a assumir, em papel de grande liderança. Nosso país será, nos próximos anos, a sede de foros internacionais de alta relevância, como o G20, a COP 30 do Clima e o BRICS.

A Cúpula da Amazônia, em agosto, contou com a presença, na qualidade de convidados especiais, de parceiros extrarregionais, como Noruega e Alemanha. Também foram convidados Indonésia, República do Congo, República Democrática do Congo e São Vicente e Granadinas, países com os quais firmamos, na ocasião, o comunicado “Unidos por Nossas Florestas”. Essa é uma iniciativa, liderada pelo Brasil, que visa à preservação das florestas tropicais no mundo, à qual foram convidados a aderir outros 80 países com importantes reservas florestais.

O Brasil também teve participação destacada na COP 28, em Dubai, encerrada ontem, 12 de dezembro, e na qual se discutiu a avaliação global (“global stocktake”) de execução dos objetivos nacionais que os países definiram na COP 21, em Paris. O Brasil, além de ter cumprido a maior parte de seus compromissos, foi confirmado como sede da COP 30, em 2025, cuja Cúpula pretendemos realizar também na cidade de Belém, no Pará.

A COP de Belém será uma grande oportunidade para revitalizarmos o regime multilateral do clima; para buscarmos limitar o aumento da temperatura global em 1,5 graus celsius; e para acelerarmos nossa própria transição ecológica e energética. Será na COP 30 que os países estabelecerão os seus próximos objetivos nacionais de redução de emissões, o que atesta a relevância dessa ocasião, no Brasil.

O Brasil já iniciou sua preparação para assumir, em 2025, a presidência do BRICS, que passará a contar, a partir do ano que vem, com novos membros. Essa é uma presidência que vai demandar significativo esforço diplomático, na medida em que envolve a realização de grande número de reuniões de comissões temáticas em diferentes níveis de representação. Acreditamos que esse esforço vai produzir resultados concretos para os países membros em termos de coordenação para a reforma da governança global e em outros temas. A ampliação do grupo deverá reforçar a relevância dos BRICS no mundo, e a presidência brasileira em 2025 valorizará a nossa relevância nesse contexto.

Neste ano de 2023, além de ter exercido a presidência do Conselho de Segurança das Nações Unidas, em outubro, como já comentei, o Brasil também assumiu a liderança de diversos outros processos diplomáticos e agrupamentos de países. Acabamos de concluir, por exemplo, nossa presidência pro-tempore do Mercosul, com a Cúpula realizada no Rio de Janeiro na semana passada. Exercemos a presidência do BASIC, grupo que coordena posições em temas ambientais entre Brasil, África do Sul, Índia e China. Além disso, o Brasil assumiu, em meados do ano, a presidência do Grupo de Países Supridores Nucleares (NSG). Antes disso, já vínhamos exercendo a presidência do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis, o MTCR.

Além disso, neste ano, o Brasil assumiu, até o final de 2024, a presidência do IBAS, grupo integrado por Índia, Brasil e África do Sul que promove ações de cooperação, sobretudo com países em desenvolvimento. Finalmente, mas não menos importante, assumimos, desde 1º de dezembro, a presidência do G20, que se estenderá até o final de 2024.

A presidência brasileira do G20 é um momento emblemático na retomada do protagonismo do país no cenário internacional. Pretendemos conduzir nossa presidência com foco em três temas prioritários, estabelecidos pelo Presidente Lula: o combate à fome, à pobreza e à desigualdade; a promoção do desenvolvimento sustentável em suas três dimensões: econômica, social e ambiental; e a reforma da governança global, em favor de maior representatividade dos países do Sul Global.

Ao longo do mandato brasileiro, estão previstas mais de 100 reuniões dos grupos de trabalho e forças-tarefa que compõem o G20, tanto presenciais quanto por teleconferência, em nível técnico e ministerial, em diferentes cidades nas cinco regiões do Brasil. Essas reuniões culminarão na 19ª Cúpula do G20, no Rio de Janeiro, dias 18 e 19 de novembro de 2024, reunindo os chefes de Estado e de Governo das maiores economias do planeta para discutir temas centrais para o mundo. A realização exitosa da presidência do G20 será, necessariamente, uma das prioridades da política externa brasileira ao longo dos próximos doze meses.

A preparação para essa presidência começou ainda em junho deste ano, a partir da publicação do decreto presidencial de governança do G20, atribuindo ao Ministério das Relações Exteriores a competência de coordenar a chamada “Trilha de Sherpas”. Essa é a instância do G20 responsável por organizar e facilitar as atividades de Quinze Grupos de Trabalho, envolvendo vários temas de relevância internacional, tais como meio ambiente, agricultura, tecnologia e inovação, energia, educação, saúde, empoderamento das mulheres, comércio e investimentos, entre outros.

A palavra “sherpa” inclusive, deriva da designação de uma etnia originária da região da Cordilheira dos Himalaias, notória por sua capacidade de guiar e conduzir nas trilhas locais todos aqueles que almejam alcançar o cume da mais alta das montanhas.

O decreto presidencial de governança do G20 também atribuiu ao Itamaraty a função de coordenador nacional do planejamento e da execução das medidas de organização e de logística das atividades a serem realizadas durante a presidência do G20.

Assim, desde março, o Itamaraty passou a conduzir um amplo processo de consultas interministeriais visando à preparação da presidência brasileira, que mobilizou mais de duas dezenas de ministérios e envolveu a definição das prioridades substantivas e dos resultados propostos de cada grupo de trabalho, bem como a definição dos recursos humanos e orçamentários que serão necessários à execução da missão que caberá ao país.

A presidência brasileira, que se iniciou agora em dezembro e se realizará ao longo do ano de 2024, já vem funcionando plenamente, na realidade, ao longo da maior parte deste ano de 2023. Queremos um G20 que se dedique menos a debates e discussões sobre temas variados e mais à obtenção de resultados que tenham impacto real na vida dos nossos cidadãos e de pessoas em todo o mundo.

 

Senhores deputados,

Como podem ver, a agenda da política externa para 2024, exigirá bastante do nosso contingente diplomático, em Brasília e nos postos no exterior. Ademais do intenso trabalho habitual em suas áreas, os servidores farão o seguimento das iniciativas lançadas ao longo deste ano, que incluem as atividades ligadas à presidência do G20, à preparação das cúpulas que serão sediadas no Brasil em 2025, e os mais de cem processos negociadores da COP 30, do BRICS e do Mercosul.

Quero deixar aqui registro do meu agradecimento ao corpo de funcionários do Ministério das Relações Exteriores.

Nesse quadro, as questões relativas à gestão de pessoas no Itamaraty – incluindo o ingresso, a lotação e a progressão de carreira dos servidores – revestem-se de fundamental importância para o êxito para política externa brasileira.

Além de medidas internas para buscar mitigar o déficit crônico de funcionários, aprimorar a alocação da força de trabalho do Ministério de forma mais eficiente, e promover a ampliação da diversidade no quadro de servidores, será eventualmente necessária a aprovação de uma nova Lei do Serviço Exterior, de modo a garantir o reenquadramento salarial e funcional dos diplomatas e demais servidores do Ministério, bem como o adequado fluxo de progressão da carreira.

Além disso, esse amplo conjunto de iniciativas internacionais em que o Brasil está engajado exigirá, naturalmente, recursos orçamentários adequados para financiar as presidências de turno lideradas pelo Brasil em 2024, as contribuições regulares do país aos órgãos internacionais de que participa, bem como o adequado funcionamento de nossa rede de postos no exterior.

Conto com o olhar dedicado e com o apoio desta Comissão às necessidades do Itamaraty, e agradeço pela atenção já dedicada ao longo deste ano, que nos permitiu saldar grande parte da dívida que o país mantinha junto a organismos internacionais.

 

Senhoras e senhores deputados,

Agradeço novamente pela oportunidade de apresentar a Vossas Excelências uma visão de conjunto das iniciativas brasileiras em política externa neste primeiro ano de Governo do Presidente Lula e, ao mesmo tempo, ressaltar algumas das nossas prioridades para 2024.

Fico, evidentemente, à disposição de todos para esclarecer dúvidas e, sobretudo, trocar ideias.

Muito obrigado.

 

[Nota publicada em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/discurso-do-ministro-mauro-vieira-na-comissao-de-relacoes-exteriores-e-de-defesa-nacional-da-camara-dos-deputados-credn

quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Pronunciamento do presidente Lula na cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco, 2023

Pronunciamento do presidente Lula na cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco

Transcrição do pronunciamento do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, na cerimônia de formatura do Instituto Rio Branco, no Palácio Itamaraty, em 21 de novembro de 2023


Meu querido companheiro Mauro Vieira, ministro das Relações Exteriores, por meio de quem cumprimento os demais diplomatas que completaram 50 anos de serviço público. General Marcos Antônio Amaro, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, Jean Baptista, o Núncio Apostólico do Brasil, por meio de quem cumprimento os demais chefes de missão diplomática. Embaixadora Maria Laura da Rocha, secretária-geral do Itamaraty, embaixadora Glivânia Maria de Oliveira, diretora do Instituto Rio Branco e embaixadora Maria Elisa Teófilo de Luna, paraninfa da turma Mônica de Menezes Campos, formandos, e familiares, amigos e amigas.

Eu, por conta do discurso do Essi Rafael, resolvi deixar meu discurso lá e vim falar um pouco com vocês, não da história da fundação do Itamaraty, ou da história da nossa diplomacia, porque não fui tão longe como esse. Mas eu queria falar para jovens que estão adentrando essa carreira de diplomata que, nesses anos todos, eu aprendi a ter uma relação de muito respeito com o Itamaraty.

Muitas vezes, eu nem era presidente da República, nos anos oitenta, era apenas um dirigente sindical, e quase todas as vezes que eu viajava para o exterior eu tinha um assessor, um grande companheiro de muitos de vocês, chamado Marco Aurélio Garcia, que toda vez que eu ia viajar ele comunicava ao Itamaraty que a gente ia viajar. Não importa se o presidente fosse Figueiredo, fosse Geisel, fosse Sarney, quem quer que seja, a gente comunicava ao Itamaraty que a gente ia viajar ao exterior.

E muitas vezes, Mauro, muitas vezes mesmo, sempre tinha alguém do Itamaraty esperando a gente no aeroporto, e muitas vezes a gente era convidado até para almoçar ou para jantar na embaixada. Isso me fez aumentar o orgulho que eu já tinha do Itamaraty, porque muitas vezes nós somos acusados, e muita gente até merece essa acusação, de termos complexo de vira-lata, de não termos autoestima, de não defendermos as coisas que nós acreditamos, e muitas vezes dizem que a gente se subordina demais, às vezes, à vontade de países mais importantes que nós.

Eu não acho que seja assim. Eu acho que não é o Itamaraty que determina a política externa dele. O Itamaraty cumpre as estratégias determinadas por um governo. E se o governo tiver estratégia de política internacional, eu posso dizer pra vocês que o Itamaraty tem mulheres e homens altamente capacitados para exercer qualquer que seja a tarefa determinada pelo governo. E isso é motivo de orgulho pra vocês que estão entrando nessa carreira.

Não é uma carreira fácil. Dizem que a gente pensa de acordo com o chão que os nossos pés pisam, e aí a gente precisa sempre ter cuidado de fazer com que os embaixadores possam conhecer, desde o início, a diversidade da função. É muito importante que a gente faça com que o Brasil tenha uma política muito altiva e ativa na América do Sul e no Caribe, e na América Latina. É muito importante estrategicamente, para um país como o Brasil, ter uma aproximação muito forte com o continente africano.

Se não por outra razão, é porque nós temos origem naquele continente. É porque nós devemos parte da nossa cultura àquele continente. Porque nós devemos parte do que nós somos àquele continente. E porque eles precisam que a gente retribua, não com dinheiro porque também não temos, mas com transferência de tecnologia, sabe, tudo aquilo que a gente pode ajudá-los. É esse o papel de um país do tamanho do Brasil, que faz fronteira seca de quase 16.800 km na América do Sul, e que tem como fronteira marítima todo o continente africano. Vai de Cabo Verde à Cidade do Cabo, ou seja, que a gente tem que tratar isso com muito carinho, muito respeito e com muita diplomacia, sem o complexo da arrogância daquele que acha que alguém é inferior a nós.

Eu vivi muitas histórias aqui no Itamaraty. Muitas. E muitas alegrias, e poucas tristezas. Eu tive oportunidade de viver isso aqui quando a gente resolveu não permitir que a ALCA se implantasse na nossa querida América do Sul, e que a gente fortalecesse o Mercosul, que tinha sido criado pelo presidente Sarney e pelo presidente Alfonsin (ex-presidente da Argentina, Raúl Alfonsin). Eu lembro da importância que foi a gente criar a UNASUL. Nunca, em nenhum momento da história desse país, os países da América do Sul estiveram tão irmanados como nós tivemos durante um período de quase 16 anos.

E não era irmanado porque pensávamos politicamente a mesma coisa, porque pensávamos ideologicamente a mesma coisa. Não. Éramos irmanados porque, em determinado momento da nossa história, o povo elegeu um agrupamento de dirigentes que tinha noção de que era preciso que a gente construísse um grupo, um conjunto de países, que resolvesse se fortalecer para negociar com aqueles que eram mais fortes do que nós. Para negociar com os Estados Unidos, para negociar com a China, para negociar com a União Europeia, para negociar com o Japão. Ou seja, era preciso que a gente se fortalecesse e que tivesse decisões comuns em determinadas ações de políticas externas.

E nós conseguimos viver o melhor momento. Foi aqui no Itamaraty que nós decidimos fazer a primeira reunião da história entre países árabes e países da América do Sul. Em que os Estados Unidos ficaram assustados achando que nós estávamos fazendo um movimento contra Israel. E a gente não queria fazer um movimento contra Israel, a gente queria fazer o movimento pró-Brasil, pró-América do Sul, para que a gente pudesse adentrar nesse mundo árabe e tentar estabelecer negociações e relações políticas mais maduras.

Foi aqui também que nós tomamos a decisão de fazer a primeira reunião entre o continente africano e o continente sul-americano para que a gente pudesse permitir, sabe, que os pobres do mundo se conhecessem, e que pudessem estabelecer relações, e que a gente pudesse descobrir que, mesmo sendo pobre, muita gente tem muito a oferecer para nós e nós temos muito a oferecer para eles. É por isso que nós fizemos a maior investida de embaixadores que já teve na história da África. Foram 19 embaixadas novas criadas, foram 34 países visitados. Levamos para Gana a Embrapa. Levamos para Moçambique a Universidade aberta, levamos uma fábrica de remédios retrovirais. Ou seja, na perspectiva de que o Brasil tinha que cumprir um papel muito forte para não permitir que a África continuasse sendo refém dos colonizadores, ou refém de uma atuação muito forte da China, que estava procurando lugares para poder comprar os alimentos que tanto eles precisavam.

E foi assim que o Brasil foi conquistando respeito no mundo, e foi assim que o Brasil foi ficando importante, e foi assim que eu tenho muito orgulho de ter sido o único presidente do Brasil convidado para participar de todas as reuniões do G7, menos uma que foi em São Francisco que foi o segundo ano já no governo Bush. E aí tem coisas interessantes para contar: a primeira vez que eu participei, em junho de 2003, eu tinha apenas seis meses de governo, e eu fui convidado a participar do G7 em Evian. Cheguei em Evian, um metalúrgico recém-eleito presidente da República, olhei pra dentro de uma sala cercada por vidros blindados para tudo quanto é lado, estavam lá grandes figuras que eu só via lá na televisão. Estava lá o Bush, estava lá o Tony Blair, estava lá o primeiro ministro da Itália e estava lá o convidado rei da Arábia Saudita, estava lá o Koizumi, do Japão. E eu fiquei pensando: "o que que eu vou fazer dentro dessa reunião?". E mais: não podia entrar intérprete. Eu nem entendia e nem falava. E eu falei: "o que que eu vou fazer?". Aí eu fiquei lá fora, o Sérgio Ferreira, que está aqui até hoje, e eu falei: "Sérgio, que que eu vou fazer lá dentro? Eu não consigo nem falar bom dia em inglês". Em espanhol eu ainda consigo falar “hola, que tal? Buenos dias”. O que é que eu vou fazer lá dentro?

Aí me baixou uma coisa, que eu acho que é uma coisa que deve nortear vocês, que é não esquecer o que vocês são, é não esquecer o que vocês querem, porque a gente não compra nem honra nem caráter em shopping. A gente traz de família, a gente traz de berço. Eu lembro que ver aquela gente toda importante, que eu só via na televisão, porque é engraçado, a gente vê mais o presidente americano na televisão brasileira do que o brasileiro mesmo. É uma capacidade de comunicação extraordinária. E eu fiquei pensando: "bem, desses presidentes que estão aí, alguém já viveu desempregado? Alguém já trabalhou no chão de fábrica? Alguém já viveu num bairro que dava enchente? Alguém já acordou com rato, com barata, com um metro e meio de água dentro de casa? Alguém já passou fome? Alguém já morou na periferia de algum país?", e eu pensava “acho que não”. E eu me enchi de orgulho para falar, e sabe o que eu vou falar? Eu vou falar o que eu sei falar. E eles vão me entender porque o Sérgio ia interpretar cada palavra que eu falasse. E eu entrei. Nunca me senti tão à vontade na vida, porque eu tinha definido antes de qualquer coisa que eu não era inferior a eles. Que eu não era melhor, que eu representava não o Lula, não a quantidade de diploma, eu representava o Brasil, o povo brasileiro e que, portanto, eu tinha que ter orgulho. Isso fez com que a gente ganhasse a respeitabilidade que eu acredito que tenha sido o melhor momento da história desse país.

Eu posso dizer aos jovens diplomatas, e aos velhos também. Velhos, não, experientes. De que eu estou voltando agora, estou apenas há 10 meses no governo, eu acho que nós estamos em uma fase melhor do que a gente estava quando eu deixei a presidência. Se bem que nós estamos vivendo algumas confusão na América do Sul. Não é mais a mesma de 2002, 2004, 2006. Nós vamos ter problemas políticos e, ao invés de reclamar dos problemas políticos, a gente precisa ser inteligente e tentar resolvê-los. Tentar conversar. Tentar fazer com que as pessoas aprendam a viver democraticamente na diversidade. Eu não tenho que gostar do presidente do Chile, da Argentina, da Venezuela. Ele não tem que ser meu amigo. Ele tem que ser presidente do país dele e eu tenho que ser presidente do meu país. Nós temos que ter políticas de Estado brasileiro e ele política do estado dele. Nós temos que sentar na mesa, cada um defendendo os seus interesses, como não pode ter supremacia de um sobre o outro, a gente tem que chegar num acordo. Essa é a arte da democracia, a gente ter que chegar a um acordo.

E aí é preciso ter capacidade de negociação, ter capacidade de convencimento, ter capacidade de ceder. É por isso que historicamente eu comparo democracia a um casamento. Nada é parecido com a democracia do que um casamento. Porque no casamento, na hora que você casa, na hora que você tem uma companheira, ou a companheira tem um companheiro, e você tem filhos, todo dia a gente faz concessão. É a gente que faz concessão pra mulher, é mulher que faz concessão pra gente, é a gente que faz concessão pra filho, é filho que faz concessão pra gente. Porque se não for assim, acaba o casamento.

E se não for assim, acaba a grandiosidade de uma coisa chamada diplomacia brasileira, que quer queira ou não é uma das mais respeitadas e mais elogiadas no mundo inteiro. Se tem uma coisa que a gente tem que ter orgulho, é da diplomacia brasileira. Eu posso não gostar de um diplomata, mas se o Brasil tiver política correta, esse diplomata vai exercer a sua função como funcionário do Estado brasileiro, e a gente vai ter orgulho do trabalho que ele prestou.

Eu lembro, Mauro, você já estava no Itamaraty, eu lembro quando começou a briga com Estados Unidos e Iraque. Eu lembro que o nosso representante na agência de armas químicas, me parece, ou armas atômicas, era o embaixador Bustani. E eu lembro que o embaixador Bustani disse publicamente, várias vezes, que não tinha armas químicas no Iraque. Disse isso com todo o poder da voz que ele tinha. Mas como os americanos precisavam prestar contas ao seu povo, de que era preciso derrotar alguém ligado ao terrorismo, era preciso consagrar a mentira de que o Iraque tinha armas químicas. E esse caso é fantástico porque mentiu Saddam Hussein pro seu povo, passando a ideia que tinha, e mentiu os Estados Unidos dizendo que tinha. Aí eu lembro que foi sacado do cargo o nosso companheiro Bustani, e eu fui conversar com um amigo embaixador. Não vou dizer nem aonde e nem quando, e ele me dizia assim: "Presidente, tá correto tirar o Bustani. O Brasil não tem que estar naquela agência, o Brasil não põe dinheiro lá". Eu achei uma atitude tão pequena, eu achei uma atitude tão subserviente, porque não se trata do Brasil colocar dinheiro ou não, se trata de um Brasil que faz parte de um conjunto de países que compõem a ONU. E que, portanto, o Brasil tem o direito de participar e tentar ocupar o cargo. Senão, fica uma coisa estranha.

Quando eu tomei posse em 2003, em setembro eu fui fazer meu discurso e o Brasil estava devendo todas as instituições. Todas. Pense no que que é um presidente chegar para falar e eu fiquei vendo a hora de o Kofi Annan falar: "ô baixinho, para de falar grosso e paga o que você deve, pô". Porque é vergonhoso, é vergonhoso você participar de uma série de coisas e não pagar. Você perde a autoridade moral. E durante todo o meu período de governo, sabe, quem foi diplomata no meu tempo, a gente fazia questão de pagar para que a gente tivesse autoridade de interferir em qualquer espaço que a gente estivesse.

Agora me parece que estava atrasado outra vez. Nós vamos ter que colocar em dia. Porque a gente tem que chegar nos lugares e andar de cabeça erguida. Porque se não você chega, vai sentar, e o cara fala: "o baixinho, você não pagou, fica de pé". E não é possível, assim a gente perde o respeito internamente entre nós.

Então eu queria dizer pra vocês que estão se formando, que a gente vai tentar fazer com que o Brasil tenha uma política externa mais ativa e mais altiva. Obviamente que a gente tem debilidades financeiras, nem sempre a gente tem a quantidade de dinheiro que a gente gostaria de ter, mas, por exemplo, eu tinha visitado, nos meus dois primeiros mandatos, todos os países da América do Sul e do Caribe. Não ficou um que eu não visitasse. E alguns mais de uma vez. A gente, pra manter uma boa relação com a Venezuela, a gente tinha quatro reuniões por ano com a Venezuela. Eram duas lá e duas cá. Era quase um bolero.

A gente fazia muita reunião com a Argentina, porque a Argentina é um país parceiro, o Brasil tem uma relação extraordinária com a Argentina. Foi o primeiro país que eu visitei para dar uma demonstração, em 2003, de que a gente ia ter uma forte política para a América do Sul. Porque quando eu não era ainda candidato, eu já percebia que, durante muito tempo, o Brasil olhava para os Estados Unidos e para União Europeia de costas viradas para a América do Sul. Isso aqui não tinha importância, isso aqui era problema. Pra que cuidar do Uruguai, do Paraguai, da Bolívia? É tudo problema. Não, gente. Se a gente não cuida de quem está perto da gente, muito menos a gente cuida de quem está longe. A gente olhava pro continente europeu e não via a África. Se bem que foi no regime militar, que foi no governo Geisel que a gente foi o primeiro país a reconhecer a independência de Angola.

É essa diplomacia que nós temos que levar em conta. É vocês saberem que vocês estão sendo respeitados por aquilo que vocês fazem. Pelo trabalho, e é preciso que o governo tenha a política, porque se alguém chegar pra vocês e falar "o embaixador não faz nada", não acreditem. O que falta é orientação política. Se o governo tiver orientação política e o Itamaraty receber a orientação política correta, todos os diplomatas serão competentes e irão executar essa política. Portanto, é esse presidente que vai, nesses próximos quatro anos, se relacionar com vocês.

A gente vai voltar a ter orgulho de ter orgulho. A gente vai voltar a ter orgulho de ser respeitado. A gente vai voltar a ser um país que não se sente menor do que ninguém, e nem queremos ser maiores. Queremos apenas compartilhar com os nossos irmãos aquilo que a gente pode fazer em conjunto. Mesmo na questão do desenvolvimento, eu sempre imaginava que o Brasil não pode crescer sozinho. Um país que tem uma fronteira que tem o Brasil, o Brasil precisa compartilhar muitas de suas políticas de desenvolvimento com outros países. Se a gente produz um avião, que alguém produza a asa, que alguém produza a hélice. Se a gente produz um barco, que alguém produza alguma parte do navio para que a gente possa gerar oportunidade pra todo mundo.

Eu não quero que o Brasil seja uma nação rica cercada de pobre por todos os lados. Eu não quero repetir o padrão América do Norte. Não é comum que a gente não tenha na América do Norte aquele monte de país do Caribe vizinho dos EUA, nenhum país ficou rico ao longo de 500 anos. É porque não tem política de compartilhamento. Vocês veem todo dia na televisão se construindo um muro para evitar que latino-americano vá para os Estados Unidos. A melhor forma de evitar, e mais barata, é fazer com que tenha desenvolvimento nos países da América Latina e do Caribe.

As pessoas viram nômade porque as pessoas querem viver, porque as pessoas querem comer. Essa é a origem da espécie humana. A gente vivia atrás de comida, as pessoas querem comer, as pessoas querem emprego. E se nos seus países não oferecem, as pessoas tentam buscar onde tem. É com essa ideia que eu gostaria de terminar meu discurso dizendo para vocês: vocês já faziam parte da história desse país, agora vocês escolheram uma função que vocês vão representar o Brasil. Não importa a grandiosidade da função, até porque ninguém nasce grande e ninguém começa grande. Ninguém. Mas vocês podem crescer na carreira, e vocês podem não só ter orgulho da função de vocês, como nós, brasileiros, poderemos ter orgulho de vocês.

Eu acho que no nosso governo, Mauro, o Itamaraty tem que receber orientação: qualquer autoridade brasileira que chegar no exterior e precisar do Itamaraty, o Itamaraty tem que atendê-lo sem saber quem é, se ele gosta do governo, se não gosta, se gosta do Lula, se não gosta, até porque ninguém é obrigado a gostar de ninguém. Nós somos obrigados a conviver de forma civilizada, democrática e respeitosa entre os seres humanos. É esse o mundo que nós poderemos construir. E é esse mundo que está agora começando na mão de vocês. Uma evolução, muitas meninas, ainda menos do que a gente precisa, vários estados estão aqui, não está mais apenas no Rio e em São Paulo. E aos poucos a gente vai fazendo com que... a gente já fez com que as universidades ficassem a cara do Brasil.

Outro dia eu fui na USP, e era um ato público, e na hora da fotografia a reitora falou assim pra mim: "Ô presidente, dá uma olhada na foto como mudou a cara da universidade". Antes, era só uma cor, era só um tipo de gente, e agora é uma coisa muito diversa. E o Itamaraty, Mauro, também tem que ser assim. O Itamaraty não tem que ter problema de gênero, o Itamaraty não tem que ter preconceito. O Itamaraty, e é por isso que vamos continuar investindo na educação, o Itamaraty tem que ser a cara do Brasil. Portanto, parabéns a vocês. Que Deus possa dar a vocês a sabedoria que o Brasil precisa desses novos representantes. E parabéns às famílias de vocês. Um abraço e boa sorte na carreira de vocês.