Nada é surrealista na América do Sul, na América Latina, ou até no Mercosul.
Os processos decisórios no Mercosul se submetem a uma regra geral que é o consenso, e a devida internalização de qualquer nova norma ou resolução, sua comunicação ao país depositário do Tratado de Assunção, que é o Paraguai, claro, e depois sua entrada em vigor, de conformidade com os trâmites constitucionais dos países e do próprio Mercosul.
Essa é a regra geral.
No caso da Venezuela, ocorreu algo estranho, bizarro, surrealista, desde o início. Ela foi aceita no Mercosul, por um protocolo, sob a esdrúxula figura de "membro pleno em processo de adesão", uma figura estranha nos anais e nos registros históricos da diplomacia mundial nos últimos dez mil anos, mais ou menos.
Três países aprovaram seu ingresso sob esse arranjo muito estranho, mesmo que a Venezuela não cumpriu formalmente os requisitos indispensáveis a seu ingresso: aceitação da Tarifa Externa Comum e demais regras de política comercial. Não se sabe quando ela vai, sequer se vai cumprir esses requisitos, pois os países membros parece não se incomodarem com isso.
Só ficou faltando o Paraguai, cujoSenado ainda não aprovou o ingresso da Venezuela.
Os presidentes ainda foram mais bizarros: criaram uma comissão para, previsivelmente, pressionar o Paraguai, ou o seu Senado, e o presidente do Paraguai concordou com mais essa bizarrice.
Já não é nem a questão democrática que está em jogo aqui (inclusive porque a cláusula democrática é muito elementar no Mercosul), mas o sim a capacidade da Venezuela -- e outros eventuais candidatos, como Equador e Bolívia -- de ingressar num "clube restrito", como pode ser o Mercosul, sem cumprir com suas regras básicas, sem aceitar suas normas de funcionamento.
O Mercosul estaria caminhando para sua "aladização", ou para sua irrelevância como bloco com pretensões a ser um mercado comum e coordenar políticas econômicas e monetárias?
Paulo Roberto de Almeida
Mercosul cria comissão para acelerar adesão da Venezuela ao grupo
BBC – 21/12/11.
Os quatro países membros do Mercosul criaram nesta terça-feira em Montevidéu, no Uruguai, uma comissão para acelerar a incorporação da Venezuela ao bloco. A adesão venezuelana depende apenas do aval do Senado paraguaio, que há anos posterga a decisão.
A declaração final do encontro, assinada pelos presidentes dos quatro países membros do bloco, ressalta a “importância” de que a adesão da Venezuela se dê “no mais breve prazo”. A presidente Dilma Rousseff foi uma das defensoras da proposta.
A comissão, proposta pelo presidente do Uruguai, José Mujica, será formada por representantes indicados pelos governos do Mercosul.
Não ficou claro, no entanto, como se dará o funcionamento do grupo já que, pelo Tratado de Assunção, de constituição do Mercosul, a adesão de novos países precisa ser aprovada pelos Congressos de todos os membros do bloco.
Chávez, que participou da cúpula como presidente de um país associado, disse que a adesão venezuelana “é importante demais” para ser deixada “na mão de cinco pessoas que não (a) querem”.
A fala foi uma referência ao Senado paraguaio, dominado pelo Partido Colorado, de oposição, que argumenta que não há garantias de democracia plena na Venezuela, pré-condição para integrar o bloco, segundo o Protocolo de Ushuaia.
“Atrás deles têm que ter uma mão muito poderosa, é necessário que o Mercosul chegue até o Caribe”, disse Chávez ao final da cúpula.
O presidente paraguaio, Fernando Lugo, também fez declarações de apoiou à entrada da Venezuela.
A comissão, por sua vez, foi duramente criticada pelo ex-presidente uruguaio Luis Alberto Lacalle, que classificou o grupo como uma “sentença de morte” ao Mercosul.
“O tratado (de Assunção) tem seus requerimentos legais e eles (os presidentes) os ignoraram. Eles estão ferindo mortalmente o Mercosul”, disse Lacalle, um dos fundadores do bloco, em 1991.
Também foi criado um grupo de trabalho com o fim de discutir com o Equador as condições de acesso do país ao Mercosul.
TEC e Palestina
A decisão de maior impacto econômico foi a expansão da lista de produtos sobre o qual incidem o imposto máximo de importação em mais cem produtos, para cada país.
Esses itens, ainda não especificados, pagarão imposto de 35%, o teto da TEC, a Tarifa Externa Comum do Mercosul. A medida foi tomada a fim de proteger as industrias nacionais da invasão de produtos estrangeiros.
O Mercosul também aprovou um acordo de livre comércio com a Palestina e um projeto de cooperação em pesquisa de biotecnologia aplicada à saúde, a ser financiado pelo Focem (Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul)