Eu ja disse aqui, e em varias outras ocasiões, em qualquer lugar aliás, que sou moderadamente pessimista quanto aos rumos da economia brasileira -- acho que continuaremos no crescimento medíocre e com aumentos contínuos na carga fiscal -- mas que sou ABSOLUTAMENTE pessimista quanto aos rumos da educação no Brasil: acredito que caminhamos direto para o brejo, e para a deterioração completa de nossas instituições de ensino.
Isso graças às pedagogas freireanas do MEC, as novas saúvas do Brasil, e aos delinquentes da língua, como os estupores que defendem a versão popular da inculta e bela (hoje feia) como igualmente válida e devendo ser não só respeitada como legitimada.
Como não tenho tempo para escrever a respeito, transcrevo o post de um jornalista conhecido para expressar algumas ideias simples sobre esse debate em si mesmo estapafúrdio, e revelador de quão baixo o Brasil chegou em matéria de educação.
A tropa de choque da “gramática diferenciada” pode botar o burro na sombra; não me assusto com a gritaria dos jihadistas lingüísticos deste aiatolá
Reinaldo Azevedo, 18/05/2011
Marcos Bagno (foto): ele fez fama e fortuna afirmando que aquilo que seus leitores ignoravam não tinha mesmo a menor importância e era só autoritarismo...
Que burrice a tropa de choque dos amigos do professor Marcos Bagno tentar me intimidar na base do “sabe com quem está falando?” Desde quando eu dou bola pra isso? Fico ainda mais animado. Eu adoro chutar o traseiro de especialistas arrogantes, especialmente quando convertem ideologia vagabunda em ciência não menos. Marcos Bagno? Quem é esse há de se perguntar o leitor desavisado.
Às 17h55 desta segunda, escrevi o texto que segue no pé deste post, apontando a responsabilidade intelectual de Bagno nessa história de vale-tudo da língua portuguesa. Eu sabia bem o que estava fazendo. Seria mais grave do que chutar a santa. Bagno é um notório depredador da norma culta da língua e da gramática e transformou isso numa profissão rentável. Está para a lingüística como Gabriel Chalita está para a filosofia. E é quase tão prolífico quanto, mas com um agravante: Chalita é desprezado no mundo acadêmico; fazem chacota dele em qualquer circulo universitário com alguma seriedade. Seus livros, com aquela ignorância palavrosa cut-cut, dão motivos de sobra pra isso.
Já o tal Bagno, o “lingüista”, é visto como um verdadeiro aiatolá da língua alternativa. É também autor de livros infanto-juvenis, adorado pelos professores — em particular por aqueles que são incapazes de entender um manual de gramática. Bagno lhes dá a sensação de que sua ignorância é irrelevante ou é uma inteligência alternativa, e eles acabam achando que não ensinam gramática aos alunos ou porque não querem ou porque seria inútil. O fato é que não sabem.
Bagno é aquele tipo perigoso que, dada a constatação de que níveis de linguagem reproduzem, por óbvio, desigualdades sociais, logo conclui que a língua é causa da desigualdade, não uma conseqüência dela. Então ele tenta mudar a sociedade mudando, ora vejam!, a língua! Fez-se um teórico supostamente refinado do assunto e convence os ignorantes e os incautos com as suas facilidades. Uma coisa é constatar, e todos estamos de acordo, que, no geral, as aulas de gramática têm um nível sofrível; outra é decretar a sua inutilidade.
Segundo os dados do Programa Internacional de Avaliação dos Alunos 2009 (Pisa), da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil ainda ocupa o 53º lugar no ranking geral, num total de 65 países que fizeram o exame. Uma vergonha! Os alunos brasileiros ficaram em 53º em ciências e leitura — superando Argentina, Panamá e Peru na América Latina, mas atrás de Chile, Uruguai, México e Colômbia — e em 57º em matemática. No ranking geral dos países avaliados na América Latina, o Brasil fica à frente de Argentina e Colômbia, mas aparece 19 pontos atrás do México (49º), 26 pontos do Uruguai (47º) e 38 do Chile (45º). Foram avaliados os processos educativos em 65 países, 34 deles da OCDE. Vinte mil estudantes brasileiros nascidos em 1993 responderam às provas de leitura, matemática e ciências.
Ora, é vergonhoso que uma economia do porte da brasileira — que, atenção!, investe, sim, relativamente bastante em educação — apresente um resultado miserável como esse. Como se dará o salto necessário? Com a professora Heloísa Ramos, ancorada nas teses de Bagno, a fazer a apologia da ignorância em nome do fim do preconceito lingüístico? Que língua será cobrada desses alunos na vida profissional?
Essa meninada não tem dificuldade nenhuma de se comunicar, por exemplo, na estranha língua das redes sociais, com seus códigos específicos. Ocorre que serão outros os textos que serão chamados a interpretar. A norma, a língua padrão, há de ser o eixo em torno do qual se organizam as demais experiências da linguagem. E ela não pode ser um código para iniciados, a que só alguns poucos têm acesso. É o padrão que nos unifica, já que a desejável diversidade nos separa. Não entender isso é não compreender coisa nenhuma e investir na bagunça. No caso de Bagno e desses professores que têm livros adotados pelo MEC, trata-se de uma bagunça muito rentável.
Pode-se ficar rico no Brasil fazendo profissão de fé na ignorância e ainda posar de democrata e libertador. Pra cima de mim? A turminha bocuda dos “especialistas bagnistas” pode pôr seu burro na sombra; aqui não se cria. A escola existe para tratar da norma. A vida se encarrega da diversidade, e ninguém precisa de professor para ensinar o erro. Uma das qualidades da democracia é permitir que cada um erre segundo a sua própria ignorância. Ninguém precisa de um Marcos Bagno e de Heloísa Ramos como organizadores da ignorância.
Segue o texto sobre Bagno que deixou a turma dele invocada. É assim que eu gosto. Quanto mais bravos ficam esses valentes, mais convicto estou de que foram pegos no pulo. Adoraria ver essa gente toda submetida a uma prova de gramática para testar seu conhecimento da língua. Há muitos malandros ocupados em referendar os erros dos alunos porque eles próprios não sabem o que é o acerto.
Se você já leu o que segue, vá para os comentários.
Este é o sacerdote do erro; é ele o burguês do socialismo na língua portuguesa; é ele quem faz de Lula uma teoria de resistência lingüística!
A professora Heloísa Ramos, a autora do tal livro que faz a apologia do erro, é, do ponto de vista intelectual, apenas uma noviça na área. O verdadeiro sacerdote dessa bobajada se chama Marcos Bagno, professor da Universidade de Brasília. É esse que vocês vêem acima.
O valente tem uma página na Internet. Ele é o propagador, nas escolas brasileiras, do conceito do “preconceito lingüístico”. Bagno denuncia o que não existe e propõe métodos profiláticos contra o mal que ele mesmo inventou. Professores de língua portuguesa, a maioria incapaz de entender e de ensinar gramática, apegam-se a seus textos como o náufrago busca uma bóia: “Ah, finalmente alguém diz que essa conversa de regra é bobagem!”. É batata, queridos! O sujeito radicalmente contrário a que se ensine o que é uma oração subordinada substantiva completiva nominal reduzida de infinitivo costuma não saber o que é uma oração subordinada substantiva completiva nominal reduzida de infinitivo. E ele sente, então, a necessidade de combater aquilo que ignora.
Resultado: professores de português se tornam “debatedores”. Essa praga está em todo lugar. Não pensem que floresce apenas em escolas públicas, em que não há critérios para medir o desempenho do professor. Textos do tal Bagno são debatidos também nas escolas privadas. Alguns tarados, sob o pretexto de “problematizar” o preconceito lingüístico, brincam mesmo é de luta de classes. A única função meritória de um professor de português é cuidar da harmonia de classes — da classe das palavras.
Na página de Bagno, encontro essas pérolas:
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As pessoas que falam e escrevem sobre a língua na mídia em geral são jornalistas, advogados ou professores de português que não estão ligados à pesquisa, não participam do debate acadêmico, não estão em dia com as novas tendências da Lingüística - são os que eu chamo de gramatiqueiros”, critica Bagno. Para ele, esses “pseudo-especialistas”, ao tentar fazer as pessoas decorarem regras que ninguém mais usa, estariam vendendo “fósseis gramaticais”, fazendo da suposta dificuldade da língua portuguesa um produto de boa saída comercial.Outro “mito” tratado no livro Preconceito lingüístico: o que é, como se faz é a idéia, bastante difundida, de que a língua portuguesa é difícil. Bagno afirma que a dificuldade de se lidar com a língua é resultado de um ensino marcado pela obsessão normativa, terminológica, classificatória, excessivamente apegado à nomenclatura. Um ensino que parece ter como objetivo a formação de professores de português e não a de usuários competentes da língua. E que ainda por cima só poderia formar maus professores, já que estaria baseado numa gramática ultrapassada, que não daria conta da realidade atual da língua portuguesa no Brasil."
Viram? É mais um que ataca a norma culta, alegando, para isso, a sua condição de especialista. E todos os que discordam dele seriam meros “gramatiqueiros”. Bagno se tornou a referência culta dos militantes da ignorância. Bagno fez afama e, acho, fortuna afirmando essas coisas. Seus livros sobre preconceito lingüístico são um sucesso. Qualquer um que combata a gramática sem saber gramática é só um vigarista. Bagno é uma espécie de autor de auto-ajuda dos despossuídos da norma. Convenham: o ignorante fica feliz ao ler que aquilo que ignora não teria mesmo importância…
Não por acaso, quem apareceu ontem no jornal O Globo em defesa do tal livro adotado pelo MEC? Ele próprio. E encontrou uma saída típica dos petistas, acusando adivinhem quem… Sim, FHC!!! Leiam:
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Não é coisa de petista. Já no governo Fernando Henrique, sob a gestão do ministro Paulo Renato, os livros didáticos de português avaliados pelo MEC começavam a abordar os fenômenos da variação lingüística, o caráter inevitavelmente heterogêneo de qualquer língua viva falada no mundo transforma qualquer idioma usado por uma comunidade humana.”
Oh, não me diga! Quem nega que a língua seja viva? Quem nega a existência de diferenças entre a norma culta e a fala? Quem nega a criatividade do falante no uso do próprio idioma? Uma coisa é descrever esses fenômenos, tentar entender a sua gênese, ver como podem servir ao ensino; outra, distinta, é negar as virtudes da norma. É a sua compreensão que permitirá ao aluno, é bom deixar claro, entender direito o que lê.
A ser como quer esse valentão todo cheio de si, muito cônscio da sua especialidade, os brasileiros se dividirão em grupos com determinado domínio da língua e viverão, como dizia aquela musiquinha, presos “a seu quadrado”. O especialista Bagno, tão “progressista”, é um notável exemplo de reacionarismo. A seguir seu modelo, em breve, a língua portuguesa será um arcano cujo domínio pertencerá à elite dirigente. O “povão”, este de que os petistas dizem gostar tanto, que se contente com o domínio precário do idioma. Por que ter mais? Para as universidades vagabundas do ProUni, tá bom demais!
Professor que usa as aulas para debater “preconceito lingüístico” está enganando. Ou joga fora o dinheiro público, se escola pública, ou o dos pais dos estudantes, se escola privada. É como se um professor de matemática ocupasse seu tempo provando a inutilidade da matemática. Muitos se espantam: “Mas por que os nossos alunos são, na média, incapazes de interpretar um texto”. Bagno diria que isso é mentira. É que deram ao jovens o texto errado… Eles precisa ler alguma coisa que seja própria de sua classe. ..
Bagno sai em defesa do petismo porque ele próprio floresce junto com o PT. É o “intelectual” símbolo da cultura disseminada pelos petistas, pouco importa se filiado ou não.
Para todos os efeitos, ele seria o amigo do “povão”, não os seus críticos. Questionado, imediatamente evoca a sua condição de “especialista”, o que não seria o caso dos adversários intelectuais. Propagando a ignorância, tornou-se um nababo da sua própria especialidade: depredar a norma culta da língua. Se alguém tem ainda alguma dúvida sobre qual é a dele, leiam este outro trecho de uma entrevista:
“Outro grande perpetuador da discriminação linguística são os meio de comunicação. Infelizmente, pois eles poderiam ser instrumentos maravilhosos para a democratização das relações linguísticas da sociedade. No Brasil, por serem estreitamente vinculados às classes dominantes e às oligarquias, assumiram o papel de defensores dessa língua portuguesa que supostamente estaria ameaçada. Não interessa se 190 milhões de brasileiros usam uma determinada forma linguística, eles estão todos errados e o que apregoam como certo é aquela forma que está consolidada há séculos. Isso ficou muito evidente durante todas as campanhas presidenciais de que Lula participou. Uma das principais acusações que seus adversários faziam era essa: como um operário sem curso superior, que não sabe falar, vai saber dirigir o país? Mesmo depois de eleito, não cessaram as acusações de que falava errado. A mídia se portava como a preservadora de um padrão linguístico ameaçado inclusive pelo presidente da República. Nessas sociedades e nessas culturas muito centradas na escrita, o padrão sempre se inspira na escrita literária. Falar como os grandes escritores escreveram é o objetivo místico que as culturas letradas propõem. Como ninguém fala como os grandes escritores escrevem, a população inteira em teoria fala errado, porque esse ideal é praticamente inalcançável.”
A pergunta que não quer calar: por que ele próprio se expressa segundo a norma culta? Mais: nessa entrevita, Bagno, agarrado à demagogia, diz que podemos, sim, cultivar e gostar da nossa língua, mas sem esquecer quantas pessoas sofreram para que ela se impusesse. Entendeu, leitor? A cada vez que você ler, sei lá, um verso de Camões, acenda uma vela para o grande cacique Touro Sentado…