O Brasil deixou de fazer parte da comunidade internacional? Desde quando?
A Deutsche Welle fala em “comunidade internacional”, da qual o Brasil se separou há muito tempo, sem perspectiva de voltar no futuro imediato. A tal comunidade internacional é formada por Estados que respeitam TODAS as cláusulas da Carta da ONU e normas elementares do Direito Internacional, o que não é o caso da Rússia nem do Brasil atual, este numa notável ruptura com padrões tradicionais da diplomacia profissional, que vigoraram mesmo durante o Estado Novo e na ditadura militar. “O presidente da Rússia, Vladimir Putin, assinou nesta sexta-feira, em uma cerimônia no Kremlin, tratados para anexar quatro regiões ucranianas parcialmente ocupadas pelas forças russas. A medida – ilegal e duramente condenada pela comunidade internacional – marca uma escalada no conflito e dá início a uma fase imprevisível, sete meses após a invasão da Ucrânia por Moscou.”
(DW, 30/09/2022)
Para um diplomata de carreira — como é o meu caso — trata-se de um deplorável aspecto da antidiplomacia do atual governo brasileiro, que deveria ser prontamente corrigido num próximo governo, o que também aparece como altamente duvidoso ( em vista de declarações já emitidas pelos prováveis responsáveis pela política externa a partir de 2023).
E não se trata apenas de instrumentos internacionais: a CF-1988 tem, em suas cláusulas de relações internacionais, princípios muito claros que devem guiar o posicionamento externo do Brasil, como a autodeterminação dos povos (ou seja, a da Ucrânia, ultrajada pela guerra de agressão da Rússia), a não-intervenção, a igualdade entre os Estados, a defesa da paz, a solução pacífica dos conflitos e a cooperação entre os povos, todos eles violados pela brutalidade da invasão da Rússia, na mais completa indiferença do governo Bolsonaro.
Constrange-me profundamente ser um servidor de um Estado, um diplomata de carreira, um representante internacional de um país que NÃO RESPEITA o Direito Internacional e a Carta da ONU. Sinto vergonha alheia pela falta total de moralidade política na postura do atual desgoverno.
Mas registro que esse afastamento não data apenas do atual governo: em 2014, quando a Rússia violou a soberania da Ucrânia— um princípio que está no artigo 1o. da CF-1988 — ao invadir e anexar militarmente a Península da Crimeia, o governo Dilma não emitiu uma nota sequer para condenar essa grosseira violação da Carta da ONU, limitando-se a presidente a dizer não iria se “meter em assuntos internos [sic!!!] da Ucrânia”, como se uma invasão externa fosse um assunto interno do país invadido. Essa foi uma das muitas violações à CF-1988 e a tratados internacionais perpetrados pela diplomacia lulopetista.
Tudo isso está registrado em meus livros que tratam da política externa do Brasil.
Brasília, 30/09/2022