O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 17 de março de 2018

A resistivel decadencia do marxismo teorico e do socialismo pratico - Paulo Roberto de Almeida

Um texto de 2010, mas como no Brasil as ideias equivocadas nunca ficam velhas, talvez ainda sirva (e talvez tenha sido por isto que os editores da revista "Espaço Acadêmico" tenham julgado melhor terminar minha colaboração voluntária com esse pasquim universitário):

A resistível decadência do marxismo teórico e do socialismo prático: um balanço objetivo e algumas considerações subjetivas
  • Espaço Acadêmico, March 2010

    Resumo: Marxistas e socialistas, atualmente, sobrevivem apenas nas academias, já que os partidos comunistas, da tradição leninista são cada vez mais raros ou tem cada vez menos sucesso eleitoral. Com exceção de um grande Estado comunista, na Ásia, mas que possui uma economia quase totalmente capitalista (e reforçando esses traços), e dois pequenos países totalmente irrelevantes, o socialismo prático desapareceu dos supermercados da história, da mesma forma como marxismo teórico, que sobrevive apenas em faculdades de ciências sociais, geralmente de países pouco capitalistas. 
    O ensaio tece considerações sobre os últimos "moicanos" desse credo decadente. 
    Palavras-chave: Marxismo; socialismo; decadência. 
    Cercando o "animal" e mostrando a arma 
    Advertência inicial: não creio que os fieis cultores do credo e, menos ainda, os pouquíssimos praticantes da crença nas supostas virtudes do coletivismo econômico e do planejamento estatal centralizado (aliás, não se sabe bem aonde isso poderia ainda existir...), possam apreciar esta peça opinativa – mas que não deixa de ser analítica e de diagnóstico – sobre um dos mais notórios fracassos teóricos e práticos do século 20. Acredito que eles fariam bem em deixar de ler desde já este artigo, que trata, como já antecipa o seu título, do rotundo insucesso, tanto no plano filosófico como no material, de um dos mais prometedores movimentos transformistas – atenção: não confundir com operação de mudança de gênero – que nos tenha legado o século 19. Com quase tanto sucesso quanto o freudismo – a outra ideologia dominante em nossos tempos –, o marxismo dominou de tal maneira os corações e mentes de tantos homens no século 20 a ponto de quase confundir-se com ele, e de ainda deixar um rastro facilmente identificável, embora evanescente. É minha opinião que grande parte dos leitores deste espaço ainda se deixa seduzir por seu charme muito pouco discreto, e certamente não apreciarão o que vai escrito nos parágrafos abaixo.
    (...)
    Texto disponível no seguinte link: 

Brasil: pais dos privilegios - Joao Dionisio Amoedo

País dos privilégios

Brasil tira dos mais pobres para dar aos mais ricos

Faz sentido o Brasil gastar com a Presidência da República R$ 564 milhões por ano, 60% a mais do que o Reino Unido desembolsa com a monarquia? Certamente não, e o problema não para por aí. O Congresso custa hoje, incluindo todos os assessores, as verbas de gabinete e os diversos auxílios, R$ 29 milhões por dia.
Na magistratura, 71% dos juízes recebem acima do teto constitucional de R$ 33 mil. Dos mais de 16 mil juízes e desembargadores dos Tribunais de Justiça, 11,6 mil ultrapassaram o teto. A remuneração média desse grupo foi de R$ 42,5 mil.
O Brasil não aguenta mais arcar com esse Estado de bem-estar para uma minoria privilegiada, enquanto o restante da população trabalha 153 dias para sustentá-lo. É auxílio para quem menos precisa, privilégios para quem menos merece e impostos para quem mais trabalha.
O Estado brasileiro virou um Robin Hood às avessas: tira dos mais pobres para dar aos mais ricos. Faz isso quando remunera mal o FGTS do trabalhador e empresta a taxas baixas para grandes empresas, quando provê uma aposentadoria média de R$ 1.200 para o empregado do setor privado enquanto o do setor público recebe R$ 7.500 e quando retira recursos da saúde e da educação para emprestar para partidos políticos fazerem propaganda eleitoral. 
Abriu-se um abismo entre a classe privilegiada e a classe desacreditada. O último Índice de Confiança na Justiça produzido pela Fundação Getulio Vargas em 2017 mostrou queda de confiança em todas as instituições públicas. Na lanterna da credibilidade ficaram o Poder Executivo, com 7% de confiança, os partidos políticos (7%) e o Congresso Nacional (6%). Até o Poder Judiciário caiu dez pontos nos últimos quatro anos, passando dos 34%, em 2013, para 24%, em 2017.
O povo está correto em desconfiar da classe política. Afinal, os discursos que ouvem estão desconectados da prática que enxergam. Ninguém aguenta mais ver a máquina pública e o dinheiro dos nossos impostos sendo utilizados para oferecer tratamento VIP à classe governante.
A responsabilidade da mudança está em nossas mãos. A única forma, democrática e republicana, que temos para reverter este quadro é renovar a classe política. E a ferramenta para a mudança é o nosso voto.
Aqueles que de fato querem o bem da nação, que colocam o bem público à frente do interesse particular, devem começar dando exemplo. A próxima geração de parlamentares deve se comprometer a cortar suas verbas pela metade, aprovar o fim do foro privilegiado e, se indicados a um cargo no Executivo, renunciar ao próprio mandato. O próximo presidente da República deve enxugar ministérios e secretarias e cortar pela metade os gastos da Presidência.
Não vamos derrotar as benesses sem uma ampla renovação política. Precisamos fazer escolhas não só pelos discursos, mas pelas práticas e pelo respeito ao dinheiro do pagador de impostos. Precisamos lembrar que elegeremos funcionários públicos, e não uma casta de privilegiados.

João Dionísio Amoedo é pré-candidato à Presidência pelo Partido Novo

A moeda e lei - Gustavo Franco (Zahar)

A moeda e a lei


Gustavo Franco
(Rio de Janeiro: Zahar editores, 2017)

Em 1933, na maior parte do mundo, o dinheiro perdeu seus vínculos com a natureza, e de moedas de ouro, prata e outros metais tornou-se apenas uma convenção social: uma criatura da lei. Talvez nenhuma outra inovação, em seus efeitos, melhor caracterize a noção de “destruição criadora” – senha para a redenção ou a danação econômica, dependendo da sabedoria de cada país.
A experiência monetária brasileira nos oitenta anos que se seguiram (1933-2013) talvez não tenha paralelo no mundo, seja pelo difícil relacionamento de nossa moeda com as de outros países, pelo tumultuado processo de constituição de um banco central com plenas funções ou ainda pela longa, intensa e complexa convivência com a inflação. Tudo é superlativo nesse trajeto, em que o Brasil teve oito padrões monetários, cinco congelamentos, confiscos pequenos e grandes, crises sem limite, euforias idem e batalhas épicas para ordenar a moeda nacional, evitar abusos fiscais e financeiros bem como para estabilizar o seu poder de compra.
O livro é uma história das instituições monetárias brasileiras, tendo como fio condutor o olhar econômico sobre a letra da lei. Seu foco incide nas convenções pensadas para criar e destruir um objeto que é hoje cada vez menos um pedaço de papel, uma cédula colorida com símbolos nacionais, e cada vez mais um impulso magnético, abstrato e conceitual. Os acontecimentos aqui analisados têm imensa atualidade, pois as dúvidas que governam essa história continuam muito vivas. Como se estivéssemos aprisionados há décadas em um mesmo enredo, sempre às vésperas de uma fórmula ideal que parece estar logo ali, mas nunca chega – uma catedral cuja construção talvez jamais se encerre.
http://zahar.com.br/livro/moeda-e-lei

A moeda e a lei

Uma história monetária brasileira, 1933-2013
Assunto:  Economia

Ficha Técnica

Lançamento: 16/11/2017
Assunto: Economia
848 páginas
16x23cm
1ª edição
ISBN: 9788537816943
eISBN 9788537817179
Código: Z2031
Uma história das instituições monetárias do Brasil, um retrospecto de nossos excessos - cujas expressões mais flagrantes são os zeros na moeda 
Em 1933, na maior parte do mundo, o dinheiro perdeu seus vínculos com a natureza, e de moedas de ouro, prata e outros metais tornou-se apenas uma convenção social: uma criatura da lei. Desde então a humanidade busca controlar os poderes que essa inovação liberou. 
A experiência monetária brasileira pode não ter paralelo no mundo, seja pelo difícil relacionamento de nossa moeda com as de outros países, pelo tumultuado processo de constituição de um banco central com plenas funções ou ainda pela longa, intensa e complexa convivência com a inflação. Tudo é superlativo nesse trajeto, em que o Brasil teve oito padrões monetários, cinco congelamentos, confiscos pequenos e grandes, crises sem limite, euforias idem e batalhas épicas para ordenar a moeda nacional e evitar abusos fiscais e financeiros, bem como para estabilizar o seu poder de compra. 
Gustavo Franco, um dos mentores do Plano Real e ex-presidente do Banco Central, tem grande autoridade para contar essa história. Ele analisa, em nove capítulos, a experiência inflacionária; a lei monetária; os mistérios da regulamentação do câmbio; os processos de criação e captura do Banco Central; a produção da hiperinflação; os planos econômicos heterodoxos; o Plano Real; a evolução institucional cumulativa; e o problema da taxa de juros. Todos acontecimentos de grande atualidade, pois as dúvidas que governam essa história continuam muito vivas. Como se estivéssemos presos há décadas em um mesmo enredo, às vésperas de uma fórmula ideal que parece estar logo ali, mas nunca chega...
Impresso: R$ 99,90
E-book: R$ 69,90

Arquivos


Meu comentário feito no site da Editora: 
Um dos poucos livros de história econômica que segue o desenvolvimento de uma das mais importantes políticas macroeconômicas - a monetária - não pelo simples relato dos indicadores econômicos e dos agregados estatísticos, mas pela sua interação com a Lei, ou seja, com as normas jurídicas em vigor no Brasil, o que o torna instrumento essencial para aulas tanto nas Faculdades de Economia, como nos cursos de pós-graduação em Direito, o que é exatamente o meu caso. Abordagem absolutamente original para um importante ramo da Economia e um relato fiel da nossa história econômica nos últimos 85 anos...
Paulo Roberto de Almeida 

Antes da Economics, havia a Political Economy - um site com textos antigos

Aqui: https://beforeeconomics.wordpress.com

Before Economics

About

Before Economics is a podcast series about the history of political economy, focusing on the British case. Each episode examines a key text in this history. The podcast is supported by the European Society for the History of Economic Thought and the University of Queensland. This site acts as a supplement to the podcasts, providing readers with an opportunity to look at the texts covered in the podcast, and to find other resources relating to these texts and the history of political economy more broadly.
Before Economics is hosted by Dr Ryan Walter, Senior Lecturer in Political Economy at the University of Queensland. Dr Walter is an intellectual historian working on the history of political and economic thought, focusing on Britain in the ‘long eighteenth century’. His current work examines how political economy was absorbed – or rejected – by Parliament and British society as a source of authoritative knowledge.
Political economy was a patriarchal discourse in the sense that it routinely took the patriarchal household as a model for the government of a state or nation. As a result, gendered language has often been used when describing the texts under study to convey the original meanings.
Sincere thanks to the following interviewees: Lorenzo Cello, Keith Tribe, Terry Peach, Richard van den Berg, Michele Chiaruzzi, Marco Guidi, Karin Sellberg, Leigh Penman, Richard Devetak, Richard Whatmore, Sergio Cremaschi, Mauro Simonazzi.
Niyi Adepoyibi was the sound engineer for the podcasts. This site has been created with the assistance of David Kearns.

Brasil segue sendo protecionista e cartelizado: CADE protege montadoras

Enquanto a SAE-PR preconiza abertura econômica e liberalização comercial – ver o seu recente documento de conjuntura neste link – o CADE rejeita a abertura à concorrência no setor automotivo:

Cade nega abertura de mercado de autopeças a terceiros

Montadoras seguem com exclusividade
Resultado foi contra o voto do relator
Fábrica da FordAlberto Coutinho/GOVBA
14.mar.2018 (quarta-feira) - 19h56
atualizado: 15.mar.2018 (quinta-feira) - 14h32
O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) negou nesta 3ª feira (13.mar.2018) o pedido da Anfape (Associação Nacional dos Fabricantes de Autopeças) para investigar a prática de abuso no comércio de auto-peças para reposição pelas montadoras Volkswagen, Fiat e Ford.
Por 4 votos a 3, os conselheiros arquivaram o processo administrativo que demorou quase 11 anos para ter 1 parecer definido. Na decisão, a maioria dos membros considerou legal o direito das montadoras de exercer o poder de exclusividade na fabricação das peças, aprovada pela Justiça.
O relator do caso, conselheiro Paulo Burnier, havia votado a favor da Anfape, e teve sua sentença acompanhada pelo conselheiro João Paulo de Resende, e pelo presidente Alexandre Barreto. Votaram contra o processo os conselheiros Maurício Oscar, Cristiane Alkimin, Polyanna Vilanova e Paula Azevedo.

ENTENDA O CASO

O INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) possui uma determinação que concede às montadoras o direito de propriedade intelectual e de exclusividade na fabricação de algumas peças de seus respectivos veículos. Na medida, também estão previstas a fabricação e comercialização de peças de reposição.
No passado, a Anfape entrou com uma série de ações na Justiça contra o monopólio dessa comercialização, alegando que as fabricantes de automóveis exerciam abusos com base nesse direito. Todos os processos foram favoráveis às montadoras, com excessão de 1 caso isolado envolvendo a montadora Ford.
Após as seguidas derrotas, a Anfape recorreu ao Cade em 2007 e iniciou o processo administrativo julgado nesta 4ª, defendendo seu direito de fabricar peças de reposição. Em sua sentença, a conselheira Cristiane Alkimin fez uma proposta para determinar a interrupção da produção e venda de autopeças pela Anfape, mas o pedido foi negado pela maioria do conselho e o caso segue aberto.

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Levantamento efetuado por Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 17 de março de 2018

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sexta-feira, 16 de março de 2018

Cooperacao cientifica Brasil-Franca: estado da arte em 1989 - Resenha de livro, PRAlmeida

Vinte Anos de Cooperação Científica Brasil-França

Resenha de livro:
Guy Martinière/Luiz Claudio Cardoso (coords):
France-Brésil: Vingt Ans de Coopération (Science et Technologie)
(Grenoble: Presses Universitaires de Grenoble, 1989, 352p.; Collection “Travaux et Mémoires” de l’Institut de Hautes Études de l’Amérique Latine, n° 44, Série Essai nº 4)


Desde sua constituição, em 1985, o “Projeto França-Brasil” havia logrado a realização de alguns bons espetáculos, aqui e lá, permitido o início da restauração dos parcos vestígios da presença francesa em nossas terras e, sobretudo, estimulado uma intensa movimentação de autoridades governamentais e de personalidades dos dois lados do Atlântico, burocratas, políticos, artistas e acadêmicos confundidos. Se a maior parte das manifestações teve caráter efêmero, em que pese sua natureza por vezes espetacular (stricto et lato sensi), temos agora a primeira evidência “material” da intensidade das relações culturais e científicas entre os dois países, sob a forma de um livro de testemunhos dos agentes humanos e institucionais engajados nesse relacionamento, verdadeira “memória coletiva” de vinte anos de cooperação científica e tecnológica entre o Brasil e a França.
O volume, editado na França pelo Professor Guy Martinière, do Instituto de Altos Estudos da América Latina (estando sua publicação no Brasil sob a responsabilidade do Itamaraty), realiza uma vasta síntese da cooperação científica e tecnológica empreendida desde longos anos pelas principais agências e instituições envolvidos nesse intercâmbio, precedida de depoimentos ilustrativos de personalidades vinculadas à cooperação franco-brasileira desde a assinatura do acordo bilateral, em finais dos anos sessenta. Um dos anexos do livro contém aliás a lista cronológica dos principais acordos de cooperação e entendimentos complementares entre instituições brasileiras e francesas entre a data de assinatura do acordo científico-tecnológico, em 16 de janeiro de 1967, e 31 de dezembro de 1987: os instrumentos mais relevantes, firmados entre 1978 e 1982, referem-se à formação de recursos humanos, à pesquisa e desenvolvimento agronômicos, bem como a atividades espaciais, oceanográficas, de saúde e de metrologia.
A primeira parte da obra, sob a responsabilidade dos ministérios das relações exteriores dos dois países, tem caráter meramente introdutório (seis páginas), mas permite, ainda assim, algumas constatações interessantes. O Brasil ocupa, de longe, o primeiro lugar da América Latina no esforço francês de cooperação científica e tecnológica externa e situa-se como o quarto parceiro da França, em termos mundiais, depois dos três países árabes do norte da África (excluída a África negra de expressão francesa, em seu conjunto). A introdução brasileira, bem mais elaborada em termos históricos e conceituais, não deixa de lembrar as contribuições pioneiras de André Thévet e de Auguste de Saint-Hilaire para o conhecimento da flora, da fauna e da etnologia do Brasil colonial e independente. Igualmente, o potencial brasileiro em ciências físicas (mineralogia, por exemplo) e biológicas foi em grande parte o resultado de uma longa colaboração, oficial ou espontânea, com a França. Na primeira metade deste século, por outro lado, a criação da Universidade de São Paulo recebeu, como é sabido, uma contribuição decisiva da parte de inúmeros cientistas sociais e pesquisadores franceses.   
Não seria, assim, exagerado dizer que o Brasil está irremediavelmente ligado à elaboração da “antropologia estrutural” de Claude Lévi-Strauss, às reflexões sobre relações raciais de Roger Bastide, ao itinerário do “comércio atlântico” de Fréderic Mauro e ao conceito de “economia-mundo” de Fernand Braudel, modelos e tipologias que tanto iriam influenciar os professores e estudantes brasileiros nas diversas áreas das ciências humanas. Da mesma forma, o “observador” beneficiou-se da aproximação: o Brasil forneceu a “matéria-prima” para os estudos de geografia humana de Pierre Monbeig, de movimentos sindicais nos trabalhos de Alain Touraine, dos problemas demográficos, urbanos e sociais nas análises sobre o desenvolvimento do Padre J. Lebret, bem como a matéria- prima tout court para tantos outros pesquisadores e cientistas franceses.
A segunda parte do livro compõe-se de uma série de catorze depoimentos de personalidades francesas e brasileiras (sete para cada lado) e constitui, por assim dizer, a parte mais “saborosa” da obra, pelo menos em comparação com a descrição mais ou menos “árida” das atividades das instituições científicas engajadas na cooperação bilateral, feita na terceira parte. Os testemunhos contemporâneos são encerrados por um “anexo especial”, que é a transcrição do capítulo inicial de “Tristes Trópicos” de Lévi-Strauss (publicado originalmente em 1955), onde o célèbre ethnologue, antes de contar suas expedições ao Brasil indígena, começa por dizer que “odeia as viagens e os exploradores”.
As 76 páginas de depoimentos pessoais são evidentemente desiguais em conteúdo e em densidade de informação, mas permitem ainda assim traçar um panorama bastante claro da intensidade de contatos humanos e científicos entre as duas comunidades acadêmicas, inclusive com diversos prolongamentos anteriores aos últimos vinte anos, período mais especificamente analisado na descrição “institucional” da terceira parte. De uma forma geral, o que poderia ser chamado de “etapa heroica” do relacionamento científico Brasil-França - basicamente o período formador da Universidade brasileira - é caracterizado por uma relação unilateral de cooperação, consistindo no “fornecimento” constante e continuado de jovens professores universitários franceses para cobrir as lacunas humanas e a sede intelectual de um corpo discente e professoral ávido pela haute culture e pelos avanços científicos da recherche française. Em contraste com a intensa “importação” de cérebros e de conhecimentos dos primeiros anos, o período recente já registra uma relação mais equilibrada no intercâmbio cultural entre os dois países. 
Os depoimentos são abertos, significativamente, por um Rapport sur les professeurs français, cobrindo o período de 1934 a 1987, escrito conjuntamente pelos professores José Ribeiro de Araujo Filho, Aziz Simão e Eduardo d'Oliveira França, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, o centro acadêmico que primeiro recebeu os “mensageiros da cultura europeia” em terras brasileiras. Dessa presença pioneira resultaram um profundo attachement da maior parte dos intelectuais brasileiros pela produção acadêmica francesa, assim como, reciprocamente, diversas liaisons affectives (senão dangereuses) de jovens professores franceses pelas coisas e pessoas do Brasil. A vinda, em princípios dos anos cinquenta para uma conferência, do historiador Lucien Febvre serviu, por exemplo, para o lançamento da Revista de História, fundada sob a influência direta dos franceses, concretizando assim a filiação metodológica com a orientação historiográfica da revista Annales (fundada por Febvre e Marc Bloch em 1929), deixada em semente alguns anos antes por Braudel.
O cientista Carlos Chagas oferece, em seu depoimento intitulado “uma visão pessoal da cooperação científica entre a França e o Brasil de 1758 a 1966”, um verdadeiro passeio pela história das ciências no Brasil. Começando pela viagem de La Condamine pelos rios Solimões e Amazonas, da qual iriam resultar interessantes observações sobre a fauna e a flora dessa região, relatadas em seu livro Relation abrégée d'un voyage fait dans l'intérieur de l'Amérique méridionale (1745), Chagas relembra, entre outros exemplos, o impacto do modelo francês na criação, por D. Pedro II, da Escola de Minas de Ouro Preto e do Observatório Nacional, a influência decisiva para a carreira de Oswaldo Cruz de seu estágio no Instituto Pasteur (1896) e o eco imenso aqui encontrado pelas ideias de Auguste Comte.
Diversos outros depoimentos, brasileiros e franceses, permitem recuperar parte da memória histórica coletiva sobre passagens por vezes esquecidas do processo de formação da comunidade científica no Brasil. Jacques Danon (que, apesar do nome, é brasileiro) retoma alguns “episódios significativos” sobre a colaboração com a França no setor da mineralogia. José Leite Lopes, por sua vez, após sublinhar a importância da cooperação bilateral no terreno da física, sugere a criação de uma estrutura permanente, uma espécie de “instituto de altos estudos científicos Brasil-França, sem pesos ou entraves burocráticos, dirigido pelas comissões científicas dos dois países, renovadas periodicamente, capaz de agir nas diferentes regiões do Brasil e de coordenar os programas e visitas em estrita associação com os serviços de cooperação científica e cultural das embaixadas e dos ministérios das Relações Exteriores e de Ciência e Tecnologia dos dois países” (p. 51-52).
Paulo Sérgio Pinheiro, em “Mai 1988, vingt ans après...”, ao relembrar seus anos de bolsista do governo francês e sua double allégeance a “Sciences Po” e ao espírito de maio de 1968, descreve o clima de fermentação intelectual em que viviam tantos brasileiros - exilados ou não - a partir do cadinho político e intelectual que tinha seu centro em Paris. Orlando Valverde, um dos fundadores do Conselho Nacional de Geografia do IBGE, retraça a formação do ensino universitário de geografia no Brasil, através notadamente das figuras de Pierre Deffontaines e Pierre Monbeig, e observa que a geografia, uma “ciência alemã” em suas origens, tendo Humboldt e Ritter como fundadores, encontrou nos maîtres français seus primeiros professores na América Latina, no Brasil em particular. José Israel Vargas, finalmente, limita seu testemunho sobre a cooperação científica e tecnológica Brasil-França envolvendo pessoas e instituições de Minas Gerais, entre 1964 e 1979, experiência particularmente ativa em termos de estágios e estudos de pós-graduação junto ao Centro de Estudos Nucleares de Grenoble.
Do lado francês, merecem relevância os depoimentos de Fréderic Mauro, no que se refere ao esprit des Annales, de Charles Mérieux sobre a “biocooperação” em matéria de vacinas e virologia, de Jean Delhaye sobre os progressos da astronomia brasileira, de Jean-Pierre Halévy sobre a “arquitetura e a invenção do Brasil”, e de Denis Vialou sobre a cooperação franco-brasileira na pesquisa da pré-história. Dois outros testemunhos - o de Michel Paty, sobre a epistemologia e a história das ciências, e o de Paul Hagenmuller, sobre a pesquisa em química inorgânica - completam essa parte do livro.
A terceira parte traz, ao longo de 202 páginas, um relato pormenorizado da atuação das instituições e organismos franceses e brasileiros envolvidos no esforço de cooperação científica e tecnológica, constituindo-se num manancial precioso de referência sobre todos os instrumentos nacionais disponíveis para as atividades de cooperação nessa área. A contribuição dos quinze órgãos franceses resenhados é examinada em detalhe, muitas vezes com a lista das atividades de pesquisa científica empreendida conjuntamente com os parceiros brasileiros, dos conferencistas enviados ou dos doutorandos brasileiros. Acrescente-se ainda o relato da ação de comitês binacionais como o GRESIL - Groupe Grenoble-Brésil - ou de instituições de coordenação como o CNRS (equivalente do nosso CNPq) ou o COFECUB - Comité Français d'évaluation de la coopération universitaire avec le Brésil - que, ao abrigo de um acordo-quadro de cooperação interuniversitária, mantém um intenso programa de formação e treinamento com a CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior.
Do lado brasileiro, são apresentadas quinze instituições de pesquisa e de formação de pessoal especializado, com uma ficha técnica sobre cada uma delas (especialmente útil para visualizar a estrutura interna, a competência setorial e suas orientações de trabalho) e, onde couber, a lista de projetos realizados ou em curso e das publicações resultantes da cooperação com os respectivos parceiros franceses. Merecem referência especial os capítulos dedicados ao Centro Técnico Aeroespacial, ao CNPq (no que se refere, por exemplo, aos estudos de pré-história no Piauí e à revisão “revolucionária” da cronologia da ocupação do Novo Mundo pelo homem), à EMBRAPA, ao INPA e ao INPE (cooperação em meteorologia e tecnologia espacial).
O livro traz ainda em anexo os textos dos acordos culturais em vigor, desde o pioneiro de 1948 até o “Projeto França-Brasil” de 1985. Dois utilíssimos index, dos nomes das instituições e das personalidades citadas, completam a obra. Sem constituir propriamente um trabalho de avaliação qualitativa - de acordo com critérios “objetivos” de aferição da produção acadêmica empreendida conjuntamente e a partir de uma metodologia adequada - do esforço de cooperação científica e tecnológica engajado com a França nas últimas décadas, o trabalho dá uma visão muito clara das affinités électives entre as instituições francesas e brasileiras de pesquisa e permite, aos responsáveis políticos e acadêmicos, traçar com muito maior segurança os caminhos futuros de uma cooperação ampliada nesse setor.

 [Genebra, 04/02/1990]

[Publicado em Ciência e Cultura (São Paulo, vol. 42, n. 5/6, maio/junho 1990, pp. 405-408); Relação de Trabalhos n. 117; Relação de Publicados n. 057]