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segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Brics ma non troppo - Paulo Roberto de Almeida


Os Brics na nova conjuntura de crise econômica mundial, por Paulo Roberto de Almeida

 
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O recrudescimento da crise econômica internacional, iniciada pelo estouro da bolha hipotecária, seguida pelas quebras bancárias nos Estados Unidos, em 2007 e 2008, agora sob a forma de esgotamento da capacidade de diversos países europeus – notadamente a Grécia, mas possivelmente Portugal também, podendo ainda repercutir sobre outros dois, maiores, Itália e Espanha – em manter os pagamentos de suas dívidas soberanas, em 2010 e 2011, suscitou em diversos observadores da imprensa especializada questionamentos sobre o papel dos Brics – Brasil, Rússia, Índia e China, agora acolhendo a África do Sul igualmente – nessa conjuntura de transição, eventualmente como novos atores de peso num eventual reordenamento da ordem econômica mundial. A imprensa nacional, sempre patriótica e grandiloquente, seguiu o coro de governistas entusiasmados com o fato de o Brasil não estar, por uma vez, envolvido ou ser o centro de alguma crise financeira, e passou a proclamar nossa nova condição de “emprestador de alguma instância”, além de repercutir, obviamente, “lições de economia” que os presidentes – o ex e a atual – ofereceram de graça (mas também sem qualquer resultado prático) a certos europeus, diminuídos em seu orgulho e convertidos em latino-americanos, por uma vez.
O objetivo deste pequeno ensaio, que adota uma perspectiva essencialmente realista, é justamente o de examinar a possibilidade da inversão de posturas econômicas, como a alegada ascensão dos emergentes e o declínio irresistível de países tidos por avançados. Como se constatará, as evidências não suportam essa hipótese, aventada em análises de cunho bem mais superficial do que fundamentadas em dados empíricos concretos ou apoiadas em um conhecimento apurado sobre o funcionamento efetivo dos Brics. Como diria Mark Twain, rumores sobre o declínio do centro e a ascensão da periferia são grandemente exagerados, inclusive porque a crise ainda não deu o seu último “suspiro”. Se e quando os Brics assumirem postura mais afirmada no quadro da economia mundial, isso dependerá essencialmente de seu desempenho individual, e não do fato de serem, ou não, Brics, que é um rótulo bem mais artificial, e de conveniência política, do que o resultado de ações concretas de coordenação econômica deliberada.
Existe um papel para os BRICS na nova conjuntura de crise político-econômica?
A imprensa econômica vem insistindo num papel econômico mais ativo para os Brics, apenas porque eles não foram atingidos pela crise econômica num sentido recessivo, como ocorreu com os EUA e a Europa, e também porque eles dispõem de reservas significativas em divisas, suscetíveis de serem mobilizadas para fins de pacotes de ajuda ou para reciclagem de títulos da dívida soberana de países enfrentando desequilíbrios temporários. Essa imagem dos Brics como bloco econômico coeso não corresponde, todavia, à realidade dos fatos, uma vez que, a despeito de reuniões políticas de seus chanceleres e dos chefes de Estado, ou mesmo de alguns encontros de seus ministros econômicos, os países do Brics não conformam, nem de longe, um grupo dotado de instâncias de coordenação de políticas econômicas e sequer de políticas homogêneas nos planos comercial, financeiro ou de investimentos.
Obviamente, a China já é um ator de peso nos diversos cenários econômicos que possam ser traçados no plano mundial, mas ela não busca – nem precisa, aliás – formular políticas comuns com seus supostos parceiros emergentes, inclusive porque suas políticas nacionais não são, exatamente, aquelas desejadas pelos demais integrantes desse bloco que não pretende se apresentar como bloco. É sabido, por exemplo, que Índia e Brasil vem adotando medidas protecionistas contra a concorrência de produtos chineses em seus mercados, aventando a existência de uma “guerra cambial” iniciada em primeiro lugar pelos Estados Unidos, pelo derrame maciço de dólares nos mercados em sustentação de seus bancos e empresas fragilizadas pela crise iniciada em 2008. Na verdade, o único bloco econômico merecedor desse nome no contexto mundial é a própria União Europeia, pois nem mesmo o Nafta mereceria essa alcunha sinônima de coordenação de políticas econômicas nacionais.
Os Brics podem se apresentar, eventualmente, como novos atores econômicos regionais e globais – embora essa capacidade seja muito restrita em vários casos – mas não dispõem de homogeneidade de propósitos ou de estratégias comuns de atuação no contexto mundial que justifique o uso do acrônimo na discussão em torno das medidas e dos mecanismos que serão mobilizados para enfrentar e superar a atual conjuntura de crise. Ainda que alguns deles – na verdade só a China, com maior largueza de meios – sejam capazes de participar de operações de socorro e de apoio a ajustes administrados aos países periclitantes, esses empreendimentos financeiros de maior escopo terão necessariamente de ser conduzidos pelas instituições econômicas atualmente disponíveis efetivamente, quais sejam: o Conselho Europeu Monetário e Financeiro, em primeiro lugar, o Banco Central Europeu, em segundo lugar, o FMI, em terceiro, e só então, mas com várias dúvidas sobre seu papel real, o G20 financeiro, com destaque para os grandes atores exclusivamente.
Uma simples confrontação de dados econômicos de base permite situar o peso efetivo de cada ator no jogo econômico global: dos (aproximadamente) 55 a 60 trilhões de dólares de PIB mundial, EUA e UE são responsáveis pela metade do valor agregado, sendo que a China e o Japão respondem por mais um quinto, sobrando outro tanto para as grandes economias do G7 mais Brasil e Índia; todos os demais são irrelevantes, sobretudo em termos de reservas em divisas e fluxos de capitais (investimentos e portfólio), terreno no qual a China é o único ator de peso entre os emergentes. Ou seja, as únicas “locomotivas” possíveis de uma economia mundial cambaleante continuam a ser os grandes atores, sendo que o poderio econômico da China, na verdade, foi construído sobre a base de investimentos e tecnologia ocidentais e japoneses e de saldos comerciais superavitários com os mesmos parceiros. A China ultrapassou, em 2011, o Japão, pela magnitude do PIB, e representa metade do PIB conjunto dos Brics, sendo aliás o elemento dinâmico do crescimento desse PIB no contexto global (já que tanto o Brasil, quanto a Rússia devem suas “emergências” respectivas à valorização cambial de suas moedas ou, mais especialmente no caso da Rússia, à valorização das commodities exportadas, basicamente o petróleo neste último caso).
O “papel” econômico dos Brics – se existe – é, assim, muito diferenciado, em função de inserções totalmente diversas na economia mundial, não existindo, portanto, a possibilidade de que eles, isolada ou conjuntamente, venham a exercer alguma influência coordenada sobre movimentos e iniciativas tomadas pelos atores relevantes (que são, pela ordem: EUA, G7, UE-BCE, FMI e, só então, o G20 financeiro). A evolução econômica do mundo se dará independentemente de qualquer ação dos Brics, sendo o resultado não coordenado, sequer coerente, das decisões tomadas pelos agentes primordiais da globalização – as empresas transnacionais – e pelos governos nacionais, eventualmente em consultas recíprocas nesses foros de discussão, o que não garante, porém, a convergência de suas ações e iniciativas. O que mais frequentemente ocorre é, justamente, a descoordenação de políticas, por mais reuniões retóricas que as autoridades econômicas e políticas desses atores empreendam a intervalos regulares.
Existe a possibilidade dos Brics sustentarem a recuperação financeira europeia?
Talvez, mas não certamente enquanto Brics; eventualmente enquanto economias nacionais, tomadas individualmente e atuando cada qual com base em seu interesse e possibilidades próprias. Uma alegada ajuda financeira dos Brics aos países europeus sob risco de insolvência, isolada ou conjuntamente, não pode, na verdade, ser feita apenas sob a forma de fluxos financeiros adicionais aos insolventes potenciais. Não se trata apenas da magnitude dos valores envolvidos – o que teoricamente habilitaria apenas a China a ser um “emprestador de segunda instância” – mas basicamente de questões de governança e de conformação a padrões aceitáveis de responsabilidade financeira, num contexto de mercados integrados e de riscos aparentes, ou pelo menos um pouco mais transparentes do que no passado (e não só em virtude do trabalho de avaliação conduzido pelas agências de classificação de riscos).
Existe uma grande ilusão – provavelmente construída por analistas acadêmicos, mas também estimulada pelos governos interessados –  de que os Brics poderão se converter em novos polos da economia mundial e, nessa condição, influenciarem decisivamente o processo decisório em determinadas instituições ou a prática econômica dos decisores microeconômicos, ou seja, os responsáveis de transnacionais que decidem sobre alocação de investimentos diretos e divisão de mercados (e que também influenciam as políticas comerciais e industriais, talvez até fiscais, das economias nacionais). Essa proposta, como aliás revelado já no primeiro substantivo deste parágrafo, não se sustenta, tanto no plano estritamente material, ou de capacidades “brutas” das economias, como no plano institucional, ou seja, no da organização política da ordem econômica mundial.
A própria noção de “polo econômico” remete a uma concepção do mundo baseada na sucessão de hegemonias, no derrocada dos “impérios” e na ascensão de novos desafiantes da ordem em declínio. Sobre estes últimos, alguns chegam inclusive a falar de “superpotências pobres”, como se a ordem econômica precisasse necessariamente ser organizada em função de hierarquias excludentes e de substituição de superpotências, o que reflete não apenas a conhecida “teoria conspiratória da história”, mas também uma visão conservadora de como se organiza o mundo real. Mas, ainda que se aceitasse a noção de “polo dominante” – que na verdade refere-se a um ordenamento econômico interpretado como constituído necessariamente de um “centro” e de uma “periferia” – o fato é que o Brics não preenche os requisitos formais do modelo e não se constitui, absolutamente, em novo polo da economia mundial, se tanto um agrupamento heteróclito de potências provisoriamente identificadas por um vago “antihegemonismo” mental.
Seguindo uma noção mesmo rudimentar de como se organiza o mundo real, é evidente que toda ordem econômica historicamente conhecida, seja ela naturalmente existente ou socialmente construída – na verdade, qualquer sistema conhecido de organização humana, ou melhor, social –, compõe-se de um centro e de uma, ou várias periferias, sendo que esses elementos mantém uma relação dinâmica entre si, como muito bem analisado nos ensaios sociológicos de Edward Shils (Center and Periphery: Essays in Macrosociology; Chicago: University of Chicago Press, 1975). Cada um dos Brics, de certa forma, constitui um polo econômico em sua própria macrorregião e alimenta uma “periferia” que pode, ou não, estender-se a diversas outras regiões, inclusive numa relação de interpenetração com outros sistemas econômicos, dominantes ou “subordinados”.
Quem quer contemple os fluxos de comércio e de investimentos nos últimos anos, bem como o impacto da demanda chinesa sobre os preços das principais commodities exportados por países latino-americanos – inclusive por um dos Brics, o Brasil –, teria de chegar à conclusão, por exemplo, de que a região pode já ter se convertido em “periferia” econômica da China, tal a dependência comercial e financeira criada nos últimos anos por essas relações de oferta e demanda absolutamente “assimétricas” (como gostam de acusar os críticos da velha dominação “imperial”). Em qualquer hipótese, aderindo ou não a essas concepções acadêmicas sobre a organização do mundo material e seus reflexos no plano institucional, parece claro que os Brics, individualmente tomados, participarão, ou não, de qualquer esforço de soerguimento de países desequilibrados do “centro” europeu em função de suas próprias possibilidades e conveniências, sendo a China o natural “dispensador” de novas “bondades financeiras”, em virtude de sua dotação própria de fatores econômicos e de recursos políticos, que a converteram, sem dúvida alguma, em ator relevante na presente (e na futura) ordem econômica internacional.
É evidente, porém, que a China – única dentre os Brics a fazer uma diferença real na atual movimentação de placas tectônicas da geoeconomia mundial – não tem condições, nem de longe, de assumir o papel que outrora foi do Reino Unido e que atualmente é desempenhado pelos EUA, enquanto provedor, real, de segurança política, de abertura econômica – ainda que relativa, atualmente – e, sobretudo, de outros instrumentos mais elementares de poder, como podem ser porta-aviões e veículos aéreos não tripulados. Existe toda uma literatura declinista – da qual o mais recente exemplo é um livro supostamente de economia, de Dambisa Moyo, How the West Was Lost?: Fifty Years of Economic Folly and the Stark Choices Ahead (New York: Farrar, Straus and Giraux, 2011) – que gostaria de transformar sonhos acadêmicos em realidades contemporâneas, mas que falha miseravelmente nos argumentos quanto à “sucessão dos impérios” (para uma visão mais realista, ver a reedição do livro de Fareed Zakaria, The Post-American World: Release 2.0 (New York: Norton, 2011); a primeira edição era de 2008, ou seja, antes da crise econômica iniciada naquele ano).
Impérios econômicos não são feitos apenas de criação – ou extração – de recursos e muitos dos que escrevem sobre ascensão e queda das grandes potências estão talvez mentalmente vinculados ao modelo dos velhos impérios tributários que organizavam a exploração de seus satélites em seu benefício exclusivo. Ainda que isso fosse verdade, a China não parece perto de cumprir todas as funções de um “império”, que não implica apenas a extração de recursos, mas também a garantia de ordem e a possibilidade de que os próprios satélites participem da ordem normativa assim criada e mantida com base em critérios de adesão voluntária, e não apenas de coerção física. Ademais dos elementos de inovação e de absorção de cérebros “estrangeiros” que todo império legítimo deve ser capaz de exibir, existem outros componentes mais “virtuais”, ou intangíveis, que devem necessariamente integrar qualquer ordem estável e suscetível de liderar “satélites periféricos” ou mesmo “aliados subalternos”, entre eles a capacidade de liderar por consenso e o fato de se fazer admirado e invejado, e não apenas temido ou tolerado.
A ascensão dos Brics faria o mundo se tornar mais multipolar e democrático?
Uma outra noção acadêmica que vem ganhando curso em certos círculos – sendo, aliás, endossada por alguns governos, inclusive dos Brics – é a de que a “ascensão do resto”, como já  caracterizada nos trabalhos de Parag Khanna – The Second World: How Emerging Powers Are Redefining Global Competition in the Twentieth-first Century (New York: Random House, 2008); How to Run the World: Charting a Course to the Next Renaissance (New York: Random House, 2011) – e do já referido Fareed Zakaria, poderia implicar no “fim do século americano”; aventa-se também a hipótese de que a nova descentralização permitida pelo relativo declínio do gigante americano equivaleria a uma “democratização” do mundo e o estabelecimento de relações mais “igualitárias” entre os grandes atores, sem a típica arrogância imperial ainda hoje manifesta.
Sem dúvida que o “resto” – e mais particularmente os emergentes dinâmicos – vão se aproximar, mais ou menos rapidamente segundo os casos, dos padrões de vida e de consumo dos atuais países membros da OCDE, convertendo o mundo numa grande “classe média” relativamente estabilizada demograficamente, ainda que não totalmente democrática e respeitadora dos direitos humanos, como parecem ser os critérios de inclusividade nesse atual “clube restrito de países ricos”. Estima-se que em três ou quatro décadas, eles possam ascender aos níveis de renda e de prosperidade relativa que são os da Europa continental atualmente, que poderá (ou não, dependendo de sua capacidade de reformar-se e avançar) ter progredido ainda mais, para patamares de abundância ainda mais afirmada.
Os novos malthusianos – que são os ecologistas não equipados de conhecimento científico apropriado – podem até se alarmar ante essa perspectiva, imaginando que, se os chineses exibirem o perfil de consumo energético dos americanos, isso representaria o equivalente de uma população mundial de várias dezenas de bilhões de habitantes, condenando todos ao esgotamento dos recursos naturais e a uma crise irremediável dos padrões civilizatórios. O mais provável é que a engenhosidade humana – feita de novas tecnologias e de adaptações realistas aos preços de mercado – consiga responder a esses desafios, sem cair na abordagem romântico-alucinada dos novos rousseaunianos ingênuos (mas os velhos também eram…).
No plano geopolítico existe a tendência a considerar que esses novos desenvolvimentos seriam eminentemente positivos, já que poderia haver a “redução do unilateralismo imperial”, a partir das novas condições de retração do “poder hegemônico” (ou qualquer outra variante dessas teses). Essa situação representaria um suposto “avanço democrático” – simbolicamente representado pela reforma da Carta da ONU e a ampliação do seu Conselho de Segurança, uma das principais reivindicações de três dos Brics que ainda não fazem parte do inner circle – e garantia um horizonte politico mais conforme às novas realidades da economia mundial. Essa descentralização pode até corresponder aos sonhos de ascensão de alguns emergentes, mas não significaria necessariamente uma “pacificação” mundial e as garantias de segurança e estabilidade que a atual “ordem hegemônica” garantiu – com uma pequena ajuda da dissuasão nuclear – nas últimas décadas.
Alguns autores – entre eles o já citado Parag Khanna, mas também Robert Kagan, este em The Return of History and the End of Dreams (Nova York: Knopf, 2008) – já fizeram analogias históricas entre a “ascensão do resto” e situações geopolíticas anteriores, seja um equivalente da “anarquia militar” do Renascimento ou da paz armada europeia do final do século XIX, no “equilíbrio dos grandes poderes”, feitos de alianças cruzadas e de muitos cálculos estratégicos. Uma situação desse tipo não significa, portanto, um mundo mais estável, mais justo ou mais pacífico, e sim um mundo mais instável e talvez potencialmente mais propenso a tensões setoriais podendo resultar em conflitos mais abertos. Não se deve esquecer, tampouco, que alguns dos Brics – os maiores, justamente, em termos geopolíticos e militares – não são exatamente modelos de democracia e de respeito aos direitos humanos, como aliás se pode constatar desde agora nos debates do CSNU em torno de alguns regimes repressivos do Oriente Médio ou alhures, objetos de projetos de resoluções “punitivas” que não logram superar o direito de veto exercido de modo cínico-realista pelos “ascendentes”.
Pode-se, assim, dizer, que os Brics apresentam perspectivas “luminosas”  para a nova ordem internacional? Talvez seja efetivamente o caso, se isso representar a conversão do mundo atual, desigual e assimétrico como querem alguns (de fato, ainda pobre e desequilibrado), em um planeta mais igualitário e de “classe média”, mais próspero e, portanto, mais pacífico, de conformidade com as teses de Montesquieu sobre o doux commercecomo “temperador” das paixões humanas mais violentas. É possível que esse cenário ideal seja factível, pari-passu à evolução econômica e política do mundo, mas conviria guardar certo realismo nas análises que possam ser feitas num ambiente acadêmico (e até governamental). Que os Brics representem um fator positivo na geoeconomia mundial, isso é inegável. Que eles sejam um fator eminentemente positivo em todas as demais equações da geopolítica mundial, ainda é uma tese que precisa ser comprovada com base nas ações efetivas para tornar a governança mundial não apenas mais segura e estável em termos geopolíticos e econômicos, mas sobretudo mais democrática e mais respeitadora dos direitos humanos no terreno dos valores e dos princípios civilizatórios. CQD…
Paulo Roberto de Almeida é diplomata, professor universitário e autor de Globalizando. (pralmeida@me.com).

Refém dos 'companheiros' - João Bosco Leal


Refém dos 'companheiros'
João Bosco Leal
10/10/2011

Os brasileiros estão assistindo - e sentindo -, as consequências do radicalismo de membros dos sindicatos e forças sindicais de trabalhadores dos grandes centros do país e sua íntima relação com os principais membros do alto escalão do Governo Federal, em sua grande maioria do mesmo partido político, o PT.
Com uma década de indicações para cargos-chaves da administração pública, a estrutura montada na máquina estatal resultou em um governo totalmente dominado pelos radicais do PT e suas diversas alas, marxistas, leninistas, maoístas, castristas e todas as outras ideologias já fracassadas em todos os países onde foram implantadas.
As consequências desse radicalismo ideológico já estão sendo assistidas - e sentidas-, pelos brasileiros em diversos setores da sociedade, como na ineficiência do governo federal na manutenção de toda a infraestrutura de transporte e geração de energia já existente no país, itens básicos indispensáveis para qualquer crescimento.
Digo manutenção dos sistemas já existentes, pois novas obras de rodovias, aeroportos e usinas hidrelétricas foram praticamente inexistentes nos dois governos Lula e mesmo quando nas raras tentativas de implantação de alguma, os 'companheiros' do Ministério do Meio Ambiente e suas secretarias não permitiram seu andamento.
A não liberação de licenças ambientais para a construção de novas usinas hidrelétricas e o impedimento de construção ou ampliação de novos aeroportos - simplesmente porque os 'companheiros' são contrários às concessões à iniciativa privada -, foram constantes.
A insegurança jurídica é outra fonte de preocupação para a realização de investimentos no país, seja por grupos brasileiros ou estrangeiros, em decorrência das repentinas alterações das regras do jogo, como no recente aumento da taxa de importação de veículos por fábricas estrangeiras que já haviam montado suas redes de revendedoras no país, ou nas várias mudanças das leis que dizem respeito à participação acionária de estrangeiros em empresas aqui instaladas.
A indicação de seus membros pelo Presidente da República e decisões do Supremo Tribunal Federal, como a que anulou o processo contra o filho do Sarney, faz com que a população se sinta totalmente desamparada, imaginando que o Poder Judiciário está submisso e à serviço do Executivo.
A legislação trabalhista brasileira aumenta cada vez mais os direitos dos trabalhadores, sem exigir nenhuma contrapartida, como na recente aprovação do aumento proporcional da indenização de aviso prévio na demissão, que pode atingir 90 dias.
As greves de serviços essenciais, como dos correios e bancos, prejudicam toda a população sem que nenhuma atitude concreta seja tomada pelo governo do PT contra as lideranças sindicais, que não se preocupam - por exemplo-, se idosos, que em sua grande maioria não consegue manusear sua conta através dos caixas eletrônicos, estão sem receber sua aposentadoria ou benefício.
São lideranças inescrupulosas, que permitem que funcionários dos correios deixem de entregar mais de 180 milhões de encomendas, simplesmente por não aceitarem o acordo salarial proposto pela empresa, inclusive não aceitando que sejam descontados ou que tenham de repor os dias parados. O governo esperou mais de 15 dias de greve para recorrer à mediação da Justiça do Trabalho, que levou mais uma semana para determinar que pelo menos 40% dos funcionários da empresa continuem trabalhando, mas a greve já completou 26 dias, com prejuízos incalculáveis à população, ao comércio e à indústria.
Como em todos os países onde foram implantados, os radicalismos ideológicos, como o do PT, só serviram aos membros da cúpula do partido e lideranças sindicais, que exploram a população em benefício próprio.

E agora... a piada da semana: corrupcao na Bulgaria constrange Brasil...

Não é uma piada?
Não sei se toda a matéria, mas pelo menos o título é uma imensa piada...
Piada pronta? Ou foi o jornalista quem deu o título?
Paulo Roberto de Almeida 



Brasil vê corrupção na Bulgária como entrave a parcerias

País chegou a ter repasses da UE suspensos por desvio de recursos; baixo fluxo de comércio também dificulta projetos

Jamil Chade / ENVIADO ESPECIAL A SÓFIA
O Estado de S.Paulo, 04 de outubro de 2011 | 22h 28

 A presidente Dilma Rousseff desembarcou ontem na Bulgária com status de líder de superpotência, com direito a um batalhão de mais de 150 jornalistas credenciados para sua visita e até com o poder de suspender a campanha eleitoral no país. Mas, se o discurso é de promessas de aproximação com a terra de seu pai, a delegação brasileira admite nos bastidores que a corrupção na Bulgária é um obstáculo para a cooperação e uma saia-justa para a presidente.
O Partido Socialista búlgaro foi acusado de usar recursos da União Europeia para financiar sua campanha eleitoral há alguns anos. O resultado foi a suspensão do repasse de dinheiro para o país, o mais pobre do bloco, algo inédito na UE. O novo governo, da direita populista, não ficou isento dos escândalos e o país até hoje é considerado o mais problemático no bloco.
Ao tentar encontrar área de cooperação para propor aos búlgaros, o Brasil esbarrou justamente no fato de que transferir dinheiro para a Bulgária não é sinônimo de resultados. Uma das opções em estudo é fazer uma cooperação triangular, emprestando o know-how brasileiro em várias áreas públicas, mas insistindo em que o financiamento venha de Bruxelas.
Outra ideia é ajudar os búlgaros a desenvolver projetos que possam evitar o desvio de recursos. Na prática, Dilma poria em sua política externa parte da imagem que já quer passar internamente e lhe vem garantindo certa popularidade.
O fato de o governo Dilma já ter perdido ministros por causa dos escândalos de corrupção não foi ignorado pela imprensa local. Na BTV, principal rede de televisão privada, a âncora Anna Tsolova deixou claro que o que “une Brasil e Bulgária” também inclui a questão da corrupção.
Conteúdo. Na delegação brasileira, o esforço todo é ainda o de colocar conteúdo na visita. Os búlgaros vêm repetindo com insistência que o Brasil seria a salvação para sua economia em recessão, com uma sociedade empobrecida e sem perspectivas de expansão econômica. Mas, apesar da vontade política por parte do Brasil, a dificuldade é encontrar quem esteja interessado em fechar negócios numa relação com fluxo comercial insignificante, de apenas US$ 113 milhões. Ontem, o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, admitia que o aumento no volume de comércio não ocorrerá “de um dia para o outro”.
Alguns dos presidentes de empresas que estarão na Bulgária tentaram driblar a viagem, enviando diretores. Mas foram convocados pessoalmente por Dilma para se deslocar até Sófia. O acordo comercial que será fechado hoje, ainda que sem conteúdo concreto, na realidade já estava sendo negociado mesmo antes da eleição de Dilma.

Productivity of Brazilian workers - The Conference Board

Productivity of Brazilian workers


   On 3rd October, the US consulting firm Conference Board released data from its study of 114 nations regarding “worker productivity” where Brazil was ranked 68th.  This study showed that in 2010 the average Brazilian worker produced 1/5 of the wealth of an American worker, 1/3 of a South Korean and ½ of an Argentine.  Compared with the other BRICs, between 2005 and 2010, the productivity of the Brazilian worker increased by 2.1% per year, less than in China (9.8%), India (5.8%) and Russia (3.2%).


Data from the US Bureau of Labor Statistics demonstrate that between 2002 and 2008 the salaries of Brazilian industrial workers increased by 174% and by 133% for those in China.  Economists claim that this helps explain the loss of competitiveness of Brazilian workers and the increase of inflation in Brazil.  When salaries increase more rapidly than productivity, the prices of goods and services become more expensive.

   This ranking of worker productivity was elaborated by the Conference Board by dividing the nation’s GDP by its work force.  Insper professor Naercio Menezes points to the precarious status of education in Brazil as one factor, and another factor is the low level on innovation of Brazilian businesses, because these firms invest very little in the creation of new technologies.  “Innovation allows firms to produce more with the same number of employees.  In 2010, China registered 13,337 patents, while Brazil registered only 442.  This shows our very low level of innovation”, Menezes observed.  University of Brasília economics professor, Jorge Arbache, affirmed that “half of the Chinese population still lives in rural areas where productivity is low.  The productivity of the Chinese industrial worker is higher than the Brazilian because Chinese industry migrated from low productivity sectors (like textiles) to more sophisticated industrial products like automobiles and computer chips”. 

Brazilian Economy - The New York Times

After a Year in Economic Overdrive, Brazil Hopes to Elude Pitfalls
The New York Times, October 8. 2011
SÃO PAULO, Brazil — In the first major test of her stewardship of Latin America’s largest economy, President Dilma Rousseff is struggling to break free of an economic trap.
Coming off a year in which it recorded its highest growth in a quarter century, Brazil is faced with rising inflation, an overvalued currency and an industrial sector losing competitiveness to cheap Chinese imports.
But Ms. Rousseff’s promising efforts to fix those problems could be undermined in the coming months as the government embarks on one of its biggest spending sprees in decades.
The leaders of the United States and Europe, struggling to right their listing economies, would count themselves lucky to have problems like Brazil’s. Its economy — driven by soaring prices for commodities, robust Chinese demand for raw materials and a domestic consumption boom spurred on by expanding credit — grew 7.5 percent last year, its highest rate since 1986.
“Like other emerging countries, Brazil has thus far been less affected by the global crisis,” Ms. Rousseff, an economist, said at the United Nations last month. “But we know that our capacity to resist is not unlimited.”
Her strategy so far has been bold. Predicting that the global economy will not improve this year, Brazil’s Central Bank has slashed interest rates, making a risky bet that already high inflation would not soar further. That move, aimed at encouraging growth and reducing the value of the currency, was paired with measures to protect Brazil’s industries from a flood of Asian imports.
That approach has shown early signs of success. The stubbornly high Brazilian real began losing value to the dollar last month, reaching its lowest point since 2008 two weeks ago before recovering somewhat last week.
The shift has been front-page news in Brazil, dampening a buoyancy among Brazilians who felt richer than ever. Even as the overvalued currency slowed industrial production, it fueled consumer spending at home and abroad at a blistering pace.
The average per capita purchases by Brazilians in the United States grew 250 percent between 2003 and 2010. Only the Japanese and the British spend more in the United States than Brazilians, figures from the United States Commerce Department show. The foreign spending, which diverts money that could support Brazilian industry, has alarmed government officials here, who have tried to slow the pace of consumption by imposing restrictions on credit card purchases.
But government spending represents the bigger threat.
Next year, the government will be obligated to meet tens of billions of dollars in promised payments for social welfare programs, minimum wage increases and infrastructure projects for its twin billing on the global stage, the 2014 World Cup and 2016 Olympic Games in Rio de Janeiro.
A 14.7 percent increase in the minimum wage is scheduled to take effect in 2012 at a cost of $13 billion, new low-income housing subsidies will cost $6 billion, and investments for the sporting events are expected to cost at least $4.5 billion, said Luiz Schymura, director of the Brazilian Economic Institute at the Getulio Vargas Foundation in Rio de Janeiro.
Since her inauguration in January, Ms. Rousseff has shown a willingness to take a red pen to fiscal spending. Her government approved $28 billion in budget cuts, privatized airports — a move considered long overdue by economists and many policy makers — and stood up to unions demanding even higher wage increases.
But standing up to the minimum wage or the World Cup may be politically impossible.
“For all her good intentions, the political pressures on her will be enormous,” Dr. Schymura said.
The surge in spending, accompanied by lower interest rates, could produce a cycle of higher inflation, economists fear. Whether the new policies will be enough to revitalize Brazil’s industrial sector remains to be seen. The economy’s growth has slowed this year to about 3.5 percent, economists say, about half that of last year. And the consumption boom is slowing. Housing, grocery and retail stores are all reporting reduced sales, said Alfredo Coutiño, director for Latin America at Moody’s Analytics.
“Now everybody is questioning if the consumption boom was sustainable or not, because everybody is losing now,” he said. “The future in Brazil is not certain, or at least not as certain as believed at the beginning of the year.”
There are also concerns that structural shifts are under way that will continue to stymie growth. Industry’s share of total economic production has been slipping, to 15.4 percent last year from 19.2 percent in 2004, government figures show.
“Some people say that Brazil is immersed in a de-industrialization process,” Dr. Coutiño said.
The government has moved aggressively to protect industry, saying last month that it would raise import taxes on foreign cars and trucks by 30 percentage points to protect jobs in Brazil’s flagging auto industry.
Brazilian industry pins its decline on the overvalued real, which reduced demand for Brazilian products, and for that Finance Minister Guido Mantega blames the United States and China for exacerbating a “currency war.”
But the real has also strengthened because of high interest rates, which have attracted a heavy influx of dollars from overseas investors. Brazil’s benchmark interest rate of 12 percent — which was slashed in August from 12.5 percent — remains among the highest in the world.
The government is determined not to repeat past mistakes. After the September 2008 collapse of Lehman Brothers, Brazil waited four months to begin cutting interest rates. The surprise cut in August came as inflation climbed to a six-year high, and more cuts could be coming.
“As the financial crisis worsens, this time we will take advantage of it,” Ms. Rousseff said to business leaders here last month.
Despite the moves, analysts fear that Ms. Rousseff will pay a political price for Brazil’s economic dip.
When former President Luiz Inácio Lula da Silva was re-elected to a second term in 2006, Brazil’s economy was taking off. His government’s approval ratings steadily soared, topping 80 percent in some polls as he left office on Jan. 1.
Ms. Rousseff, his chosen successor, was elected last October just as Brazil’s economy was starting to overheat, with another global slowdown months away. But so far she has not mustered the same political support that Mr. da Silva enjoyed, and she has struggled to contain unrest in her governing coalition. Five ministers have resigned in the past four months, the latest being Pedro Novais, the tourism minister, who stepped down last month amid allegations of ethics violations.
Ms. Rousseff “is embarking upon a politically more difficult path precisely when her base of support in Congress could start to wane and her approval ratings are more likely to drop over the next four to six months,” said Christopher Garman, an analyst at Eurasia Group, a political risk consultancy in New York.
“She is embarking upon a bold strategy,” he said, “but she won’t be able to fully deliver on that strategy.”

O fim da ilusão dos Brics - Marcelo Coutinho


O fim da ilusão dos Brics
Marcelo Coutinho
O Globo, 9/10/2011

Em 1499, Américo Vespúcio passou próximo à costa norte da América do Sul, a caminho das Índias Ocidentais, como então era chamado o continente americano. Só anos depois, quando o navegador florentino regressava de uma viagem ao Brasil, concluiu que não podíamos ser um prolongamento da Ásia.
Mesmo após tal descoberta, o termo Índias Ocidentais continuou a ser utilizado pela Companhia Holandesa, entre outras. Responsável pela ocupação do Nordeste brasileiro no século XVII, essa empresa desenvolveu uma organização mais capitalista no comércio internacional, cuja origem antiga remonta às redes fenícias de cidades mercantes, centenas de anos antes de Cristo.
Os Países Baixos apenas iniciariam a transição do mercantilismo para os mercados modernos. Estes se globalizaram, se desglobalizaram e se globalizaram novamente. Mas nunca estiveram tão perto de ver a Ásia predominar. Estamos entrando na Era do Dragão. E talvez em um neomercantilismo.
Países como China e Índia se distanciaram muito daquelas antigas fontes de bens primários e bugingangas. A Chíndia exporta também em massa produtos e serviços de alta qualidade. Não há nenhum outro país ou região comparável. O acrônimo Bric equivale à confusão criada com as Índias Ocidentais na geografia comercial.
O Brasil voltou a ser confundido com a Ásia. Ninguém acredita que somos a costa oriental do Sudeste Asiático como na época de Vespúcio, mas de alguma forma nos igualamos a partir de uma invenção do sistema financeiro. Sonhamos em ser um dos grandes emergentes que dominarão a economia no mundo. É o nosso excepcionalismo.
Quanto mais cedo despertarmos, melhor. Em comum com a Chíndia, o Brasil tem apenas o tamanho. Nos últimos três anos, crescemos em média 1/3 do que cresceram as potências orientais. Por outro lado, quando o Ocidente entrou em recessão em 2008, acompanhamos a queda, ainda que numa intensidade menor (-0,6%). O mesmo ambiente de forte desaceleração parece acontecer agora no fim de 2011.
Em matéria de dinamismo econômico, o Brasil é um país dividido. Seus setores industriais mais avançados seguem padrões ocidentais de derretimento. Já os setores tradicionais ligados às commodities ancoram-se na demanda do Oriente. O resultado é um crescimento intermediário entre os dois grupos, porém mais próximo dos baixos níveis dos países já desenvolvidos.
A pauta do que exportamos se concentra nos itens básicos. Somos menos diversificados do que éramos há dez anos. A substituição dos EUA pela China não trouxe vantagens. A indústria nacional desenvolveu dependência estrutural das importações, de modo que mudanças abruptas no câmbio não ajudam, mesmo quanto ocorre desvalorização.
O peso do Brasil no comércio é residual e vem caindo. O Brasil responde por 1% do fluxo comercial global, ou seja, bem menos do que há 50 anos, e um décimo hoje da Chíndia, com seus 2,5 bilhões de pessoas. Por sua vez, a importância brasileira no PIB do mundo em PPP representará em 2011 só 1/6 da participação chinesa e 40% da indiana. O mero ranqueamento que nos coloca entre as maiores economias gera, como se percebe, falsas impressões.
Se o critério utilizado para o acrônimo da Goldman Sachs é político, a situação fica ainda mais complicada. China e Índia têm armas nucleares, a primeira é autoritária e a segunda tem indicadores sociais piores que os do Maranhão. A China não apoia nosso assento fixo na ONU. A Índia encontrou sozinha aprovação dos EUA. As visões na OMC tampouco coincidem. Isso tudo sem falar da Rússia.
O fim da ilusão chamada Bric não deve estimular, todavia, comportamentos orientalófobos. O novo protecionismo pune os consumidores sem gerar compensações à altura em empregos locais. Mal ou bem, os asiáticos são agora atores imprescindíveis. Constatar que não somos a extensão deles é o início para nos inserirmos conscientes das novas rotas do comércio, da nossa menor importância relativa e dos desequilíbrios na condição de global players. Não somos China nem Índia ocidentais.

domingo, 9 de outubro de 2011

Carreira diplomatica e carreira academica: um questionario


Carreira Diplomática e Carreira Acadêmica:
vidas paralelas ou linhas que não se tocam?

Paulo Roberto de Almeida

No início de setembro de 2011, mais exatamente no dia 9, recebi, pela segunda vez (a meu pedido), correspondência, acompanhada de um questionário, de um acadêmico interessado na carreira diplomática, que reproduzo abaixo, pois ele (omito seu nome, por simples resguardo de privacidade) tece considerações extremamente interessantes sobre essas duas vertentes da atividade profissional que sempre estiveram no centro de minhas ocupações da idade adulta (ou seja, desde quando deixei de ser simplesmente um “estudante” e fui ao “mercado” para trabalhar e sobreviver, embora eu tivesse trabalhado sempre, desde a infância).
O questionário parece ter sido dirigido exclusivamente a mim, mas acredito que ele poderia se aplicar também a diversos outros colegas da carreira. Imaginando que minhas respostas possam, igualmente, interessar tanto colegas de carreira como diversos outros acadêmicos eventualmente interessados na profissão diplomática, tomo a liberdade (esperando que isso não vá contrariar meu ”interrogador”) de postar minhas respostas publicamente. O título deste trabalho é anódino, obviamente, e apenas reproduz um informação de fato, ou seja, um paralelo entre duas carreiras. O subtítulo é meu, e remete, no primeiro trecho, à famosa obra de Plutarco – que traçava vidas paralelas de diversos imperadores romanos (mas longe de mim insinuar qualquer semelhança conceitual entre um caso e outro) – e, no segundo, ao conceito matemático de paralelas, que caminham eternamente em direção ao infinito, sem necessariamente apresentar divergência irremediável, mas tampouco tendendo a uma hipotética junção futura.
Em que sentido este subtítulo expressa meu pensamento sobre essas duas carreiras? Provavelmente nada, já que subtítulos são feitos para informar ou para provocar (embora esta função, nos livros publicados nos EUA, caiba aos títulos accrocheurs ou appealings). No meu caso, nem para uma coisa, nem outra, apenas para colocar uma pergunta, uma dúvida, mas não ainda uma resposta. As respostas virão abaixo, sistematicamente, embora essa questão envolva tantas outras interações, e variáveis analíticas, que respostas tópicas provavelmente não bastarão para esgotar um debate que reputo importante e cativante, numa perspectiva puramente pessoal, dado meu interesse e envolvimento nessas duas vertentes, mas também objetivamente, como fonte possível de reflexões em torno de dois polos da vida profissional – a acadêmica e a diplomática, ou seja de servidor de Estado – que conformam, junto com o polo propriamente empresarial, ou seja, na vida privada (como empregador ou  assalariado), as três grandes interfaces de atuação de qualquer indivíduo, em qualquer tempo e lugar (tirante a carreira de eremita, que imagino não existir como carreira, e sim como opção puramente pessoal e bem mais teórica do que prática).
Dito isto, vejamos as perguntas do correspondente, e minhas respostas:

1. Sua área de especialização acadêmica afetou sua escolha ou opções de trabalho no Itamaraty? Você acredita que tenha sido um fator essencial para algum posto específico?
PRA: Sim, tremendamente. O fato de eu vir das humanidades, mais especificamente das ciências sociais, fez-me dirigir, naturalmente, para aquelas áreas que tinham a ver com meus objetos de estudo, contrariamente a possíveis orientações, no Itamaraty, para Administração, Cerimonial, ou Comunicações, por exemplo, se por acaso meus estudos e preferências pessoais tivessem me feito inclinar por essas áreas, para as quais confesso não manter sequer curiosidade ou gosto. Minhas opções sempre penderam para questões econômicas e políticas de desenvolvimento nacional, de cooperação internacional, que estão no âmago, podemos dizer, do trabalho substantivo em diplomacia, ou seja, a negociação de acordos e esquemas internacionais, no mais das vezes multilaterais, mas também bilaterais, que tem a ver com organização econômica e social dos países, seu desenvolvimento econômico e suas relações pacíficas. Venho das ciências sociais, e mais especificamente da sociologia histórica, mas com interesse pelo desenvolvimento econômico e político.

2. A intenção de se fazer um mestrado / doutorado (MSc-MA / PhD) no exterior é viável no contexto da carreira diplomática, especialmente num momento inicial da mesma (os primeiros dez anos de casa, p. ex.)? E na UnB, quando a lotação for BSB?
PRA: Pode-se tentar, ou deve-se tentar, embora a carreira seja extremamente absorvente quanto a horários, viagens, obrigações, totalmente fora do expediente e ocupando fins de semana inclusive. O diplomata não tem, ou não deveria ter, um expediente corriqueiro, como se faz numa empresa ao “bater o ponto”. Por isso mesmo, estudos acadêmicos, em paralelo ou concorrentemente com a profissão, são extremamente difíceis no desempenho normal das funções, embora não seja excluída essa possibilidade. Teoricamente sempre se pode estudar de noite, ou perseguir seus objetivos em horários parcialmente coincidentes com o desempenho normal de funções na carreira, em Brasília ou no exterior, mas isso depende muito das circunstâncias e possibilidades de cada posto ou função.

3. Há alguma “parceria” entre alguma escola internacional e o Inst. Rio Branco, no que tange ao aperfeiçoamento do corpo diplomático?
PRA: Possivelmente existe, e sempre existe cooperação entre academias diplomáticas por meio de convênios abertos, mas sua implementação depende muito da vontade das chefias de “liberar” diplomatas para se dedicar a atividades acadêmicas, e depende muito, também, da orientação política de cada chefia. O IRBr já fez muito disso e ainda faz, mas desde 2003, a cooperação e o intercâmbio têm sido basicamente empreendidos no contexto Sul-Sul, quando não exclusivamente.

4. Há alguma incentivo por parte do Itamaraty, como flexibilização de horários ou reestruturação da carga horária?
PRA: Pode haver, mas isso depende muito de uma negociação caso a caso.

5. Há alguma forma de “lotação especial ou provisória” em razão de admissão em um programa de pós-graduação no exterior?
PRA: Não. O diplomata não pode partir da hipótese de que a Administração vai removê-lo para Boston ou NY, e liberá-lo de obrigações diplomáticas, apenas pelo fato de ter sido aceito em Harvard ou Columbia. Isso simplesmente seria uma imposição pessoal sobre o interesse do serviço. Pode haver alguma acomodação a posteriori, mediante consulta e exame do caso, mas não existe possibilidade uma carreira acadêmica, exterior ao serviço, determinar a mobilidade e atribuições do funcionário.

6. Considerando sua experiência pessoal, você acredita que tenha sido mais recompensador ingressar no Itamaraty um pouco mais maduro, mas já tendo completado um doutorado (algo que não seria tão simples se sua opção fosse inversa)?
PRA: Foi certamente mais interessante ingressar no Itamaraty mais maduro, embora sempre se “perdem” alguns anos na progressão etária, digamos assim, mas eu ingressei com o mestrado completo, e o doutoramento em curso (terminado apenas depois de estar em meu segundo posto, e isto por decisão pessoal).

7. Por último, especulo se no futuro próximo, cogita-se postergar a aposentadoria compulsória dos servidores públicos (inclusive diplomatas)?
PRA: Se a Constituição determina aposentadoria aos 70, essa deveria ser a idade limite de fato para os diplomatas; de direito é, mas de fato se dá cinco anos antes, com adaptações caso a caso. No futuro, certamente haverá postergação geral da idade limite.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 9/10/2011

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Correspondência original:

From: Fulano <fulano@yahoo.com.br>
Subject: Reenviando email com dúvidas sobre carreira diplomática e acadêmica
Date: 9 de setembro de 2011 18:45:40 BRT
To: Paulo Almeida <pralmeida@me.com>

Caro P.R. de Almeida,
envio novamente o email com algumas dúvidas sobre carreira diplomática e acadêmica.
Imagino que você receba muitas dúvidas e afins. Portanto, sublinho que não há urgência nos meus questionamentos, mas acredito ser um tópico interessante para vários futuros diplomatas.
Abaixo segue,
Att.
Fulano

Primeiramente gostaria de lhe cumprimentar pela excelente iniciativa de organizar FAQs sobre a carreira diplomática. Muitos dos tópicos são esclarecedores e foram uma ótima orientação sobre diversas dúvidas sobre o Itamaraty.

Escrevo para indagar sobre a relação entre carreira acadêmica e carreira diplomática. Pelo que consegui investigar, constatei que embora a carreira diplomática não impeça que se tenha uma vida paralela na academia, não é simples conciliar ambas.

Certamente o Itamaraty valoriza uma preparação acadêmica. A própria atividade diplomática já exige algum conhecimento teórico e preparação intelectual diferenciada. No entanto, não parece claro o benefício em termos de longo-prazo de se aperfeiçoar academicamente. Conforme conversei com outros diplomatas, em boa medida os indivíduos acabam tendo uma carreira acadêmica quase que apartada da vida diplomática. Ou seja, me parece que os motivos preponderantes são mais de ordem intelectual/pessoal do que de benefícios profissionais.

Tomando-se em consideração que a maioria das universidades e centros de ensino, em especial nos Estados Unidos, oferece apenas programas full-time , torna-se extremamente árdua manter qualquer perspectiva de ser possível cursar uma pós-graduação no exterior, ainda que seja na área de Relações Internacionais ou Ciência Política, que, em princípio, seria uma boa forma de manter-se atualizado e academicamente ativo. Por outro lado, vejo que algumas instituições oferecem programas part-time para profissionais da área, valorizando os profissionais e destacando o que a experiência pode trazer para a sala de aula de aula. Dentre os programas que abrem essa possibilidade estão da London School of Economics and Political Science – LSE e do Center for Global Affairs – da NYU.

Caso haja uma possibilidade concreta de estudar em um bom MA/MSc ou PhD,  seria mais adequado colocar esse projeto como prioridade em relação ao Inst. Rio Branco, visto que talvez seja parcial ou completamente inviável algo do gênero após ingressar no Itamaraty ? Seria a situação do ex-chanceler Amorim, que, salvo engano meu, estudou na LSE em nível de pós-graduação e teve que abandonar seu curso antes de o completar ou defender sua dissertação/tese.

De certa forma, parece que é um tradeoff clássico : ingressar mais tarde na carreira(pelo menos 4-6 anos depois) ou ingressar mais cedo e deixar a vida acadêmica como um “hobby” (sem maiores preocupações com pós-graduação). 

Assim sendo, minhas perguntas seriam as seguintes:

1.  Sua área de especialização acadêmica afetou sua escolha ou opções de trabalho no Itamaraty ? Você acredita que tenha sido um fator essencial para algum posto específico ?
2.  A intenção de se fazer um mestrado / doutorado (MSc-MA / PhD) no exterior é viável no contexto da carreira diplomática, especialmente num momento inicial da mesma (os primeiros dez anos de casa, p. ex.) ? E na UnB, quando a lotação for BSB ?
3.  Há alguma “parceria” entre alguma escola internacional e o Inst. Rio Branco, no que tange ao aperfeiçoamento dos corpo diplomática ?
4.  Há alguma incentivo por parte do Itamaraty, como flexibilização de horários ou reestruturação da carga horária ?
5.  Há alguma forma de “lotação especial ou provisória” em razão de admissão em um programa de pós-graduação no exterior ?
6.  Considerando sua experiência pessoal, você acredita que tenha sido mais recompensador ingressar no Itamaraty um pouco mais maduro, mas já tendo completado um doutorado (algo que não seria tão simples se sua opção fosse inversa) ?
7.  Por último, especulo se no futuro próximo, cogita-se postergar a aposentadoria compulsória dos servidores públicos (inclusive diplomatas)?

Quero dizer, em alguns casos parece problemático o fato do Itamaraty perder indivíduos que teriam condições de contribuir por mais alguns anos (embora sempre haja o risco de perpetuar uma “gerontocracia”). Assim, seria uma boa forma de evitar que haja um custo tão grande de se ingressar na carreira mais tarde.

Desde já agradeço pela gentileza de usar seu tempo e paciência para os aspirantes à carreira diplomática.

Atenciosamente,
Fulano

O Dissenso de Washington - livro de Rubens A. Barbosa: lancamento em Brasilia

A Editora Agir e a Saraiva convidam para o lançamento do livro de:

Rubens Antônio Barbosa
O DISSENSO DE WASHINGTON: Notas de um observador privilegiado sobre as relações Brasil-Estados Unidos
(São Paulo: Editora Agir, 2011)

na quarta-feira, dia 19 de outubro, na 
Livraria Saraiva Megastore do 
Shopping Pátio Brasil, Brasília
SCS/B, Lote A, nível 1
Tel.: (61) 3323-6789
(estacionamento subterrâneo no local)


O que o Brasil tem a dizer - João Augusto de Castro Neves


O que o Brasil tem a dizer?
João Augusto de Castro Neves
Artigo originalmente publicado no jornal O Globo, em 09/10/2011

Em 2001, um banco de investimentos cunhou a expressão Brics, situando o Brasil num agrupamento promissor de economias emergentes. Em 2006, a Bolívia nacionalizou ativos de uma empresa estatal brasileira naquele país, acontecimento que inaugurou uma onda de novas reivindicações de países vizinhos perante o Brasil. Ano passado, a tentativa do Brasil de intermediar, juntamente com a Turquia, as negociações nucleares entre as grandes potências e o Irã foi prontamente rechaçada pelas grandes potências.

O que esses fatos têm em comum? Primeiramente, são reflexos de algumas transformações mais profundas na inserção internacional do Brasil. A combinação de estabilidade macroeconômica com crescimento permitiu avanços e garantiu também um ambiente propício à consolidação de políticas sociais. O resultado desse processo foi além da emergência de uma nova classe média e do surgimento de multinacionais brasileiras, as chamadas campeãs nacionais. No front externo, essas mudanças geraram entusiasmo e confiança nos governantes nacionais e alargaram os horizontes de atuação do Brasil.

Mas um aspecto menos comentado daqueles acontecimentos merece atenção. Positivos ou negativos, todos foram recebidos com certa surpresa pelo Brasil, inclusive nos círculos governamentais. Não raro, as reações variaram da euforia, como se o mundo finalmente tivesse acordado para a grandeza do Brasil, à perplexidade, como se qualquer ato contrário aos interesses do país fosse resultado de má vontade ou incompreensão.

Para um país que ambiciona, há décadas, posições mais elevadas na hierarquia de poder global, essas reações extremadas impressionam. E o fato de elas acompanharem até mesmo algumas transformações mais graduais porém mais evidentes na agenda externa, como a elevação da China a principal parceiro econômico do Brasil, não só impressiona, mas assusta. Desnecessário afirmar que a crescente atitude anti-China nos meios políticos e produtivos é tão contraproducente e ideológica quanto o excesso de otimismo do governo do PT com a suposta “parceria estratégica”.

O bom desempenho econômico e social do Brasil dos últimos anos inspira, com razão, questionamentos internos sobre a sua sustentabilidade. A ascensão internacional do país, de certa forma um subproduto desse desempenho, por sua vez, demanda um debate igualmente importante sobre os efeitos e as possibilidades dessa nova situação. Afinal, a ascensão do Brasil não ocorre no vácuo. Intencionalmente ou não, ela reverbera na região e alcança temas globais, como o comércio e as finanças, o meio ambiente, os direitos humanos e a proliferação nuclear.

A nova visibilidade internacional do Brasil, portanto, não deve ser encarada como a conclusão de um processo bem-sucedido de modernização. Essa nova condição de potência emergente — ou já emergida —, na verdade, deve ser entendida como o início de uma nova fase nas relações internacionais do Brasil. Uma fase que, além de oportunidades, traz mais riscos e novas responsabilidades, não havendo espaço para surpresas, indefinições e improviso.

Diante dessa realidade, é fundamental o cultivo de uma cultura de planejamento estratégico entre governo e sociedade civil. Isto é, coordenar esforços para desenvolver a capacidade de olhar para a frente e além do nevoeiro do curto prazo e do dia a dia, a fim de que se possa enxergar tendências duradouras e desenhar estratégias para lidar com elas. Afinal, uma retórica diplomática ambiciosa, por si só, não prepara as lideranças do país para lidar com a realização de alguns objetivos que pareciam distantes.

País que sempre clamou por mais voz nos assuntos internacionais, o Brasil tem de evitar o risco de, quando começar a ser ouvido, não saber bem ao certo o que tem a dizer.

@BrazilPolitics

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Acabo de me cadastrar, e já downloadei (ugh!) dois livros inteiros, recentes, sobre economia brasileira e vários outros assuntos.
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