Despesa com educação no Brasil- 1
Sempre escuto um debate caloroso no Brasil que precisamos investir mais em educação, que o Brasil só crescerá quando o investimento em educação passar a ser prioritário. OK, como se pode verificar se o gasto com educação no Brasil é ou não prioritário?
Que tal olharmos quanto o gasto com educação representa do PIB ao longo do tempo? E se compararmos o gasto com educação em relação a outros países? Que tal olharmos se esse gasto é protegido de cortes para alcançar a meta de superávit primário? Que tal olharmos o crescimento real do gasto por estudante?
Parte 1 – Qualquer que seja o critério que se use, gasto com educação no Brasil já é prioritário.
De acordo com dados de gasto com educação no Brasil do INEP, o gasto público com educação no Brasil passou de 4,7% do PIB, em 2000, para 6,1% do PIB, em 2011. Acho esse valor muito alto, esperava que fosse lago mais próximo de 5% do PIB, mas como é um dado da página do INEP, vamos usá-lo e completar a séria para trás (1950-1995) com os dados do economista Paulo Maduro da sua dissertação de mestrado na FGV-RJ.
Gráfico 1 – Gasto Público com Educação – % do PIB de 1950-2011
Fonte: Paulo Maduro (Tese de Mestrado – FGV-RJ) e INEP
Primeiro, podemos ver de forma muito clara que, de 1970 a 1985, o Brasil não aumentou o gasto com educação como % do PIB e, no início desse período, tínhamos uma poupança pública de quase 7% do PIB. Samuel Pessôa gosta de lembrar que, enquanto estávamos construindo Brasília lá no final da década de 1950, o nosso gasto com educação era de 1,5% do PIB. Naquela época, educação não era uma prioridade e só passou a ser com a redemocratização do Brasil.
Segundo, não há dúvida que fizemos um grande progresso na década de 1990 que teve início com o ex-ministro Paulo Renato e continuamos esse esforço nos governos Lula e Dilma. No período mais recente, graças ao maior crescimento do PIB que se refletiu na maior arrecadação do governo federal e nas transferências para estados e municípios, o gasto com educação continuou crescendo como % do PIB, principalmente depois de 2005. O boom de commodities aumentou não apenas o crescimento, mas também a arrecadação e, logo, o gasto com educação.
Terceiro, de 2008 a 2012, a despesa do governo federal com a função educação foi a que mais cresceu e passou de 0,8% para 1,4% do PIB. Esse forte crescimento pode ser explicado por três fatores: (i) a eliminação da incidência da Desvinculação das Receitas da União (DRU) sobre os recursos destinados à educação; (ii) a Lei 11.494/2007, que limitou em 30% o montante máximo que a União poderia considerar como gasto com educação, o que significou, na prática, que o Governo Central teve que destinar mais recursos para essa rubrica para cumprir com o mínimo constitucional; e (iii) aumento da arrecadação do IOF para compensar o fim da CMPF, o que aumentou o gasto com educação (vinculação do gasto com educação é cima de impostos e não de contribuições como a CPMF).
Gráfico 2 – Despesa Primária do Governo Federal com a Função Educação – 2002-2012 (% do PIB)
Fonte: Balanço da União e SIAFI. Incluis pessoal, custeio e investimento. Elaboração: Mansueto Almeida
Se compararmos nosso gasto com educação (que está na faixa de 5,5% a 6% do PIB) com outros países, estamos na média internacional. A média dos países ricos da OCDE é 5% do PIB e, assim, gastamos até mais do que seria esperado dada a nossa renda per capita. O economista Fernando Veloso do IBRE-FGV escreveu um texto muito bom sobre educação no Brasil no qual fala que:
“Diante da elevação nos últimos anos dos recursos destinados à educação, uma questão que se coloca é como o gasto público em educação no Brasil se compara ao de outros países. Como mostra o Gráfico 4, países mais ricos em geral gastam mais em educação como proporção do PIB. No entanto, o gasto público em educação no Brasil está um pouco acima do esperado para um país com nosso nível de renda per capita. O que os dados mostram, portanto, é que o Brasil não gasta pouco em educação como fração do PIB” (ver Veloso, F., 2011, p. 236).
Reproduzo abaixo o gráfico 4 do texto dele:
Despesa com educação no Brasil- 1
Sempre escuto um debate caloroso no Brasil que precisamos investir mais em educação, que o Brasil só crescerá quando o investimento em educação passar a ser prioritário. OK, como se pode verificar se o gasto com educação no Brasil é ou não prioritário?
Que tal olharmos quanto o gasto com educação representa do PIB ao longo do tempo? E se compararmos o gasto com educação em relação a outros países? Que tal olharmos se esse gasto é protegido de cortes para alcançar a meta de superávit primário? Que tal olharmos o crescimento real do gasto por estudante?
Parte 1 – Qualquer que seja o critério que se use, gasto com educação no Brasil já é prioritário.
De acordo com dados de gasto com educação no Brasil do INEP, o gasto público com educação no Brasil passou de 4,7% do PIB, em 2000, para 6,1% do PIB, em 2011. Acho esse valor muito alto, esperava que fosse lago mais próximo de 5% do PIB, mas como é um dado da página do INEP, vamos usá-lo e completar a séria para trás (1950-1995) com os dados do economista Paulo Maduro da sua dissertação de mestrado na FGV-RJ.
Gráfico 1 – Gasto Público com Educação – % do PIB de 1950-2011
Fonte: Paulo Maduro (Tese de Mestrado – FGV-RJ) e INEP
Primeiro, podemos ver de forma muito clara que, de 1970 a 1985, o Brasil não aumentou o gasto com educação como % do PIB e, no início desse período, tínhamos uma poupança pública de quase 7% do PIB. Samuel Pessôa gosta de lembrar que, enquanto estávamos construindo Brasília lá no final da década de 1950, o nosso gasto com educação era de 1,5% do PIB. Naquela época, educação não era uma prioridade e só passou a ser com a redemocratização do Brasil.
Segundo, não há dúvida que fizemos um grande progresso na década de 1990 que teve início com o ex-ministro Paulo Renato e continuamos esse esforço nos governos Lula e Dilma. No período mais recente, graças ao maior crescimento do PIB que se refletiu na maior arrecadação do governo federal e nas transferências para estados e municípios, o gasto com educação continuou crescendo como % do PIB, principalmente depois de 2005. O boom de commodities aumentou não apenas o crescimento, mas também a arrecadação e, logo, o gasto com educação.
Terceiro, de 2008 a 2012, a despesa do governo federal com a função educação foi a que mais cresceu e passou de 0,8% para 1,4% do PIB. Esse forte crescimento pode ser explicado por três fatores: (i) a eliminação da incidência da Desvinculação das Receitas da União (DRU) sobre os recursos destinados à educação; (ii) a Lei 11.494/2007, que limitou em 30% o montante máximo que a União poderia considerar como gasto com educação, o que significou, na prática, que o Governo Central teve que destinar mais recursos para essa rubrica para cumprir com o mínimo constitucional; e (iii) aumento da arrecadação do IOF para compensar o fim da CMPF, o que aumentou o gasto com educação (vinculação do gasto com educação é cima de impostos e não de contribuições como a CPMF).
Gráfico 2 – Despesa Primária do Governo Federal com a Função Educação – 2002-2012 (% do PIB)
Fonte: Balanço da União e SIAFI. Incluis pessoal, custeio e investimento. Elaboração: Mansueto Almeida
Se compararmos nosso gasto com educação (que está na faixa de 5,5% a 6% do PIB) com outros países, estamos na média internacional. A média dos países ricos da OCDE é 5% do PIB e, assim, gastamos até mais do que seria esperado dada a nossa renda per capita. O economista Fernando Veloso do IBRE-FGV escreveu um texto muito bom sobre educação no Brasil no qual fala que:
“Diante da elevação nos últimos anos dos recursos destinados à educação, uma questão que se coloca é como o gasto público em educação no Brasil se compara ao de outros países. Como mostra o Gráfico 4, países mais ricos em geral gastam mais em educação como proporção do PIB. No entanto, o gasto público em educação no Brasil está um pouco acima do esperado para um país com nosso nível de renda per capita. O que os dados mostram, portanto, é que o Brasil não gasta pouco em educação como fração do PIB” (ver Veloso, F., 2011, p. 236).
Reproduzo abaixo o gráfico 4 do texto dele:
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Despesa com educação no Brasil- 2
OBS: continuação do post anterior
Este post complementa o anterior sobre a prioridade de gasto em educação no Brasil. Como já destacado no post anterior, o gasto com educação no Brasil vem crescendo fortemente e, como mostraremos em seguida, quando olhamos a execução orçamentaria de todos os níveis de governo, o gasto com educação é prioritário.
De acordo com a Constituição Federal, 18% da arrecadação de impostos do Governo Federal líquida de transferências tem que ser aplicada na manutenção e desenvolvimento do ensino e, no caso dos estados e municípios, essa vinculação é de 25% da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências O gasto com a função educação é o gasto mais importante nos estados e municípios, e o terceiro gasto de maior importância no governo federal, fincando atrás apenas do gasto com as funções previdência social e saúde (excluindo dessa conta o pagamento de juros e amortização da divida bem como operações de equalização de juros).
Gráfico 1 – Despesa Primária por Função Municípios, Estados e Governo Federal – 2011 (% do PIB)
Fonte: Balanço Geral da União - gasto liquidado de pessoal, custeio e investimento.
E o que dizer do gasto real por estudante ao longo dos últimos anos? Reproduzo abaixo dados disponíveis na página do INEP. A tabela mostra o gasto real por estudante para todos os níveis de ensino e para níveis diferentes de ensino. Há alguma dúvida quanto ao crescimento do gasto real por aluno? De 2005 a 2010 mais do que duplicou em termos reais o gasto para todos os níveis de ensino!!!
Tabela 1 – Gasto Real por Aluno – Níveis de Ensino 2000-2011 – R$ de 2011
Fonte: INEP. Dados atualizados pelo INPC.
Agora começa o debate mais complicado. No Brasil, não gastamos pouco com educação, mas o retorno do gasto é pequeno. Sim, esse é um problema. A qualidade do ensino público é ruim e mesmo com a melhora nas últimas edições do teste internacional PISA estamos muito abaixo da média da OCDE. No PISA de 2009, a pontuação do Brasil foi de 401 contra a nota média da OCDE de 496. Os EUA estão bem perto da média da OCDE, mas lá isso é motivo de preocupação e um sinal que o sistema de educação americano está com sérios problemas. No nosso caso é muito pior.
Como melhorar o resultado do gasto com educação? Aqui não tem reposta fácil e vou recomendar três leituras. Primeiro, o capítulo já citado no post anterior do economista Fernando Veloso (FGV-IBRE) no qual ele mostra que há várias modelos de escola para melhorar o aprendizado dos alunos (clique aqui). Segundo, recomendo no mesmo livro o texto do economista e professor do INSPER, Naércio Menezes, no qual ele mostra que precisamos testar vários modelos de escola e de ensino e avaliar o que funciona antes de replicar essas experiências no âmbito nacional (clique aqui).
Terceiro, recomendo o novo livro do economista Eric Hanushek e co-autores, Endangering Prosperity: A Global View of the American School (2013), no qual eles analisam o problema das escolas americanas. Neste livro os autores mostram que o problema da qualidade da educação nos EUA não é questão de dinheiro, mas muito mais questões ligadas à organização das escolas. Na opinião dos autores, melhorar o ensino não está ligado diretamente ao gasto, mas na promoção de bons professores e retirar das salas de aulas os professores ruins, o que exige um bom sistema de avaliação do resultado dos alunos e professores. Como falou Hanushek em um entrevista sobre o livro: “nos países com bom sistema educacional, os professores ruins não ficam na sala de aula por muito tempo”.
Em resumo, o problema com a qualidade da nossa educação não parece ser a falta de recursos. E mesmo se o gasto em educação (entre 5,5% a 6% do PIB) permanecer constante, o gasto por estudante aumentará com as mudanças demográficas em curso no Brasil. De acordo com Fábio Giambiagi em um dos seus brilhantes artigos sobre demografia no Valor Econômico:
“Pense-se num crescimento do PIB de 3,5% ao ano, o que pode ser considerado pouco, porém mantido ao longo de 40 anos e com a trajetória populacional prevista, daria uma bela expansão per capita. Ora, como o conjunto de indivíduos de 5 a 14 anos encolherá 1,40% em média a cada ano, a simples manutenção do percentual da despesa em educação no PIB durante 4 décadas vai gerar um aumento da despesa por aluno de nada menos que 596%.”
Acho até que podemos discutir aumentar recursos para educação para contratar melhores professores e colocar crianças em tempo integral nas escolas em bairros e municípios mais pobres. Mas o debate sobre educação, a meu ver, não deveria começar pela expansão do gasto. Ao invés de se comprometer com um gasto com educação de 10% do PIB em 10 anos, o compromisso deveria ser com a qualidade da educação e, em um segundo momento, se discutir a necessidade ou não de mais recurso público direcionado para educação que, no Brasil, já parece ser grande quando comparado com a média internacional.
Despesa com Educação no Brasil – 3
Algumas pessoas nos comentários dos posts anteriores sobre educação levantaram duas questões: (i) não é justo comparar internacionalmente quanto o país gasta com educação como % do PIB, e (ii) não é justo fazer a comparação de gasto por aluno como % do PIB per capita e o resultado medido por testes internacionais como o PISA.
Por exemplo, o Brasil gastou com educação primária por aluno, em 2009, o equivalente a 20% de sua renda per capita e teve uma nota no PISA para matemática de 385,8. A Finlândia gastou com educação primária por aluno no mesmo ano 20,5% da sua renda per capita e teve uma nota em matemática de 540,5 pontos. Assim, por essa simples comparação, a educação primária na Finlândia seria muito mais eficiente.
Mas de fato essa medida não é muito boa, pois o mesmo porcentual do PIB per capita gasto com educação por aluno no Brasil e Finlândia são números muito diferentes. Para os dados de 2009, esse percentual de 20% do PIB per capita era US$ 1.687,6 no Brasil e US$ 9.194,1 na Finlândia, pois o PIB per capital da Finlândia em 2009, era 5,3 vezes maior que o do Brasil.
OK, mas e se olharmos apenas para o dado de gasto por aluno nas escolas brasileiras e o resultado dos testes aplicados aqui? Neste caso é possível ver uma correlação positiva entre gasto por aluno no primário e as notas em testes de avaliação? Os economistas Cláudio Ferraz, Frederico Finan e Diana Moreira (2009) fizeram isso em um dos seus textos (ver indicação abaixo). Reproduzo o gráfico 3 deste texto. Como se observa, não há correlação positiva entre gasto por aluno e resultado nos testes do prova Brasil.
Gráfico – Gasto por Aluno no Primário e Resultado dos Testes de Matemática e Português do Prova Brasil para 4a série – 2005
Fonte: Cláudio Ferraz, Frederico Finan e Diana Moreira (2009). Corrupting Learning: evidence from missing federal education learning in Brazil. TD 562, PUC, Rio de Janeiro. (clique aqui)
Para concluir, quero fazer três observações.Primeiro, acho que um maior gasto por aluno per capita pode ajudar a recuperar o nosso déficit educacional. Essa foi inclusive a lógica do FUNDEF e FUNDEB. Mas como mostra o gráfico acima há uma dispersão muito grande no resultado do gasto com por aluno no Brasil.
Segundo, de acordo com uma consulta que fez Gustavo Ioschpe ao INEP (clique aqui), no Brasil, haviam 5 milhões de trabalhadores na educação em 2010, sendo 2 milhões de professores e 3 milhões de não professores. Ou seja, para cada professor havia 1,5 funcionário. Na OCDE, a relação entre funcionários e professores em seus países-membros é de 0,43. Se nossa relação aqui fosse a mesma de lá, segundo Ioschpe:
“Se o Brasil tivesse a mesma relação professor/funcionário dos países desenvolvidos, haveria 706.000 funcionários públicos no setor, em vez dos 2,4 milhões que temos. Como é difícil imaginar que precisemos de mais funcionários que as bem-sucedidas escolas dos países desenvolvidos, isso faz com que tenhamos 1,7 milhão de pessoas excedentes no sistema educacional”.
Terceiro e último ponto, embora faça algum sentido compara gasto per capita com saúde e educação entre países, nunca conseguiremos com um PIB per capita de US$ 10.500 gastar a mesma coisa que um país desenvolvido.
A titulo de exemplo, para dados de 2009, se fôssemos gastar por aluno com educação primária no Brasil o mesmo que a Finlândia a conta seria: US$ 9.100 para cada um dos 15,2 milhões de estudantes no ensino primário, uma conta de US$ 140 bilhões, ou de 8,6% do PIB. Como o gasto com educação primária no Brasil é apenas 32% do gasto total, isso significa um gasto total com educação de 27% do PIB.
E se em cima dessa conta colocássemos o gasto com saúde padrão Inglaterra, a conta ficaria ainda maior. O gasto per capita com saúde no Brasil é de US$ 1.000 e, na Inglaterra, é de 3.500. Isso significaria que se fôssemos gastar per capita com saúde o mesmo que a Inglaterra, precisaríamos de 32% PIB.
O gasto público total no Brasil incluindo Juros, segundo o FMI, foi de 40% do PIB, em 2012; um dos três maiores da América Latina (os outros são Argentina e Venezuela). Se hoje quiséssemos ter o mesmo gasto per capita de educação primária da Finlândia com o gasto per capita de saúde da Inglaterra apenas essas duas contas seria de 59% do PIB.
Por isso que Peter Lindert fala em paradoxo de Robin Hood em políticas sociais: são os países mais ricos que podem gastar mais com saúde, educação e transferência de renda e não os mais pobres. Quanto mais ricos ficarmos, mais poderemos gastar com educação e saúde em valor real per capita. Por enquanto, a demografia vai nos ajudar na educação mas vai pesar na saúde.