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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Regime militar: desencontros Brasil-China - Elio Gaspari

O caso dos nove chineses

Elio Gaspari
O Globo, 2/07/2014

No dia 16 chega ao Brasil o presidente da China, Xi Jinping. Ele governa uma ditadura de vitrine, a segunda economia do mundo, e é o maior parceiro comercial de Pindorama.
Semanas depois, chegará às livrarias O caso dos nove chineses, dos jornalistas Ciça Guedes e Murilo Fiuza de Melo, um magnífico trabalho de pesquisa histórica onde está contada a história de um episódio de vergonhosa marquetagem e histeria do amanhecer da ditadura.
Aconteceu o seguinte:
No dia 3 de abril de 1964, logo depois da deposição do presidente João Goulart, a polícia do governador Carlos Lacerda prendeu no Rio de Janeiro nove cidadãos chineses. Perigosos agentes, comandavam uma rede de 191 pessoas, tinham agulhas envenenadas, bombas teleguiadas e uma lista de personalidades que deveriam ser assassinadas durante a revolução comunista.
Tudo mentira. Dois eram jornalistas da agência estatal e estavam no Brasil desde 1961. Quatro haviam chegado em junho de 1963 para tratar de uma exposição comercial e três vieram em janeiro de 1964, para comprar algodão.
Todos tinham vistos oficiais. Começaram a apanhar no momento da prisão, em suas casas, e depois alguns deles foram espancados pela polícia. Tiveram os apartamentos saqueados e as contas confiscadas (R$ 865 mil em dinheiro de hoje.)
No dia 16, quando Xi Jinping descer em Brasília, completam-se 50 anos dos dias em que os nove chineses estavam trancados em quartéis. Só puderam escrever para as famílias dois meses depois. Só receberam a visita das mulheres (vigiadas por 32 agentes), em agosto.
“O caso dos nove chineses” conta uma história de acovardamento da qual emerge, altaneiro, o advogado Sobral Pinto, que aceitou a defesa dos presos. A Sobral juntaram-se intelectuais como Augusto Frederico Schmidt e jornalistas como Antonio Callado e Carlos Heitor Cony. (Seus destemidos artigos da época, publicados no livro “O ato e o fato”, foram reeditados há pouco.)
Como era tudo mistificação, violência e histeria, em poucos meses o governo ficou com uma batata quente nas mãos. Condenara os chineses a dez anos de prisão, enfrentava uma campanha internacional e não tinha como se explicar. Em fevereiro de 1965, eles foram expulsos e recebidos como heróis em Pequim.
Aí o jogo virou. Desde então, o Império do Meio mostra que tem memória. Não cria caso, mas não esquece. Sempre que surge a ocasião, refere-se ao “contencioso” do episódio. Cinco dos nove estão vivos.
Um deles tornou-se diretor da agência de notícias para a qual trabalhava, outro dirigiu a área de América Latina do Ministério das Relações Exteriores e foi embaixador em Moçambique e Angola. Wang Yaoting chegou a presidente do Conselho para a Promoção do Comércio Internacional. Em 1979, quando o general João Figueiredo visitou a China, ele conversou com um brasileiro:
— Morei um ano no Rio.
— Então o senhor deve conhecer bem o Brasil.
— Conheço muito pouco, porque fiquei aquele ano quase todo preso.
Foram-se os militares, vieram Sarney, Collor, Itamar, Fernando Henrique, Lula e Dilma. Os tempos seriam outros. Talvez, mas até hoje o Império do Meio não recebeu satisfação pelo que sucedeu aos seus cidadãos, nem o dinheiro de volta. Mais: em 1997 (governo Fernando Henrique), um dos jornalistas tentou vir ao Brasil com a mulher, mas não conseguiu visto.

Elio Gaspari é jornalista

Decreto bolivariano dos sovietes companheiros: a Camara deveria rejeita-lo...

Vamos ver se o fará...
Paulo Roberto de Almeida 
Henrique Alves, presidente da Câmara: ele diz que decreto 8.243 fere prerrogativas do Congresso
Henrique Alves, presidente da Câmara: ele diz que decreto 8.243 fere prerrogativas do Congresso. Que o Parlamento reaja!
O presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), deve pôr em votação nesta quarta o Decreto Legislativo da Câmara que torna sem efeito o decreto presidencial 8.243 — aquele arroubo bolivariano de Dilma Rousseff —, que submete, ainda que de forma oblíqua, as decisões do governo federal a conselhos populares. Trata-se de uma óbvia usurpação dos poderes do Congresso pelo Executivo. Já tratei do assunto aqui muitas vezes. A Constituição estabelece, sim, a participação direta da população por meio de três instrumentos: plebiscitos, referendos e emendas de iniciativa popular. Os conselhos, na forma como quer o decreto de Dilma, simplesmente substituem a democracia representativa pela democracia direta.
Folha, afirmou Alves: “O decreto está em desarmonia com o princípio da separação dos Poderes, pois ao Congresso Nacional cabe, precipuamente, formulação de políticas públicas, por meio de lei, após amplo debate entre todas as forças políticas — da situação e da oposição — sobre as mais diversas demandas de todos e quaisquer grupos da sociedade, alinhados ou não, ao governo”. É só uma questão de bom senso.
Nesta terça, Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, esteve com Alves. O deputado voltou a defender a retirada do texto, mas o governo deixou claro que não negocia. OI presidente da Câmara lamentou: “Esperava compreensão do governo, mas não foi possível”.
Não custa lembrar trechos do monstrengo dilmiano. O Artigo 1º do decreto estabelece: “Fica instituída a Política Nacional de Participação Social – PNPS, com o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil”. Sei… O Inciso II do Artigo 3º sustenta ainda que uma das diretrizes do PNPS é a“complementariedade, transversalidade e integração entre mecanismos e instâncias da democracia representativa, participativa e direta”.
Certo! Então os conselhos seriam uma forma de democracia direta, né? Só que é a democracia direta que se realiza à socapa, sem que ninguém saiba. Ou o “cidadão” decide fazer parte de algum “coletivo” ou “movimento social” ou não vai participar de coisa nenhuma. O texto tem o topete de definir o que é sociedade civil logo no Inciso I do Artigo 2º: “o cidadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”. Ou por outra: é sociedade civil tudo aquilo que o poder decidir que é; e não é o que ele decidir que não é.
Fim da propriedade privada
Como observei numa coluna na Folha, O “indivíduo” só aparece no decreto para que possa ser rebaixado diante dos “coletivos” e dos “movimentos sociais institucionalizados” e “não institucionalizados”, seja lá o que signifiquem uma coisa, a outra e o seu contrário. Poucos perceberam que o decreto institui uma “justiça paralela” por intermédio da “mesa de diálogo”, assim definida: “mecanismo de debate e de negociação com a participação dos setores da sociedade civil e do governo diretamente envolvidos no intuito de prevenir, mediar e solucionar conflitos sociais”.

Ai, ai, ai… Como a Soberana já definiu o que é sociedade civil, podemos esperar na composição dessa mesa o “indivíduo” e os movimentos “institucionalizados” e “não institucionalizados”. Se a sua propriedade for invadida por um “coletivo”, por exemplo, você poderá participar, apenas como uma das partes, de uma “mesa de negociação” com os invasores e com aqueles outros “entes”. Antes que o juiz restabeleça o seu direito, garantido em lei, será preciso formar a tal “mesa”…
Isso tem história. No dia 19 de fevereiro, o ministro Gilberto Carvalho participou de um seminário sobre mediação de conflitos. Com todas as letras, atacou a Justiça por conceder liminares de reintegração de posse e censurou o Estado brasileiro por cultivar o que chamou de “uma mentalidade que se posiciona claramente contra tudo aquilo que é insurgência“. Ou por outra: a insurgência lhe é bem-vinda. Parece que ele tem a ambição de manipulá-la como insuflador e como autoridade.
Vocês se lembram do “Programa Nacional-Socialista” dos Direitos Humanos, de dezembro de 2009? É aquele que, entre outros mimos, propunha mecanismos de censura à imprensa. Qual era o Objetivo Estratégico VI? Reproduzo trecho:
“a- Assegurar a criação de marco legal para a prevenção e mediação de conflitos fundiários urbanos, garantindo o devido processo legal e a função social da propriedade.
(…)
d- Propor projeto de lei para institucionalizar a utilização da mediação como ato inicial das demandas de conflitos agrários e urbanos, priorizando a realização de audiência coletiva com os envolvidos (…) como medida preliminar à avaliação da concessão de medidas liminares (…)”


Eleicoes 2014: comecou a campanha encoberta dos neobolcheviques - Reinaldo Azevedo

Que coisa bonitinha! A coordenação da campanha da presidente Dilma Rousseff resolveu enviar o pré-programa de governo já aprovado pelo partido à lavanderia para ver se ele fica com uma aparência melhorzinha. Segundo informa reportagem de hoje da Folha, sumiram da versão quer chegou à presidente a “democratização da mídia”, que é o outro nome para censura; o “financiamento público de campanha”, que todo mundo sabe no bolso o que é, e a Constituinte exclusiva para fazer a reforma política. Mas Dilma não abre mão, disto não!, da tal democracia direta por meio de conselhos — aquela estrovenga que ela meteu no decreto 8.243 (ver post).

Esses, digamos, “compromissos” estão no documento aprovado pelo PT, e chegou a se noticiar que a presidente havia se comprometido ao menos com a questão da mídia, que é central para o partido. Segundo informa aFolha, Rui Falcão e Franklin Martins (este ainda não se recuperou da demissão da Globo) queriam, sim, incluir no texto final o combate ao tal “monopólio”, mas foram votos vencidos. Afinal, o programa da presidente tem de contar com a aprovação dos demais partidos — e o PMDB, por exemplo, fez um congresso em que se definiu como diretriz o repúdio a qualquer forma de censura.

Será que os defensores da democracia podemos, então, ficar tranquilos caso Dilma seja reeleita? É claro que não! Os absurdos, na forma e no conteúdo, do Decreto 8.243 falam por si. Sem contar que é preciso deixar claro que o PT está em franca mobilização em favor da Constituinte exclusiva e do financiamento público de campanha — e é claro que vai tentar emplacar essa agenda. Aqui e ali já leio colunistas a vender com suas “ideias” que são do partido.

Até porque a campanha está na rua petista. O partido emitiu uma circular a seus filiados em que deixa claro que a prioridade é, sim, a Constituinte exclusiva — aquela mesma que a coordenação de Dilma tirou do programa para não assustar. O texto tem dois links que remetem para as orientações para os diretórios estaduais e para as redes sociais. Vejam:

A circular

comunicado do PT 1

Orientação para os diretórios:

Comunicado do PT 2

Orientação para as redes sociais:

comunicado do PT 3

Quanto à  tal “regulação da mídia”, que fique claro: todos os documentos oficiais do PT consideram essa uma pauta prioritária. O fato de o tema eventualmente não ser incluído no programa que Dilma vai entregar ao TSE não quer dizer absolutamente nada! De resto, constate-se: o partido decidiu fazer uma lista negra de jornalistas, como é sabido, e seus respectivos nomes costumam frequentar as conversas de alguns ministros do governo Dilma, inconformados com a liberdade de imprensa. Assim, não é verdade que o único controle admitido pela Soberana seja o remoto. Também vale a intimidação.

Para encerrar, destaco: não tenho a boa-vontade de alguns com o dito espírito democrático de Dilma. O Decreto 8.243 deixa claro como ele cede facilmente a tentações. Ademais, no que que concerne à reforma política, o seu programa de governo vai falar em plebiscitos — que podem ser uma boa forma de inflamar a sociedade com apelos demagógicos. Para começo de conversa e para encerrar este artigo, temas dessa natureza sempre vêm a público quando os governos esgotam o seu repertório e já não têm mais como engabelar a sociedade.

Rumos adequados à política externa brasileira na próxima década - Paulo Roberto de Almeida

Uma recompilação das publicações feitas em torno deste texto:

“Rumos adequados à política externa brasileira na próxima década” 
Portland, Maine, 31 Maio 2014, 7 p. 
Texto originalmente preparado a convite do 19° Encontro Nacional de Estudantes de Relações Internacionais (ENERI, 4-7 de junho de 2014, Balneário Camboriú, SC, organizado pela Universidade do Vale do Itajaí.
 Publicado nas colunas de Dom Total (12/06/2014; 
link: http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=4276). 

Revisto inteiramente em Hartford (19/06/2014), com novo título:
Política externa brasileira, presente e futura: o que andou errado, o que se deveria corrigir?”
publicada, sob o título de “Política externa brasileira, presente e futura”, 
em 20/06/2014 no blog Amálgama
(link: http://www.amalgama.blog.br/06/2014/politica-externa-brasileira-presente-e-futura/). 

Dividido em quatro partes para o site do Instituto Millenium; 
publicado sob o título Política externa brasileira, presente e futura: o que andou errado, o que se deveria corrigir?” a partir de 27/06/2014: 
1a. parte: http://www.imil.org.br/artigos/poltica-externa-brasileira-presente-futura-andou-errado-se-deveria-corrigir/
2a. parte: http://www.imil.org.br/artigos/poltica-externa-brasileira-presente-futura-andou-errado-se-deveria-corrigir-parte-ii/ 
3a. parte: http://www.imil.org.br/artigos/poltica-externa-brasileira-presente-futura-andou-errado-se-deveria-corrigir-parte-iii/ 
4a. parte: http://www.imil.org.br/artigos/poltica-externa-brasileira-presente-futura-andou-errado-se-deveria-corrigir-parte-iv/

Going to Canada, to see a beautiful country: 147 years since its creation

Amanha vou visitar o Canadá, um país tranquilo, cujo saldo de benefícios à humanidade é enorme.
Aqui uma matéria sobre o seu estado de espírito atual.
Paulo Roberto de Almeida 

147 Years Since Its Birth, It’s Still Fleur-de-Lis and Maple Leaves for Canada

Today is Canada's 147th birthday and as a present to itself, the country might finally be putting its national identity crisis to rest. Since its birth, America's northern neighbor has been grappling with a conflict between its British and French roots. The residents of its French-speaking province, Quebec, have by and large felt no great deal of affection for their English-speaking countrymen, and have several times attempted to secede. But now, on the occasion of Canada's birthday, that split appears to be healing -- at least in the minds of Quebec residents.

According to a new poll from the Association for Canadian Studies, a Montreal-based think tank, some 64 percent of Quebecois, as natives of Canada's predominantly French-speaking province are known, say they no longer feel the need to choose between allegiance to Quebec and Canada, perhaps signaling the end of Canada's cultural divide.

Quebecois separatism and nationalism have long been defining features of Canadian politics, and Tuesday's finding marks a significant milestone for a region that has often resisted being part of Canada and has agitated for independence. Canadian territory was first colonized by France in the 16th century and remained under the French colonial yoke until 1763. Ever since, New France, now called Quebec, has existed as a distinct culture within Canada. This separate identity has often clashed with the rest of Canada, with its roots as a British colony. That conflict has spawned two popular referendums for independence, in 1980 and 1995, both of which failed.

But even as residents of Quebec are feeling less of a divide between their Canadian and Quebecois loyalties, they aren't exactly rushing into Canada's embrace. When the ACS pollsters asked Quebecois how attached they feel to the rest of Canada, they found that their level of attachment has remained mostly the same over the last 10 years.

For now, Quebec has largely put its ambitions for independence on ice. In April elections, the separatist Parti Quebecois, the main political vehicle for Quebecois nationalism, lost control of the provincial government to the more federally-minded Liberal party. Many observers saw it as a sign of a newfound fondness for Canada among the province's historically antagonistic residents.

Moreover, Quebec's young people aren't hankering for independence. According to the ACS poll, 65 percent of Quebecois between the ages of 18 and 24 say they are strongly or somewhat strongly attached to Canada. This finding is in line with a June poll from ACS that found 61 percent of Quebecois were not interested in separating from Canada.

Though Quebec's independence movement isn't gaining much traction, nationalist sentiment in Quebec is being channeled toward other expressions of the province's French-inspired identity. During its time in power from 2012 to 2014 at the provincial level, the Parti Quebecois pushed projects promoting the French language and religious secularism. Though it died in the provincial legislature, Bill 14 would have mandated that Quebec's business owners advertise in French and restricted the use of English in the workplace. The Parti Quebecois also tried to promote secularism through such things as the Quebec Charter of Values, which, if approved by the legislature, would have banned public employees from wearing religious symbols, such as the Muslim veil, at work.

Despite the dissipation of Quebec's identity crisis, there is still appetite for similar legislation. Among francophone respondents, 54 percent would like to see the charter become a topic of public debate once more after it effectively died with the Liberal party's electoral win.

That public sentiment is having an impact on Quebec's Liberal government. This fall, Premier Philippe Couillard is planning to introduce a diluted version of the charter at the provincial legislature.