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sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Heavy Regulation Hurts the Economy. Just Look at France - Veronique de Rugy (Reason)

 ECONOMY

Yes, Heavy Regulation Hurts the Economy. Just Look at France.

We're often told European countries are better off thanks to big-government policies. So why is the U.S. beating France in many important ways?


It's fashionable to claim that the free market ideas of Nobel laureate economist Milton Friedman have failed the country, and that it's time for new policies. Campaigning in 2020, Joe Biden declared that "Milton Friedman isn't running the show anymore." More recently, New York Times columnist David Leonhardt noted that people like Friedman promised that the free market "would bring prosperity for all. It has not."

This is nonsense. For one thing, I wish we lived in a world fashioned more fully by Friedman's ideas. Sadly, while his insights have indeed influenced some U.S. economic policies, particularly during former President Ronald Reagan's administration, the extent of their implementation has been quite limited.

Friedman, for example, would be appalled that federal debt is now roughly the size of annual gross domestic product (GDP), having grown like a kudzu vine since registering at around 25 percent in the early 1980s. Taxes remain lower since the Reagan revolution took place, but our incomes are often taxed multiple times. Nearly every aspect of our lives is regulated by various agencies—local, state, and national. And—no surprise—cronyism is alive and well.

Still, Friedman's critics are right to treat him as a monumental figure. His ideas helped make trade freer and school choice mainstream. His clarity in contrasting markets with government opened many eyes to the benefits of capitalism. We are immeasurably better off for it. If you don't believe me, look at my native France, where Friedman has had almost no influence.

The French economy is weighed down by one of the heaviest tax levels among wealthy democratic nations, with regressive taxes and social security contributions representing a significant portion of GDP. This tax haul funds France's extensive web of social welfare programs, including health care, education, and pensions.

French regulation is also comprehensive, covering many aspects of employment, business operations, and environmental protection. The labor code is particularly onerous. Additionally, its government plays a direct role in the economy, with a significant number of partially state-owned enterprises and interventionist policies intended to safeguard employment and prioritize equality and social cohesion.

Let's see how they're doing.

U.S. GDP per capita is now $76,398; France's is $40,964. The U.S. unemployment rate is 3.9 percent. As of the second quarter of 2023, France's was 7.2 percent—a relatively low figure for a country that often faces double-digit rates even outside of recession periods. We shouldn't be surprised at any of this, considering France's stringent rules on working hours, dismissals, and employee benefits, which make it difficult for businesses to respond to market conditions. The country is slathered with reasons not to hire people.

Youth unemployment is a significant indicator of how well an economy integrates its young population into the job market. As of May 2023, France's youth unemployment rate was 17.2 percent, with historical data showing an average of 20.6 percent from 1983 until 2023. In November of 2012, it peaked at a Great Depression–like level of 28.20 percent. This is the result of well-documented structural issues distorting France's labor market. Rigid labor laws dissuade employers especially from hiring young, inexperienced workers.

In contrast, in October 2023, the U.S. youth unemployment rate was 8.9 percent. These are not just numbers; they have real implications for young individuals' economic prospects, skills development, and long-term career trajectories. As such, American youth, for all its complaints, is much better off than its French peers are.

Some claim that this is a fair price to pay for France's social cohesion and equity. I don't see it. Over the last decade, France has experienced significant social unrest rooted in economic, political, and social issues. One of the most notable periods of unrest was the yellow vest movement that began in 2018. It was sparked by the announcement of another increase in the fuel tax on top of hundreds of other taxes. It quickly morphed into a broader movement against economic inequality and the cost of living. The protests were marked by widespread demonstrations, some of which turned violent.

France is also renowned for its labor strikes, which often bring millions of protesters onto the streets. The frequency and intensity of these protests underscore the challenges that France faces in balancing economic reforms with social cohesion.

The U.S. isn't perfect. Its social cohesion could certainly be better. But given a choice between an economic system that has been somewhat influenced by Friedman and one that's barely been influenced by him at all, my choice is clear. I made it when I left France and became an American.

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A dupla barbárie na guerra Hamas-Israel e a solução de dois Estados - Sérgio Florêncio (Portal Interesse Nacional)

 A dupla barbárie na guerra Hamas-Israel e a solução de dois Estados

Sérgio Florêncio

Embaixador aposentado


A dupla barbárie - o ataque terrorista do Hamas contra a população civil israelense, com 1200 mortos, além de 240 reféns; e a brutal contraofensiva israelense, com mais de 12 mil mortos em Gaza – poderá abrir caminho à única alternativa viável para a questão palestina: a solução de dois Estados, apresentada pela ONU em 1947, quando da partilha da Palestina. A partir de então, essa solução sempre fracassou, tanto por intransigência israelense como palestina. Diante da devastadora tragédia iniciada em 7 de outubro, diversos líderes mundiais e Estados árabes, por primeira vez, sinalizam apoio à solução de dois Estados. Assim, a superação do impasse passa a depender de dois polos : EUA -Israel versus Irã-Hezbollah-Hamas. 

A primeira solução de dois Estados, proposta pela ONU em 1947, previa 53% da Palestina para os israelenses e 47% para os palestinos, sendo que os primeiros eram apenas 30% da população e os segundos , 70%. Os Estados árabes naquele momento foram terminantemente contrários à partilha. Consideravam a criação do Estado de Israel inaceitável imposição do colonialismo inglês, contrária aos direitos legítimos do povo palestino, e que poderia ser revertida pelas armas, diante da fragilidade militar e demográfica dos israelenses. A consequência foi a guerra de 1948 , surpreendentemente vencida por Israel, que ampliou sua área, passando dos 53%, previstos na partilha definida pela ONU, para 79%, consolidando, dessa forma, sua existência como Estado.

Diversos outros conflitos armados marcaram a rivalidade entre árabes e israelenses, tendo como epifenômeno a questão palestina e como resultado concreto a contínua ampliação do território de Israel. Assim foi na Guerra dos Seis Dias, de 1967, provocada por Israel, assim foi na Guerra do Yom Kippur, de 1973, iniciada por Egito e Síria. Na primeira, Israel ocupou toda a Palestina histórica, objeto da partilha de 1947. Na segunda, os árabes tentaram retomar esses territórios, mas fracassaram, sendo as Colinas de Golan, da Síria, formalmente anexadas a Israel. 

 Paralelamente a esses conflitos em torno da questão palestina, se desenvolviam os processos de paz, com avanços e recuos, mas que nunca chegaram a implantar a solução de dois Estados. 

Os Estados Unidos sempre foram o grande mediador/protagonista nessas negociações, que resultaram em dois Acordos de Paz - Camp David e Oslo - e envolveram, de um lado, Israel e, de outro, os Estados árabes mais influentes, como Egito, Síria, Jordânia, e a Organização para a Libertação da Palestina - OLP, sob a firme e carismática liderança de Yasser Arafat. 

As propostas contidas naqueles acordos de paz, embora contemplassem relativo equilíbrio entre as aspirações de judeus e palestinos, fracassaram, o que explica o clima de permanente tensão e conflito em torno da questão palestina. 

Os Acordos de Camp David de 1978 selaram a paz entre os atores hegemônicos na época - Israel e Egito. A Península do Sinai foi devolvida a esse último, que, em troca, reconhecia a existência do Estado de Israel. Na mesma linha, os acordos Begin-Sadat se referiam à devolução da Cisjordânia e da Faixa de Gaza para as lideranças palestinas. Isso significava ruptura radical com o passado. Nos anos 1950 e 1960, a liderança nacionalista de Nasser, o armamentismo egípcio com ajuda soviética e seu projeto de panarabismo ameaçavam de morte a existência de Israel. Em consequência, fortaleciam sua militarização, a defesa prioritária de suas fronteiras, tendo como desfecho, em 1967, a Guerra dos Seis Dias. 

Entretanto, aquelas promessas de Camp David foram desrespeitadas e só retomadas quinze anos depois, em 1993, com os Acordos de Oslo. Esses estabeleciam que a OLP, liderada por Yasser Arafat, reconhecia a existência de Israel, mas agora em troca de sua retirada da Cisjordânia e da Faixa de Gaza. Tratados complementares a Oslo previam a restituição aos palestinos de todos os territórios ocupados, o que nunca ocorreu. 

Qual a importância dessa revisão histórica para a compreensão da atual guerra entre Hamas e Israel e da possibilidade de, no pós-guerra, prevalecer a solução de dois Estados? A não implementação tanto de Camp David como de Oslo e o avanço dos assentamentos de colonos judeus sobre a Cisjordânia geraram ampla e profunda frustração entre os palestinos. Isso contribuiu para sua radicalização, visível na violência das duas Intifadas, que sepultaram aqueles dois processos de paz e fortaleceram os grupos rebeldes paramilitares apoiados pelo Irã – Hezbollah, Hamas e Jihad Islâmica. 

No plano doméstico, a ascensão política do Likud, dos religiosos ortodoxos e da extrema direita em Israel completava um quadro de polarização interna e externa. O projeto autoritário de poder de Netanyahu não dava margem a dúvidas - seu governo se afastava do jogo democrático ao perseguir o Judiciário; buscava o expansionismo sionista com exclusão da causa palestina; e dividia a sociedade israelense, que ia as ruas com milhões de manifestantes em defesa das instituições democráticas. 

Na vertente externa, a essência do contexto negociador se alterava substancialmente: declínio da importância dos EUA no Oriente Médio; ascensão de da direita radical, com Trump na presidência; e robusta influência política e militar iraniana na região. Os atores relevantes na Guerra dos Seis Dias, na Guerra do Yom Kippur e nas negociações de paz – Egito, Síria, Jordânia e OLP – eram substituídos pelo Irã revolucionário, e seus agentes nas proxy wars – Hamas, Hezbollah, Jihad Islâmica - que desestabilizavam as monarquias do golfo, mas ao mesmo tempo defendiam o status quo na Síria O Irã se afirmava na região e globalmente pelas armas e pelo avanço de seu programa nuclear.

Outra mudança de peso foi a aliança revigorada entre Washington e Tel Avive, visível na decisão crucial de Trump de retirar os EUA do Acordo sobre o Programa Nuclear Iraniano de 2015, arduamente negociado por Obama e aprovado pelos cinco membros permanentes do CSNU mais a Alemanha. A nova estratégia norte-americana se contrapunha ao Irã e tinha como alicerce os Acordos de Abraão, destinados a normalizar as relações de Israel com Bahrein, Emirados Árabes Unidos (EAU), Marrocos e Sudão. Ao mesmo tempo, avançava celeremente a aproximação diplomática Israel-Arábia Saudita. Essa seria, na visão dos países envolvidos, o desfecho de uma modalidade inédita de paz no Oriente Médio, ao selar uma aliança entre o Estado judeu e seus arqui-inimigos do passado no mundo árabe. 

Mas nessa gramática geopolítica, aparentemente exitosa, havia um sujeito oculto – o povo palestino. Enquanto os acordos de paz anteriores – Camp David e Oslo – tinham como centro a questão palestina, a estratégia de Trump fragilizava as lideranças moderadas palestinas (Fatah e Autoridade Nacional Palestina – ANP) e buscava uma paz top down, alicerçada na normalização das relações árabe-israelenses. 

Netanyahu consolidava essa estratégia de Trump, que considerava a questão palestina como integrante de um irrelevante coeteris paribus. Como Primeiro Ministro, controlava o Parlamento - em aliança com o Likud, as lideranças religiosas e a extrema direita - ao mesmo tempo que procurava neutralizar o Judiciário e, assim, eliminar a democracia israelense. Diante da alternativa entre identidade judaica ou democracia liberal, Netanyahu optou pela primeira, tendo como instrumento o Estado unitário, ou seja, o antípoda da solução de dois Estados. 

O braço direito dessa estratégia consistia em desacreditar o Fatah e a Autoridade Palestina, por meio do avanço exponencial dos assentamentos de colonos judeus na Cisjordânia ( cerca de 468 mil , segundo levantamento de 2022 da CIA) e em Jerusalém ( cerca de 262 mil). O outro braço era manter o Hamas sob controle, ao facilitar o fluxo de recursos do Catar para o grupo paramilitar e ao liberar residentes da Faixa de Gaza para trabalharem em Israel.

Assim, um transfigurado acordo de paz entre elites regionais estava em curso. Ao colocar entre parênteses ou jogar para escanteio a questão palestina, o objetivo era estabilizar a região, o que significava ameaçar a hegemonia do Irã e a razão de existir de seus procuradores regionais – Hezbollah e Hamas. Era uma transfiguração com os três pilares políticos acima indicados – revigorada aliança EUA-Israel; normalização das relações entre Israel e Estados árabes; e inexorável fragilização do Fatah e da Autoridade Palestina, por meio de mais de 700 mil assentamentos judeus na Cisjordânia e em Jerusalém. O preço da estratégia era uma paz de cemitério, com o sepultamento da questão palestina. 

Desdobramentos do processo acima descrito estarão na dependência do desfecho do conflito Hamas – Israel e da desafiadora gestão do pós-guerra. Parece provável que Israel esteja próximo de alcançar seu objetivo da eliminação militar do Hamas e da desmilitarização da Faixa de Gaza. Caso esse cenário se consolide, a pressão internacional para a solução de dois Estados assumirá supremacia, com o respaldo das duas superpotências, da Rússia e da União Europeia. 

É evidente que a continuidade da guerra beneficia China e Rússia . Os EUA saem fragilizados, porque são forçados a destinar vultosos recursos materiais e humanos para dois conflitos simultâneos de grandes proporções – Faixa de Gaza e Ucrânia . Mas o custo humanitário de estimular a barbárie seria brutal para China e Rússia. Por isso mesmo, a primeira votou a favor e a segunda se absteve na Resolução articulada pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU, apoiada por 12 dos 15 membros e vetada pelos EUA. Esse contexto geopolítico global favorece a solução de dois Estados.

 Entretanto, o avanço nessa direção dependerá de duas variáveis domésticas decisivas. A primeira é de fácil previsibilidade – a queda de Netanyahu no day after do conflito e a emergência de um governo de coalizão com maioria liberal. A segunda variável é extremamente difícil. Exigirá uma engenharia política e de segurança de alto risco em termos de coesão interna e de estabilidade social. Como proceder ao êxodo dos 700 mil israelenses que hoje ocuparam a Cisjordânia e Jerusalém, com o estímulo do governo de Israel e o beneplácito de Trump? Em sua maioria são colonos aliados de Netanyahu, integrantes da ortodoxia religiosa e da extrema direita antidemocrática. Em outros termos, como desmontar, numa democracia, o poderoso Cavalo de Troia montado por Netanyahu para dividir o país e bloquear a solução de dois Estados? 

Além desses obstáculos, o modelo de dois Estados exigirá, no day after do conflito, uma complexa gestão política, administrativa e de segurança. Que conformação terá o novo Estado Palestino para gerir, de forma sustentável, um território devastado pela contraofensiva militar israelense? Poderá Israel assumir temporariamente, como vem indicando Netanyahu, no imediato pós-guerra, a administração da Faixa de Gaza virtualmente destruída? Poderá uma Força de Paz da ONU, integrada também por nacionais de países árabes, construir pontes, moldar a transição para o almejado Estado palestino e, assim, consolidar a solução de dois Estados?

 Embora de difícil concretização, o modelo de dois Estados é o único capaz de trazer paz duradoura para a dividida sociedade israelense e alívio prolongado para o sofrido povo palestino. Apesar dos obstáculos hercúleos e dos enigmas comparáveis aos do oráculo de Delfos, a solução de dois Estados ganha momento no plano internacional e doméstico. Conta com a poderosa adesão das grandes potências, com o apoio da opinião pública nas sociedades democráticas, com os milhões de manifestantes nas ruas de Israel e com a resiliência das instituições representativas - pilares da democracia israelense. Talvez aqui seja válida a conhecida frase atribuída a Victor Hugo. “Nada é tão poderoso como uma ideia cujo tempo chegou”. 

 

Sérgio Florêncio

Brasília, 30 de novembro de 2023

Portal da revista Interesse Nacional


Materiais para leitura de Candidatos à Carreira Diplomática - Paulo Roberto de Almeida (Blog Diplomatizzando)

 Materiais para leitura de Candidatos à Carreira Diplomática

Compilação: 

Paulo Roberto de Almeida

Blog Diplomatizzando 

 

Discurso do Ministro Mauro Vieira por ocasião do Dia do Diplomata - Brasília, 21 de novembro de 2023: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/discurso-do-ministro-mauro-vieira-por.html

 

Intervenção do Ministro Mauro Vieira no Debate de Alto Nível do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a situação no Oriente Médio, inclusive a Questão Palestina - 29 de novembro de 2023 - Nova York: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/intervencao-do-ministro-mauro-vieira-no.html

 

- COP-28: o que esperar do Brasil na Cúpula do Clima? - Paula Ferreira (O Estado de S. Paulo): https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/cop-28-o-que-esperar-do-brasil-na.html

 

- “Grave Crise Regional” (Venezuela-Guiana) – Rubens Barbosa (O Estado de S. Paulo): https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/venezuela-guiana-grave-crise-regional.html

 

- “A dupla barbárie na guerra Hamas-Israel e a solução de dois Estados” - Sérgio Florêncio: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/a-dupla-barbarie-na-guerra-hamas-israel.html

 

- “O legado de Henry Kissinger” - Paulo Roberto de Almeida (1 junho 2008, Meridiano 47): https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/o-legado-de-henry-kissinger-2008.html

 

- “Henry Kissinger era um hipócrita, e seu legado é a prova” – Ben Rhodes (NYT, O Estado de S. Paulo): https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/henry-kissinger-era-um-hipocrita-e-seu.html

 

- Death of a Diplomat Henry Kissinger, 1923-2023 (The Washington Post): https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/death-of-diplomat-henry-kissinger-1923.html


- "Henry Kissinger ignorou violações de direitos humanos, se aproximou de ditadura e colocou Brasil na posição de aliado principal dos EUA" - Matias Spektor, entrevista: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/henry-kissinger-ignorou-violacoes-de.html

 

- “La Doctrina Monroe, 200 años después” – Reginaldo Nasser (Nueva Sociedad): https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/12/la-doctrina-monroe-200-anos-despues.html  


- Xi Jinping retraça a história das relações sino-americanas em mais de um século: https://diplomatizzando.blogspot.com/2023/11/xi-jinping-retraca-historia-das.html

 

Brasil assume presidência do G20 - Brics Policy Center

 

Brasil assume presidência do G20

BRICS Policy Center

Hoje, dia 01 de dezembro, o Brasil assume a presidência do G20 com o lema ‘Construindo um mundo justo e um planeta sustentável’. A presidência brasileira terá como prioridades o combate à fome, à pobreza e à desigualdade, as mudanças climáticas e transição energética, e a reforma da governança global. A implementação dessa agenda pelo governo brasileiro contará com o apoio de dois outros países BRICS: a Índia, última ocupante da presidência, e a África do Sul que assumirá a presidência em 2025. O BRICS Policy Center terá participação ativa nas atividades do G20 através da sua atuação no T20 (grupo de engajamento de think tanks e outros centros de pesquisa dos países do G20) e do diálogo constante organizações da sociedade civil, em particular C20, bem como outros grupos de engajamento.

 

Com isso, o BPC pretende contribuir para um processo participativo e formativo durante a presidência brasileira do G20, em permanente diálogo com a sociedade, com vistas a buscar soluções para problemas globais comuns.


COP-28: o que esperar do Brasil na Cúpula do Clima? - Paula Ferreira O Estado de S. Paulo

 COP-28: o que esperar do Brasil na Cúpula do Clima?

Paula Ferreira

O Estado de S. Paulo, 1/12/2023

 

Queda do desmate na Amazônia será argumento para obter dinheiro de nações ricas e liderar grupo de países florestais, mas hesitação sobre exploração petrolífera atrai desconfiança O Brasil chega à Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-28) em Dubai com o objetivo de ganhar protagonismo na agenda ambiental, em um ano simbólico na piora do aquecimento global. 

 

Segundo a ONU, já é possível dizer que 2023 foi o ano mais quente já registrado - pelo menos até agora. O planeta assistiu nos últimos meses a uma série de eventos climáticos extremos - como incêndios na Europa e no Havaí, ciclones no Sul e seca recorde no Amazonas -, agravados pelo El Niño. O governo federal defenderá metas mais ambiciosas de redução de emissões de gases estufa e irá atrás de dinheiro para proteção florestal.

 

 As últimas conferências climáticas acumularam tentativas frustradas de ampliar a ajuda financeira das nações desenvolvidas a países pobres, mas o anúncio de um acordo seguido de doações para um fundo de desastres ambientais, anunciado nessa quinta-feira, 30, renovou esperanças para este ano. Além disso, a delegação brasileira levará números positivos no combate ao desmatamento da Amazônia e um plano com foco na economia verde. Isso somado ao esforço de mostrar o compromisso sustentável do nosso agronegócio, um dos principais motores do nosso PIB. Por outro lado, a gestão Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terá de driblar questionamentos sobre os planos de explorar petróleo na Margem Equatorial da Foz do Amazonas e a crescente pressão sobre o Cerrado, onde o governo não tem conseguido frear o desmate. 

 

Missão 1,5º C 

O Acordo de Paris, de 2015, prevê manter a alta da temperatura média global abaixo de 2ºC (preferencialmente até 1,5ºC) ante os níveis pré-industriais. Para isso, os países signatários assumiram metas de reduzir emissões de gases de efeito estufa. Nesta COP, será apresentado o Balanço Global do Acordo para mostrar o que foi feito e preparar o cenário para a COP-30, que será realizada em 2025 em Belém, quando os governos deverão apresentar novas metas. O Brasil vai defender metas mais ousados, de modo a não superar o teto de 1,5ºC. “O Acordo de Paris não está dando conta da tarefa” disse ao Estadão a secretária nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni. “O Brasil chega de cabeça em pé. Se vamos liderar pelo exemplo, temos mais moral para cobrar dos outros.” 

 

Fundo de proteção florestal 

Uma das principais apostas da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, é propor um novo modelo de financiamento global para quem preservar suas florestas. A proposta é que os países florestais sejam pagos por hectare de bioma preservado e pode beneficiar 80 nações com florestas, como Brasil, Colômbia, Indonésia e Congo. A ideia é que seja diferente do Fundo Amazônia e seja gerido por uma instituição financeira multilateral. Os países ricos têm resistido a ampliar mecanismos de repasses de verbas a nações pobres, tema que emperrou as negociações nos últimos encontros. Na abertura desta cúpula, porém, houve uma sinalização positiva. Um grupo de nações ricas anunciou nesta quarta, 30, a destinação de mais de US$ 400 milhões (quase R$ 2 bilhões) para colocar em operação o fundo climático de perdas e danos, que vai financiar medidas de adaptação dos países mais pobres ao aquecimento global.

 O consenso logo na largada é “inédito na história das COPs”, segundo o negociador-chefe do Itamaraty, o embaixador André Corrêa do Lago. Desmate cai na Amazônia, mas fogo preocupa A taxa de desmatamento da Amazônia teve queda de 22% em um ano, após um período de escalada da devastação da floresta na gestão Jair Bolsonaro (PL). Para especialistas, a retomada do plano de combate aos crimes ambientais adotado na 1.ª gestão Lula e o aumento da fiscalização ajudaram nesse resultado. Daqui para frente, porém, o desafio é bem mais complexo. Será preciso enfrentar uma rede de crimes ambientais em que já foram mapeadas 22 facções criminosas, entre elas o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho. Além disso, a estiagem histórica seguida por um número recorde de incêndios no Amazonas expõe falhas no planejamento do governo na resposta aos eventos climáticos extremos. A própria gestão Lula admitiu que o número de brigadistas era insuficiente para dar conta do problema, agravado pelo El Niño, cujos efeitos graves eram alertados pelos cientistas desde o começo do ano. 

 

Não é só floresta 

Mas não é só a Amazônia que demanda atenção. O avanço da destruição no Cerrado, por exemplo, ameaça o equilíbrio hidrológico do País e a sustentabilidade do agronegócio, o principal motor da economia na última década. “Não dá para deixar só a Amazônia cumprir meta em nome do Brasil”, diz Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, voltada para a ação climática. O Cerrado é essencial para o equilíbrio hidrológico e para a agropecuária, que tem na região alguns dos seus principais negócios, como gado e soja. Na Amazônia, quase toda a destruição é ilegal e grande parte se concentra em áreas federais, como reservas indígenas e unidades de conservação. 

Já no Cerrado, há significativa perda em propriedade privadas e com aval de autoridades locais, o que torna a estratégia antidesmate mais complexa. O avanço dos desequilíbrios ambientais também evidencia a fragilidade de outros biomas. O Pantanal, por exemplo, ainda se recupera do número recorde de queimadas em 2020 e viu, em novembro, uma onda de incêndios que voltou a destruir refúgios de onças-pintadas. Após apresentar planos de combate ao desmatamento para a Amazônia e o Cerrado, o governo promete documentos similares para a Mata Atlântica, o Pantanal e os Pampas até o 1º semestre do ano que vem. 

 

Exploração de petróleo 

A oscilação de Lula sobre os planos de explorar petróleo na Margem Equatorial do Amazonas põe em risco suas pretensões de se firmar como uma liderança climática. O projeto divide o governo internamente. A área ambiental resiste em conceder licenças para que a Petrobras pesquise petróleo na região. Já a pasta de Minas e Energia defende fazer o estudo com o propósito de extrair o recurso. Em falas recentes, o presidente minimiza a controvérsia. “É uma exploração a 575 quilômetros à margem do (Rio) Amazonas. Não é uma coisa que está vizinha do Amazonas”, afirmou o petista, em setembro. A Margem Equatorial não está na floresta, mas se estende por mais de 2,2 quilômetros de litoral do Amapá ao Rio Grande do Norte. Naquela região, a Guiana também espera lucrar com a exploração de petróleo. 

Na Cúpula de Belém, em junho, o governo recursou a proposta do presidente colombiano, Gustavo Petro, de incluir no documento assinado pelas nações amazônicas o compromisso de não abrir novas frentes de exploração de combustíveis fósseis na região. “É uma posição importante que o Brasil terá de encarar, porque ninguém é líder global da agenda, ou se coloca como guardião do 1,5ºC falando só de desmatamento. É preciso posição firme para o mundo inteiro e dar exemplo em casa” , afirma o secretário executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini. 

 

Plano de transição ecológica 

Capitaneado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o Plano de Transição Ecológica, que pretende impulsionar o Brasil na disputa por espaços na economia verde. Haverá seis eixos: finanças sustentáveis, economia circular, adensamento tecnológico, bioeconomia, transição energética e adaptação à mudança do clima. Entre outros pontos, a proposta de Haddad é criar linhas de crédito voltada para o desenvolvimento de alternativas sustentáveis e a criação de um mercado regulado de carbono. 

O plano será apresentado nesta sexta-feira, 1º, durante a Conferência do Clima. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação também vai lançar cinco editais do programa Mais Inovação Brasil, em um total de R$ 20,85 bilhões, com foco nas áreas do plano de Haddad.

 

https://www.estadao.com.br/sustentabilidade/cop-28-o-que-esperar-do-brasil-na-cupula-do-clima/

 

quinta-feira, 30 de novembro de 2023

Henry Kissinger era um hipócrita, e seu legado é a prova - Ben Rhodes (NYT; O Estado de S. Paulo)

Henry Kissinger era um hipócrita, e seu legado é a prova

Ben Rhodes (NYT)
O Estado de S. Paulo, 30/11/2023


'Política externa defendida pelo ex-secretário de Estado não tinha preocupação com seres humanos deixados em seu rastro', escreve ex-vice-conselheiro de segurança nacional dos EUA.
https://www.estadao.com.br/internacional/henry-kissinger-era-um-hipocrita-e-seu-legado-e-a-prova-leia-a-analise/?utm_medium=newsletter&utm_source=salesforce&utm_campaign=manchetes&utm_term=20231130&utm_content=


THE NEW YORK TIMES - Henry Kissinger, que morreu na quarta-feira, era o exemplo vivo da lacuna entre a história que os Estados Unidos, a superpotência, conta e a maneira como os EUA agem no mundo. Por vezes oportunista e reativa, a política externa defendida por Kissinger era apaixonada pelo exercício do poder e sem preocupação com os seres humanos deixados em seu rastro. Justamente porque os Estados Unidos de Kissinger não eram a versão maquiada da “cidade na colina”, ele nunca se sentiu irrelevante: ideias entram e saem de moda, mas o poder não.

De 1969 a 1977, Kissinger se estabeleceu como um dos funcionários mais poderosos da história. Durante uma parte desse período, ele foi a única pessoa a ocupar simultaneamente os cargos de conselheiro de segurança nacional e secretário de Estado, dois postos muito diferentes que o tornaram responsável por moldar e executar a política externa americana. Se suas origens judaico-alemãs e seu inglês carregado o diferenciavam, a facilidade com que exercia o poder fez dele um avatar natural para um estado de segurança nacional americano que cresceu e ganhou impulso ao longo do século XX, como um organismo que sobrevive ao se expandir.

Trinta anos depois que Kissinger se aposentou no conforto do setor privado, servi por oito anos em um aparato de segurança nacional maior, pós-Guerra Fria e pós-11 de setembro. Como assessor adjunto de segurança nacional, com responsabilidades que incluíam a redação de discursos e comunicações, meu trabalho muitas vezes se concentrava mais na história que os Estados Unidos contavam do que nas ações que tomávamos.

Na Casa Branca, você está no topo de uma estrutura que inclui as Forças Armadas e a economia mais poderosas do mundo e, ao mesmo tempo, detém os direitos de uma história radical: “Consideramos estas verdades evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais”.

Mas eu era constantemente confrontado com as contradições embutidas na liderança americana, o conhecimento de que nosso governo arma autocratas enquanto sua retórica apela para os dissidentes que tentam derrubá-los ou que nossa nação impõe regras - para a condução da guerra, a resolução de disputas e o fluxo do comércio - enquanto insiste que os Estados Unidos sejam dispensados de segui-las quando elas se tornam inconvenientes.

Kissinger não se sentia desconfortável com essa dinâmica. Para ele, a credibilidade estava enraizada no que se fazia, não no que se defendia, mesmo quando essas ações anulavam os conceitos americanos de direitos humanos e direito internacional. Ele ajudou a estender a guerra no Vietnã e a expandi-la para o Camboja e o Laos, onde os Estados Unidos lançaram mais bombas do que na Alemanha e no Japão na 2ª Guerra Mundial.

Esses bombardeios - muitas vezes com massacre indiscriminado de civis - não contribuíram em nada para melhorar os termos em que a Guerra do Vietnã terminou; na verdade, apenas indicou até que ponto os Estados Unidos chegariam para expressar seu descontentamento com a derrota.

É irônico que esse tipo de realismo tenha atingido seu ápice no auge da Guerra Fria, um conflito que era ostensivamente sobre ideologia. Do lado do mundo livre, Kissinger apoiou campanhas genocidas - do Paquistão contra os bengaleses e da Indonésia contra os timorenses. No Chile, ele foi acusado de ajudar a preparar o terreno para um golpe militar que levou à morte de Salvador Allende, o presidente esquerdista eleito, dando início a um terrível período de governo autocrático.

A defesa generosa é que Kissinger representava um ethos que via os fins (a derrota da União Soviética e o comunismo revolucionário) como justificativa para os meios. No entanto, para grandes áreas do mundo, essa mentalidade trazia uma mensagem brutal que os Estados Unidos sempre transmitiram às suas próprias populações marginalizadas: nós nos preocupamos com a democracia para nós, não para eles. Pouco antes da vitória de Allende, Kissinger disse: “As questões são importantes demais para que os eleitores chilenos decidam por si mesmos”.

Será que tudo valeu a pena? Kissinger estava obcecado com a credibilidade, a ideia de que os Estados Unidos devem impor um preço àqueles que ignoram nossas exigências para moldar as decisões de outros no futuro. É difícil ver como o bombardeio do Laos, o golpe no Chile ou os assassinatos no Paquistão Oriental (atual Bangladesh) contribuíram para o resultado da Guerra Fria.

Mas a visão não sentimental de Kissinger sobre os assuntos globais permitiu que ele conseguisse avanços consequentes com países autocráticos mais próximos da estatura dos Estados Unidos - uma distensão com a União Soviética que reduziu o ímpeto de escalada da corrida armamentista e uma abertura para a China que aprofundou a divisão sino-soviética, integrou a República Popular da China à ordem global e antecedeu as reformas chinesas que tiraram centenas de milhões de pessoas da pobreza.

O fato de essas reformas terem sido iniciadas por Deng Xiaoping, o mesmo líder chinês que ordenou a repressão aos manifestantes na Praça Tiananmen, mostra a natureza ambígua do legado de Kissinger. Por um lado, a aproximação entre os EUA e a China contribuiu para o fim da Guerra Fria e melhorou os padrões de vida do povo chinês. Por outro lado, o Partido Comunista Chinês emergiu como o principal adversário geopolítico dos Estados Unidos e a vanguarda da tendência autoritária na política global, colocando um milhão de uigures em campos de concentração e ameaçando invadir Taiwan, cuja situação não foi resolvida pela diplomacia de Kissinger.

Kissinger viveu metade de sua vida depois de deixar o governo. Ele abriu o que se tornou uma trilha bipartidária de ex-funcionários que criaram empresas de consultoria lucrativas enquanto negociavam com contatos globais. Durante décadas, ele foi um convidado cobiçado em reuniões de estadistas e magnatas, talvez porque sempre pudesse fornecer uma estrutura intelectual para explicar por que algumas pessoas são poderosas e justificam o exercício do poder.

Escreveu uma prateleira de livros, muitos dos quais poliram sua própria reputação como oráculo dos assuntos globais; afinal, a história é escrita por homens como Henry Kissinger, não pelas vítimas das campanhas de bombardeio das superpotências, incluindo as crianças do Laos, que continuam a ser mortas pelas bombas que não explodiram e que cobrem seu país.

Você pode optar por ver essas bombas não detonadas como a tragédia inevitável da condução dos assuntos globais. Do ponto de vista estratégico, Kissinger certamente sabia que o fato de ser uma superpotência trazia consigo uma grande margem de erro que pode ser perdoada pela história.

Apenas algumas décadas após o fim da Guerra do Vietnã, os mesmos países que havíamos bombardeado estavam buscando expandir o comércio com os Estados Unidos. Bangladesh e Timor Leste são agora nações independentes que recebem assistência americana. O Chile é governado por um socialista millenial cujo ministro da defesa é a neta do Allende. As superpotências fazem o que devem fazer. A roda da história gira. Quando e onde você vive determina se você será esmagado ou erguido por ela.

Mas essa visão de mundo confunde cinismo - ou realismo - com sabedoria. A história, o que está em jogo, é importante. No final das contas, o Muro de Berlim foi derrubado não por causa de movimentos de xadrez feitos no tabuleiro de um grande jogo, mas porque as pessoas do Leste queriam viver como as pessoas do Oeste. A economia, a cultura popular e os movimentos sociais eram importantes. Apesar de todas as nossas falhas, tínhamos um sistema e uma história melhores.

 

Ironicamente, parte do fascínio sobre Kissinger se deveu ao fato de sua história ser eminentemente americana. Sua família escapou por pouco da roda da história, fugindo da Alemanha nazista no momento em que Hitler colocava em prática seu plano diabólico. Kissinger retornou à Alemanha no Exército dos EUA e libertou um campo de concentração.

A experiência o impregnou de uma cautela em relação à ideologia messiânica associada ao poder do Estado. Mas isso não legou a ele muita simpatia pelos menos favorecidos. Tampouco o motivou a vincular a superpotência americana do pós-guerra à própria teia de normas, leis e fidelidade a certos valores que foi escrita na ordem do pós-guerra liderada pelos americanos para evitar outra guerra mundial.

A credibilidade, afinal, não se trata apenas de punir ou não um adversário para enviar uma mensagem a outro; trata-se também de saber se você é o que diz ser. Ninguém pode esperar perfeição nos assuntos de Estado, assim como nas relações entre os seres humanos. Mas os Estados Unidos pagaram um preço por sua hipocrisia, embora seja mais difícil de medir do que o resultado de uma guerra ou negociação.

Agora a história completou o círculo. Em todo o mundo, vemos um ressurgimento da autocracia e do etnonacionalismo, mais acentuadamente na guerra da Rússia contra a Ucrânia. Em Gaza, os Estados Unidos apoiaram uma operação militar israelense que matou civis em um ritmo que, mais uma vez, sugeriu a grande parte do mundo que somos seletivos em nossa adoção de leis e normas internacionais.

Enquanto isso, em casa, vemos como a democracia se tornou subordinada à busca pelo poder em uma parte do Partido Republicano. É a isso que o cinismo pode levar. Porque quando não há uma aspiração maior, nenhuma história que dê sentido às nossas ações, a política e a geopolítica se tornam meramente um jogo de soma zero. Nesse tipo de mundo, o poder faz a razão.

Tudo isso não pode ser colocado sobre os ombros de Henry Kissinger. De muitas maneiras, ele foi tanto uma criação do estado de segurança nacional americano quanto seu autor. Mas ele também é um conto de advertência. Por mais imperfeitos que sejamos, os Estados Unidos precisam de nossa história para sobreviver. É ela que mantém unida uma democracia multirracial em casa e nos diferencia da Rússia e da China no exterior.

Essa história insiste que uma criança no Laos é igual em dignidade e valor às nossas crianças e que o povo do Chile tem o mesmo direito de autodeterminação que nós. Para os Estados Unidos, isso deve fazer parte da segurança nacional. Nós nos esquecemos disso por nossa conta e risco.


* Ben Rhodes foi vice-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA entre 2009 e 2017, no governo de Barack Obama

 

Intervenção do Ministro Mauro Vieira no Debate de Alto Nível do Conselho de Segurança da ONU sobre a situação no Oriente Médio e Palestina

Um dos mais importantes discursos preparados pela diplomacia brasileira para transmitir nossas posições tradicionais em matéria de política externa, em especial em relação à situação no Oriente Médio, com um foco bem mais explícito na questão da Palestina. Vale ler com atenção e gravar as posturas expressas desde muitos anos pela diplomacia brasileira, independentemente do que possa ser dito em nível executivo por amadores ou observadores.

Ministério das Relações Exteriores

Assessoria Especial de Comunicação Social

 

Nota nº 552

29 de novembro de 2023

Intervenção do Ministro Mauro Vieira no Debate de Alto Nível do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a situação no Oriente Médio, inclusive a Questão Palestina - 29 de novembro de 2023 - Nova York 

Versão original em inglês

(abaixo, versão em português)

Mr. President,

I thank the Chinese Presidency for elevating this meeting on the situation in the Middle East to a High-Level Event. The matter is of utmost importance and urgency to Brazil, of which is example the current official visit of President Lula to Saudi Arabia and Qatar where he is exchanging views with the main stakeholders on the situation in the region.

As we convene today, on the International Day of the Solidarity with the Palestinian People, we are compelled to acknowledge that the time is not for commemoration.

After hearing the Secretary-General António Guterres and Special Coordinator Thor Wennesland on the unprecedented horror taking place in Gaza, after the terror attack of October 7th and the 48 consecutive days of unrelenting bombardments that followed it, solidarity is certainly not the first word that comes to anyone’s mind.

Solidarity implies unity.

And, in the Security Council, we too have to stand in unity and solidarity for all those in need.

The situation in the Middle East, including the Palestinian Question, is, however, one of the most vetoed matters of the Security Council.

Such record is an unfortunate testament to the fact that more often than not disagreements triumph over common interest in this body. 

Yet the conflict in the Middle East has not disappeared, as we have been failing to see eye to eye in the Security Council. Much to the contrary, we have continuously heard reports of actions that have been undermining the viability of a Palestinian state and the fulfillment of the General Assembly Resolution 181 (II) of 1947 on the establishment of two States, living side by side in peace and security, within mutually accepted and internationally recognized borders.

The worsening situation in the past years between Israel and Palestine has not compelled us to unite and take action towards the shared goal of achieving peace to the Palestinians, the Israelis, and the people in the Middle East at large.

As we are now appalled by the spiral of violence and the intolerable loss of innocent lives, both in Israel and Palestine, and as we worry at the very concrete possibility of a regional spillover, we have to hold the Security Council accountable too, in its main obligation to uphold international peace and security.

Mr. President, Ladies and Gentlemen,

What is worse: we did not unite in the past. And we do not seem to be ready to unite now.

The Gaza Strip is grappling with unacceptable levels of violence. More than five thousand children have perished. We have heard Catherine Russell, Director of UNICEF, state unequivocally that "the Gaza Strip is the most dangerous place in the world to be a child".

The number of civilian lives lost exceeds 14 thousand. The plight of women, particularly pregnant women, in Gaza, is deeply disturbing.

The displacement figures are staggering, reaching nearly 1.7 million people, or 80% of Gaza's population.

An estimated number of 41,000 houses were destroyed or severely damaged. A total of 18 hospitals were shut down. The number of trucks with humanitarian assistance is utterly insufficient to attend the basic needs of the population, such as food, water, medicine, and fuel.

Alleged violations of International Humanitarian Law and International Human Rights Law continue as civilian infrastructure are destroyed.

The alarming death toll of over one hundred UN staff members is a tragic record in history.

In this light, Mr. President, this Council and the international community must join forces to ensure the end of violence, as well as to grant unhindered, sustainable, and predictable humanitarian aid to Gaza.

Mr. President, Ladies and Gentlemen,

We also stand unequivocally in solidarity with the Israeli families, whose innocent members were made hostages.

In this light, Brazil welcomes the release of 74 hostages in the past days. However, 167 individuals are still held captive. We share their pain and the unbearable suffering of their families. We cannot bear the idea of children taken from their families, under no circumstances and without any justification.

This is why we reiterate our call for the safe and unconditional liberation of all innocent people.

Brazil welcomes the recent truce deal between the parties, achieved through the mediation of Qatar and supported by Egypt and the United States.

Although contingent and temporary, halting hostilities and facilitating the release of numerous captives is a sign that agreement is possible, even when it seems unreachable and unattainable.

While acknowledging the efforts of the mediators of this encouraging diplomatic development, Brazil also welcomes the news of the extension of the truce for another two days.

Violence, terror, and forceful measures only breed hatred and fuel a never-ending cycle of hostilities.

We, therefore, urge all parties to cling to this spark of hope and encourage them to uphold this vital agreement.

Mr. President,

The truce is a first step towards a de-escalation of violence. It should encourage us to overcome differences and cooperate ambitiously.

While recognizing the relevance of the Security Council Resolution 2712(2023) and its call for humanitarian pauses and corridors in Gaza, Brazil is of the view that this Council must do more. It must unite to adopt a more decisive and comprehensive course of action that can consolidate gains; sustainably and predictably address the dire situation on the ground; and foster a safer and more hopeful future.

Echoing President Lula's recent remarks on the matter, we very much hope that this agreement on a short humanitarian truce – a modest sign of hope amidst an appalling human tragedy – can show a way to peace and lay the groundwork for the resumption of the peace process between Israel and Palestine.

In this endeavor, we must not lose sight of the need to address the root causes of the Palestinian issue through dialogue, political will, and good diplomacy.

This process needs to be fully inclusive, considering the perspectives of all relevant stakeholders. Every country and partner with influence over the parties must be called to shoulder their responsibility to reach a lasting solution for this central issue. And of course this Council should also live up to its responsibilities.

Burying the two States solution is burying any prospect for peace. A viable Palestinian state, living side by side in peace and security with Israel, within mutually accepted and internationally recognized borders, is the fulfillment of the Palestinian self-determination. But it is also the most crucial interest of all peace-loving countries that belong to the United Nations. Any initiative, in the form of an international conference, as some member states have proposed, with a view to implementing the two States solution, counts with the Brazilian unequivocal support.

Mr. President,

The legitimate aspirations of Palestinians and Israelis for peace and security in their own countries cannot be overlooked or neglected any longer.

As I tried to convey here today, solidarity is not only a moral obligation. It is the Security Council’s duty. In order to discharge its responsibilities for the maintenance of international peace and security, as enshrined in the UN Charter, the Security Council must unite around a common good and raise above any individual interest of its members.

Thank you.

 

* * * * * * * * *

(Tradução para o português)

 

Senhor Presidente, 

Agradeço à Presidência Chinesa por elevar esta reunião sobre a situação no Oriente Médio a um Evento de Alto Nível. O assunto é de extrema importância e urgência para o Brasil, como exemplificado pela atual visita oficial do Presidente Lula à Arábia Saudita e ao Catar, onde está intercambiando impressões com os principais interessados na situação da região.

Enquanto nos reunimos hoje, no Dia Internacional de Solidariedade com o Povo Palestino, somos compelidos a reconhecer que este não é um momento de comemoração.

Após ouvir o Secretário-Geral António Guterres e o Coordenador Especial Thor Wennesland sobre o horror sem precedentes que está ocorrendo em Gaza, após o ataque terrorista de 7 de outubro e os 48 dias consecutivos de bombardeios incessantes que o seguiram, solidariedade certamente não é a primeira palavra que vem à mente.

Solidariedade implica unidade.

E, no Conselho de Segurança, também precisamos estar unidos em solidariedade por todos aqueles que precisam.

A situação no Oriente Médio, inclusive a Questão Palestina, no entanto, é uma das mais vetadas no Conselho de Segurança.

Esse registro é um testemunho infeliz de que frequentemente discordâncias triunfam sobre interesses comuns neste órgão.

Ainda assim, o conflito no Oriente Médio não desapareceu enquanto não conseguimos chegar a acordo no Conselho de Segurança. Pelo contrário, continuamos a ouvir relatos de ações que têm minado a viabilidade de um Estado palestino e o cumprimento da Resolução 181 (II) da Assembleia Geral de 1947 sobre o estabelecimento de dois Estados, convivendo lado a lado em paz e segurança, dentro de fronteiras mutuamente aceitas e internacionalmente reconhecidas.

A piora da situação nos últimos anos entre Israel e Palestina não nos levou a nos unir e agir em prol do objetivo comum de alcançar a paz para os palestinos, israelenses e as pessoas no Oriente Médio em geral.

Enquanto estamos chocados com a espiral de violência e a perda intolerável de vidas inocentes, tanto em Israel quanto na Palestina, e enquanto nos preocupamos com a possibilidade concreta de um transbordamento regional, também temos de responsabilizar o Conselho de Segurança, no que tange à sua principal obrigação de manter a paz e a segurança internacionais.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores,

O que é pior: não nos unimos no passado. E não parece que estamos prontos para nos unir agora.

A Faixa de Gaza tem sofrido com níveis inaceitáveis de violência. Mais de cinco mil crianças faleceram. Ouvimos Catherine Russell, Diretora da UNICEF, afirmar inequivocamente que "a Faixa de Gaza é o lugar mais perigoso do mundo para ser uma criança".

O número de vidas civis perdidas ultrapassa 14 mil. A situação das mulheres, especialmente das grávidas, em Gaza, é profundamente perturbadora.

Os números de deslocamento são impressionantes, atingindo quase 1,7 milhão de pessoas, ou 80% da população de Gaza.

Um número estimado de 41.000 casas foi destruído ou gravemente danificado. Um total de 18 hospitais foram fechados. O número de caminhões com assistência humanitária é totalmente insuficiente para atender às necessidades básicas da população, como alimentos, água, medicamentos e combustível. 

Alegadas violações do Direito Internacional Humanitário e do Direito Internacional dos Direitos Humanos continuam à medida que infraestruturas civis são destruídas.

O alarmante número de mais de cem membros do pessoal da ONU mortos é um registro trágico na história.

Nesta perspectiva, Senhor Presidente, este Conselho e a comunidade internacional devem unir forças para garantir o fim da violência, bem como para prestar assistência humanitária incondicional, sustentável e previsível a Gaza.

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores,

Também expressamos nossa solidariedade inequívoca às famílias israelenses, cujos membros inocentes foram feitos reféns. 

Nesse sentido, o Brasil saúda a libertação de 74 reféns nos últimos dias. No entanto, 167 pessoas ainda estão mantidas em cativeiro. Compartilhamos a dor e o sofrimento insuportável de suas famílias. Não podemos aceitar a ideia de crianças tiradas de suas famílias, sob nenhuma circunstância e sem qualquer justificativa. 

Por isso, reiteramos nosso apelo pela libertação segura e incondicional de todas as pessoas inocentes. 

O Brasil saúda o recente acordo de cessar-fogo entre as partes, alcançado por meio da mediação do Catar e apoiado pelo Egito e pelos Estados Unidos.

Embora pontuais e temporárias, a suspensão das hostilidades e a facilitação da libertação de numerosos prisioneiros demonstram que um acordo é possível, mesmo quando parece inalcançável.

Ao reconhecer os esforços dos mediadores deste encorajador desdobramento diplomático, o Brasil também recebe com satisfação a notícia da prorrogação da trégua por mais dois dias.

A violência, o terror e medidas coercitivas apenas instilam o ódio e nutrem um ciclo interminável de hostilidades. Portanto, instamos todas as partes a se apegarem a essa centelha de esperança e as encorajamos a manter este acordo vital.

Senhor Presidente, 

A trégua é um primeiro passo rumo à redução da violência. Deve nos encorajar a superar as diferenças e cooperar com ambição.

Ao reconhecer a relevância da Resolução 2712(2023) do Conselho de Segurança e seu apelo por pausas humanitárias e corredores em Gaza, o Brasil considera que este Conselho deve fazer mais. Ele deve unir-se para adotar um curso de ação mais decisivo e abrangente que possa consolidar ganhos; abordar de maneira sustentável e previsível a precária situação no terreno; e promover um futuro mais seguro e esperançoso.

Ecoando os recentes comentários do Presidente Lula sobre o assunto, esperamos sinceramente que este acordo sobre uma breve trégua humanitária - um modesto sinal de esperança em meio a uma tragédia humana terrível - possa indicar um caminho para a paz e lançar as bases para a retomada do processo de paz entre Israel e Palestina. 

Nesta empreitada, não devemos perder de vista a necessidade de abordar as causas profundas da questão palestina por meio do diálogo, da vontade política e da boa diplomacia.

Esse processo precisa ser totalmente inclusivo, considerando as perspectivas de todos os atores relevantes. Todos os países e parceiros com influência sobre as partes devem ser chamados a assumir sua responsabilidade para alcançar uma solução duradoura para esta questão central. E, é claro, este Conselho também deve cumprir suas responsabilidades.

Enterrar a solução de dois Estados é enterrar qualquer perspectiva de paz. Um Estado palestino viável, convivendo lado a lado em paz e segurança com Israel, dentro de fronteiras mutuamente aceitas e internacionalmente reconhecidas, é a concretização da autodeterminação palestina. Mas também é o interesse mais crucial de todos os países que amam a paz e fazem parte das Nações Unidas. Qualquer iniciativa, na forma de uma conferência internacional, como alguns Estados membros propuseram, com o objetivo de implementar a solução de dois Estados, conta com o apoio inequívoco do Brasil.

Senhor Presidente, 

As aspirações legítimas dos palestinos e israelenses por paz e segurança em seus próprios países não podem mais ser ignoradas ou negligenciadas.

Como tentei transmitir aqui hoje, a solidariedade não é apenas uma obrigação moral. É o dever do Conselho de Segurança. Para cumprir suas responsabilidades na manutenção da paz e segurança internacionais, conforme consagrado pela Carta da ONU, o Conselho de Segurança deve unir-se em torno de um bem comum e elevar-se acima de qualquer interesse individual de seus membros.

Obrigado.

 

Nota publicada em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/intervencao-do-ministro-mauro-vieira-no-debate-de-alto-nivel-do-conselho-de-seguranca-da-onu-sobre-a-situacao-no-oriente-medio 



Seminário sobre o Programa Espacial Brasileiro no Itamaraty - Nota do MRE

 Ministério das Relações Exteriores

Assessoria Especial de Comunicação Social

 

Nota nº 553

29 de novembro de 2023

 

 

Seminário sobre o Programa Espacial Brasileiro

 

 

O Ministério das Relações Exteriores e a Fundação Alexandre de Gusmão, em colaboração com o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, a Agência Espacial Brasileira e a Força Aérea Brasileira, realizaram, em 29 de novembro, Seminário sobre o Programa Espacial Brasileiro, no Palácio do Itamaraty, em Brasília. O Seminário reuniu os principais atores do setor espacial no Brasil para discussão sobre a história do setor no país, o panorama atual, interno e mundial, e as perspectivas para o futuro.

O Seminário buscou promover a importância estratégica das tecnologias espaciais para o desenvolvimento nacional. Atualmente, as tecnologias espaciais são essenciais para áreas como telecomunicações, vigilância das fronteiras e costas marítimas, mapeamento de recursos, combate a desastres naturais, monitoramento ambiental e meteorológico, segurança cibernética, entre outras. O evento também avaliou o papel central da cooperação internacional e da diversificação de parcerias para o fortalecimento do Programa Espacial Brasileiro, bem como um papel ativo do Brasil no âmbito multilateral, no que concerne a regulações e regimes de uso do espaço, para consolidar o princípio de que a exploração espacial deve ser empreendida em benefício de todas as nações.

 

Nota publicada em: https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/seminario-sobre-o-programa-espacial-brasileiro

Death of a diplomat: Henry Kissinger, 1923-2023 (The Washington Post)

Death of a diplomat

The Washington Post, Nov 30, 2023

Henry A. Kissinger, a scholar, statesman and celebrity diplomat who wielded unparalleled power over U.S. foreign policy throughout the administrations of Presidents Richard M. Nixon and Gerald Ford, and who for decades afterward, as a consultant and writer, proffered opinions that shaped global politics and business, died Nov. 29 at his home in Connecticut. He was 100.

His death was announced in a statement by his consulting firm, which did not give a cause.

As a Jewish immigrant fleeing Nazi Germany, Dr. Kissinger spoke little English when he arrived in the United States as a teenager in 1938. But he harnessed a keen intellect, a mastery of history and his skill as a writer to rise quickly from Harvard undergraduate to Harvard faculty member before establishing himself in Washington.

As the only person ever to be White House national security adviser and secretary of state at the same time, he exercised a control over U.S. foreign policy that has rarely been equaled by anyone who was not president.

He and Vietnam’s Le Duc Tho shared the Nobel Peace Prize for the secret negotiations that produced the 1973 Paris agreement and ended U.S. military participation in the Vietnam War. His famous “shuttle diplomacy” after the 1973 Middle East war helped stabilize relations between Israel and its Arab neighbors.

As the impresario of Nixon’s historic opening to China and as the theoretician of détente with the Soviet Union, Dr. Kissinger earned much of the credit for seismic policy shifts that redirected the course of world affairs.

When he was appointed secretary of state, a Gallup poll found him to be the most admired person in the country. But he also became the target of relentless critics.

On the left, loud voices accused him of a coldblooded pragmatism that put strategic gains ahead of human rights. Some of his critics said the Paris agreement left a longtime ally, the government of South Vietnam, to a dark fate as the North Vietnamese seized control. Others accused him of letting the war continue for three years while he negotiated a deal that he could have had from the beginning.

Throughout his life, Dr. Kissinger ruminated on power and strategy in philosophical and even existential terms, but he always described himself as a realist, able to see which risks were worth taking.

“Policy is the art of weighing probabilities; mastery of it lies in grasping the nuances of possibilities,” he wrote as a young man. “To attempt to conduct it as a science must lead to rigidity. For only the risks are certain; the opportunities are conjectural.”

By Thomas W. Lippman, a former Washington Post reporter who covered Dr. Kissinger’s diplomatic activities in Vietnam and the Middle East.

Read more: Henry Kissinger, who shaped world affairs under two presidents, dies at 100.
https://s2.washingtonpost.com/3bf32b1/6568175fee20006aed835632/596b79f3ade4e24119b43ed3/26/61/6568175fee20006aed835632