DESBUROCRATIZAÇÃO: A MELHOR POLÍTICA PÚBLICA DE DESENVOLVIMENTO
Luciano Benetti Timm
Em 2010, o Banco Mundial atualizou sua publicação denominada de Doing Business in Brazil, na qual novamente nosso país teve desempenho sofrível. Este Relatório é trabalho desenvolvido pelo Banco Mundial com o intuito de analisar, dentre outros pontos, as regras que envolvem a abertura e o encerramento de empresas em determinados países.
Sua premissa fundamental é a de que a simplificação dos procedimentos de registro empresarial proporciona um estímulo ao surgimento de novas empresas que são o grande eixo produtor de riquezas.
A teoria econômica e jurídica que justifica esta premissa é a chamada Teoria dos Custos de Transação (TCT). De acordo com esta literatura (que de certa forma funde conceitos de Direito e de Economia), os agentes econômicos adaptam e moldam seus comportamentos de acordo com os incentivos institucionais, ou seja, de acordo com as regras formais e informais postas numa determinada sociedade. E, como o mercado não é um espaço absolutamente imperfeito de trocas econômicas, existem as fricções nominadas de custos de transação, que envolvem custos de informação, monitoramento, registro e execução de contratos e negócios (como são os contratos e acordos empresariais).
Custos de transação elevados tendem a elevar o custo social de determinada atividade, criando óbices ao seu exercício. A empresa funciona justamente como feixe de contratos e como mecanismo redutor de custos de transação. Portanto, um sistema nacional de registro empresarial ineficiente, como o brasileiro, tenderia a aumentar os custos de transação numa dada sociedade.
Se isso é verdade, não é menos verdade que a comunidade científica brasileira encontrou problemas metodológicos graves no Relatório Doing Business, já que, de um lado, a metodologia empregada não fica clara na exposição do relatório final, dando a entender que teriam sido ouvidas, por questionários, autoridades acadêmicas, governamentais e profissionais nas grandes metrópoles do País, no relatório de 2006; e, já nos relatórios de 2007 e 2008, haveria apenas o preenchimento de questionário por duas firmas de auditoria e de advocacia localizadas em São Paulo (o que, naturalmente, não seria suficiente para radiografiar a eficiência das instituições associadas à abertura de negócios no Brasil). Por outro lado, ele super dimensionaria as questões institucionais em detrimento do contexto macroeconômico.
Em 2009, com verbas oriundas do PNUD, da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça e da PUCRS, foram feitas pesquisas empíricas quantitativas e qualitativas para tentar radiografar o problema da abertura de negócios no Brasil e para medir o prejuízo causado pela ineficiência desse mesmo sistema.
A conclusão parcial foi a de que o Relatório Doing Business teve a virtude de mobilizar o Poder Público a buscar uma maior eficiência das Juntas Comerciais e da formalização de empresas no País. Desde então, as próprias Juntas Comerciais e o DNRC têm tentado buscar quantificar o tempo e o custo de registro de atos societários.
Nessa pesquisa, concluiu-se que grande problema no sistema de abertura de negócios no Brasil é uma organização federativa altamente ineficiente, que combina e multiplica registros desnecessários, burocráticos e reduntantes. Com efeito, de acordo com a Constituição Federal, em seu artigo 24, inciso III, compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre as Juntas Comerciais. Hoje a competência supletiva no plano administrativo do DNRC e a competência de administração e execução dos serviços de registros pelas Juntas Comerciais possibilitam a aparição de discrepâncias entre os Estados.
Além dessa divisão de competências, existem ainda diversos outros órgãos federativos ligados, direta ou indiretamente, à abertura de uma empresa no Brasil, a saber: Prefeituras Municipais (alvarás de abertura e funcionamento; inscrição municipal de tributos), Estados (inscrição estadual de tributos) e Federação (inscrição tributária federal). Ademais, outros órgãos de diversas esferas poderão, eventualmente, participar do processo de abertura de empresas, como na obtenção de licenças ambientais (municipais, estaduais e federais) e de agências reguladoras (Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Agência Nacional do Petróleo (ANP), Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), dentre outros).
Não se conseguiu na pesquisa medir o custo social da ineficiência do sistema de abertura de negócios, pois (não surpreendentemente) faltaram dados básicos de todos estes órgãos mapeados para a rodagem de um modelo econométrico confiável. Quase nenhum deles tem dados sobre o tempo necessário ao registro de uma atividade empresarial em seus guichês (o que é um péssimo sinal, diga-se de passagem). Embora seja intuitivo que muitos recursos são sorvidos nessa ineficiência, além do incentivo à corrupção.
Contudo, ela permitiu visualizar que a integração e coordenação institucional dos órgãos envolvidos no registro mercantil seriam o principal elemento impulsionador da eficiência dos processos de formalização de empresas.
Nesse sentido, o fiel cumprimento da Lei nº 11.598/2007 (que ainda não pegou) pode ser considerada o melhor caminho para desburocratização do sistema, já que ela objetiva a simplificação e a integração do processo de registro empresarial através da instituição da Redesim (uma rede de interligação de sistemas dos órgãos envolvidos no registro).
No entanto, para que a Lei saia do papel, precisamos de um “novo” Departamento Nacional de Registro Comercial (DNRC), mais prestigiado e capitalizado.
Tirar o governo do caminho, nesse caso, é a melhor política desenvolvimentista.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quinta-feira, 29 de julho de 2010
Ativismo estatal: mais recente artigo publicado - Paulo R Almeida
Acaba de ser publicado...
O ativismo econômico estatal: quais os seus custos e benefícios?
Paulo Roberto de Almeida, especial para o iG
Portal de Economia do iG, 27/07/2010 17:10
Atualmente os Estados ostentam políticas públicas para todos e cada um dos setores da vida moderna que é possível imaginar
Governos, ou melhor, políticos nos governos, adoram se mostrar prestativos, atentos em relação aos desejos dos eleitores, extremamente cuidadosos com a segurança e o patrimônio dos cidadãos, ciosos na criação de empregos, na distribuição de renda, enfim, sempre dispostos a oferecer a todos os cidadãos aquilo mesmo que todos os políticos prometem: estímulos ao crescimento, melhores empregos, aumento da renda e promoção do desenvolvimento social. A tudo isso, alguns ainda acrescentam, com motivação essencialmente demagógica: “com preservação da soberania nacional”. Claro, ainda está para nascer o político que, consciente dos benefícios de maior abertura e inserção internacional, vai ter a coragem de proclamar: “vamos internacionalizar o país, abri-lo à globalização, acolher de braços abertos o capital estrangeiro”... Enfim, sigamos adiante, pois nosso assunto é outro.
Todas essas boas promessas exigem, na visão dos mesmos políticos, um Estado atuante. No limite, um Estado interventor no campo econômico e regulador da ação dos agentes privados; na hipótese mais benigna, apenas um Estado indutor e promotor de condições favoráveis ao crescimento pela via do investimento particular e da acumulação de riqueza pela própria sociedade. A maior parte dos governos fica no meio do caminho entre essas duas opções: nem cuidam eles mesmos da produção e da oferta de bens e serviços, que podem ser fornecidos em melhores condições pelo setor privado, nem se abstêm de intervir naquilo que consideram necessário, segundo as concepções dos próprios políticos ou dos altos burocratas do governo Eles o fazem, alegadamente, para atender às demandas dos cidadãos (que, por coincidência, são eleitores também).
Talvez para desespero dos extremadamente liberais, ou daquela tribo especial de libertários conhecidos como anarco-capitalistas, vou defender a tese de que políticas ativas por parte do Estado são, sim, necessárias – aliás, mais do que necessárias, elas são inevitáveis, num sentido até de fatalidade – em sociedades como as nossas, hiper-burocratizadas e complexas demais para que o exército de políticos que nos governam e o enxame de tecnocratas que os servem deixem de propor medidas geniais para melhorar a nossa vida e, supostamente, para resolver os problemas existentes. Esses problemas, diga-se de passagem, foram, em grande medida, criados por medidas adotadas anteriormente pelos mesmos políticos e burocratas que estão sempre dispostos a fazer o bem com o dinheiro dos outros.
Em Estados normalmente organizados, funcionando de maneira transparente e atendendo às regras básicas da democracia, essas políticas públicas geralmente funcionam, embora nem sempre produzam os resultados desejados ou esperados, por uma razão muito simples: os agentes privados, farejando o que vem pela frente, exibem essa incrível tendência a se antecipar a efeitos considerados inevitáveis (em seu detrimento, claro) dessas mesmas políticas, adotando então disposições que contornam ou neutralizam as políticas ativas dos governos. A justificativa sempre adotada pelos governos ativistas é a de que as políticas aumentam a eficiência do sistema econômico, produzem bem-estar coletivo e reduzem externalidades negativas.
Talvez isso ocorra, o que caberia ainda aferir de maneira independente. Mas o custo para a sociedade sempre é muito alto, já que, sem produzir um só centavo de riqueza, os governos simplesmente retiram da sociedade os recursos de que necessitam para implementar essas políticas, com um pedágio – ou seja, o custo da intermediação burocrática – que pode ir de 10% (nos Estados mais enxutos) a mais de 25% dos valores envolvidos naqueles países mais desorganizados (como alguns perto de nós). Sempre é assim, e a tendência das burocracias estatais – de todas as burocracias, inclusive a dos organismos internacionais – é passar a gastar cada vez mais em projetos e programas definidos pelos próprios estamentos burocráticos e seus mentores políticos. A esperança da cidadania consciente é de que o Estado não gaste muito consigo mesmo e que, ao contrário, utilize os recursos, justamente, para fins de investimentos, que ou são projetos básicos – geralmente infra-estrutura – ou são políticas setoriais, as tais políticas ativas que recebem a aprovação de nove entre dez políticos profissionais e de dez entre dez burocratas estatais.
Se esta é uma realidade dos Estados modernos, como fazer a diferença entre as políticas absolutamente necessárias – as que justificariam a “extorsão tributária” contra o nosso bolso – e aquelas que poderiam ser deixadas à auto-regulação da sociedade? Até mesmo um liberal clássico como Adam Smith reconhecia funções governativas que deveriam ser suportadas pela coletividade por meio de impostos: essas áreas eram as de defesa, justiça, determinadas obras de infra-estrutura (portos, estradas) e algumas poucas mais. Em sua época, os governos pouco se ocupavam da saúde e da educação da população, temas que eram deixados aos cuidados das próprias famílias; como tampouco existiam seguros previdenciários, esquemas para o desemprego e acidentes de trabalho, exigências que foram crescendo com a urbanização e a construção da cidadania, ou seja, a incorporação de estratos menos privilegiados nas esferas de decisão e de representação política.
Atualmente os Estados ostentam políticas públicas para todo e cada um dos setores da vida moderna que é possível imaginar, existindo até a pretensão de cuidar do cidadão do berço à cova, como se parece ocorrer nos países escandinavos. Mas não apenas neles, posto que mesmo em Estados menos desenvolvidos, como no Brasil, existe essa ideia de que o Estado precisa ‘prover’ os menos contemplados com todos os serviços de que venha a necessitar: nascem, assim, os programas habitacionais, de primeiro emprego, de apoio à cultura, de inclusão digital, auxílio maternidade, auxílio funeral e, obviamente, as transferências diretas de dinheiro para os mais necessitados. Essas políticas de renda não são, ao contrário do que se acredita, as mais custosas de todas, embora envolvam considerável burocracia e se prestem a doses inevitáveis de fraudes e malversações.
As mais custosas costumam ser as políticas setoriais que contemplam as duas grandes áreas de atividade econômica: políticas industriais e agrícolas. São conhecidas as políticas agrícolas ultra-subvencionistas e altamente protecionistas praticadas em grande número de países desenvolvidos, destacando-se, nesse setor, a União Europeia, que consome metade do orçamento comunitário com pagamentos diretos e indiretos aos produtores super-protegidos dos países membros. Estima-se que os europeus poderiam reduzir o valor de sua cesta de compras alimentar à metade do que pagam nas feiras e supermercados se o setor agrícola fosse liberalizado.
No caso do Brasil, são igualmente conhecidas as pretensões industrializantes de todos os governos sucessivos à Revolução de 1930, criando um dos mais extensos e generosos sistemas de apoio à indústria nacional. Surgido nos anos 1950, o BNDES converteu-se numa das mais poderosas máquinas de transferência de renda de todos os cidadãos para um punhado de industriais privilegiados, no que é apenas um dos mecanismos mais deletérios de concentração de renda e de deformação do mercado de capitais num país em desenvolvimento.
É uma fatalidade de nossos sistemas pretensamente democráticos – em grande medida plutocráticos ou oligárquicos – que os setores mais privilegiados da sociedade lutem e ganhem as ‘suas’ políticas setoriais: empréstimos subsidiados para capitalistas e empreendedores ‘merecedores’; subvenções à produção e à comercialização de produtos do setor primário – especialmente custosos nos países mais ricos; isenções diversas para setores considerados “estratégicos”, o que nada mais representa do que dar dinheiro a quem já é rico. As justificativas, como sempre, são as usuais: é preciso garantir a “segurança alimentar”, não se pode “desindustrializar” o país e se deve, absolutamente, “investir” nas tecnologias que vão garantir o “futuro” da economia. Também em outras áreas o dinheiro público escorre pelo ralo: universitários costumam ter lobbies mais eficientes na capital do que estudantes do primário, daí a concentração de recursos na mesma elite que depois vai galgar os postos de melhores salários na administração pública, e se aposentar com 100% da renda da ativa.
Em síntese, políticas ativas funcionam sim, apenas não se pode ter certeza de que o dinheiro nelas “investido” não teria sido mais bem empregado se fosse deixado com os próprios particulares para que estes operem as suas escolhas de bens e serviços de que necessitam dispor ao longo da vida, inclusive para a aposentadoria. O Estado benfeitor está se convertendo num grande baby-sitter que cuida carinhosamente dos seus filhos; deve-se registrar, apenas, que a taxa de serviço retira cada vez mais renda dos bolsos dos próprios interessados. Pode-se não gostar da perspectiva, mas este é o nosso horizonte de vida. Estarei sendo muito pessimista?
Paulo Roberto de Almeida é doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas (1984). Diplomata de carreira desde 1977, exerceu diversos cargos na Secretaria de Estado das Relações Exteriores e em embaixadas e delegações do Brasil no exterior. Trabalhou entre 2003 e 2007 como Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Autor de vários trabalhos sobre relações internacionais e política externa do Brasil.
O ativismo econômico estatal: quais os seus custos e benefícios?
Paulo Roberto de Almeida, especial para o iG
Portal de Economia do iG, 27/07/2010 17:10
Atualmente os Estados ostentam políticas públicas para todos e cada um dos setores da vida moderna que é possível imaginar
Governos, ou melhor, políticos nos governos, adoram se mostrar prestativos, atentos em relação aos desejos dos eleitores, extremamente cuidadosos com a segurança e o patrimônio dos cidadãos, ciosos na criação de empregos, na distribuição de renda, enfim, sempre dispostos a oferecer a todos os cidadãos aquilo mesmo que todos os políticos prometem: estímulos ao crescimento, melhores empregos, aumento da renda e promoção do desenvolvimento social. A tudo isso, alguns ainda acrescentam, com motivação essencialmente demagógica: “com preservação da soberania nacional”. Claro, ainda está para nascer o político que, consciente dos benefícios de maior abertura e inserção internacional, vai ter a coragem de proclamar: “vamos internacionalizar o país, abri-lo à globalização, acolher de braços abertos o capital estrangeiro”... Enfim, sigamos adiante, pois nosso assunto é outro.
Todas essas boas promessas exigem, na visão dos mesmos políticos, um Estado atuante. No limite, um Estado interventor no campo econômico e regulador da ação dos agentes privados; na hipótese mais benigna, apenas um Estado indutor e promotor de condições favoráveis ao crescimento pela via do investimento particular e da acumulação de riqueza pela própria sociedade. A maior parte dos governos fica no meio do caminho entre essas duas opções: nem cuidam eles mesmos da produção e da oferta de bens e serviços, que podem ser fornecidos em melhores condições pelo setor privado, nem se abstêm de intervir naquilo que consideram necessário, segundo as concepções dos próprios políticos ou dos altos burocratas do governo Eles o fazem, alegadamente, para atender às demandas dos cidadãos (que, por coincidência, são eleitores também).
Talvez para desespero dos extremadamente liberais, ou daquela tribo especial de libertários conhecidos como anarco-capitalistas, vou defender a tese de que políticas ativas por parte do Estado são, sim, necessárias – aliás, mais do que necessárias, elas são inevitáveis, num sentido até de fatalidade – em sociedades como as nossas, hiper-burocratizadas e complexas demais para que o exército de políticos que nos governam e o enxame de tecnocratas que os servem deixem de propor medidas geniais para melhorar a nossa vida e, supostamente, para resolver os problemas existentes. Esses problemas, diga-se de passagem, foram, em grande medida, criados por medidas adotadas anteriormente pelos mesmos políticos e burocratas que estão sempre dispostos a fazer o bem com o dinheiro dos outros.
Em Estados normalmente organizados, funcionando de maneira transparente e atendendo às regras básicas da democracia, essas políticas públicas geralmente funcionam, embora nem sempre produzam os resultados desejados ou esperados, por uma razão muito simples: os agentes privados, farejando o que vem pela frente, exibem essa incrível tendência a se antecipar a efeitos considerados inevitáveis (em seu detrimento, claro) dessas mesmas políticas, adotando então disposições que contornam ou neutralizam as políticas ativas dos governos. A justificativa sempre adotada pelos governos ativistas é a de que as políticas aumentam a eficiência do sistema econômico, produzem bem-estar coletivo e reduzem externalidades negativas.
Talvez isso ocorra, o que caberia ainda aferir de maneira independente. Mas o custo para a sociedade sempre é muito alto, já que, sem produzir um só centavo de riqueza, os governos simplesmente retiram da sociedade os recursos de que necessitam para implementar essas políticas, com um pedágio – ou seja, o custo da intermediação burocrática – que pode ir de 10% (nos Estados mais enxutos) a mais de 25% dos valores envolvidos naqueles países mais desorganizados (como alguns perto de nós). Sempre é assim, e a tendência das burocracias estatais – de todas as burocracias, inclusive a dos organismos internacionais – é passar a gastar cada vez mais em projetos e programas definidos pelos próprios estamentos burocráticos e seus mentores políticos. A esperança da cidadania consciente é de que o Estado não gaste muito consigo mesmo e que, ao contrário, utilize os recursos, justamente, para fins de investimentos, que ou são projetos básicos – geralmente infra-estrutura – ou são políticas setoriais, as tais políticas ativas que recebem a aprovação de nove entre dez políticos profissionais e de dez entre dez burocratas estatais.
Se esta é uma realidade dos Estados modernos, como fazer a diferença entre as políticas absolutamente necessárias – as que justificariam a “extorsão tributária” contra o nosso bolso – e aquelas que poderiam ser deixadas à auto-regulação da sociedade? Até mesmo um liberal clássico como Adam Smith reconhecia funções governativas que deveriam ser suportadas pela coletividade por meio de impostos: essas áreas eram as de defesa, justiça, determinadas obras de infra-estrutura (portos, estradas) e algumas poucas mais. Em sua época, os governos pouco se ocupavam da saúde e da educação da população, temas que eram deixados aos cuidados das próprias famílias; como tampouco existiam seguros previdenciários, esquemas para o desemprego e acidentes de trabalho, exigências que foram crescendo com a urbanização e a construção da cidadania, ou seja, a incorporação de estratos menos privilegiados nas esferas de decisão e de representação política.
Atualmente os Estados ostentam políticas públicas para todo e cada um dos setores da vida moderna que é possível imaginar, existindo até a pretensão de cuidar do cidadão do berço à cova, como se parece ocorrer nos países escandinavos. Mas não apenas neles, posto que mesmo em Estados menos desenvolvidos, como no Brasil, existe essa ideia de que o Estado precisa ‘prover’ os menos contemplados com todos os serviços de que venha a necessitar: nascem, assim, os programas habitacionais, de primeiro emprego, de apoio à cultura, de inclusão digital, auxílio maternidade, auxílio funeral e, obviamente, as transferências diretas de dinheiro para os mais necessitados. Essas políticas de renda não são, ao contrário do que se acredita, as mais custosas de todas, embora envolvam considerável burocracia e se prestem a doses inevitáveis de fraudes e malversações.
As mais custosas costumam ser as políticas setoriais que contemplam as duas grandes áreas de atividade econômica: políticas industriais e agrícolas. São conhecidas as políticas agrícolas ultra-subvencionistas e altamente protecionistas praticadas em grande número de países desenvolvidos, destacando-se, nesse setor, a União Europeia, que consome metade do orçamento comunitário com pagamentos diretos e indiretos aos produtores super-protegidos dos países membros. Estima-se que os europeus poderiam reduzir o valor de sua cesta de compras alimentar à metade do que pagam nas feiras e supermercados se o setor agrícola fosse liberalizado.
No caso do Brasil, são igualmente conhecidas as pretensões industrializantes de todos os governos sucessivos à Revolução de 1930, criando um dos mais extensos e generosos sistemas de apoio à indústria nacional. Surgido nos anos 1950, o BNDES converteu-se numa das mais poderosas máquinas de transferência de renda de todos os cidadãos para um punhado de industriais privilegiados, no que é apenas um dos mecanismos mais deletérios de concentração de renda e de deformação do mercado de capitais num país em desenvolvimento.
É uma fatalidade de nossos sistemas pretensamente democráticos – em grande medida plutocráticos ou oligárquicos – que os setores mais privilegiados da sociedade lutem e ganhem as ‘suas’ políticas setoriais: empréstimos subsidiados para capitalistas e empreendedores ‘merecedores’; subvenções à produção e à comercialização de produtos do setor primário – especialmente custosos nos países mais ricos; isenções diversas para setores considerados “estratégicos”, o que nada mais representa do que dar dinheiro a quem já é rico. As justificativas, como sempre, são as usuais: é preciso garantir a “segurança alimentar”, não se pode “desindustrializar” o país e se deve, absolutamente, “investir” nas tecnologias que vão garantir o “futuro” da economia. Também em outras áreas o dinheiro público escorre pelo ralo: universitários costumam ter lobbies mais eficientes na capital do que estudantes do primário, daí a concentração de recursos na mesma elite que depois vai galgar os postos de melhores salários na administração pública, e se aposentar com 100% da renda da ativa.
Em síntese, políticas ativas funcionam sim, apenas não se pode ter certeza de que o dinheiro nelas “investido” não teria sido mais bem empregado se fosse deixado com os próprios particulares para que estes operem as suas escolhas de bens e serviços de que necessitam dispor ao longo da vida, inclusive para a aposentadoria. O Estado benfeitor está se convertendo num grande baby-sitter que cuida carinhosamente dos seus filhos; deve-se registrar, apenas, que a taxa de serviço retira cada vez mais renda dos bolsos dos próprios interessados. Pode-se não gostar da perspectiva, mas este é o nosso horizonte de vida. Estarei sendo muito pessimista?
Paulo Roberto de Almeida é doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Bruxelas (1984). Diplomata de carreira desde 1977, exerceu diversos cargos na Secretaria de Estado das Relações Exteriores e em embaixadas e delegações do Brasil no exterior. Trabalhou entre 2003 e 2007 como Assessor Especial no Núcleo de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Autor de vários trabalhos sobre relações internacionais e política externa do Brasil.
Um escritor que sabia escrever: Otto Maria Carpeaux
Parece redundância, ou erro de título, mas não é: hoje em dia, são poucos os escritores que sabem escrever, sobretudo no jornalismo. Minha homenagem a um mestre da escrita.
OBSERVATÓRIO LITERÁRIO
Um erudito que sabia escrever
Esdras do Nascimento
Observatório da Imprensa, 28.07.2010
Em parceria com a UniverCidade, do Rio, a Editora Topbooks está relançando em dez volumes toda a obra de Otto Maria Carpeaux, crítico literário austríaco que atuou durante muitos anos, de forma brilhante, na imprensa brasileira e escreveu, com inusitada clareza, ensaios de rara profundidade sobre dezenas de autores e compositores, muitos dos quais até então praticamente desconhecidos no país.
No suplemento Mais! , da Folha de S. Paulo, de 4/7/99, Nelson Ascher faz um perfil do ensaísta e lembra uma época em que havia, no Brasil, uma "atividade especial, mas não especializada, considerada antes uma disciplina humanística do que um tipo de ciência. Seus praticantes podiam ser diplomados em direito, engenharia, medicina etc. ou não ter diploma algum; escreviam em jornais, revistas, publicavam livros, davam conferências e aulas, mas sua hierarquia se devia mais aos méritos que à antigüidade e aos títulos".
Nelson Ascher ressalta, no seu artigo, a qualidade dos textos de Carpeaux, que mesmo quando abordavam temas controvertidos e complexos eram escritos na "língua comum dos seres humanos letrados" e "cumpriam uma função definida, qual seja, a de servir como intermediário entre algo em busca de um público e um público em busca de algo. Esse algo era a literatura, e a atividade em questão chamava-se crítica literária".
Muito oportuna essa observação de Nelson Ascher. Os trabalhos produzidos hoje nas universidades, na área das ciências humanas, são quase sempre pernósticos e mal-escritos, talvez porque os seus autores estejam mais preocupados em mostrar como são inteligentes, sabidos e eruditos, do que em prestar serviços aos leitores, transmitindo-lhe as informações que obtiveram e analisando-as de maneira compreensível. Isso provavelmente ocorre porque eles escrevem para os colegas, pensando na repercussão que seus trabalhos terão na área específica em que atuam, podendo render-lhes alguns lucros, em termos de promoções acadêmicas, prestígio, convites para congressos e simpósios etc. etc. Predominam as citações, as longas bibliografias, as notas de pé de página e a linguagem empolada. O leitor, em geral, não é levado em conta. E esses textos cumprem o seu natural destino de mofar na poeira dos arquivos das universidades.
Otto Maria Carpeaux, ao lado de Álvaro Lins, Nelson Werneck Sodré, Sérgio Milliet e alguns outros, era exatamente o contrário disso. Daí a importância do relançamento de suas obras.
OBSERVATÓRIO LITERÁRIO
Um erudito que sabia escrever
Esdras do Nascimento
Observatório da Imprensa, 28.07.2010
Em parceria com a UniverCidade, do Rio, a Editora Topbooks está relançando em dez volumes toda a obra de Otto Maria Carpeaux, crítico literário austríaco que atuou durante muitos anos, de forma brilhante, na imprensa brasileira e escreveu, com inusitada clareza, ensaios de rara profundidade sobre dezenas de autores e compositores, muitos dos quais até então praticamente desconhecidos no país.
No suplemento Mais! , da Folha de S. Paulo, de 4/7/99, Nelson Ascher faz um perfil do ensaísta e lembra uma época em que havia, no Brasil, uma "atividade especial, mas não especializada, considerada antes uma disciplina humanística do que um tipo de ciência. Seus praticantes podiam ser diplomados em direito, engenharia, medicina etc. ou não ter diploma algum; escreviam em jornais, revistas, publicavam livros, davam conferências e aulas, mas sua hierarquia se devia mais aos méritos que à antigüidade e aos títulos".
Nelson Ascher ressalta, no seu artigo, a qualidade dos textos de Carpeaux, que mesmo quando abordavam temas controvertidos e complexos eram escritos na "língua comum dos seres humanos letrados" e "cumpriam uma função definida, qual seja, a de servir como intermediário entre algo em busca de um público e um público em busca de algo. Esse algo era a literatura, e a atividade em questão chamava-se crítica literária".
Muito oportuna essa observação de Nelson Ascher. Os trabalhos produzidos hoje nas universidades, na área das ciências humanas, são quase sempre pernósticos e mal-escritos, talvez porque os seus autores estejam mais preocupados em mostrar como são inteligentes, sabidos e eruditos, do que em prestar serviços aos leitores, transmitindo-lhe as informações que obtiveram e analisando-as de maneira compreensível. Isso provavelmente ocorre porque eles escrevem para os colegas, pensando na repercussão que seus trabalhos terão na área específica em que atuam, podendo render-lhes alguns lucros, em termos de promoções acadêmicas, prestígio, convites para congressos e simpósios etc. etc. Predominam as citações, as longas bibliografias, as notas de pé de página e a linguagem empolada. O leitor, em geral, não é levado em conta. E esses textos cumprem o seu natural destino de mofar na poeira dos arquivos das universidades.
Otto Maria Carpeaux, ao lado de Álvaro Lins, Nelson Werneck Sodré, Sérgio Milliet e alguns outros, era exatamente o contrário disso. Daí a importância do relançamento de suas obras.
Suriname: um novo narco-Estado, e mais um Estado falido?
Da coluna diária de Cesar Maia (29.07.2010):
SURINAME CAMINHA PARA SER MAIS UM NARCO ESTADO? BOUTERSE OUTRA VEZ PRESIDENTE!
1. O atual Presidente do Suriname, Ronald Runaldo Venetiaan, que desempenhou por três vezes essa função (entre 1991-1996; entre 2000 e 2005; e de 2005 aos nossos dias), será substituído em 03/08/2010 pelo General Desiré Delano Bouterse, 65 anos de idade, eleito em 19/07/2010 pelo Parlamento. O General Desi Bouterse foi o autor do golpe-de-estado de 25/02/1980, que proclamou a República Socialista do Suriname. Em 08/12/1982, jornalistas, intelectuais e líderes sindicais contrários o seu governo foram presos, torturados e assassinados, provocando a suspensão de todos os acordos de cooperação assinados entre a Holanda e sua ex-colônia.
2. Em 29/11/1986, mais uma vez a violência do governo de Bouterse foi direcionada contra os opositores em um ataque efetuado por uma unidade militar à aldeia de Moiwana. A casa do chefe da oposição armada, Ronnie Brunswijker, foi incendiada e 35 pessoas foram sumariamente executadas, principalmente mulheres e crianças. A repressão foi tanta que, quando as investigações do caso foram reabertas em 1990, o inspetor-chefe encarregado do novo inquérito, Herman Gooding, foi assassinado, sendo seu corpo jogado na frente dos escritórios de Bouterse.
3. Desde agosto de 2008 Bouterse aguarda julgamento no Suriname por estes crimes. Ademais, o Tribunal Supremo de Amsterdã sentenciou que Dési Bouterse in absentia, debaixo da acusação de ter encabeçado uma rede de contrabando de cocaína durante seu governo, e de promover os assassinatos de 1982.
4. De acordo com o Relatório sobre Narcóticos de 2008, preparado pelo Departamento de Estado dos EUA, “a incapacidade de o Governo do Suriname controlar suas fronteiras, seus inadequados recursos, sua limitada aptidão de aplicar a lei no interior do país, e a falta de aeronaves e de barcos de patrulha possibilitaram aos traficantes expedirem drogas ilícitas por terra, mar, rio e ar, com pouca resistência. A cocaína sul-americana transita pelo Suriname na rota para a Europa e a África.
5. O relatório da CIA (22/07/2010), ao tratar de drogas ilícitas, afirma que o Suriname é um local de crescente importância na reexportação da cocaína para a Europa, via Holanda e Brasil, além de servir ao contrabando de armas e de munições. Portanto, tudo indica que vamos ter, junto às nossas fronteiras, mais um controverso Chefe de Estado, com um passado ligado ao tráfico de drogas e de armamento, além de crueldades no trato da oposição a seu governo.
6. Diário de Cuiabá (21/01/2002): A Justiça de Água Boa condenou na semana passada o traficante Leonardo Dias de Mendonça a 23 anos e quatro meses de cadeia em regime fechado, no processo que investigava a apreensão de 327 quilos de cocaína em uma fazenda no município de Cocalinho, em 19 de agosto de 1999.
7. Leonardo Dias de Mendonça é considerado pela polícia um dos maiores transportadores de cocaína do país. Ele tem ligações com o cartel do Suriname e com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Mendonça foi sócio de Desire Delano Bouterse, ditador do Suriname entre 1980 e 1987, e do filho dele, Dino Bouterse. A ligação foi confirmada com o depoimento do piloto Bernardas Annand Nanhu à polícia holandesa.
8. O piloto contou que em “oito ou dez ocasiões” transportou cerca de 200 quilos de cocaína da Colômbia para o Suriname, onde a droga era trocada por armas do Exército. Por cada vôo, Mendonça lhe pagava US$ 15 mil. Nanhu também revelou à polícia holandesa que a droga era embarcada na cidade de Barranco Minas (COL), sob a proteção das Farc, que cobravam US$ 10 mil por decolagem. Mendonça vem sendo investigado pelos policiais federais brasileiros e norte-americanos há mais de cinco anos. Pelo envio de cocaína para os EUA, o governo americano indiciou os líderes das Farc e três brasileiros por tráfico de drogas, entre eles Mendonça.
SURINAME CAMINHA PARA SER MAIS UM NARCO ESTADO? BOUTERSE OUTRA VEZ PRESIDENTE!
1. O atual Presidente do Suriname, Ronald Runaldo Venetiaan, que desempenhou por três vezes essa função (entre 1991-1996; entre 2000 e 2005; e de 2005 aos nossos dias), será substituído em 03/08/2010 pelo General Desiré Delano Bouterse, 65 anos de idade, eleito em 19/07/2010 pelo Parlamento. O General Desi Bouterse foi o autor do golpe-de-estado de 25/02/1980, que proclamou a República Socialista do Suriname. Em 08/12/1982, jornalistas, intelectuais e líderes sindicais contrários o seu governo foram presos, torturados e assassinados, provocando a suspensão de todos os acordos de cooperação assinados entre a Holanda e sua ex-colônia.
2. Em 29/11/1986, mais uma vez a violência do governo de Bouterse foi direcionada contra os opositores em um ataque efetuado por uma unidade militar à aldeia de Moiwana. A casa do chefe da oposição armada, Ronnie Brunswijker, foi incendiada e 35 pessoas foram sumariamente executadas, principalmente mulheres e crianças. A repressão foi tanta que, quando as investigações do caso foram reabertas em 1990, o inspetor-chefe encarregado do novo inquérito, Herman Gooding, foi assassinado, sendo seu corpo jogado na frente dos escritórios de Bouterse.
3. Desde agosto de 2008 Bouterse aguarda julgamento no Suriname por estes crimes. Ademais, o Tribunal Supremo de Amsterdã sentenciou que Dési Bouterse in absentia, debaixo da acusação de ter encabeçado uma rede de contrabando de cocaína durante seu governo, e de promover os assassinatos de 1982.
4. De acordo com o Relatório sobre Narcóticos de 2008, preparado pelo Departamento de Estado dos EUA, “a incapacidade de o Governo do Suriname controlar suas fronteiras, seus inadequados recursos, sua limitada aptidão de aplicar a lei no interior do país, e a falta de aeronaves e de barcos de patrulha possibilitaram aos traficantes expedirem drogas ilícitas por terra, mar, rio e ar, com pouca resistência. A cocaína sul-americana transita pelo Suriname na rota para a Europa e a África.
5. O relatório da CIA (22/07/2010), ao tratar de drogas ilícitas, afirma que o Suriname é um local de crescente importância na reexportação da cocaína para a Europa, via Holanda e Brasil, além de servir ao contrabando de armas e de munições. Portanto, tudo indica que vamos ter, junto às nossas fronteiras, mais um controverso Chefe de Estado, com um passado ligado ao tráfico de drogas e de armamento, além de crueldades no trato da oposição a seu governo.
6. Diário de Cuiabá (21/01/2002): A Justiça de Água Boa condenou na semana passada o traficante Leonardo Dias de Mendonça a 23 anos e quatro meses de cadeia em regime fechado, no processo que investigava a apreensão de 327 quilos de cocaína em uma fazenda no município de Cocalinho, em 19 de agosto de 1999.
7. Leonardo Dias de Mendonça é considerado pela polícia um dos maiores transportadores de cocaína do país. Ele tem ligações com o cartel do Suriname e com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Mendonça foi sócio de Desire Delano Bouterse, ditador do Suriname entre 1980 e 1987, e do filho dele, Dino Bouterse. A ligação foi confirmada com o depoimento do piloto Bernardas Annand Nanhu à polícia holandesa.
8. O piloto contou que em “oito ou dez ocasiões” transportou cerca de 200 quilos de cocaína da Colômbia para o Suriname, onde a droga era trocada por armas do Exército. Por cada vôo, Mendonça lhe pagava US$ 15 mil. Nanhu também revelou à polícia holandesa que a droga era embarcada na cidade de Barranco Minas (COL), sob a proteção das Farc, que cobravam US$ 10 mil por decolagem. Mendonça vem sendo investigado pelos policiais federais brasileiros e norte-americanos há mais de cinco anos. Pelo envio de cocaína para os EUA, o governo americano indiciou os líderes das Farc e três brasileiros por tráfico de drogas, entre eles Mendonça.
Reflexoes sobre as politicas afirmativas - Andre de Almeida
O QUE PRETENDEM AFIRMAR AS POLÍTICAS AFIRMATIVAS
André de Almeida
Prof. Associado - Departamento de Engenharia Química – IT - UFRRJ
Blog Contra a Racialização do Brasil, 28 Jul 2010 04:13 PM PDT
A questão das cotas no ensino superior tem sido o centro das atenções de um conjunto de políticas, gestadas ou implementadas, voltadas à segmentação da sociedade brasileira em duas categorias: “brancos” (ou seja, não-negros) e “negros” (composta por pretos e todo o restante da diversidade cromática brasileira). Recorrendo a termos alternativos como raça, cor ou etnia, mas mantendo a essência de sua inspiração original – os EUA -, estas políticas são referenciadas como afirmativas.
Sendo assim, antes de nos perdermos em questões que, de fato, não se encontram em discussão - como a inexistência de raças entre os homens, o sistema de “mérito” para a ocupação de espaços sociais ou a repercussão acadêmica da entrada de grupos sociais previamente determinados - seria interessante que tentássemos refletir sobre as afirmações implícitas nas políticas com este recorte. Porque estas, como qualquer outra política, partem de determinadas representações da realidade e procuram atender a interesses específicos. Sem entende-las neste contexto, não poderemos avaliá-las em perspectiva histórica, nem tampouco procurar extrapolar o seu impacto no desenvolvimento da sociedade brasileira.
A primeira destas afirmações é que a sociedade brasileira é racista, ou seja, deliberadamente segrega a parcela da população de “raça negra”. Mesmo reconhecendo que este racismo nunca foi institucionalizado, como na matriz inspiradora, teria organizado de fato a estruturação da sociedade. E é precisamente este racismo que, mesmo velado, camuflado ou envergonhado, impossibilita a ascensão social da população negra. Esta afirmação busca a sua legitimação a partir da confrontação, direta, de dados estatísticos oficiais - renda, escolaridade, taxa de mortalidade, etc - entre “brancos” e “negros”. Trabalhados neste nível de agregação, as médias produzidas aparentam respaldar a afirmação.
Tomando, então, o racismo como um dado essencial da realidade e considerando o possível efeito na valorização social da população “negra” surge a segunda afirmação: a necessidade de construir uma identidade negra. Para tanto, os termos de conotação étnica adquirem especial importância, emergindo assim os “afro-descendentes” e “afro-brasileiros”. Para fortalecer o caráter étnico desta identidade, construída a partir da idéia de uma homogeneidade africana, recorrentemente são produzidos, para efeito de comparação, outros grupos “étnicos” brasileiros; é quando surge um Brasil multi-étnico, formado por italianos, japoneses, alemães, árabes, etc. A partir desta representação de uma sociedade fragmentada, os “negros”, conscientes do pertencimento ao seu grupo de iguais em confronto com os diversos outros, estariam preparados para enfrentar, de verdade, a luta contra o racismo.
A terceira, e última, dimensão desta construção simbólica aparece na vinculação causal entre identidade (africana), escravidão e racismo. Desta tríade é lançada uma culpa atávica sobre toda a população “branca” que estaria por exigir mecanismos para reparação e compensação. Na atual conjuntura, ponderado o nível de aceitação social, estes mecanismos convergem para a focalização de políticas públicas. Daí a afirmação de que é necessário reservar espaços sociais a serem ocupados apenas por “negros”.
Em poucas palavras estes são os principais argumentos que se articulam na formação do suporte ideológico para a reinvindicação de políticas afirmativas que, no momento, têm o seu impulso inicial com a implementação de cotas no ensino superior e a aprovação do estatuto da igualdade racial, mas que, a longo prazo, apontam para uma ação de estado baseada numa visão de sociedade fragmentada nestes termos.
Este conjunto de argumentos – que procurei expor como eles são defendidos – apresenta, entretanto, diversos problemas. O primeiro deles diz respeito ao tipo de agregação e à interpretação oferecida aos dados estatísticos usados como suporte científico. Ao não considerar tanto o caráter de classe da estrutura social brasileira como o da sua dinâmica determinada pelos movimentos do capitalismo, parte para uma simplificação ao tipificar grupos homogêneos de brancos e negros. Por exemplo: entre os brancos se encontra, seguramente, aquele percentual diminuto da sociedade brasileira que se apropria da fração expressiva da renda (e da riqueza) nacional; ao serem agregados ao restante da população branca - e pobre – deturpam qualquer média de indicadores sociais. Ao mesmo tempo, estes argumentos desconsideram deliberadamente toda agregação de dados que, partindo dos pobres como um segmento social representativo, aparentam mostrar não haver diferença estatística significativa no desempenho social.
Um segundo problema se encontra na questão da identidade negra. Qual seria esta identidade particular, para além da cor da pele? A origem africana, parece ser a resposta sugerida. Neste ponto, duas questões se colocam. A primeira diz respeito a qual África se está referindo, visto que tanto histórica, sociológica como culturalmente sempre existiram e existem muitas áfricas. A própria origem dos escravos que para cá vieram é bastante diversificada. A outra questão é que grande parte deste diversificado aporte cultural já está plenamente incorporado à cultura brasileira e, portanto, constitui uma marca de identidade para toda a população. Esta mesma constatação coloca em dúvida a própria afirmação de um racismo estrutural, uma vez que fica difícil imaginar mecanismos sociais, amplamente difundidos, que ao mesmo tempo segregam e incorporam os elementos culturais dos segregados.
Um outro aspecto deve, também, ser problematizado. É a idéia implícita na associação entre reparação e culpa por processos históricos. Na realidade a referência à História, nestes casos, é meramente instrumental, visto que este tipo de concepção é fundamentalmente a-histórica. Um processo histórico é sempre o resultado de múltiplas determinações. E assim foi também a escravidão. Diversos agentes - indivíduos, populações, nações e Estados – e variados interesses conduziram à sua operação. A historiografia recente tem apresentado inúmeras evidências da participação de indivíduos (alforriados) e populações negras (outras etnias ou grupos) neste processo. Para o bem ou para o mal, a História não se presta ao modelo hollywoodiano de pensar o mundo como a luta de mocinhos contra bandidos. Se há culpa e reparações necessárias, devemos encontra-las no presente. Nesta sociedade profundamente desigual e excludente onde, ao sabor da onda neoliberal, contingentes cada vez maiores da população (de todas as cores!) são arrastados para a indigência social.
Por último deveríamos refletir sobre o resultado alcançado por este tipo de política na sociedade que lhe deu origem: a sociedade estadunidense. Lá, ao mesmo tempo em que foi se constituindo uma classe média de “afro-americanos” – tão conservadora como o conjunto da classe média – a maioria da população negra foi conduzida às prisões, aos guetos e a um padrão social bem inferior às médias nacionais. O racismo, para além dos numerosos grupos organizados, continua a existir e a determinar grande parcela das interações sociais. Como se pode observar, as políticas afirmativas não operam no sentido de reverter as injustiças sociais. Pelo contrário, como toda política social que focaliza ações ao invés de universalizá-las, se enquadra perfeitamente na ordem de interesses do capital. Não por outra razão encontramos as suas Fundações (Ford, Rockfeller, etc.) entre os principais financiadores dos movimentos que reivindicam a sua implementação.
Mas não deixa de ser intrigante constatar como, em nome da justiça social, se opta por adotar este modelo, quando em um outro país - de colonização primário-exportadora, abolição tardia, e origem latina como o nosso – as políticas de universalização de direitos sociais levaram a uma efetiva ampliação da igualdade social. Existe racismo em Cuba, mas é uma percepção de foro individual que não interfere na estruturação e na dinâmica de sua sociedade. Que razões, então, existiriam para a realização social alcançada por Cuba tornar-se invisível a este debate? Talvez a resposta se encontre junto ao porquê destas políticas terem ganho impulso no Brasil na seqüência dos governos FHC e Lula, quando desenvolveu-se claramente os contornos neoliberais para as políticas públicas.
Para concluir é forçoso reconhecer que existe racismo no Brasil, como, também, preconceito contra judeus, homossexuais, nordestinos e, principalmente, contra pobres. Mas há de se reconhecer ainda que, por mais que se olhe para o mundo, não se encontra experiência mais avançada do que a nossa forma de socializar a diferença, seja racial, étnica, de cor ou que outro qualificativo se encontre. Esta incrível mestiçagem brasileira já é, por si só, uma confirmação. O racismo envergonhado, de que somos acusados de possuir, nada mais é do que o resultado do constrangimento social construído, silenciosamente, contra o racismo. Não devemos, então, procurar modelos. Nós somos o modelo a ser seguido; é a partir do patamar que alcançamos que devemos aprofundar e avançar. No entanto, nós temos que admitir que não somos uma democracia racial. O problema central, todavia, não se encontra no adjetivo; é para o substantivo, democracia, que devemos voltar nossa reflexão. Nenhuma sociedade tão desigual, na distribuição da renda e da riqueza, pode se acreditar democrática. Não pode existir democracia em convívio com tamanha injustiça social, com a cotidiana criminalização da pobreza. Este é o problema a ser enfrentado, mas, certamente, não será fragmentando “racialmente” a sociedade que o faremos. Ao contrário, efetivada esta fragmentação, estaremos legando um problema adicional para o futuro. E é a necessidade desta clivagem social, que as políticas com este corte tentam afirmar, que nós precisamos, urgentemente, negar.
André de Almeida
Prof. Associado - Departamento de Engenharia Química – IT - UFRRJ
Blog Contra a Racialização do Brasil, 28 Jul 2010 04:13 PM PDT
A questão das cotas no ensino superior tem sido o centro das atenções de um conjunto de políticas, gestadas ou implementadas, voltadas à segmentação da sociedade brasileira em duas categorias: “brancos” (ou seja, não-negros) e “negros” (composta por pretos e todo o restante da diversidade cromática brasileira). Recorrendo a termos alternativos como raça, cor ou etnia, mas mantendo a essência de sua inspiração original – os EUA -, estas políticas são referenciadas como afirmativas.
Sendo assim, antes de nos perdermos em questões que, de fato, não se encontram em discussão - como a inexistência de raças entre os homens, o sistema de “mérito” para a ocupação de espaços sociais ou a repercussão acadêmica da entrada de grupos sociais previamente determinados - seria interessante que tentássemos refletir sobre as afirmações implícitas nas políticas com este recorte. Porque estas, como qualquer outra política, partem de determinadas representações da realidade e procuram atender a interesses específicos. Sem entende-las neste contexto, não poderemos avaliá-las em perspectiva histórica, nem tampouco procurar extrapolar o seu impacto no desenvolvimento da sociedade brasileira.
A primeira destas afirmações é que a sociedade brasileira é racista, ou seja, deliberadamente segrega a parcela da população de “raça negra”. Mesmo reconhecendo que este racismo nunca foi institucionalizado, como na matriz inspiradora, teria organizado de fato a estruturação da sociedade. E é precisamente este racismo que, mesmo velado, camuflado ou envergonhado, impossibilita a ascensão social da população negra. Esta afirmação busca a sua legitimação a partir da confrontação, direta, de dados estatísticos oficiais - renda, escolaridade, taxa de mortalidade, etc - entre “brancos” e “negros”. Trabalhados neste nível de agregação, as médias produzidas aparentam respaldar a afirmação.
Tomando, então, o racismo como um dado essencial da realidade e considerando o possível efeito na valorização social da população “negra” surge a segunda afirmação: a necessidade de construir uma identidade negra. Para tanto, os termos de conotação étnica adquirem especial importância, emergindo assim os “afro-descendentes” e “afro-brasileiros”. Para fortalecer o caráter étnico desta identidade, construída a partir da idéia de uma homogeneidade africana, recorrentemente são produzidos, para efeito de comparação, outros grupos “étnicos” brasileiros; é quando surge um Brasil multi-étnico, formado por italianos, japoneses, alemães, árabes, etc. A partir desta representação de uma sociedade fragmentada, os “negros”, conscientes do pertencimento ao seu grupo de iguais em confronto com os diversos outros, estariam preparados para enfrentar, de verdade, a luta contra o racismo.
A terceira, e última, dimensão desta construção simbólica aparece na vinculação causal entre identidade (africana), escravidão e racismo. Desta tríade é lançada uma culpa atávica sobre toda a população “branca” que estaria por exigir mecanismos para reparação e compensação. Na atual conjuntura, ponderado o nível de aceitação social, estes mecanismos convergem para a focalização de políticas públicas. Daí a afirmação de que é necessário reservar espaços sociais a serem ocupados apenas por “negros”.
Em poucas palavras estes são os principais argumentos que se articulam na formação do suporte ideológico para a reinvindicação de políticas afirmativas que, no momento, têm o seu impulso inicial com a implementação de cotas no ensino superior e a aprovação do estatuto da igualdade racial, mas que, a longo prazo, apontam para uma ação de estado baseada numa visão de sociedade fragmentada nestes termos.
Este conjunto de argumentos – que procurei expor como eles são defendidos – apresenta, entretanto, diversos problemas. O primeiro deles diz respeito ao tipo de agregação e à interpretação oferecida aos dados estatísticos usados como suporte científico. Ao não considerar tanto o caráter de classe da estrutura social brasileira como o da sua dinâmica determinada pelos movimentos do capitalismo, parte para uma simplificação ao tipificar grupos homogêneos de brancos e negros. Por exemplo: entre os brancos se encontra, seguramente, aquele percentual diminuto da sociedade brasileira que se apropria da fração expressiva da renda (e da riqueza) nacional; ao serem agregados ao restante da população branca - e pobre – deturpam qualquer média de indicadores sociais. Ao mesmo tempo, estes argumentos desconsideram deliberadamente toda agregação de dados que, partindo dos pobres como um segmento social representativo, aparentam mostrar não haver diferença estatística significativa no desempenho social.
Um segundo problema se encontra na questão da identidade negra. Qual seria esta identidade particular, para além da cor da pele? A origem africana, parece ser a resposta sugerida. Neste ponto, duas questões se colocam. A primeira diz respeito a qual África se está referindo, visto que tanto histórica, sociológica como culturalmente sempre existiram e existem muitas áfricas. A própria origem dos escravos que para cá vieram é bastante diversificada. A outra questão é que grande parte deste diversificado aporte cultural já está plenamente incorporado à cultura brasileira e, portanto, constitui uma marca de identidade para toda a população. Esta mesma constatação coloca em dúvida a própria afirmação de um racismo estrutural, uma vez que fica difícil imaginar mecanismos sociais, amplamente difundidos, que ao mesmo tempo segregam e incorporam os elementos culturais dos segregados.
Um outro aspecto deve, também, ser problematizado. É a idéia implícita na associação entre reparação e culpa por processos históricos. Na realidade a referência à História, nestes casos, é meramente instrumental, visto que este tipo de concepção é fundamentalmente a-histórica. Um processo histórico é sempre o resultado de múltiplas determinações. E assim foi também a escravidão. Diversos agentes - indivíduos, populações, nações e Estados – e variados interesses conduziram à sua operação. A historiografia recente tem apresentado inúmeras evidências da participação de indivíduos (alforriados) e populações negras (outras etnias ou grupos) neste processo. Para o bem ou para o mal, a História não se presta ao modelo hollywoodiano de pensar o mundo como a luta de mocinhos contra bandidos. Se há culpa e reparações necessárias, devemos encontra-las no presente. Nesta sociedade profundamente desigual e excludente onde, ao sabor da onda neoliberal, contingentes cada vez maiores da população (de todas as cores!) são arrastados para a indigência social.
Por último deveríamos refletir sobre o resultado alcançado por este tipo de política na sociedade que lhe deu origem: a sociedade estadunidense. Lá, ao mesmo tempo em que foi se constituindo uma classe média de “afro-americanos” – tão conservadora como o conjunto da classe média – a maioria da população negra foi conduzida às prisões, aos guetos e a um padrão social bem inferior às médias nacionais. O racismo, para além dos numerosos grupos organizados, continua a existir e a determinar grande parcela das interações sociais. Como se pode observar, as políticas afirmativas não operam no sentido de reverter as injustiças sociais. Pelo contrário, como toda política social que focaliza ações ao invés de universalizá-las, se enquadra perfeitamente na ordem de interesses do capital. Não por outra razão encontramos as suas Fundações (Ford, Rockfeller, etc.) entre os principais financiadores dos movimentos que reivindicam a sua implementação.
Mas não deixa de ser intrigante constatar como, em nome da justiça social, se opta por adotar este modelo, quando em um outro país - de colonização primário-exportadora, abolição tardia, e origem latina como o nosso – as políticas de universalização de direitos sociais levaram a uma efetiva ampliação da igualdade social. Existe racismo em Cuba, mas é uma percepção de foro individual que não interfere na estruturação e na dinâmica de sua sociedade. Que razões, então, existiriam para a realização social alcançada por Cuba tornar-se invisível a este debate? Talvez a resposta se encontre junto ao porquê destas políticas terem ganho impulso no Brasil na seqüência dos governos FHC e Lula, quando desenvolveu-se claramente os contornos neoliberais para as políticas públicas.
Para concluir é forçoso reconhecer que existe racismo no Brasil, como, também, preconceito contra judeus, homossexuais, nordestinos e, principalmente, contra pobres. Mas há de se reconhecer ainda que, por mais que se olhe para o mundo, não se encontra experiência mais avançada do que a nossa forma de socializar a diferença, seja racial, étnica, de cor ou que outro qualificativo se encontre. Esta incrível mestiçagem brasileira já é, por si só, uma confirmação. O racismo envergonhado, de que somos acusados de possuir, nada mais é do que o resultado do constrangimento social construído, silenciosamente, contra o racismo. Não devemos, então, procurar modelos. Nós somos o modelo a ser seguido; é a partir do patamar que alcançamos que devemos aprofundar e avançar. No entanto, nós temos que admitir que não somos uma democracia racial. O problema central, todavia, não se encontra no adjetivo; é para o substantivo, democracia, que devemos voltar nossa reflexão. Nenhuma sociedade tão desigual, na distribuição da renda e da riqueza, pode se acreditar democrática. Não pode existir democracia em convívio com tamanha injustiça social, com a cotidiana criminalização da pobreza. Este é o problema a ser enfrentado, mas, certamente, não será fragmentando “racialmente” a sociedade que o faremos. Ao contrário, efetivada esta fragmentação, estaremos legando um problema adicional para o futuro. E é a necessidade desta clivagem social, que as políticas com este corte tentam afirmar, que nós precisamos, urgentemente, negar.
A tragedia educacional brasileira: finalmente comecam a se dar conta
Demorou, mas finalmente chegou. Universitários se debruçam sobre a verdadeira tragédia que é a educação pública brasileira. Ainda não reconheceram a culpa das instituições universitárias, mas já é um começo.
Se caminharem rápido, em 15 anos vai dar para começar a corrigir os problemas, mas tenho dúvidas. Em todo caso, se trata de uma primeira tomada de consciência...
Especialistas defendem "tratamento de choque" para a educação
Daniela Oliveira
Jornal da Ciência, 28/07/2010
Ensino básico no país é considerado como uma tragédia pelos participantes de mesa-redonda na 62ª Reunião Anual da SBPC. Eles apresentam sugestões para dar o salto necessário, mas ressaltam que não há solução de curto prazo
Dos 135 milhões de brasileiros que deverão votar nas eleições gerais de outubro, cerca de 20% - ou 27 milhões - são analfabetos ou não têm escolaridade. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que retratam a situação da crítica da educação no país, foram apresentados pelo professor Nilson Machado, da Faculdade de Educação da USP, durante mesa-redonda na tarde desta terça-feira (27/7), na 62ª Reunião Anual da SBPC.
"Em 2002, 26% dos eleitores eram analfabetos ou não tinham escolaridade. Em 2006, eram 23%. Agora, são 20%. Está melhorando, mas não dá para a gente se conformar com esse ritmo de mudança. Se continuarmos, acabaremos com os eleitores analfabetos apenas daqui a sete eleições", alerta Machado.
O evento na Reunião Anual reuniu especialistas na área da educação com objetivo de refletir sobre a necessidade de uma inflexão do setor. Para isso, concordaram os participantes da discussão, são necessárias mudanças amplas e urgentes. O coordenador do GT-Educação da SBPC, Isaac Roitman, considera que todo o sistema precisa ser revisto, desde a primeira infância até a pós-graduação.
Roitman mostrou dados referentes ao que chama de "tragédia" - que mostram, entre outros aspectos, o baixo índice de alunos que chegam ao ensino médio e a alta taxa de abandono da escola, especialmente nas regiões Nordeste e Norte; as péssimas colocações do Brasil em exames como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) e em avaliações da Unesco sobre repetência; a diminuição do número de formandos em carreiras do magistério; e as precárias condições de infraestrutura das escolas e de trabalho dos docentes.
Para Nilson Machado, da USP, o país necessita de um projeto nacional que tenha como objetivo imediato a universalização da educação básica - que inclui do ensino infantil ao médio. Para isso, propõe Machado, é necessário um mutirão que reúna todos os atores envolvidos com a educação, durante um período de três a cinco anos para produzir uma inflexão e outro intervalo temporal igual para consolidar as metas.
"A educação precisa de um tratamento de choque. É incompreensível termos uma pós-graduação e pesquisa com reconhecimento até internacional em algumas áreas, e termos um ensino básico com a que existe atualmente", lamenta.
Seguindo esse propósito de fazer um mutirão pela educação, a SBPC criou, em 2008, o grupo de trabalho (GT-Educação) para pensar soluções de médio e longo prazo para o setor. No ano passado, a entidade lançou o movimento "Pacto pela Educação", ampliando as ações do GT, que tem representantes da academia, do setor empresarial, de entidades estudantis e da sociedade civil. (leia mais abaixo)
Outro ponto ressaltado na mesa-redonda foi a questão dos modelos pedagógicos utilizados pelas escolas brasileiras. Fernando Becker, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), defende uma reformulação profunda na formação dos professores, já que, a seu ver, o modelo atual é o de apresentar o conteúdo e mandar o aluno repetir. "A escola tem que se transformar cada vez mais em laboratório e cada vez menos em auditório", provoca Becker.
Com relação aos investimentos no setor, os especialistas concordam que os recursos existentes são, mais que insuficientes, mal aplicados. Para eles, seria possível até mesmo quadruplicar o salário dos professores da educação básica, cujo piso atual está próximo de R$ 1.000. Uma proposta seria a adoção de remuneração diferenciada para docentes com mestrado e doutorado - o que propiciaria uma transição gradual para atingir um padrão salarial e incentivaria o aperfeiçoamento dos professores.
O debate sobre educação foi mediado pela professora Araci Assinelli da Luz, do Departamento de Teoria e Prática de Ensino da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que alertou sobre a importância de a sociedade como um todo se mobilizar em favor das mudanças necessárias à educação no país.
GT-Educação da SBPC quer apresentar propostas ao próximo governo
O grupo de trabalho (GT-Educação) criado pela SBPC para discutir e propor ações para a educação no país pretende consolidar propostas, principalmente voltadas ao ensino básico, que serão entregues ao próximo presidente da República.
A intenção é reunir uma série de ações práticas e estratégias de desenvolvimento dessas ações nas seguintes dimensões: o professor; conteúdos e processos pedagógicos; infraestrutura; gestão; avaliação; e integração com a sociedade.
O coordenador do GT, Isaac Roitman, informou que o objetivo é consolidar as propostas até fevereiro de 2011. O próximo passo será a elaboração de indicadores para avaliar se as medidas sugeridas estão sendo postas em prática e quais são seus resultados.
Se caminharem rápido, em 15 anos vai dar para começar a corrigir os problemas, mas tenho dúvidas. Em todo caso, se trata de uma primeira tomada de consciência...
Especialistas defendem "tratamento de choque" para a educação
Daniela Oliveira
Jornal da Ciência, 28/07/2010
Ensino básico no país é considerado como uma tragédia pelos participantes de mesa-redonda na 62ª Reunião Anual da SBPC. Eles apresentam sugestões para dar o salto necessário, mas ressaltam que não há solução de curto prazo
Dos 135 milhões de brasileiros que deverão votar nas eleições gerais de outubro, cerca de 20% - ou 27 milhões - são analfabetos ou não têm escolaridade. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que retratam a situação da crítica da educação no país, foram apresentados pelo professor Nilson Machado, da Faculdade de Educação da USP, durante mesa-redonda na tarde desta terça-feira (27/7), na 62ª Reunião Anual da SBPC.
"Em 2002, 26% dos eleitores eram analfabetos ou não tinham escolaridade. Em 2006, eram 23%. Agora, são 20%. Está melhorando, mas não dá para a gente se conformar com esse ritmo de mudança. Se continuarmos, acabaremos com os eleitores analfabetos apenas daqui a sete eleições", alerta Machado.
O evento na Reunião Anual reuniu especialistas na área da educação com objetivo de refletir sobre a necessidade de uma inflexão do setor. Para isso, concordaram os participantes da discussão, são necessárias mudanças amplas e urgentes. O coordenador do GT-Educação da SBPC, Isaac Roitman, considera que todo o sistema precisa ser revisto, desde a primeira infância até a pós-graduação.
Roitman mostrou dados referentes ao que chama de "tragédia" - que mostram, entre outros aspectos, o baixo índice de alunos que chegam ao ensino médio e a alta taxa de abandono da escola, especialmente nas regiões Nordeste e Norte; as péssimas colocações do Brasil em exames como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa) e em avaliações da Unesco sobre repetência; a diminuição do número de formandos em carreiras do magistério; e as precárias condições de infraestrutura das escolas e de trabalho dos docentes.
Para Nilson Machado, da USP, o país necessita de um projeto nacional que tenha como objetivo imediato a universalização da educação básica - que inclui do ensino infantil ao médio. Para isso, propõe Machado, é necessário um mutirão que reúna todos os atores envolvidos com a educação, durante um período de três a cinco anos para produzir uma inflexão e outro intervalo temporal igual para consolidar as metas.
"A educação precisa de um tratamento de choque. É incompreensível termos uma pós-graduação e pesquisa com reconhecimento até internacional em algumas áreas, e termos um ensino básico com a que existe atualmente", lamenta.
Seguindo esse propósito de fazer um mutirão pela educação, a SBPC criou, em 2008, o grupo de trabalho (GT-Educação) para pensar soluções de médio e longo prazo para o setor. No ano passado, a entidade lançou o movimento "Pacto pela Educação", ampliando as ações do GT, que tem representantes da academia, do setor empresarial, de entidades estudantis e da sociedade civil. (leia mais abaixo)
Outro ponto ressaltado na mesa-redonda foi a questão dos modelos pedagógicos utilizados pelas escolas brasileiras. Fernando Becker, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), defende uma reformulação profunda na formação dos professores, já que, a seu ver, o modelo atual é o de apresentar o conteúdo e mandar o aluno repetir. "A escola tem que se transformar cada vez mais em laboratório e cada vez menos em auditório", provoca Becker.
Com relação aos investimentos no setor, os especialistas concordam que os recursos existentes são, mais que insuficientes, mal aplicados. Para eles, seria possível até mesmo quadruplicar o salário dos professores da educação básica, cujo piso atual está próximo de R$ 1.000. Uma proposta seria a adoção de remuneração diferenciada para docentes com mestrado e doutorado - o que propiciaria uma transição gradual para atingir um padrão salarial e incentivaria o aperfeiçoamento dos professores.
O debate sobre educação foi mediado pela professora Araci Assinelli da Luz, do Departamento de Teoria e Prática de Ensino da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que alertou sobre a importância de a sociedade como um todo se mobilizar em favor das mudanças necessárias à educação no país.
GT-Educação da SBPC quer apresentar propostas ao próximo governo
O grupo de trabalho (GT-Educação) criado pela SBPC para discutir e propor ações para a educação no país pretende consolidar propostas, principalmente voltadas ao ensino básico, que serão entregues ao próximo presidente da República.
A intenção é reunir uma série de ações práticas e estratégias de desenvolvimento dessas ações nas seguintes dimensões: o professor; conteúdos e processos pedagógicos; infraestrutura; gestão; avaliação; e integração com a sociedade.
O coordenador do GT, Isaac Roitman, informou que o objetivo é consolidar as propostas até fevereiro de 2011. O próximo passo será a elaboração de indicadores para avaliar se as medidas sugeridas estão sendo postas em prática e quais são seus resultados.
Guerrilha obscurantista contra transgenicos (e preconceito contra multinacionais tambem)
Os medievais supostamente ecologistas continuam sua guerra de retaguarda contra os transgênicos, misturando crenças irracionais e preconceitos anticapitalistas contra a introdução de OGMs no mercado alimentar.
Eles são bem sucedidos conjunturalmente, atrasando o progresso, aumentando custos para a sociedade, provocando reações irracionais e paranóicas contra produtos contendo OGMs.
Eles serão derrotados, não sem antes provocar muito desgaste para a ciência e para a economia, barrando empresas e cientistas no caminho do progresso.
Paulo Roberto de Almeida
Justiça proíbe venda de milho transgênico da Bayer
Lígia Formenti
O Estado de S.Paulo, 28/07/2010
Polêmica já dura dois anos; produto só pode retornar ao mercado após CTNBio aprovar o plano de monitoramento do produto no mercado
A Justiça Federal proibiu a venda do milho transgênico Liberty Link, produzido pela Bayer. A decisão, da juíza federal Pepita Durski Tramontine, da Vara Ambiental de Curitiba, na segunda-feira, afirma que o produto só pode retornar ao mercado após a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovar o plano de monitoramento do produto no mercado.
A juíza também ordenou a proibição do uso do milho, resistente ao herbicida glufosinato de amônio, no Norte e Nordeste até que sejam realizados estudos ambientais do produto nas regiões. "Nesses locais, não basta a aprovação do plano de monitoramento pela CTNBio. É preciso que estudos anteriores, relacionados à segurança, sejam realizados", explicou a advogada e consultora do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Andrea Lazzarini Salazar.
A decisão fixa uma multa de R$ 50 mil diários caso a Bayer não suspenda imediatamente a comercialização, semeadura, transporte, importação e descarte do milho geneticamente modificado. A empresa afirmou que se manifestará apenas quando for notificada judicialmente.
A polêmica em torno do milho transgênico dura mais de dois anos. Liberado pela CTNBio em 2007, o produto foi alvo de uma ação proibindo sua comercialização no mesmo ano. Uma liminar foi concedida e, em janeiro de 2008, revogada. Agora, a juíza analisou a ação principal.
O milho da Bayer provocou uma disputa dentro do governo. Descontente com a aprovação, a Anvisa interpôs um recurso no Conselho Nacional de Biossegurança. Em junho de 2008, o conselho confirmou a liberação.
A CTNBio não se manifestou.
Eles são bem sucedidos conjunturalmente, atrasando o progresso, aumentando custos para a sociedade, provocando reações irracionais e paranóicas contra produtos contendo OGMs.
Eles serão derrotados, não sem antes provocar muito desgaste para a ciência e para a economia, barrando empresas e cientistas no caminho do progresso.
Paulo Roberto de Almeida
Justiça proíbe venda de milho transgênico da Bayer
Lígia Formenti
O Estado de S.Paulo, 28/07/2010
Polêmica já dura dois anos; produto só pode retornar ao mercado após CTNBio aprovar o plano de monitoramento do produto no mercado
A Justiça Federal proibiu a venda do milho transgênico Liberty Link, produzido pela Bayer. A decisão, da juíza federal Pepita Durski Tramontine, da Vara Ambiental de Curitiba, na segunda-feira, afirma que o produto só pode retornar ao mercado após a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) aprovar o plano de monitoramento do produto no mercado.
A juíza também ordenou a proibição do uso do milho, resistente ao herbicida glufosinato de amônio, no Norte e Nordeste até que sejam realizados estudos ambientais do produto nas regiões. "Nesses locais, não basta a aprovação do plano de monitoramento pela CTNBio. É preciso que estudos anteriores, relacionados à segurança, sejam realizados", explicou a advogada e consultora do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Andrea Lazzarini Salazar.
A decisão fixa uma multa de R$ 50 mil diários caso a Bayer não suspenda imediatamente a comercialização, semeadura, transporte, importação e descarte do milho geneticamente modificado. A empresa afirmou que se manifestará apenas quando for notificada judicialmente.
A polêmica em torno do milho transgênico dura mais de dois anos. Liberado pela CTNBio em 2007, o produto foi alvo de uma ação proibindo sua comercialização no mesmo ano. Uma liminar foi concedida e, em janeiro de 2008, revogada. Agora, a juíza analisou a ação principal.
O milho da Bayer provocou uma disputa dentro do governo. Descontente com a aprovação, a Anvisa interpôs um recurso no Conselho Nacional de Biossegurança. Em junho de 2008, o conselho confirmou a liberação.
A CTNBio não se manifestou.
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