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sábado, 18 de setembro de 2010

Republica Mafiosa do Brasil (29): Revista Veja detona a Casa Civil...

Em qualquer país decente -- por exemplo, os EUA, vários europeus (mas não todos), os nórdicos certamente, e até alguns latinos, do Norte e do Sul -- o governo já teria caído.
Num país com Justiça atuante, com procuradoria independente, com parlamento digno, não apenas todo o governo teria caído, mas o presidente seria provavelmente objeto de processo por crime de responsabilidade, e até condenado a perder o mandato por impeachment. Não necessariamente por participar de qualquer crime, mas simplesmente por mentir.
Obviamente, nada disso vai ocorrer no Brasil.

Eu estava pensando que esta série sobre a república mafiosa do Brasil -- que possui até Constituição (vou repostá-la, ugh, no próximo post -- teria menos de dez posts. Mas ela já vai para 30 e promete nunca acabar. A culpa não é minha...
Paulo Roberto de Almeida

'Caraca! Que dinheiro é esse?'
Diego Escosteguy e Otávio Cabral
Revista Veja, 18.9.2010| 9h04m

Funcionário da Casa Civil recebeu propina dentro da Presidência da República, perto do gabinete da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e a um andar do presidente Lula

Numa manhã de julho do ano passado, o jovem advogado Vinícius de Oliveira Castro chegou à Presidência da República para mais um dia de trabalho. Entrou em sua sala, onde despachava a poucos metros do gabinete da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e de sua principal assessora, Erenice Guerra Vinícius se sentou, acomodou sua pasta preta em cima da mesa e abriu a gaveta.

O advogado tomou um susto: havia ali um envelope pardo. Dentro, 200 mil reais em dinheiro vivo – um “presentinho” da turma responsável pela usina de corrupção que operava no coração do governo Lula.

Vinícius, que flanava na Agência Nacional de Aviação Civil, a Anac, começara a dar expediente na Casa Civil semanas antes, apadrinhado por Erenice Guerra e o filho-lobista dela, Israel Guerra, de quem logo virou compadre.

Apavorado com o pacotaço de propina, o assessor neófito, coitado, resolveu interpelar um colega: “Caraca! Que dinheiro é esse? Isso aqui é meu mesmo?”. O colega tratou de tranquilizá-lo: “É a ‘PP’ do Tamiflu, é a sua cota. Chegou para todo mundo”.

PP, no caso, era um recado – falado em português, mas dito em cifrão. Trata-se da sigla para os pagamentos oficiais do governo. Consta de qualquer despacho público envolvendo contratos ou ordens bancárias. Adaptada ao linguajar da cleptocracia, significa propina. Tamiflu, por sua vez, é o nome do remédio usado para tratar pacientes com a gripe H1N1, conhecida popularmente como gripe suína.

Dias antes, em 23 de junho, o governo, diante da ameaça de uma pandemia, acabara de fechar uma compra emergencial desse medicamento – um contrato de 34,7 milhões de reais. A “PP” entregue ao assessor referia-se à comissão obtida pela turma da Casa Civil ao azeitar o negócio Segundo o assessor, o governo comprara mais Tamiflu do que o necessário, de modo a obter uma generosa comissão pelo negócio.

Até a semana passada, Vinícius era assessor da Casa Civil e sócio de Israel Guerra, filho de Erenice Guerra, ex-ministra da pasta, numa empresa que intermediava contratos com o governo usando a influência da petista. Naturalmente, cobravam comissão pelos serviços.

Depois que VEJA revelou a existência do esquema em sua última edição, Vinícius e outro funcionário do Planalto, Stevan Knezevic, pediram demissão, a ministra Erenice caiu – e o governo adernou na mais grave crise política desde o escândalo do mensalão, e que ronda perigosamente a campanha presidencial da petista Dilma Rousseff.

Lançado ao centro do turbilhão de denúncias que varre a Casa Civil, Vinícius Castro confidenciou o episódio da propina a pelo menos duas pessoas: seu tio e à época diretor de Operações dos Correios, Marco Antonio de Oliveira, e a um amigo que trabalhava no governo. Ambos, em depoimentos gravados, confirmaram a VEJA o teor da confissão.

Antes de cair em desgraça, o assessor palaciano procurou o tio e admitiu estar intrigado com a incrível despreocupação demonstrada pela família Guerra no trato do balcão de negócios instalado na Casa Civil. Disse o assessor: “Foi um dinheiro para o Palácio. Lá tem muito negócio, é uma coisa. Me ofereceram 200 000 por causa do Tamiflu”.

Vinícius explicou ao tio que não precisou fazer nada para receber a PP. “Era o ‘cala-boca". O assessor disse ainda ao tio que outros três funcionários da Casa Civil receberam os tais pacotes com 200 000 reais; porém não declinou os nomes nem a identidade de quem distribuiu a propina. Diz o ex-diretor dos Correios: “Ele ficou espantado com aquela coisa. Eu avisei que, se continuasse desse jeito, ele iria sair algemado do Palácio”.

O cândido ex-assessor tem razão: dinheiro sujo dentro de um gabinete da Presidência da República é um fato espantoso. Nos últimos anos, sobretudo desde que o presidente Lula relativizou os crimes cometidos durante o mensalão, sempre que se apresenta um caso de corrupção à opinião pública surgem três certezas no imaginário popular.

* Primeiro, nunca se viu um escândalo tão escabroso
* Ninguém será punido
* O escândalo que vier a sucedê-lo reforçará as duas certezas anteriores.


A anestesiada sociedade brasileira já soube de dinheiro na cueca, dinheiro na meia, dinheiro na bolsa, dinheiro em caixa de uísque, dinheiro prometido por padre ligado a guerrilheiros colombianos. Mas nada se compara em ousadia ao que se passava na Casa Civil. Ficará consolidado no inverno moral da era Lula se, mais uma vez, esses eventos forem varridos para debaixo do tapete.

Já se soube de malfeitorias produzidas na Presidência, mas talvez nunca de um modo tão organizado e sistemático como agora – e, ao mesmo tempo, tão bisonhamente rudimentar, com contratos, taxas de sucesso e depósitos de propina em conta bancária.

Por fim, o que pode ser mais escabroso do que um grupo de funcionários públicos, ao que tudo indica com a participação de um ministro da Casa Civil, cobrar pedágio em negócios do governo? O mais assustador, convenha-se, é repartir o butim ali mesmo, nas nobres dependências da cúpula do Poder Executivo, perto do presidente da República e ao lado da então ministra e hoje candidata petista Dilma Rousseff.

Na semana passada, quando o caso veio a público, a candidata do PT ao Planalto, Dilma Rousseff, tentou se afastar o quanto pôde do escândalo. Apesar de o esquema ter começado quando Dilma era ministra e Erenice sua escudeira, a candidata disse que não poderia ser responsabilizada por “algo que o filho de uma ex-assessora fez”. Dilma candidata não tinha mesmo outra alternativa. As eleições estão aí e o assunto em questão é por demais explosivo.

Erenice Guerra ganhou vida em razão do oxigênio que Dilma lhe forneceu durante sete anos de governo. Erenice trabalhou com a candidata quando esta comandava a pasta de Minas e Energia e na Casa Civil transformou-se na assessora-mor da petista, assumindo o cargo de secretária-executiva. É possível que em todos esses anos de intenso trabalho conjunto Dilma não tenha percebido o que se passava ao seu redor. É possível que Dilma seja uma péssima leitora de caráter. Mas, em algum momento, ela vai ter que enfrentar publicamente esse enorme contencioso passado.

Obedecendo à consagrada estratégia política estabelecida pelo PT, Dilma não só tentou se distanciar do caso como buscou desqualificar os fatos apresentados por VEJA. “É um factoide”, afirmou a candidata, dois dias antes de Erenice ser demitida pelo presidente Lula. (O governo divulgou que a ministra pediu demissão, o que é parolagem.)

A chefe da numerosa família Guerra caiu na manhã da última quinta-feira, vítima dos vícios da sua turma. Além dos fatos apontados por VEJA, veio a público o atávico hábito da ex-ministra em empregar parentes no governo, que, desde já, dá um novo significado ao programa Bolsa Família. Também se descobriram contratos feitos sem licitação favorecendo parentes da ministra.

Em um dos episódios, o filhote de Erenice cobrou propina até de um corredor de Motocross, que descolara um patrocínio de 200 000 reais com a Eletrobrás, estatal sob a influência de Erenice. Taxa de sucesso paga: 40 000 reais. “Israel chamava a Dilma de tia”, contou o motoqueiro Luís Corsini, o desportista que pagou a taxa de sucesso.

Antes de capitular aos irretorquíveis fatos apresentados por VEJA, o governo fez de tudo para desqualificar o empresário Fábio Baracat, uma das fontes dos jornalistas na revelação do esquema de arrecadação de propina na Casa Civil. Baracat, um empresário do setor aéreo, narrara, em conversas gravadas, as minúcias de suas tratativas com a família Guerra, que tinham por objetivo facilitar a obtenção de contratos da empresa MTA nos Correios.

No sábado, depois de, como disse, sofrer “fortes pressões”, Baracat divulgou uma nota confusa, na qual “rechaçava oficialmente informações" da reportagem, mas, em seguida, confirmava os fatos relatados. Com medo de retaliações por parte do governo, o empresário refugiou-se no interior de São Paulo. Ele aceitou voltar à capital paulista na última quinta-feira, para mais uma entrevista. Disse ele na semana passada: “Temo pela minha vida. Vou passar um tempo fora do país”. O empresário aceitou ser fotografado e corroborou, diante de um gravador, as informações antes prestadas à revista.

Baracat não quis explicar de onde partiram as pressões que sofreu, mas, em uma hora e meia de entrevista gravada, ratificou integralmente o conteúdo da reportagem. O empresário confirmou que, levado por Israel e Vinícius, encontrou-se várias vezes com Erenice Guerra, quando ela era secretária-executiva e, por fim, quando a petista virou ministra.

As primeiras conversas, narra Baracat, serviram para consolidar a convicção de que Israel não vendia falsamente a influência da mãe. Na última conversa que eles tiveram, em abril deste ano, o tom mudou. Israel cobrava dinheiro do empresário por um problema resolvido para ele na Infraero.

Diz Baracat: “Ele dizia que havia pagado na Infraero para resolver”.
Na reunião, disse Erenice, de acordo com o relato do empresário: “’Olha, você sabe que a gente está aqui na política, e a gente tem que cumprir compromissos’. (...) Ficou subentendido (que se tratava da propina). (Ela) foi sempre genérica (nesse sentido). (...) Ela disse: ‘A gente é político, não pode deixar de ter alguns parceiros’”. Baracat diz que não sabe o que a família Guerra fez com o dinheiro.

O misterioso caso da comissão do Tamiflu também merece atenção das investigações iniciadas pela Polícia Federal e pela Procuradoria-Geral da República. O Ministério da Saúde, que já gastou 400 milhões de reais com a aquisição do remédio desde o ano passado, afirma que não houve qualquer ingerência da Casa Civil – e que a quantidade de Tamiflu comprada foi definida somente por critérios técnicos.

A seguir, mais uma história edificante

Em outros episódios, a participação da Casa Civil aparece de forma mais clara. VEJA apurou mais um caso no qual o poder da Casa Civil dentro do governo misturou-se aos interesses comerciais da ex-ministra, resultando numa negociata de 100 milhões de reais. Desta vez, o lobista central da traficância não é o filho, mas o atual marido de Erenice Guerra, o engenheiro elétrico José Roberto Camargo Campos.

Com a ministra Dilma Rousseff na Casa Civil e a esposa Erenice Guerra como seu braço direito, Camargo convenceu dois amigos donos de uma minúscula empresa de comunicações a disputar o milionário mercado da telefonia móvel. Negócio arriscado, que exige muito capital e experiência num ramo cobiçado e disputado por multinacionais. Isso não era problema para Camargo e seus sócios. Eles não tinham dinheiro nem experiência, mas sim o que efetivamente importa em negócios com o governo: os contatos certos – e poderosos.

Em 2005, a empresa Unicel, tendo Camargo como diretor comercial, conseguiu uma concessão da Anatel para operar telefonia celular em São Paulo. Por decisão pessoal do então presidente da agência, Elifas Gurgel, a empresa do marido ganhou o direto de entrar no mercado. De tão exótica, a decisão foi contestada pelos setores técnicos da Anatel, que alegaram que a empresa sequer havia apresentado garantias sobre sua capacidade técnica e financeira para tocar o negócio.

O recurso levou dois anos para ser julgado pela Anatel. Nesse período, Erenice e seu marido conversaram pessoalmente com o presidente da agência, conselheiros e técnicos, defendendo a legalidade da operação. “A Erenice fazia pressão para que os técnicos revissem seus parecereres e os conselheiros mudassem seu voto”, conta um dos membros do conselho, também alvo da pressão da ex-ministra.

A pressão deu certo. O técnico que questionou a legalidade da concessão, Jarbas Valente, voltou atrás e mudou seu parecer, admitindo os “argumentos” da Casa Civil. Logo depois, Valente foi promovido a conselheiro da Anatel. Um segundo conselheiro, Pedro Jaime Ziller, também referendou a concessão a Unicel. Não se entende bem a relação entre uma coisa e a outra, mas dois assessores de Ziller, logo depois, trocaram a Anatel por cargos bem remunerados na Unicel.

Talvez tenham sido seduzidos pelos altos salários pagos pela empresa, algo em torno de 30 000 reais – muito, mas muito mais do que se paga no serviço público. O presidente Elifas foi pressionado diretamente pelo Ministro das Comunicações, mas nem precisava: ele foi colega de Exéricito de um dos sócios da Unicel. Tudo certo? Não. Havia ainda um problema a ser sanado.

A legislação obriga as concessionárias a pagar 10% do valor do contrato como entrada para sacramentar o negócio. A concessão foi fixada em 93 milhões de reais. A empresa, portanto, deveria pagar 9,3 milhões de reais. A Unicel não tinha dinheiro.

Novamente com Erenice à frente, a Unicel conseguiu uma façanha. O conselho da Anatel acatou o pedido para que o sinal fosse reduzido para 1% do valor do negócio, ou seja, pouco mais de 900 000 reais. A insólita decisão foi contestada pelo Ministério Público e, há duas semanas, considerada ilegal pela Justiça.

Com a ajuda estatal, a empresa anunciou o início da operação em outubro de 2008, com o nome fantasia de AEIOU, prometendo tarifas mais baixas para atrair o público jovem, com o compromisso de chegar a um milhão de clientes em dois anos. Como foi previsto pelos técnicos, nada disso aconteceu.

Hoje, a empresa tem 20 000 assinantes, sua única loja foi fechada por falta de pagamento de aluguel e responde a mais de 30 processos por dívidas, que ultrapassam 20 milhões de reais. Mau negócio? Apesar da aparência, não. A grande tacada ainda está por vir.

O alvo do marido de Erenice é o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) – uma invenção que vai consumir 14 bilhões de reais para universalizar o acesso a internet no Brasil. O grupo trabalha para “convencer” o governo a considerar que a concessão da Unicel é de utilidade pública para o projeto. Com isso, espera receber uma indenização. Valor calculado por técnicos do setor: se tudo der certo, a empresa sairá com 100 milhões de reais no bolso, limpinhos.

Dinheiro dos brasileiros honestos que trabalham e pagam impostos.
A participação da Casa Civil no episódio ultrapassa a intolerável fronteira das facilidades e da pressão política. Aqui, aparecem diretamente as promíscuas relações entre os negócios da família Guerra e os funcionários que, dentro da Presidência da República, deveriam zelar pelo bem público.

A Unicel contou, em especial, com os favores de Gabriel Boavista Lainder, assessor da Presidência da República e dirigente do Comitê Gestor dos Programas de Inclusão Digital, que comanda o PNBL. Antes de ocupar o cargo, Gabriel trabalhou por oito anos com os donos da Unicel. Mas isso é, como de costume, apenas uma coincidência – como também é coincidência o fato de ele ter sido indicado ao cargo pelo marido de Erenice.

“O marido da Erenice é um cara que admirava meu trabalho. Ela me disse que precisava de alguém para coordenar o PNBL”, diz Laender. E completa: “O PNBL não contempla o uso da faixa da Unicel, mas ela pode operar a banda larga do governo se fizer adaptações técnicas” É um escárnio.

Camargo indicou o homem que pode resolver os problemas de sua empresa. Procurado, o marido de Erenice não quis se pronunciar. Na Junta Comercial, o nome de Camargo aparece como sócio de uma empresa de mineração, que funciona em modesto escritório em Brasília. Um probleminha que pode chamar a atenção dos investigadores: a Unicel está registrada no mesmo endereço, que também era usado para receber empresários interessados em negócios com o governo. Certamente mais uma coincidência.

Com reportagem de Rodrigo Rangel, Daniel Pereira, Gustavo Ribeiro e Fernando Mello

Republica Mafiosa do Brasil (28): propina paga dentro do Palacio do Planalto...

Essa Casa Civil era uma casa de tolerância...
Tolerância com a corrupção, tolerância com o roubo declarado, com a mentira, com a mais sórdida orientação em favor de ações delituosas, enfim, com aquilo que justifica o título desta série: uma republiqueta mafiosa, daquelas bem chegadas na criminalidade sem vergonha.
Tudo vai ser negado, tudo vai ser desviado, todas as mentiras serão proclamadas.
Já estamos acostumados a isso. Não se surpreendam com o que vem pela frente.
Eu não me espanto com mais nada, tamanha a cara de pau dos mafiosos...
Paulo Roberto de Almeida

Propina era paga dentro da Casa Civil
Revista Veja, 18/09/2010

Vinícius Castro, sócio de Israel Guerra, recebeu R$ 200 mil reais dentro da sala onde despachava, a poucos metros do gabinete da ministra da Casa Civil

É o ‘PP’ do Tamiflu, é a sua conta. Chegou para todo mundo”. ‘PP’ significa propina no linguajar da repartição.

A reportagem de capa de VEJA desta semana traz mais indícios da extensão do balcão de negócios que funcionava dentro da Casa Civil. A revista relata o episódio em que o jovem advogado Vinicius de Oliveira Castro, sócio do filho da ex-ministra Erenice, se surpreendeu ao encontrar 200 000 reais na gaveta de sua mesa de trabalho. “Caraca! Que dinheiro é esse? Isso aqui é meu mesmo?”, disse.

De acordo com o texto, o dinheiro era parte de um pagamento da turma responsável pela usina de corrupção que funcionava dentro do Palácio do Planalto. Um colega mais experiente explicou: “É o ‘PP’ do Tamiflu, é a sua conta. Chegou para todo mundo”. ‘PP’ significa propina no linguajar da repartição. Tamiflu é o medicamento utilizado para tratar da gripe suína. Dias antes, em 23 de junho, o governo fechara um contrato de 34,7 milhões de reais para compra emergencial da droga. O Ministério da Saúde nega qualquer ingerência da Casa Civil na aquisição de Tamiflu, que já gastou 400 milhões de reais aos cofres públicos.

A história foi revelada a VEJA por um amigo de Vinícius que trabalhava no governo e seu tio, Marco Antonio Oliveira, então diretor de Operações dos Correios. A revista informa que ambos os depoimentos foram gravados. Vinícius relatou ao tio, sem dizer nomes, que outros três funcionários da Casa Civil receberam os pacotes de 200 000 reais. “Foi um dinheiro para o Palácio. Lá tem muito negócio, é uma coisa”, afirmou. Para receber o valor, o ex-assessor da Casa Civil (pediu exoneração na segunda-feira) explicou ao tio que não precisou fazer nada para receber a propina. O pagamento Era o ‘cala-boca’. “Eu avisei que, se continuasse desse jeito, ia sair algemado do Palácio”, lembrou o ex-diretor dos Correios.

Além de ex-funcionário do Planalto, Vinícius foi sócio de Israel Guerra, filho de Erenice Guerra, ex-ministra da Casa Civil (teria sido demitida na quinta-feira), numa empresa que intermediava contratos com o governo. A influência de Erenice no alto escalão do governo garantia bons negócios. E, pelos indícios, alcançava o repugnante fato de receber os favores da corrupção dentro do Palácio de Planalto, numa sala ao lado do gabinete da ministra-chefe da Casa Civil.

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No post seguinte, a matéria completa da Veja...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Republica Mafiosa do Brasil (27): sabendo das coisas e nao fazendo nada...

A desfaçatez geral da república é assim mesmo: não fazer nada até incomodar. Depois disso, acusar os acusadores de propósitos eleitorais. Depois alegar que não sabia de nada. Neste caso, fica difícil.

Caso Erenice Guerra
Planalto sabia de lobby desde fevereiro
Opinião e Notícia, 17/09/2010

O empresário Rubnei Quícoli enviou e-mails no dia 1º de fevereiro para quatro funcionários da assessoria especial da Casa Civil

De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, o Palácio do Planalto sabia, pelo menos desde o mês de fevereiro, que havia um lobby dentro da Casa Civil. A reportagem afirma ainda que também se sabia que havia cobrança de vantagens para a intermediação de empréstimos junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Segundo o jornal, o empresário Rubnei Quícoli enviou e-mails no dia 1º de fevereiro para quatro funcionários da assessoria especial da Casa Civil denunciando a cobrança de R$ 240 mil “por fora” feita pela empresa do filho de Erenice Guerra, Israel Guerra.

Quícoli teria solicitado que o assunto fosse levado à então ministra Dilma Rousseff: “espero de coração que esse e-mail chegue às mãos da dra. Erenice e a (sic) ministra Dilma”.

Sintese dos indicadores sociais do Brasil - PNAD-IBGE

Não apenas a tragédia educacional como refletida no título da matéria, mas também a dependência dos programas sociais -- que, como alertado diversas vezes aqui, cria um exército de assistindos "inextinguível" -- e uma maioria de negros e pardos segundo o sistema de autodeclaração, o que teoricamente faz dos brancos minoria no país, suscetível, quem sabe?, de programas de ação afirmativa...
Em todo caso, sabemos porque o número de pretos e pardos aumentou, e não foi porque a pigmentação da pele escureceu de repente ou as tendências demográficas se alteraram dramaticamente.
Um governo oportunista e debochado costuma dar maus exemplos à população, e construir uma nação de mentirosos...
Paulo Roberto de Almeida

Pnad
Brasil lidera o ranking de abandono escolar no Mercosul, aponta IBGE
Rafael Galdo e Henrique Gomes Batista
O Globo, 17/09/2010

RIO - A Síntese dos Indicadores Sociais, publicada hoje pelo IBGE sobre os dados da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2009, indica que o Brasil lidera a taxa de abandono escolar entre os países do Mercosul. Segundo o levantamento, 10% dos alunos do ensino médio abandonaram as salas de aula no Brasil em 2007, contra 7% na Argentina, 6,8% no Uruguai, 2,9% no Chile, 2,3% no Paraguai e 1% na Venezuela. O mesmo se repete com os ensino fundamental: a taxa de abandono no Brasil foi de 3,2%, acima da registrada na Venezuela (2,3%), Paraguai (1,9%), Argentina e Chile (1,3% cada um) e Uruguai (0,3%).

A taxa de aprovação brasileira também é a pior em relação aos principais vizinhos: 85,8% no fundamental (todos os demais países têm índices superiores a 90%). No ensino médio, a taxa de aprovação de 77% só é superior à uruguai, de 72,7% e da argentina, de 74,3%, mas abaixo da chilena e paraguaia (de 90,9% cada uma) e da venezuelana (91,0%).

O estudo também apontou que 5 milhões de crianças entre 0 e 14 anos, ou 10,9% do total deste segmento, vive em situação de risco, ou seja, em casas sem água tratada, sem rede de esgoto geral e sem coleta de lixo, ou, no dizer do instituto, estavam seriamente expostas a riscos de doenças.

O Nordeste concentra grande parte destas crianças: 19,2% das crianças nesta faixa etária não tem acesso a estes serviços básicos. O Maranhão e o Piauí lideram esta triste estatística, com 27,7% e 26,8% de suas crianças, respectivamente, em risco.

Os problemas não ficam concentrados apenas nas casas das famílias: 39,4% dos alunos na educação básica estudam em escolas brasileiras sem esgotamento sanitário e 10% delas em colégios sem água potável.

Outros fatores de risco também preocupam: 56,9% dos alunos do 9º ano do ensino funamental não praticam 300 minutos semanais de atividade física, 24,2% já experimentaram cigarro, 22,1% já sofreram algum episódio de embriaguez e 24,1% não usaram preservativo em sua última relação sexual.

Aumenta dependência de programas sociais
A síntese indicou também o impacto de programas de transferência de renda na população mais pobres. Nas famílias com renda per capita de até 1/4 do salário mínimo (R$ 116/mês na época da pesquisa) aumentou muito o peso das "Outras Fontes" no orçamento familiar. Se em 1999 essa fonte de renda onde está incluído o Bolsa Família, PETs, LOAS, etc, representava 4,4%, agora está em 28%. Com isso, o peso da renda do trabalho caiu de 81,4% para 66,2% e o da renda oriunda de aposentadorias e pensões passou de 14,2% para 5,8%. As outras fontes neste grupo de famílias representa 30,8% no Nordeste, única região acima da média. Por estado, o líder é o Piauí 33,5%. No Rio, esse percentual está em 20% e só maior que o Acre, onde é 18,8%.

Mulheres ainda ganham menos
De acordo com o estudo do IBGE, 51,2% das mulheres estão no trabalho informal (contra 46,8% dos homens) e 11,6% das mulheres com 16 anos ou mais ocupadas não tem rendimento, trabalham na produção para o próprio consumo ou na construção para o próprio uso ou simplesmente não tem remuneração. Segundo a Pnad o estado onde há maior ocorrência deste fenômeno é no Piauí, onde o fenômeno atinge 28,4% das mulheres com mais de 16 anos e ocupadas.

O trabalho informal feminino é mais comum entre as mulheres entre 16 e 24 anos (69,2%) e para aquelas com 60 anos ou mais (82,2%). O mesmo ocorre com as mulheres que se delcaram pardas, onde a informalidade chega a 60%, contra 44% entre as brancas. Regionalmente a informalidade é maior no Norte. Elas continuam recebendo, em geral 30% a menos que os homens, embora a taxa de escolaridade seja maior que a deles, em especial entre os mais jovens. 55% das domésticas tem entre 25 e 44 anos e 72,8% delas não tem carteira de trabalho assinada.

Aumenta o número de adultos com 11 anos ou mais de estudo
O Pnad apontou também que aumentou fortemente o número de adultos com 11 anos ou mais de estudos. De acordo com o levantamento, 47,2% Da População Economicamente Ativa (PEA) acima de 18 anos, Já tém 11 anos (Ensino fundamental e médio) ou mais de estudos. Há dez anos, esse percentual estava em 28,1%.

"Isso demonstra que a nova geração possui uma escolaridade maior, justamente o que o mercado de trabalho espera"

Levando em conta a população entre 18 e 24 anos, esse percentual está em 55,9% (era 29,6% em 1999), o que mostra que a população mais nova está mais interessada em concluir o ensino médio, tanto por ter mais acesso, como por exigência do mercado de trabalho. No ano passado, 40,7% desta população tinha onze anos de estudo e 15,2% tinha mais que 11 anos de estudo.

- Isso demonstra que a nova geração possui uma escolaridade maior, justamente o que o mercado de trabalho espera - afirma Ana Lúcia Saboia, coordenação geral da pesquisa.

Além disso, o IBGE aponta que a taxa de escolarização líquida - ou seja, a quantidade de pessoas que estão na série adequada à idade - da população entre 15 a 17 anos está em 50,9%. Ou seja, mais pessoas estão concluindo o ensino médio e estão fazendo isso na época certa. Em 1999, esse número estava em 32,7%.

O dado, contudo, esconde distorções nas regiões. No Norte e Nordeste a taxa atual não só é muito menor que nas outras regiões como ainda não alcançaram o resultado do Sudeste e do Sul há dez anos. Hoje no Norte está em 39,1% e no Nordeste 39,2%. O Sudeste tinha em 1999 a taxa de 42,1% e hoje está com 60,5%. No Sul, a taxa há uma década era de 44,6% e hoje está em 57,4%.

População preta ou parda soma 51,1% do total do país
A Pnad indica que 51,1% da população já se considera preta ou parda. Há dez anos, esse percentual estava em 45,4%. O número de pretos, que era 40% em 1999, passou para 42,2% em 2004 e para 44,2% no ano passado. O percentual da população que se declara parda passou de 5,4% em 1999 para 5,9% em 2004 e agora está em 6,9%.

Na outra ponta, o número de pessoas que se declaravam brancas caiu de 54% em 199 para 51,3% em 2004 e chegou em 2009 a 48,2%. A população que se declara amarela ou indígena quase não variou: eram 0,6% tanto em 1999 como em 2004 e agora está em 0,7%,

Aumenta número de residências de casais sem filhos
Em 2009, havia no Brasil 17,1% dos lares formados por casais sem filhos. Em 2004, esse percentual era de 14,6% e em 1999 estava em 13,3%, aponta o estudo. Por outro lado, houve uma forte redução de residências de casais com filhos: eram 55% do total nacional há dez anos, caiu para 51% em 2004 e em 2009 estava em 47,3%.

O número de lares com mulheres sem cônjuges e com filhos voltou a cair: eram 17,1% em 1999, passou para 18,4% em 2004 e em 2009 ficou em 17,4%. Outros tipos de lares, que inclui, por exemplo, pessoas sozinhas, que eram 5,5% em 1999, agora são 6,2%.

O estudo indica também que segue aumentando o número de casamentos entre desquitados. Se em 1999 o casamento entre pessoas que já haviam sido casadas era de 10,6% do total, no ano passado foi de 17,1%, maior patamar da década.

Apenas 22,6% dos idosos se declaram sem doenças
Segundo o levantamento, apenas 22,6% das pessoas com mais de 60 anos indicam que não possuem nenhuma doença. De acordo com o levantamento, 53,5% afirmam sofrer de hipertensão, 35,1% sofrem de dores de coluna ou nas costas, 24,2% vivem com artrite ou reumatismo, 17,3% sofrem com doenças do coração e 16,1% são diabéticos.

Outros 20,9% declaram sofrer de outros males. O percentual supera os 100% porque muitos afirmam ter mais de uma doença. O levantamento indica ainda que 13,6% das pessoas com mais de 60 anos têm dificuldades de andar mais de 100 metros, percentual que sobe para 27,3% quando o instituto leva em conta a população acima de 75 anos.

Governanca no Brasil: personagens obscuros na republica dos ineptos

Um sujeitinho que ja deveria ter sido afastado, ou então, como se diz, "demitido a bem do serviço público", por absoluta incompetência substantiva e inépcia administrativa, que só ascendeu onde esteve por comportamentos mafiosos entre companheiros, em que se premiam os partidários da causa, não a preparação para os cargos.

Ministério Público pede afastamento de diretor-geral da ANP
Juliana Ennes,
Valor Online, 17/09 às 17h37

RIO - O diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP), Haroldo Lima, poderá ser afastado do cargo. O Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo pediu o afastamento e moveu uma ação de improbidade contra Lima por considerá-lo responsável pelo atraso na homologação das especificações do diesel S-50, menos poluente.

A demora na homologação teria atrasado o programa de combustíveis e veículos menos poluentes, "causando danos morais e ambientais ao país", de acordo com nota divulgada pelo MPF.

Para a instituição, o afastamento de Lima do cargo é necessário para evitar que ele venha a praticar novos atos que instiguem, ainda mais, a descrença da população com a ANP, "agravando o dano moral coletivo já sofrido".

Além do pedido de afastamento liminar do diretor-geral da ANP, o MPF quer seu afastamento definitivo da função e sua condenação por improbidade administrativa e ao ressarcimento integral do dano moral coletivo em valor a ser estipulado pela Justiça Federal.

Além disso, Haroldo Lima teria suspensos seus direitos políticos de três a cinco anos, pagaria multa civil de 100 vezes o valor de sua remuneração e a proibição de contratar com o poder público por três anos.

Quando Lima era diretor responsável pela Superintendência de Qualidade da ANP, segundo o Ministério Público, ele não levou ao colegiado a proposta de ação da agência que visava definir as especificações do óleo diesel de referência para as fases P6 e L5 do Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve).

Depois, como diretor-geral, ele não teria garantido a aprovação da resolução especificando o combustível dentro do prazo estabelecido em lei, que era 1º de janeiro de 2006. A resolução ficou pronta somente em novembro de 2007.

Com isso, a indústria automobilística e a de combustíveis não teve tempo suficiente para cumprir as fases P6 e L5 do Proconve, não colocando em circulação frota e combustíveis menos poluentes, em 2009, em especial o diesel S-50, como previa o programa de controle.

"A ação é resultado das apurações feitas em um inquérito civil público, aberto pelo MPF em São Paulo, em janeiro de 2008, para apurar de quem foi a responsabilidade pelo descumprimento da resolução 315/2002", informa a nota do MPF.

A investigação foi realizada enquanto o MPF e o Estado de São Paulo buscavam, judicialmente, o cumprimento da resolução dentro do prazo, o que acabou resultando em um acordo para a entrada paulatina do diesel S-50 no mercado e outras medidas anti-poluição.

Em sua defesa, o diretor-geral da ANP teria argumentado, segundo o MPF, que o prazo previsto tratava de uma fase já cumprida. "Para o MPF, tal justificativa não afasta o ato de improbidade cometido, primeiro porque a interpretação dada à norma pelo diretor-geral da ANP é juridicamente insustentável e diverge de todos os órgãos que participaram da elaboração da resolução (...) segundo porque ele nunca consultou o departamento jurídico da agência para buscar se certificar de que sua interpretação da lei estava correta", informa a nota.

Devido ao descumprimento do cronograma para a entrada do diesel S-50 no mercado, com menos enxofre e, portanto, menos poluente, o Estado de São Paulo ingressou com uma ação na 19ª Vara Federal Cível de São Paulo contra a Petrobras e a ANP.

O MPF ingressou na ação em janeiro de 2008 e acrescentou novos pedidos. O objetivo era garantir a distribuição do diesel menos poluente ainda em 2009. O MPF, em junho de 2008, moveu ainda uma ação contra os fabricantes de veículos, para que fossem fabricados motores adequados ao novo combustível.

Tratado de Petropolis com a Bolivia: contexto negociador, texto do tratado (PRA)

Transcrevo abaixo longa introdução que preparei ao Tratado de Petrópolis (1903) fixando as fronteiras entre o Brasil e a Bolívia, depois das negociações que resultaram na compra do território do Acre pelo Brasil, mediante compensações financeiras e territoriais (ademais de facilidades de acesso aos rios brasileiros conduzindo à saída do Amazonas).
Essa introdução, escrita originalmente -- Brasília, 25 fevereiro 2010 -- para uma revista da Câmara dos Deputados (Plenarium), não foi ainda publicada, razão pela qual resolvi divulgá-la neste momento.
Paulo R. de Almeida (17.09.2010)

O Tratado de Petrópolis de 1903, sobre o Acre, com a Bolívia: contextualização histórica e breve descrição
Paulo Roberto de Almeida

A negociação e a assinatura do Tratado de Petrópolis, que concluiu a compra do Acre à Bolívia pelo Brasil, em 17 de novembro de 1903, com alguma permuta de territórios e compensações financeiras, se situa exatamente a meio termo de um período de intensas negociações e de processos de arbitragem que consolidou as fronteiras do Brasil como jamais tinha ocorrido desde o Tratado de Madri (1750), que também redefiniu de modo radical os limites geográficos do Brasil na América do Sul. Na década e meia que vai da arbitragem em torno do caso das Missões (1895) a um novo tratado de limites com o Uruguai (1909), o Barão do Rio Branco conduziu praticamente sozinho a mais extensa, mais complexa e mais diversificada maratona diplomática de fixação das fronteiras do Brasil já registrada em nossa história. Ao final desse ciclo, já consolidada a República, o território brasileiro tinha, grosso modo, a conformação hoje presente nas cartas geográficas.
Até o início do regime republicano – no seguimento da anulação do Tratado de Madri, pelo qual a linha de Tordesilhas (1494) tinha sido empurrada bem longe, na direção do poente e no vácuo deixado pelos tratados “revisores” que o sucederam, El Pardo (1761) e Santo Idelfonso (1777) –, o Império tinha concluído, na segunda metade do século 19 (e depois das revoltas do período regencial), alguns tratados de “amizade, limites, navegação e comércio” com os países limítrofes (inclusive um com a Bolívia, em 1867) que buscavam delimitar fronteiras ainda largamente indefinidas, e que, em larga medida, assim permaneceram até que o Barão entrasse em cena. [Nota: Todos os tratados internacionais do Brasil, desde Tordesilhas até 1912, estão referenciados nos dois volumes de José Manoel Cardoso de Oliveira, Actos Diplomaticos do Brasil: tratados do periodo colonial e varios documentos desde 1492 (edição facsimilar: Brasília: Senado Federal, 1997; Coleção Memória brasileira nº 11; organização e introdução de Paulo Roberto de Almeida); o tratado de Santo Idelfonso, por sinal, foi invalidado pela guerra de 1801 entre Portugal e Espanha e pela conclusão do tratado de Badajós, logo em seguida, por sua vez declarado nulo por meio de manifesto que D. João, Príncipe Regente, fez divulgar logo após sua instalação no Rio de Janeiro, em 1808.]
Depois de Alexandre de Gusmão, um dos precursores do estudo e da aplicação consciente do princípio do uti possidetis à fixação das fronteiras do Brasil foi o diplomata Duarte da Ponte Ribeiro, um grande “recolhedor” de mapas e manuscritos dos países vizinhos em todos os postos por onde andou (repúblicas hispânicas do Pacífico, em sua maior parte). Curiosamente, a primeira diplomacia brasileira não acolheu favoravelmente suas sugestões quando esse “diplomata a cavalo” as fez, pioneiramente, na terceira e quarta décadas do século 19. [Nota: Sobre a vida e o trabalho diplomático do Barão da Ponte Ribeiro, ver José Antonio Soares de Souza, Um Diplomata do Império: Barão da Ponte Ribeiro (São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1952; Coleção Brasiliana 273). Ponte Ribeiro chegou a negociar um tratado baseado no uti possidetis com a então Confederação Peruana-Boliviana, em 1837, inconclusivo em função da dissolução dessa confederação. Ver, também, Luis Cláudio Villafañe Gomes Santos, O Império e as repúblicas do Pacífico: as relações do Brasil com o Chile, Bolívia, Peru, Equador e Colômbia, 1822-1889 (Curitiba: Editora da UFPR, 2002).]
De certa forma, ainda que por vias diferentes e mediante procedimentos não necessariamente conformes ao espírito desse princípio, o uti possidetis também foi aplicado ao caso do território do Acre, talvez até com maior ênfase prática, ainda que o conceito latino da posse legal pela ocupação efetiva nem de longe esteja presente na letra do referido tratado bilateral. De fato, brasileiros tinham se instalado de modo quase permanente no território boliviano, tão pronto a exploração da hevea brasiliensis levou seringueiros e outros aventureiros a avançar cada vez mais a montante dos tributários do Solimões e do Amazonas, à medida que a borracha subia de preço nos mercados internacionais. A reafirmação desse princípio, mais os traços físicos de antigas visitas e de localidades portuguesas fundadas desde a época da unificação dos dois reinos ibéricos – abundantes mapas e muitos marcos em pedra, penosamente levados em embarcações e em lombos de burros – serviram de substrato documental e material aos negociadores brasileiros na delimitação ulterior de nossas fronteiras com nossos vizinhos sul-americanos.
Uma característica, porém, distingue o Tratado de Petrópolis de todos os demais estabelecidos com os países vizinhos, negociados ou não pelo Barão do Rio Branco: à diferença dos territórios em larga medida indevassados, de cartografia imprecisa ou inexistente, cuja linha divisória necessitava ser penosamente demarcada por homens no terreno, consoante definições difusas constantes de antigos tratados da era luso-castelhana ou no seguimento das independências sul-americanas, todo o território do Acre era juridicamente, historicamente boliviano. Tão boliviano, aliás, quanto atualmente os territórios do Chile setentrional, na fronteira com o Peru, que a nação vizinha perdeu para o longo país andino, na segunda guerra do Pacífico.
Persistia, entretanto, no caso do tratado de 1867 com a Bolívia, dúvidas quanto à divisória exata naquele espaço acreano: se a linha oblíqua Javari-Beni, ou o paralelo 10°20’, como tendia a acreditar o Brasil. Essas divergências cartográficas, incertezas derivadas do próprio desconhecimento da hidrografia local, também alimentaram teses divergentes no período mais agudo do conflito, marcado pelas incursões dos patriotas liderados por Plácido de Castro e, depois, pela ocupação militar do Brasil.
O Brasil, que jamais empreendeu qualquer guerra de conquista contra qualquer um dos seus vizinhos – apenas defendendo o que lhe pertencia por herança lusitana na América do Sul, à exceção do território da Cisplatina, o Uruguai atual, contencioso criado com a própria fundação da Colônia de Sacramento, mas que, na condição de foco de precoce animosidade entre o jovem Império do Brasil e as então pouco consolidadas Províncias Unidas do Rio da Prata, reproduzia históricos conflitos luso-castelhanos – e que jamais manifestou qualquer espírito belicoso em relação a vizinhos grandes, pequenos e médios, sempre preferiu a via do direito para estabelecer esses limites, seja pela via das negociações diretas, seja por meio da arbitragem internacional. A mesma abordagem escrupulosamente jurídica foi seguida igualmente no caso da Bolívia, como também foi o caso de uma hipotética fronteira entre o Brasil e o Equador, cujas linhas básicas, em grande medida virtuais, o Barão do Rio Branco fez questão de finalizar com aquele país do Pacífico – que depois perdeu territórios amazônicos para o Peru e a Colômbia – tão pronto foram resolvidas as pendências com a Bolívia e com o Peru. Depois da infeliz decisão do árbitro italiano – o rei Vitório Emanuel – em torno da questão da Guiana, cujo território disputado foi em boa parte entregue pelo italiano ao Reino Unido, o Barão preferiu negociar diretamente com os vizinhos todas as pendências remanescentes da era colonial e do Império.
A outra característica do território acreano, e que o distinguia das demais disputas ou negociações para o estabelecimento de linhas divisórias com os países lindeiros, era que essa mesma região era mais facilmente acessível pelo lado do Brasil do que a partir do território boliviano, o que justamente explica a ocupação gradual, e pacífica, de gente brasileira no último terço do século 19, ali deslocada para extrair a goma-elástica, que constituía uma das bases da economia local. Foi justamente em face dessa dificuldade em administrar um território que, em grande medida, escapava à sua autoridade, que os dirigentes de La Paz tinham resolvido arrendar a região e seus recursos naturais a um “sindicato” de capitalistas ingleses e americanos, processo efetuado mediante a assinatura de um “contrato” entre o governo boliviano e a corporação então criada, em junho de 1901, e aprovado pelo Congresso boliviano em dezembro do mesmo ano. Tal decisão ameaçou trazer para o coração da América do Sul o mesmo de tipo de colonização por grandes companhias ocidentais já protagonizado em territórios asiáticos ou africanos, com possível ingerência política ulterior das potências sedes dessas corporações.
Falhando as admoestações diplomáticas brasileiras em prol do cancelamento desse contrato de cessão de soberania, e revoltando-se a população local brasileira contra as novas condições estabelecidas após o arrendamento estrangeiro, o governo boliviano resolveu deslocar tropas para a região, como forma de submeter os rebeldes e implementar as pretensões dos arrendatários. Foi esse o estado de situação que o Barão encontra, como seu primeiro grande problema diplomático, ao tomar posse como ministro das relações exteriores do presidente Rodrigues Alves (1902-1906) em dezembro de 1902.

Rio Branco constatou, “ao primeiro exame, que só uma solução se impunha, urgente e inadiável: tornar brasileiro todo o território habitado pelos nossos nacionais mediante sua aquisição. Solução prática e eficaz, de benefícios imediatos para um e outro governo, eliminava radicalmente as causas de desinteligência entre as duas soberanias e removia, de uma vez por todas, as dificuldades com que ambas lutavam desde 1889.” [Nota: Cf. A. G. de Araújo Jorge, Rio Branco e as Fronteiras do Brasil: uma introdução às obras do Barão do Rio Branco (Brasília: Senado Federal, 1999), p. 104-105.]
O processo não foi evidentemente linear ou rápido, tendo os bolivianos recusado algumas propostas brasileiras e ordenado a pacificação militar da região, em face do que o Brasil decidiu atuar no mesmo sentido: “Ante esses preparativos bélicos, o governo do Brasil julgou ser do seu dever ordenar a remessa de tropas para os estados de Mato Grosso e Amazonas e encarregou a legação brasileira em La Paz de informar o governo boliviano de que o Brasil resolvera ocupar militarmente o território do Acre, até solução final do litígio.” [Nota: Idem, p. 105.]
Um armistício foi obtido em março de 1903, logrando-se o fim das hostilidades, o controle efetivo do território pelo Brasil, o pleno acesso garantido à Bolívia das vias fluviais do Amazonas, com trânsito comercial assegurado, e, mais importante, a “declaração legal de absoluta desistência do sindicato anglo-americano de todo e qualquer direito ou reclamação possível, mediante uma indenização de 110 mil libras esterlinas.” [NOTA: Idem, p. 106. Os agentes financeiros do Brasil em Londres, os Rothchilds, se incumbiram de negociar a renúncia do Sindicato Boliviano, em montante equivalente a meio milhão de dólares, ao câmbio da época.] As negociações prosseguiram, sob a responsabilidade direta do próprio Rio Branco, com a ajuda temporária do Senador Rui Barbosa (até 17 de outubro) e do político e diplomata Joaquim Francisco de Assis Brasil, então ministro brasileiro em Washington, cuja atuação na capital americana foi no sentido de desmontar as pretensões do Bolivian Syndicate.
Quatro longos meses duraram essas negociações, com propostas e contrapropostas, ao cabo das quais foi assinado o Tratado de Petrópolis de 17 de novembro de 1903, com ratificações trocadas em 10 de março de 1904, após as quais puderam ser efetuadas as “permutas e outras compensações” previstas no acordo bilateral. As negociações foram complicadas pelo fato de que “o Peru reivindicava boa parte da área em litígio, e já assinara acordo de arbitramento com o Bolívia para decidir sobre a fronteira no Alto Purus e Alto Juruá”. [NOTA: Cf. Luis Felipe Pereira de Carvalho, As Negociações do Tratado de Petrópolis: o estilo negociador do Barão do Rio Branco e a formação do território nacional (Brasília: Instituto Rio Branco, dissertação de Mestrado apresentada ao programa de pós-graduação do Instituto Rio Branco, 2005), p. 14. As linhas da fronteira com o Peru só seriam resolvidas em 1907.] A tática negociadora do Barão foi a de isolar as negociações com um país e com outro, e tratá-las separadamente, o que suscitou protestos do Peru. Para tentar conter esses ânimos e entabular as primeiras negociações com o Peru a respeito das fronteiras com o Brasil, Rio Branco convidou para ser chefe de legação em Lima o historiador e diplomata Manuel de Oliveira Lima, que no entanto relutou em aceitar a missão. [Nota: Cf. Paulo Roberto de Almeida, “O Barão do Rio Branco e Oliveira Lima: Vidas paralelas, itinerários divergentes”, In: Carlos Henrique Cardim e João Almino (orgs.), Rio Branco, a América do Sul e a Modernização do Brasil (Brasília: Comissão Organizadora das Comemorações do Primeiro Centenário da Posse do Barão do Rio Branco no Ministério das Relações Exteriores, IPRI-Funag, 2002), p. 233-278; disponível: http://www.pralmeida.org/01Livros/2FramesBooks/57BaraoRioBranco.html. O Peru pretendia não apenas participar das negociações bilaterais entre o Brasil e a Bolívia, mas queria depois, qualquer que fosse o resultado, submeter o eventual resultado de um acordo tripartite a arbitragem internacional, com o que não concordava em absoluto o Barão.]

O Tratado de Petrópolis, em si, é uma peça relativamente simples de diplomacia política e “geográfica”, constando de apenas dez artigos, com sete parágrafos no primeiro, e principal, deles, o que justamente define a fronteira entre o Brasil e a Bolívia. As coordenadas certamente refletiam uma melhor precisão em termos de latitudes e longitudes do que o tratado de 1867, impreciso em pontos importantes. Ainda assim, o parágrafo sétimo abre duas alíneas para possibilidades alternativas no que se refere à nascente do rio Acre, indeterminada até aquele momento: “se a nascente do Acre estiver em longitude menos ocidental...”, ou, “se o rio Acre, como parece certo, atravessar a longitude 69° Oeste de Greenwich e correr ora ao Norte, ora ao Sul do citado paralelo 11°...”, o que denota não apenas bom-senso dos negociadores, como criatividade e boa-fé recíproca.
Basicamente, o tratado efetuou compensações territoriais em diversos pontos da fronteira comum, obviamente concedendo ao Brasil uma porção maior de terras do que o originalmente atribuído pelo tratado de 1867. A Bolívia passava a ter liberdade de trânsito em caráter perpétuo, a ser garantido por um tratado de comércio e navegação; a ela seria facilitado o acesso pelos rios amazônicos até o oceano, e o Brasil se obrigava a viabilizá-lo mediante a construção, inteiramente a seu encargo, de uma ferrovia desde o Porto de Santo Antonio, no rio Madeira, até Guajará-Mirim, no rio Mamoré, com um ramal chegando a Villa-Bella, na Bolívia. Por não haver equivalência entre os territórios trocados, o artigo III estipulava o pagamento de uma indenização de 2 milhões de libras esterlinas, a serem pagos em duas prestações: a primeira três meses após a troca de ratificações (o que ocorreu em março de 1904), a segunda em março de 1905. Teoricamente, a Bolívia se comprometia em aplicar essa receita principalmente na construção de estradas de ferro ou “outras obras tendentes a melhorar as comunicações e desenvolver o comércio entre os dois países”, o que é duvidoso que ela o tenha feito. [Nota: No cômputo final, o Brasil cedeu 3.200 quilômetros quadrados de seu próprio território e recebeu 191 mil, superfície superior à de vários pequenos estados brasileiros, e capaz de produzir riquezas certamente elevadas naquela conjuntura de alta excepcional da demanda pela borracha.]

Para ser mais exato, a própria construção da ferrovia na selva foi estimada em 2 milhões de libras esterlinas, o que significa que o Brasil arcou com um custo financeiro total pelo menos duplicado em relação ao expresso no tratado. Também é preciso registrar que a ideia de uma estrada de ferro ligando o Madeira ao Mamoré não era exatamente nova, nem derivou exclusivamente do Tratado de Petrópolis de 1903. Já o tratado de 1867 com a Bolívia – de amizade, limites, navegação e comércio – continha uma cláusula (artigo 9) que estipulava a construção de linha ferroviária exatamente unindo os dois rios, promessa renovada solenemente em 1882.
Em 1870 foi concedida uma concessão a uma companhia inglesa, a “Madeira and Mamoré Railway”: bem rapidamente se constatou que a região era terrivelmente insalubre e que os homens morriam como moscas. Em 1879, restavam apenas 180 homens, a maior parte dos quais doente e sem recurso algum. [Nota: Cf. Cassiano Ricardo, O Tratado de Petrópolis (Rio de Janeiro: Ministério das Relações Exteriores, 1954, vol. II), p. 153, que por sua vez cita William Price, The Amazing Amazon (New York: The John Day Company, 1952).] A empresa foi naturalmente à falência e um decreto de setembro de 1881 declarava caduca a concessão feita anteriormente. Em 1882, tenta-se o reinício dos trabalhos, por intermédio de uma nova comissão designada pelo governo imperial, mas tampouco se conseguiu fazer o projeto avançar.
Foi só com o Tratado de Petrópolis que os trabalhos efetivamente deslancharam: em junho de 1907 foram realizados os estudos iniciais e a terraplenagem começou no ano seguinte. Em 1910 se inaugura a estação de Jaci Paraná e em mais dois anos, em 30 de abril de 1913, a de Guajará-Mirim, onde já se podia trafegar com locomotivas. A Madeira Mamoré fica então concluída e é arrendada à “Madeira Mamoré Railway Company”, desde janeiro de 1912, em conformidade com o decreto 7.344, de 25 de fevereiro de 1909. [Nota: Idem, Ricardo, p. 157.]

No que se refere especificamente à demarcação da fronteira, o Artigo IV não deixava dúvidas quanto à seriedade do comprometimento do Brasil: “Uma Comissão Mista, nomeada pelos dois Governos, dentro do prazo de um ano, contado da troca das ratificações, procederá à demarcação da fronteira descrita no Artigo I, começando os seus trabalhos dentro dos seis meses seguintes à nomeação. (...) Se os Comissários demarcadores nomeados por uma das Altas Partes Contratantes deixarem de concorrer ao lugar e na data da reunião que forem convencionados para o começo dos trabalhos, os Comissários da outra procederão por si sós à demarcação, e o resultado das suas operações será obrigatório para ambas”. Finalmente, os desacordos eventuais quanto à interpretação ou execução do tratado deveriam ser resolvidos mediante arbitramento, método porém excluído nas negociações seguintes que o Brasil tencionava empreender com o Peru.

O tratado não foi unanimemente acolhido em todos os setores: ele foi objeto de intenso debate no Senado, onde estava Rui Barbosa, um dos negociadores até um mês antes de sua assinatura, tendo renunciado então. O senador baiano considerava que o Brasil não deveria ceder nenhum território seu à Bolívia e julgava onerosas demais as concessões financeiras que estavam sendo prometidas à Bolívia, ao que Rio Branco lhe escreveu, pouco depois de seu afastamento: “Se comprássemos dois grandes encouraçados gastaríamos improdutivamente tanto quanto vamos gastar com essa aquisição de um vastíssimo e rico território, já povoado por milhares de brasileiros que assim libertaremos do domínio estrangeiro.” [Nota: Cf. Araújo Jorge, Rio Branco e as Fronteiras do Brasil, op. cit.. p. 112.] Rui Barbosa se considerou, como ele mesmo escreveu, um plenipotenciário vencido.

Ao fim e ao cabo, o tratado de Petrópolis, que comprou o Acre à Bolívia, não foi, exatamente, um tratado diplomático, baseado em princípios abstratos do direito ou de natureza essencialmente política: ele foi negociado para resolver um problema social, uma realidade humana e um fato concreto, que mobilizou enormemente a opinião pública nacional: a presença de milhares de brasileiros num território essencialmente estrangeiro. Que este tenha sido trazido ao Brasil mediante negociações diretas, sem imposições e sem conflito, revela o tino diplomático do Barão do Rio Branco, uma das raras unanimidades, junto provavelmente com Tiradentes, na História do Brasil.


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Anexos:
DECRETO N° 5.161, DE 10 DE MARÇO DE 1904.
Manda executar o Tratado de permuta de territórios e outras compensações, celebrado em 17 de novembro de 1903, entre o Brasil e a Bolívia.

O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil,
Tendo sancionado, pelo Decreto n° 1.179, de 18 de fevereiro do corrente ano, a resolução do Congresso Nacional de 12 do mesmo mês, que aprova o Tratado de permuta de territórios e outras compensações entre o Brasil e a Bolívia, concluído na cidade de Petrópolis aos 17 de novembro de 1903 e havendo sido trocadas hoje as respectivas ratificações nesta cidade do Rio de Janeiro,
Decreta que o mesmo Tratado seja executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém.
Rio de Janeiro, 10 de março de 1904; 16° da República.
FRANCISCO DE PAULA RODRIGUES ALVES
Rio-Branco

Tratado de permuta de Territórios e outras Compensações (Tratado de Petrópolis)

A República dos Estados Unidos do Brasil e a República da Bolívia,
Animadas do desejo de consolidar par sempre a sua antiga amizade, removendo motivos de ulterior desavença, e
Querendo ao mesmo tempo facilitar o desenvolvimento das suas relações de comércio e boa vizinhança,
Convieram em celebrar um Tratado de permuta de territórios e outras compensações, de conformidade com a estipulação contida no Art. 5° do Tratado de Amizade, Limites, Navegação e Comércio de 27 de março de 1867.
E, para esse fim, nomearam Plenipotenciários, a saber:
O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, os Srs. José Maria da Silva Paranhos do Rio-Branco, Ministro de Estado das Relações Exteriores e Joaquim Francisco de Assis Brasil, Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário nos Estados Unidos da América; e
O Presidente da República da Bolívia, os Srs. Fernando E. Guachalla, Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário em Missão Especial no Brasil e Senador da República e Cláudio Pinilla, Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário no Brasil, nomeado Ministro das Relações Exteriores da Bolívia;
Os quais, depois de haverem trocado os seus plenos poderes, que acharam em boa e devida forma, concordaram nos artigos seguintes:

Artigo I
A fronteira entre a República dos Estados Unidos do Brasil e a da Bolívia ficará assim estabelecida:
§ 1° Partindo da latitude Sul de 20° 08’ 35" em frente ao desaguadouro da Baía Negra, no Rio Paraguai, subirá por este rio até um ponto na margem direita distante nove quilômetros, em linha reta, do forte de Coimbra, isto é, aproximadamente, em 19° 58’ 05" de latitude e 14° 39’ 14" de longitude Oeste do Observatório do Rio de Janeiro (57° 47’ 40" Oeste de Greenwich), segundo o Mapa da fronteira levantado pela Comissão Mista de Limites, de 1875; e continuará desse ponto, na margem direita do Paraguai, por uma linha geodésica que irá encontrar outro ponto a quatro quilômetros, no rumo verdadeiro de 27° 01’ 22" Nordeste, do chamado "Marco do fundo da Baía Negra", sendo a distância de quatro quilômetros medida rigorosamente sobre a fronteira atual, de sorte que esse ponto deverá estar, mais ou menos, em 19° 45’ 36", 6 de latitude e 14° 55’ 46", 7 de longitude Oeste do Rio de Janeiro (58° 04’ 12", 7 Oeste de Greenwich). Daí seguirá no mesmo rumo determinado pela Comissão Mista de 1875 até 19° 02’ de latitude e, depois, para Leste por este paralelo até o arroio Conceição, que descerá até a sua boca na margem meridional do desaguadouro da lagoa de Cáceres, também chamado de rio Tamengos. Subirá pelo desaguadouro até o meridiano que corta a ponta do Tamarindeiro e depois para o Norte, pelo meridiano de Tamarindeiro, até 18° 54’ de latitude, continuando por este paralelo para Oeste até encontrar a fronteira atual.
§ 2° Do ponto de interseção do paralelo de 18° 54’ com a linha reta que forma a fronteira atual seguirá, no mesmo rumo que hoje, até 18° 14’ de latitude e por este paralelo irá encontrar a Leste o desaguadouro da lagoa Mandioré, pelo qual subirá, atravessando a lagoa em linha reta até o ponto, na linha antiga de fronteira, eqüidistante dos dois marcos atuais, e depois por essa linha antiga, até o marco da margem setentrional.
§ 3° Do marco setentrional na lagoa Mandioré continuará em linha reta, no mesmo rumo que hoje, até a latitude de 17° 49’ e por este paralelo até o meridiano do extremo Sudeste da lagoa Gahiba. Seguirá esse meridiano até a lagoa e atravessará esta em linha reta até o ponto eqüidistante dos dois marcos atuais, na linha antiga de fronteira, e depois por esta linha antiga ou atual até a entrada do canal Pedro Segundo, também chamado recentemente rio Pando.
§ 4° Da entrada Sul do canal Pedro Segundo ou rio Pando até a confluência do Beni e Mamoré os limites serão os mesmos determinados no Artigo 2° do Tratado de 27 de março de 1867.
§ 5° Da confluência do Beni e do Mamoré descerá a fronteira pelo rio Madeira até a boca do Abunan, seu afluente da margem esquerda, e subirá pelo Abunan até a latitude de 10° 20’. Daí irá pelo paralelo de 10° 20’, para Leste até o rio Rapirran e subirá por ele até a sua nascente principal.
§ 6° Da nascente principal do Rapirran irá, pelo paralelo da nascente, encontrar a Oeste o rio Iquiri e subirá por este até a sua origem, donde seguirá o igarapé Bahia pelos mais pronunciados acidentes do terreno ou por uma linha reta, como aos Comissários demarcadores dos dois países parecer mais conveniente.
§ 7° Da nascente do igarapé Bahia seguirá, descendo por este, até a sua confluência na margem direita do rio Acre ou Aquiry e subirá por este até a nascente, se não estiver esta em longitude mais ocidental do que a de 69° Oeste de Greenwich:
a) no caso figurado, isto é, se a nascente do Acre estiver em longitude menos ocidental do que a indicada, seguirá a fronteira pelo meridiano da nascente até o paralelo de 11° e depois, para Oeste, por esse paralelo até a fronteira com o Peru;
b) se o rio Acre, como parece certo, atravessar a longitude de 69° Oeste de Greenwich e correr ora ao Norte, ora ao Sul do citado paralelo de 11°, acompanhando mais ou menos este, o álveo do rio formará a linha divisória até a sua nascente, por cujo meridiano continuará até o paralelo de 11° e daí na direção de Oeste, pelo mesmo paralelo, até a fronteira com o Peru; mas, se a Oeste da citada longitude de 69° o Acre correr sempre ao Sul do paralelo de 11°, seguirá a fronteira, desde esse rio, pela longitude de 69° até o ponto de interseção com esse paralelo de 11° e depois por ele até a fronteira com o Peru.

Artigo II
A transferência de territórios resultante da delimitação descrita no artigo precedente compreende todos os direitos que lhes são inerentes e a responsabilidade derivada da obrigação de manter e respeitar os direitos reais adquiridos por nacionais e estrangeiros, segundo os princípios do direito civil.
As reclamações provenientes de atos administrativos e de fatos ocorridos nos territórios permutados, serão examinadas e julgadas por um Tribunal Arbitral composto de um representante do Brasil, outro da Bolívia e de um Ministro estrangeiro acreditado junto ao Governo brasileiro. Esse terceiro árbitro, Presidente do Tribunal, será escolhido pelas duas Altas Partes Contratantes logo depois da troca das ratificações do presente Tratado. O Tribunal funcionará durante um ano no Rio de Janeiro e começará os seus trabalhos dentro do prazo de seis meses, contados do dia da troca das ratificações. Terá por missão: 1° Aceitar ou rejeitar as reclamações; 2° Fixar a importância da indenização; 3° Designar qual dos dois Governos a deve satisfazer.
O pagamento poderá ser feito em apólices especiais, ao par, que vençam o juro de três por cento e tenham a amortização de três por cento ao ano.

Artigo III
Por não haver equivalência nas áreas dos territórios permutados entre as duas nações, os Estados Unidos do Brasil pagarão uma indenização de £ 2.000.000 (dois milhões de libras esterlinas), que a República da Bolívia aceita com o propósito de a aplicar principalmente na construção de caminhos de ferro ou em outras obras tendentes a melhorar as comunicações e desenvolver o comércio entre os dois países.
O pagamento será feito em duas prestações de um milhão de libras cada uma: a primeira dentro do prazo de três meses, contado da troca das ratificações do presente Tratado, e a segunda em 31 de março de 1905.

Artigo IV
Uma Comissão Mista, nomeada pelos dois Governos, dentro do prazo de um ano, contado da troca das ratificações, procederá à demarcação da fronteira descrita no Artigo I, começando os seus trabalhos dentro dos seis meses seguintes à nomeação.
Qualquer desacordo entre a Comissão Brasileira e a Boliviana, que não puder ser resolvido pelos dois Governos, será submetido à decisão arbitral de um membro da Royal Geographical Society, de Londres, escolhido pelo Presidente e membros do Conselho da mesma.
Se os Comissários demarcadores nomeados por uma das Altas Partes Contratantes deixarem de concorrer ao lugar e na data da reunião que forem convencionados para o começo dos trabalhos, os Comissários da outra procederão por si sós à demarcação, e o resultado das suas operações será obrigatório para ambas.

Artigo V
As duas Altas Partes Contratantes concluirão dentro do prazo de oito meses um Tratado de Comércio e Navegação baseado no princípio da mais ampla liberdade de trânsito terrestre e navegação fluvial para ambas as nações, direito que elas reconhecem perpetuamente, respeitados os regulamentos fiscais e de polícia estabelecidos ou que se estabelecerem no território de cada uma. Esses regulamentos deverão ser tão favoráveis quanto seja possível à navegação e ao comércio e guardar nos dois países a possível uniformidade. Fica, porém, entendido e declarado que se não compreende nessa navegação a de porto a porto do mesmo país, ou de cabotagem fluvial, que continuará sujeita em cada um dos dois Estados às respectivas leis.

Artigo VI
De conformidade com a estipulação do artigo precedente, e para o despacho em trânsito de artigos de importação e exportação, a Bolívia poderá manter agentes aduaneiros junto às alfândegas brasileiras de Belém do Pará, Manaus e Corumbá e nos demais postos aduaneiros que o Brasil estabeleça sobre o Madeira e o Mamoré ou em outras localidades da fronteira comum. Reciprocamente, o Brasil poderá manter agentes aduaneiros na alfândega boliviana de Villa Bella ou em qualquer outro posto aduaneiro que a Bolívia estabeleça na fronteira comum.

Artigo VII
Os Estados Unidos do Brasil obrigam-se a construir em território brasileiro, por si ou por empresa particular, uma ferrovia desde o porto de Santo Antônio, no rio Madeira, até Guajará-Mirim, no Mamoré, com um ramal que, passando por Vila-Murtinho ou em outro ponto próximo (Estado de Mato-Grosso), chegue a Villa-Bella (Bolívia), na confluência do Beni e do Mamoré. Dessa ferrovia, que o Brasil se esforçará por concluir no prazo de quatro anos, usarão ambos os países com direito às mesmas franquezas e tarifas.

Artigo VIII
A República dos Estados Unidos do Brasil declara que ventilará diretamente com a do Peru a questão de fronteiras relativa ao território compreendido entre a nascente do Javari e o paralelo de 11°, procurando chegar a uma solução amigável do litígio sem responsabilidade para a Bolívia em caso algum.

Artigo IX
Os desacordos que possam sobrevir entre os dois Governos, quanto à interpretação e execução do presente Tratado, serão submetidos a Arbitramento.

Artigo X
Este Tratado, depois de aprovado pelo Poder Legislativo de cada uma das duas Repúblicas, será ratificado pelos respectivos Governos e as ratificações serão trocadas na cidade do Rio de Janeiro no mais breve prazo possível.

EM FÉ DO QUE, nós, os Plenipotenciários acima nomeados, assinamos o presente tratado, em dois exemplares, cada um nas línguas portuguesa e castelhana, apondo neles os nossos selos.

FEITO na cidade de Petrópolis, aos dezessete dias do mês de novembro de mil novecentos e três.
Rio-Branco
J.F. de Assis Brasil
Fernando E. Guachalla
Cláudio Pinilla

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Balanco da Pos-Graduacao no Brasil - editorial O Estado de S.Paulo

O balanço da pós-graduação
Editorial - O Estado de S.Paulo
16 de setembro de 2010

Promovida a cada três anos pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação, a avaliação dos 4.099 cursos de mestrado e doutorado, que acaba de ser divulgada, registra avanços importantes na pós-graduação do País.

A primeira boa notícia é que o número de doutorados com padrão internacional vem crescendo. Em 2007, a Capes atribuiu os conceitos máximos (notas 6 e 7) a 237 cursos, nas mais variadas áreas do conhecimento. Neste ano, o número subiu para 298, o que representa 11% do total. Com isso, o Brasil pulou do 20.º para o 13.º lugar no ranking de produção científica do Journal of Scientific Research. Quando os cursos recebem as notas 1 e 2, eles são considerados "insuficientes", perdem o credenciamento e não podem conceder certificados. E os cursos que não se recuperarem nas avaliações seguintes podem até ser fechados. Do total de cursos avaliados, apenas 75 receberam os conceitos mais baixos. E 870 cursos foram considerados regulares, alcançando a nota 3.

Para receber a nota 6, os cursos precisam ter um desempenho equivalente ao dos centros de pesquisa e das universidades de ponta norte-americanas e europeias, principalmente em matéria de produção científica e de acordos regulares com instituições estrangeiras de ponta, do porte de uma London School of Economics e de uma University of Cambridge, na Inglaterra, e de universidades como Yale, Harvard, Columbia, Princeton ou o Massachusetts Institute of Technology (MIT).

No que se refere à produção científica, os professores e pesquisadores dos cursos de doutorado têm de exercer a liderança nacional em suas áreas de atuação, integrar entidades científicas e conselhos editoriais de periódicos, participar de congressos no exterior e publicar regularmente artigos nas mais prestigiosas revistas científicas internacionais. Em matéria de convênios e acordos, os cursos precisam manter intercâmbio internacional contínuo, desenvolver pesquisas conjuntas com instituições estrangeiras, ter doutorandos cursando disciplinas no exterior e contar em seu corpo docente com professores que sejam membros das diretorias das mais reputadas entidades acadêmicas internacionais.

Para alcançar a nota 7, os cursos não apenas precisam atender a essas exigências, como também têm de atrair alunos de outros países. E também têm de contar com financiamentos internacionais para suas pesquisas e projetos vinculados ao programa de pós-graduação.

A segunda boa notícia da avaliação trienal da Capes é que a pós-graduação já não mais está concentrada no Sudeste. Embora mais da metade dos programas de mestrado e doutorado esteja situada na região, principalmente no Estado de São Paulo, seguido pelo Estado do Rio de Janeiro, aumentou significativamente o número de cursos tanto no Nordeste como no Norte. Nesta região, por exemplo, o aumento foi de 35,3%, em relação à avaliação de 2007. E, no Nordeste, o crescimento foi de 31,3%.

Como são cursos recentes, eles precisam de tempo para obter melhores notas. Hoje, o Norte só tem um curso com padrão internacional, a pós-graduação em geologia e geoquímica da UFPA. Parece pouco, mas é uma conquista, considerando-se as carências da região amazônica. Como era de esperar, por causa da pujança econômica de São Paulo, as três universidades estaduais paulistas e as universidades federais de São Carlos e de São Paulo são as que têm maior número de cursos com as notas máximas. A líder do ranking da Capes é a USP, com 34 cursos com padrão internacional, situados nos campi de São Paulo, Ribeirão Preto, Piracicaba e São Carlos, seguida pela Unicamp, com 15 cursos.

A avaliação da pós-graduação, que envolveu 877 consultores recrutados nos próprios cursos de mestrado e doutorado, começou a ser implantada há mais de três décadas, quando a Capes era chefiada pelo economista Cláudio Moura Castro, e hoje é considerada uma das mais eficientes do mundo. Os conceitos atribuídos servem de parâmetro para a concessão de bolsas e financiamentos de projetos, pelas agências nacionais e internacionais de fomento à pesquisa.

Ranking das universidades: USP e Unicamp depois de 232...

Melhores universidades do mundo estão nos EUA
MARCOS FLAMÍNIO PERES
Folha de S.Paulo, 16/09/2010

Não é só mito, mas estatística: Harvard é a melhor universidade do mundo, os EUA, sozinhos, abrigam 15 das 20 melhores instituições de ensino do planeta, e é dinheiro, muito dinheiro, que move essa engrenagem.

Essas são algumas das conclusões do Ranking Mundial de Universidades 2010-11 da Times Higher Education, referência em ensino superior que a Folha publica com exclusividade no Brasil.

OPINIÃO: Nova versão do ranking se baseia em detalhadas consultas internacionais
DEPOIMENTO: Em Harvard, você é só um grão de areia em boa companhia
Na América Latina, USP é a 1ª colocada em ranking

A crise financeira de 2008 parece não ter provocado estrago nos campi dos EUA. Entre as 200 instituições que figuram no ranking, mais de um terço é de norte-americanas (72).

A receita é simples, segundo Ann Mroz, editora da THE: "Os EUA investem 3,1% de seu Produto Interno Bruto em educação superior, enquanto os demais países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico investem 1,5%".

FORÇA ASIÁTICA
Em sua sétima edição, o ranking também revela a forte presença das asiáticas. Entre as 50 melhores, o continente possui sete --China (2), Hong Kong (2), Japão, Coreia do Sul e Cingapura-- e, nessa faixa, já bate a Europa continental: Suíça (2), França (2), Alemanha e Suécia.

No entanto, se for incluído o Reino Unido, a balança pende para a Europa. A ilha detém quatro das 50 melhores universidades, três delas entre as dez primeiras (Cambridge, Oxford e Imperial College). Levando-se em conta o ranking completo, o Reino Unido (com 29) e Europa continental (com 51) disparam.

No total, as asiáticas somam 27 --China (6), Japão (5), Taiwan e Coreia do Sul (4 cada uma) são os destaques.

Já as instituições dos países de língua inglesa, somadas, dominam 120 posições --ou 60% do ranking (Canadá --nove-- e Austrália --sete-- vêm em seguida).

Na Europa continental, a surpresa foi a Alemanha. Com 14 instituições, o motor econômico da região também lidera o ensino superior. O país "investiu 18 bilhões de euros em pesquisa nos últimos cinco anos", afirma Mroz.

A França decepcionou: figura apenas em quinto.

NOVOS CRITÉRIOS
A versão 2010-11 do ranking da THE passou por ampla reformulação --a começar da compiladora dos dados, que é a Thomson Reuters. Mas a mudança mais radical, segundo Mroz, foi de metodologia: "Usamos hoje 13 indicadores, em vez dos seis usados anteriormente [...] e ouvimos 13.388 acadêmicos altamente qualificados, de todo o mundo".

O critério de reputação também teve seu peso reduzido. "Privilegiamos mais as evidências objetivas --e não as subjetivas."

Colaborou EMILIO SANT'ANNA, de São Paulo

[A USP está no lugar 232 e a Unicamp em 248)

Aposta mafiosa: ganha (ou perdida) pela metade

Como sabem os que acompanham este blog, eu fiz uma aposta contra mim mesmo, segundo a qual, um ou os dois dos meliantes que participaram de crimes políticos e de crimes comuns nos últimos tempos seria(m) demitido(s) ou apresentaria(m) demissão.
(Vejam aqui e aqui.)
Não acreditava que pudesse ocorrer, pelo menos não com os elementos de informação até então disponíveis. Mas é que outros fatos, indesmentíveis, se acumularam, levando à primeira queda. Está faltando a segunda...
Eis a carta de "demitida" da ex-ministra enrolada. Sim, sua carta de demissão foi forçada, o que é evidente para qualquer estudante de jornalismo ou direito (ou não, para qualquer pessoa medianamente bem informada).
Paulo Roberto de Almeida

Leia íntegra da carta de demissão da ministra Erenice Guerra
Porta-voz leu carta de demissão da ministra no Palácio do Planalto.
Filho da ministra é acusado de tráfico de influência na Casa Civil.
Do G1, em Brasília, 16/09/2010 13h36 - Atualizado em 16/09/2010 13h40

O porta-voz da Presidência da República, Marcelo Baumbach, anunciou nesta quinta-feira (16) a saída de Erenice Guerra da Casa Civil.
Leia abaixo a íntegra da carta de demissão:
"Senhor Presidente
Nos últimos dias, fui surpreendida por uma série de matérias vinculadas por alguns órgãos da imprensa contendo acusações que envolvem familiares meus e um ex-servidor lotado nesta pasta, tenho respondido uma a uma, buscando esclarecer o que se publica e principalmente a verdade dos fatos, defrontando-me com toda a sorte de afirmações, ilações e mentiras que visam a desacreditar o meu trabalho e atingir o governo ao qual sirvo.
Não posso, não devo e nem quero furtar-me a tarefa de esclarecer todas essas acusações nem posso deixar qualquer dúvida pairando acerca da minha honradez e da seriedade com a qual me porto no serviço público. Nada fiz e permiti que se fizesse ao longo de 30 anos de minha trajetória pública que não tenha sido um estrito cumprimento dos meus deveres. Prova irrefutável dessa minha postura, é que já solicitei à Comissão de Ética a abertura de procedimento para esclarecimento dos fatos aleivosamente contra mim levantados. À Controladoria-Geral da União (CGU), a auditagem dos atos relativos à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), dos Correios e da contratação de parecer jurídico da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), além de solicitar ao Ministério da Justiça a abertura dos procedimentos que se fizerem necessários no âmbito daquela pasta para também esclarecer os citados fatos.
No entanto, mesmo com todas essas medidas por mim adotadas, inclusive com a abertura dos meus sigilos telefônico, bancário e fiscal, a sórdida campanha para desconstituição da minha imagem, do meu trabalho e da minha família continuou implacável. Não apresentam uma única prova sobre minha participação em qualquer dos pretensos atos levianamente questionados, mas mesmo assim estampam, diariamente, manchetes cujo único objetivo é criar e alimentar artificialmente um clima de escândalo. Não conhecem limites.
Senhor presidente, por ter formação cristã, não desejo nem para o pior dos meus inimigos que ele venha a passar por uma campanha de desqualificação como a que se desencadeou contra mim e minha família. As paixões eleitorais não podem justificar esse vale-tudo. Preciso agora de paz e tempo para defender a mim e a minha família, fazendo com que a verdade prevaleça, o que se torna incompatível com a carga de trabalho que tenho a honra de desempenhar na Casa Civil.
Por isso, agradecendo a confiança de vossa excelência ao designar-me para a honrosa função de ministra-chefe da Casa Civil da República, solicito em caráter irrevogável que aceite meu pedido de demissão. Cabe-me daqui por diante a missão de lutar para que a verdade dos fatos seja restabelecida.
Brasília, 16 de setembro de 2010"

Ranking de universidades: latinas abaixo da critica

Se alguma, alguma vez, em algum momento futuro, for colocada na lista das 200 melhores do mundo, pode ser uma boa coisa, mas isso refletirá, provavelmente, o desempenho de algumas áreas científicas de uma ou outra tomadas isoladamente, o que obviamente não reflete o estado geral de descalabro universitário.
Acho que ainda vai demorar um bocado para termos, como a Austrália, sete entre as 200 melhores...
Paulo Roberto de Almeida

The World University Rankings
The Times, 16th September 2010

Comentário: Nenhuma universidade sul-americana está listada entre as 200 melhores do mundo na listagem do Times Higher Education. A Universidade de Buenos Aires, a USP e a UNICAMP são candidatas a serem incluídas nas “top 200” na região. A análise abaixo, com ênfase no caso brasileiro, mostra o quanto de caminho há que percorrer para atingir a excelência... Para os interessados vide o endereço:
http://www.timeshighereducation.co.uk/world-university-rankings/ - como medida de comparação, a Austrália tem 7 (repito sete) universidades na lista da melhores do mundo.

The goals will come
By Phil Baty

Unlike their football teams, South America's universities have not made a global splash. But Brazil looks likely to score some big successes soon.

The continent of South America does not have a single institution in the Times Higher Education list of the world’s 200 top universities.
And those institutions most likely to break into the elite list, according to one expert, are hampered by a number of obstacles in their climb to the top.
“Latin America has several serious challenges on the road to developing world-class universities,” says Philip Altbach, director of the Center for International Higher Education at Boston College, US.
“The main contenders are the continent’s great public universities such as the University of Buenos Aires. These are, however, saddled with cumbersome, bureaucratic and sometimes politicised governance structures. They rely mainly on part-time faculty – and part-timers can never be the basis of a research university. They are also under-funded and most are unable to charge tuition fees to their students.”

But there are undoubtedly bright spots, he says. “Perhaps only in the Brazilian state of São Paulo can there be world-class universities. Its two main universities are staffed by full-time faculty who hold doctorates, and the universities have a significant research mission and adequate funding from the state.”

Indeed, the University of São Paulo was very close to making it into the table of the top 200 institutions for 2010-11 – as revealed in data from the Times Higher Education World University Rankings iPhone application, which includes information on more than 400 institutions.
The iPhone rankings app also reveals that the State University of Campinas and São Paulo State University are also sitting just outside the top 200.

In his 2009 book The Challenge of Establishing World Class Universities, Jamil Salmi, tertiary education coordinator at the World Bank, highlights both the potential of and the challenges at the University of São Paulo.
It is the most selective institution in Brazil, he writes, and it has “the highest number of top-rated graduate programmes, and every year it produces more PhD graduates than any US university”.

But he laments: “At the same time, its ability to manage its resources is constrained by rigid civil service regulations, even though it is the richest university in the country.

“It has very few linkages with the international research community, and only 3 per cent of its graduate students are from outside Brazil. The university is very inward-looking.”

Salmi tells THE that there have been many positive developments in the region. He highlights the establishment of accreditation systems in most of its countries, and the development of student loan systems in Brazil, Chile and Colombia.

However, he also outlines the challenges: low public investment in higher education, hidebound governance structures, a paucity of international exchange programmes and links, predominantly monolingual campus cultures and a “lack of long-term vision for the development of higher education”.

But Andreas Schleicher, head of the indicators and analysis division at the Organisation for Economic Cooperation and Development’s Directorate for Education, says that for some countries in the region, “there have been very interesting recent developments” that may soon have an impact on the Times Higher Education World University Rankings.

“While for most OECD countries spending per student has continued to rise since 2000, countries such as Brazil and Chile have seen much faster rises in participation than [rises in] spending levels,” he says.
Spending per student in Chile has dropped by 25 per cent and by 15 per cent in Brazil – “and yet, the labour-market returns to higher education seem to be picking up.
“In Brazil, the earnings advantage of tertiary graduates over secondary school graduates is now over 263 per cent, well above the figure for any OECD country. The figure for the US, which is high by OECD standards, is 177 per cent.

“It is hard to say to what extent supply or demand factors play into this, but these data may suggest that quality is improving.”
And the continent appears poised for a much greater profile in world-class research in some key fields.

A Global Research Report on Brazil by Thomson Reuters, the data supplier for the World University Rankings, identifies Brazil as a dominant force in a new pack of “Latin tigers” – including Mexico and Argentina.

The report says that Latin America’s share of the world’s scientific papers rose from 1.7 per cent in 1990 to 4.8 per cent in 2008. In 1981, about 2,000 papers had an author address in Brazil. In 2008, the figure was about 20,000.

“The most striking feature of the new geography of science is the sheer scale of investment and mobilisation of people behind innovation that is under way, driven by a high-tech vision of how to succeed in the global economy,” the Thomson Reuters report says.

Brazil, which has a population of 190 million, spent £8.4 billion on research and development in 2007: this equates to roughly 1 per cent of gross domestic product – well ahead of many European nations.
Each year, the country produces more than 500,000 new graduates and about 10,000 new PhD researchers, the report says, representing a 10-fold increase in 20 years.

It is in the life sciences that Brazil is most impressive.
Between 2003 and 2007, the country published about 85,000 papers, which accounted for 1.83 per cent of all the papers published in journals indexed by Thomson Reuters.

But Brazil accounts for almost 19 per cent of the global share of research papers in tropical medicine, and more than 12 per cent of those in parasitology.

In its report, Thomson Reuters warns: “Brazil is an increasingly important and competitive research economy. Its research workforce capacity and R & D investment are expanding rapidly, offering many new possibilities in a rapidly diversifying research portfolio. Brazil’s profile, improving excellence, size and interface with the rest of the international research base make it an essential partner in any future international research portfolio.”

Triste fim de Policarpo Fidel Castro: um modelito pret-a-rien...

Triste fim a desse gerontocrata totalitário: quando tem um repente de sinceridade, um vislumbre de realismo, no meio dos devaneios com que conduz o povo cubano há meio século, causa surpresa geral na galera e é obrigado a se desdizer.
Eu fico imaginando a cara, e as angústias, de meia dúzia de idiotas apoiadores aqui mesmo no Brasil, que estavam dispostos a apoiar Cuba hasta la muerte, siempre...
De repente, tendo dedicado toda uma carreira medíocre a defender o totalitarismo cubano, vem o líder supremo e "crau!", lhes retira o tapete sob os pés??!!
Isso não se faz.
Ainda bem que Fidel se desmentiu, para alívio dos stalinistas locais, para conforto dos boçais que apoiam um sistema prisional e absolutamente desumano.
Que o modelo não funciona, que ele seja disfuncional para fins de crescimento e criação de riqueza, que ele seja amoral, imoral, ilegítimo e absolutamente pornográfico do ponto de vista das liberdades democráticas, isso já se sabia há muito tempo.
Mas, se esperava que só depois da morte do patriarca ditatorial se fosse finalmente reconhecer essa verdade elementar.
Que o próprio ditador o tenha dito, isso representa uma traição à causa, sobretudo da nomenklatura que vive às expensas do povo cubano.
Pronto, voltamos à estaca zero, para conforto dos idiotas cubanófilos...
Paulo Roberto de Almeida

Cuba: Quem quer comprar?
Percival Puggina
Opinião e Notícia, 16/09/2010

E Fidel saiu-se com esta: 'O modelo cubano não funciona mais nem para nós'

Cuba é bem mais do que uma ilha em forma de lagarto, plantada no meio do Caribe. Cuba é um divisor de águas entre democratas e totalitários. Não tem erro. Saiu em defesa de Cuba, começou a falar em educação, saúde e “bloqueio” americano, deu. Não precisa dizer mais nada. O cara abriu a porta do armário e assumiu. O negócio dele é o comunismo da velha guarda. Na melhor das hipóteses, marxismo-leninismo; na pior e mais provável, stalinismo.

Pois eis que Fidel Castro decidiu conceder longa entrevista ao jornalista norte-americano Jeffrey Goldberg. Embora a pauta fosse o ambiente político do Oriente Médio e o tom belicoso das posições de Ahmadinejad, Fidel gosta de falar e outros assuntos entraram na conversa. Não li toda a matéria. Poucas coisas serão tão infrutíferas quanto conhecer a opinião de Fidel a respeito de Ahmadinejad. Convenhamos. Horas tantas, o jornalista faz uma pergunta absolutamente sem sentido e obtém por resposta algo que arrancou manchetes mundo afora. É dessas coisas que acontecem uma vez na vida de cada jornalista sortudo. A pergunta foi sobre se valia a pena exportar o sistema cubano para outros países. Pondere, leitor, o absurdo da indagação: como poderia haver interesse em exportar algo sem qualquer cotação no mercado mundial há mais de três décadas? E Fidel saiu-se com esta: “O modelo cubano não funciona mais nem para nós”. Como se percebe, há na frase sinceridade e falsidade. Sincero o reconhecimento. Falsa a sugestão de que, durante certo tempo, o sistema teria funcionado.

De todo modo, até o dia 8 de setembro, quando foi divulgada a observação do líder da revolução cubana, supunha-se que só ele, o líder da revolução cubana ainda levasse fé na própria obra. Dois dias mais tarde, diante da repercussão internacional dessa sapientíssima frase, ele voltou atrás e disse ter sido mal-interpretado. Alegou que afirmara o oposto: o que não funcionaria é o capitalismo. E assim ficamos sabendo que os países capitalistas são um desastre e os socialistas um sucesso de público e renda.

Entenda-se o velho. Aos 84 anos ele já não pode mais voltar atrás. Vendeu a alma a Mefisto e os ponteiros de seu relógio quebraram. Quando fez uma primeira experiência com a sinceridade, deu-se mal. Coisa como para nunca mais. Era preciso retroceder e apelar para o “fui mal entendido”. Está bem, Fidel. Foste mal entendido. Mas ainda que tivesses sido bem entendido, andaste bem longe do problema de teu país. Neste último meio século, as dificuldades da antiga Pérola do Caribe, que transformaste num presídio, bem antes de serem econômicas, são políticas! Mais do que a ineficácia de uma economia estatizada, o que faz dó em Cuba é o totalitarismo. É a asfixia de todas as liberdades. São as prisões por delito de opinião. São os julgamentos políticos em rito sumaríssimo. É o paredón. É o aviltamento dos direitos humanos (quem disse que eles se restringem a educação e saúde?). É a perseguição aos homossexuais. São os linchamentos morais. É haver um espião do governo em cada quarteirão de cada cidade do país. É a dissimulação como forma de convívio social. É a falta de algo a que se possa chamar de vida privada. É terem os estrangeiros, em Cuba, direitos que são negados aos cubanos. É serem os cubanos cidadãos de segunda categoria em seu próprio país.

Há meio século – contam-se aí duas gerações – Cuba está submetida aos devaneios totalitários de um fanático que, para maior dos pesares, agrupou adeptos mundo afora. Esses adeptos atuaram na mais inverossímil e resistente montagem publicitária que o mundo já viu, em tudo superior à soviética, que desabou 21 anos atrás. Pois não bastasse a ressonância universal do fracasso, o mundo se encanta quando Fidel declara que o sistema econômico cubano não funciona mais. Mas o problema de Cuba é outro e ele está longe de reconhecer.

Republica Mafiosa do Brasil (26): l'embarras du choix

Os franceses usam essa expressão para designar a hesitação de alguém em face de muitas opções disponíveis, ou seja, uma profusão de escolhas frente às quais não se sabe bem qual a mais interessante, qual o prato mais apetitoso, qual garota convidar para ir ao cinema, enfim, dúvidas sempre de natureza positiva...
No meu caso, as opções são simplesmente horrorosas, para dar continuidade -- o que eu sinceramente não gostaria -- a esta minha série que pensei iria terminar muito rapidamente.
Passei o dia lendo coisas terríveis, cada uma mais cabeluda que a outra, informações (de caráter mafioso, claro), desmentidos, agitações, análises, crônicas de costumes, colunas de jornalistas famosos e outras matérias de repórteres menos famosos. Todo esse material horripilante, não apenas relacionado ao caso do momento, mas a ele conectado por uma série de razões, eleitorais ou não.
De minha parte, confesso meu desalento com essa situação e a continuidade da minha série: constato que uma quadrilha de mafiosos se incrustou nas mais altas esferas dessa republiqueta a que o país foi conduzido por vias diversas, mas todas elas coincidentes.
Decidi não publicar nenhuma das matérias coletadas durante o dia, pois seria uma massa enorme e, presumivelmente, desanimadora para qualquer leitor.
Em contrapartida, publico simplesmente um fato, nada mais que um fato, uma ilustração concreta, aparentemente indesmentível, de mais um caso, a vírgula que faltava para concluir o caso de certa mafiosa ainda negacionista...
Seria um prego no caixão, mas permito-me desconfiar que isso não venha a ocorrer, any time soon, conhecendo todos os demais mafiosos em torno do caso...
Paulo Roberto de Almeida

ENTREVISTA RUBNEI QUÍCOLI
"Fiquei horrorizado de ter de pagar", diz negociador
Letícia Moreira - DE BRASÍLIA
Folhapress, 16.09.2010

CONSULTOR CONFIRMA ENCONTRO COM ERENICE, DIZ QUE EMPRESA SE RECUSOU A PAGAR PROPINA E DESCREVE REUNIÃO COM ISRAEL
(foto) Rubnei Quícoli, consultor da EDRB, empresa de Campinas

O empresário Rubnei Quícoli disse que ficou "horrorizado" e se sentiu "lesado" ao receber a proposta de contrato da Capital Consultoria, empresa que pertence a um filho da ministra da Casa Civil, Erenice Guerra. A seguir, trechos de uma das entrevistas que o consultor deu à Folha.

Folha - Quando e como você foi apresentado à empresa Capital?
Rubnei Quícoli - Me foi apresentado o Marco Antonio [ex-diretor dos Correios]. Ele ficou durante um tempo como diretor dos Correios e me trouxe o [sobrinho dele, que trabalhava na Casa Civil] Vinícius, onde foram viabilizados esses e-mails para poder ir para a Casa Civil para demonstrar esse projeto.
É lógico que o pessoal viu o tamanho do investimento e todo mundo criou uma situação favorável para ele, em termos de participação e intermediação. Acho que todo mundo que trabalha tem direito a alguma coisa, mas dentro de uma coisa normal.
Estive na Casa Civil junto com a Erenice, que era a secretária-executiva da Casa Civil. A Dilma não pôde me receber, estava com outros afazeres. Ela sabe do projeto, recebeu em 2005, se não me engano. O documento foi encaminhado para o MME [Ministério de Minas e Energia].
Houve essa reunião com a Erenice, que encaminhou isso para a Chesf. A Chesf teve reunião conosco, me parece que um deles teve problema de saúde, isso acarretou todo esse tempo em que aconteceu esse contrato de participação, de intermediação.
Eu fiquei horrorizado de ter que pagar R$ 40 mil por mês para eles terem um favorecimento de acesso. Para que eu vou pagar se não vai sair [o crédito]? Eles diziam que iria sair, para dar sustentação e eu pagar os R$ 40 mil. E eu decidi com [os sócios] o Aldo e o Marcelo não pagar nada e esperar ver.

Quando você conversou com o Vinícius, ele se apresentou como da empresa Capital?
Não, ele disse que iria me levar para o escritório que daria a sequência do trabalho, que precisaria do escritório para dar manutenção, assessoria e consultoria para a gente não ficar desprotegido.

Erenice prometeu fazer algo?
Ela se colocou num patamar assim: "Vou ver onde eu coloco isso". Ela colocou que a Chesf seria a empresa recomendada porque está no Nordeste. Nessa condição ela agiu corretamente. [...] Até então eu nem sabia da existência da Capital, para mim o negócio estava sendo direcionado ao governo. Eu não sabia que existia propina no meio, contrato, que eu teria que pagar. Não dá para entender a pessoa deixar um filho [Israel Guerra] tomar conta de um ministério. É um projeto que foi investido muito dinheiro para parar por conta de propina.

O senhor recebeu e-mail com cobrança. O que queriam?
A ideia principal era amarrar o aporte e a manutenção de R$ 40 mil para eles porque era final de ano. A gente sabe como funciona Brasília. Eles [a Capital] queriam receber antecipadamente uma mensalidade para poder se manter. Quem está fazendo uma intermediação de R$ 9 bilhões e vai se preocupar com R$ 40 mil por mês? Não dá para entender.

Como você reagiu quando pediram dinheiro?
Eu mandei, desculpe a expressão, para a puta que o pariu. Falei: "Vocês estão de brincadeira?" [Disse] que não assinava nada.

Em que momento o Israel apareceu?
O que aconteceu depois? Isso foi informação do Marco Antônio. Ele falou que precisava de R$ 5 milhões para poder pagar a dívida lá que a mulher de ferro tinha. Que tinha que ser uma coisa por fora para apagar um incêndio.

Quem era a mulher de ferro?
A mulher de ferro é a Dilma e a Erenice, as duas. Não sei quanto é a dívida de uma e de outra. Eu sei que a Erenice precisava de dinheiro para cobrir essa dívida. O Marco Antônio é que pediu. Eu falei: "Eu não vou dar dinheiro nenhum. Eu estou fazendo um negócio que é por dentro e estou me sentindo lesado".
Aí o Marco Antônio falou: "O Israel, filho da Erenice, bloqueou a operação porque você não deu o dinheiro". Isso é a palavra do Marco Antônio. Eu respondi: "Não tenho conversa com bandido". Isso aconteceu há três meses. Foi o último contato com eles.

Você esteve com o Israel?
O encontro foi no escritório do Brasília Shopping. O Israel nunca pediu nada porque eu não dei chance. Eu não sabia que ele era filho da Erenice. Soube pelo Marco Antônio. Quanto à atitude dele, barrar um negócio desse por conta do dinheiro me deixou totalmente nervoso, com atitude até agressiva.