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quinta-feira, 7 de junho de 2018

Nuvens negras se adensam no panorama da economia brasileira

1) Brasil pode ser a bola da vez dos emergentes a cair, diz guru dos mercados”* - Mohamed  El-Erian, economista e guru dos mercados internacionais, alertou nesta quarta-feira (6) para o fato de que o Brasil pode ser o próximo emergente a entrar em crise financeira. "Depois da Argentina e da Turquia, o Brasil é o próximo", questionou El-Erian em um tuíte, que veio acompanhado de um gráfico que mostra a disparada do dólar em relação ao real. "A recente queda moeda coloca o Banco Central em uma posição complicada, e há pouca margem para erro, e suas ações estão sendo monitoradas de perto pelos mercados doméstico e externo." (FSP)

2) O peso da incerteza sobre a atividade produtiva é ponto pacífico no debate econômico e, no caso do Brasil, essa incapacidade de ver o futuro com alguma clareza é regra desde pelo menos as eleições presidenciais de 2014 e uma nova onda se avizinha. Apesar disso, pouco se sabe sobre os reais efeitos da incerteza na economia brasileira. Partindo desse ponto, pesquisadores elaboraram modelos para tentar mensurar o impacto desse fenômeno e concluíram que os níveis de incerteza vigentes desde as eleições presidenciais de 2014 representam importante fator por trás da recessão, diminuindo fortemente o investimento, a produção industrial e, consequentemente, o Produto Interno Bruto (PIB). 
"Estima-se que, caso não houvesse a expansão de incerteza doméstica observada a partir do segundo semestre de 2014, a produção industrial em 2015 teria sido, em média, entre 0,9% e 3,9% maior, dependendo da variável de incerteza utilizada. No caso do IBC-Br, esse teria sido entre 0,4% e 1,3% maior. Como a incerteza afeta mais intensamente o investimento e como bens de investimento são produzidos pelo setor industrial, é natural que os efeitos da incerteza na indústria sejam maiores do que no PIB", diz o estudo "Os Efeitos da Incerteza sobre a Atividade Econômica no Brasil", de Ricardo de Menezes Barboza, economista do Grupo de Conjuntura Econômica da UFRJ, e Eduardo Zilberman, do Departamento de Economia na PUC-Rio. O trabalhou foi publicado recentemente na Revista Brasileira de Economia, da FGV. (Valor Econômico)

3) Saída para regra de ouro é 'grave precedente', dizem técnicos”* - Técnicos das consultorias de orçamento do Congresso Nacional criticaram a proposta do governo para cumprir a "regra de ouro" das contas públicas em 2019. A medida "abriria grave precedente", provocando insegurança jurídica e enfraquecendo o arcabouço legal das finanças públicas. Mesmo assim, eles reconhecem não haver uma alternativa fácil para atender a norma constitucional.  A análise está em nota técnica elaborada conjuntamente pela Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle (Conorf, do Senado Federal) e pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof, da Câmara dos Deputados). Os técnicos chegam a propor ações para o cumprimento da regra, mas admitem que pode acabar sendo necessário alterar a Constituição. A regra de ouro veda operações de crédito (endividamento público) em montante superior ao total das despesas de capital (como investimentos). A exceção é quando o valor for autorizado por meio de créditos adicionais, aprovados pelo Congresso.
O governo buscou uma saída ao inserir, no Projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), um artigo prevendo créditos adicionais no Orçamento. Mas os técnicos contestam. Para eles, as peças orçamentárias devem vir com a regra de ouro equacionada (operações de crédito iguais ou abaixo das despesas de capital) e os créditos adicionais só podem ser requeridos durante a execução do Orçamento - ou seja, no ano que vem.
No entanto, o governo viu dificuldades para enviar ao Congresso um Orçamento de 2019 com a regra de ouro equacionada e, por isso, propôs uma solução já na PLDO. Para os técnicos, o governo busca um aval do Congresso para que o Orçamento desobedeça a regra de ouro. Segundo eles, o artigo 21 da PLDO - que prevê os créditos especiais no Orçamento – pode ser contestado no Supremo Tribunal Federal.  (Valor Econômico)

terça-feira, 5 de junho de 2018

Brasil: crescimento sem investimento - Ricardo Bergamini

Crescimento sem investimento é gerado do pó e ao pó voltará
Ricardo Bergamini
(Recebido em 5/06/2018)


A taxa de Investimento no primeiro trimestre de 2018 foi de 16,0% do PIB. No primeiro trimestre de 2000 foi de 20,5% do PIB. Redução de 21,95% em relação ao PIB em 18 anos. 

Sabedores que somos há mais de duzentos anos que: (poupança = Investimento = crescimento) podemos afirmar, de forma cabal e irrefutável, de que o Brasil não cresceu no período de 2003 até 2014 com base sólida dos investimentos, mas sim através da ilusão monetária do crédito. 

Em vista do acima exposto poderíamos afirmar que o crescimento de 40,90% ocorrido no período 2003 até 2014 foi uma ilusão monetária provocada pela alta liquidez de dólares falsos emitidos pelos Estados Unidos para financiar as guerras do Afeganistão e Iraque. 

Em 2002 o volume de operações de crédito era de R$ 378,0 bilhões (25,35% do PIB), em 2014 o volume de operações de crédito era de R$ 3.021,8 bilhões (54,73% do PIB).  .

O volume de crédito cresceu em termos reais em relação ao PIB em 115,90%, para um crescimento do PIB de 40,90% no período. Esse desequilíbrio gera uma ilusão monetária de crescimento.

Gostaria de fazer a sua regressão de R$ em US$ que será efetivamente como seremos avaliados junto a ONU e ao FMI, conforme quadros demonstrativos abaixo que em 2017 retornamos ao ano abaixo de 2010 e acima de 2009. Sem investimentos não tem como crescer de forma saldável. O Brasil Avança para o abismo.

PIB A Preços Correntes

Fonte IBGE

Ano
R$ Bilhões
US$/R$
US$ Bilhões
2002
1.488,8
2,9296
508,2
2003
1.717,9
3,0705
559,5
2004
1.957,7
2,9247
669,4
2005
2.170,6
2,4335
892,0
2006
2.409,4
2,1763
1.107,1
2007
2.720,3
1,9475
1.396,8
2008
3.109,8
1,8369
1.693,0
2009
3.333,0
1,9927
1.672,6
2010
3.885,8
1,7585
2.208,5
2011
4.376,4
1,6739
2.614,5
2012
4.814,8
1,9453
2.470,5
2013
5.331,6
2,1738
2.475,1
2014
5.778,9
2,3599
2.448,8
2015
5.995,8
3,3856
1.772,4
2016
6.266,9
3,4538
1.814,5
2017
6.559,9
3,1930
2.054,5 

PIB Per Capita

Fonte IBGE

Ano
R$ 1,00
US$/R$
US$ 1,00
2002
8.350
2,9296
2.850
2003
9.511
3,0705
3.097
2004
10.703
2,9247
3.659
2005
11.723
2,4335
4.817
2006
12.862
2,1763
5.910
2007
14.359
1,9475
7.373
2008
16.237
1,8369
8.839
2009
17.222
1,9927
8.642
2010
19.878
1,7585
11.303
2011
22.171
1,6739
13.237
2012
24.165
1,9453
12.399
2013
26.520
2,1738
12.165
2014
28.498
2,3599
11.538
2015
29.329
3,3856
8.670
2016
30.407
3,4538
8.804
2017
31.930
3,1930
10.000



Ricardo Bergamini

quinta-feira, 17 de maio de 2018

O juro “neutro” e a trajetoria da taxa de cambio no Brasil - Paulo Gala

O juro “neutro” e a trajetória da taxa de câmbio no Brasil

Os choques de juros na economia brasileira desde a implantação do Real decorreram de depreciações cambiais no período de câmbio flutuante ou de reversões de fluxos de capital na época do câmbio fixo. Os juros altos dos últimos 20 anos foram fruto da fragilidade de nossas contas externas e de grandes desvalorizações de nossa moeda. O primeiro choque de juros sofrido no Plano Real veio com a crise do Méxicodecorrente da explosão da ancora cambial implantada no final dos anos de 1980 para controlar a inflação mexicana. Já o segundo choque relevante veio com o contágio da crise asiática. O terceiro choque acompanhou o contágio da crise russa, resultado do estouro da ancoragem cambial para controle da inflação por lá em 1998. A crise cambial brasileira que rompeu com o regime quase rígido da década de 1990 aconteceu em janeiro de 1999, quando um novo choque de juros foi aplicado para tentar segurar o padrão monetário brasileiro na presença de enorme desvalorização cambial na transição para o regime de câmbio flutuante administrado. Em 2001, outro choque de juros foi aplicado como resposta aos atentados de 11 de setembro. Na epoca o Brasil atravessava o apagão energético interno e a crise na Argentina. Já em 2003, um novo choque foi administrado por conta da enorme desvalorização cambial decorrente dos temores na transição eleitoral. Finalmente, em 2008, a crise americana provocou nova desvalorização cambial, somada a uma parada brusca da atividade econômica no mundo e no Brasil. O Banco Central respondeu com alta inicial de juros e, logo na sequência, queda das taxas.
Em todos esses episódios de choque de juros, a forte apreciação cambial observada no período subsequente foi primordial para derrubar o preço dos bens transacionáveis, ajudar na convergência da inflação e estimular o corte da Selic para seu ponto “neutro”. Em 2013, a decisão do Federal Reserve de reduzir os estímulos monetários forçou o BC a construir enorme estoque de swaps em posições vendidas em dólar e iniciar novas altas da Selic para tentar evitar uma desvalorização cambial mais brusca. A trajetória da Selic em todos esses anos, talvez com a exceção do ciclo de alta de 2005, sempre dependeu da dinâmica das contas externas, do sentido dos fluxos de capital e da taxa de câmbio. Os cortes foram feitos em momentos de apreciação cambial que reduziram a inflação, quase que independentemente do nível de atividade. A exceção foi o movimento de corte de juros feito em 2011, que acabou inflando nossa bolha de crédito e pressionando o preço dos bens não tradables em uma economia em pleno emprego, expansão fiscal e câmbio em rota de desvalorização.
Na década de 1990, os choques de juros tinham o objetivo explícito de segurar a âncora cambial. Depois da implantação do regime de metas de inflação, em 1999, os juros passaram a responder aos movimentos da inflação. Mas as grandes oscilações da taxa de câmbio acabaram ditando os movimentos de juros pela via do aumento dos preços de tradables e das tentativas do BC de segurar os efeitos de segunda ordem da desvalorização cambial nos preços. A grande acumulação de reservas cambiais entre 2004 e 2012 acabou aumentando a potência de intervenção do BC no mercado de câmbio via swaps ou leilões reversos para domar a trajetória do Real. Essa posição robusta de reservas e a utilização de um regime de câmbio flutuante administrado provou-se muito mais eficiente para reduzir os juros nos anos 2000. Ao fim e ao cabo, os juros altos no Brasil sempre foram uma tentativa do BC de manter nosso padrão monetário em um contexto de contas externas deficitárias, inércia nos preços domésticos e fortes oscilações da conta capital, com a exceção dos superávits em conta corrente registrados entre 2003 e 2007. A história recente mostra que não faz sentido discutir juro “neutro” no Brasil sem olhar nossa frágil dinâmica externa, muito dependente de bonanças de commodities e fluxos de capitais.
No momento, a trajetória do câmbio contribui para a queda da inflação. Seguimos com apreciações da moeda brasileira graças à nova onda de capitais que parece vir por aí. Nosso déficit em conta corrente caiu de 4% do PIB para 1,5%, as reservas continuam robustas e os swaps foram praticamente eliminados. A inflação está cedendo graças à queda de preços de alimentos, do alto desemprego, mas, também, por conta da forte apreciação cambial dos últimos meses. O BC seguirá reduzindo juros e argumentará que o “juro neutro”, aquele capaz de equilibrar a economia sem pressões inflacionárias, voltou a cair. Com política fiscal contracionista, investimentos públicos em mínimas históricas, enorme desemprego e ociosidade na indústria, o juro real capaz de estimular a economia vai mesmo lá para baixo. Durante as ondas de apreciação do câmbio nominal nunca houve pressão inflacionária no Brasil. No final das contas o “juro neutro” depende mesmo é da trajetória do câmbio.


domingo, 29 de abril de 2018

Economistas defendem nova agenda - Marcos Lisboa, Ana Carla Abrão e Vinicius Carrasco (Insper)

OLIVER WYMAN e INSPER lançam o primeiro artigo da série Panorama Brasil /
(Marcos Lisboa, Ana Carla Abrão e Vinicius Carrasco apresentaram um diagnóstico da economia para aprofundar o debate eleitoral)
Apresentação
34 telas
26abr18
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Economistas defendem nova agenda

Marcos Lisboa, Ana Carla Abrão e Vinicius Carrasco apresentaram um diagnóstico da economia para aprofundar o debate eleitoral

Fernando Dantas e Luciana Dyniewicz, O Estado de S.Paulo
A falta de reformas na condução da economia do País pode resultar em novos Estados entrando em crises semelhantes à vivida pelo Rio de Janeiro, em uma nova escalada da inflação ou ainda em um eventual calote do governo brasileiro, afirmou nesta quinta-feira, 26, o economista Marcos Lisboa, presidente da instituição de ensino superior Insper, na apresentação de um diagnóstico detalhado dos problemas econômicos do País. 
O documento – cuja coordenação foi feita também pelos economistas Ana Carla Abrão, colunista do Estado e sócia da consultoria Oliver Wyman, e Vinicius Carrasco, professor da PUC-Rio – é o primeiro de uma série batizada como Panorama Brasil. O projeto, de acordo com Lisboa, busca sair do “debate superficial de câmbio e juro” para investigar com rigor acadêmico temas como a complexidade do sistema tributário brasileiro e o comércio exterior fechado.
Segundo Ana Carla, a série de documentos não tem caráter partidário ou eleitoral. “Não é um programa de governo. É uma contribuição para o debate. Por acaso, o momento é bastante propício. Mas nossa ambição é que a série se mantenha viva por muito tempo, independentemente do ciclo eleitoral”, afirmou a economista, que também foi secretária da Fazenda de Goiás entre 2015 e 2016, durante o governo de Marconi Perillo (PSDB). 
Apesar de fugir da ideia de proposta de programa de governo, o projeto aponta a necessidade de reformas, como a abertura comercial, e critica questões como o a concessão de crédito subsidiado por bancos públicos.
Diagnóstico. O relatório apresentado na última quinta-feira, 26, intitulado “Renda e Produtividade nas Duas Últimas Décadas”, mostra que a renda per capita no Brasil cresceu menos, nos últimos 20 anos, que em outros países emergentes e na América Latina. Isso ocorreu devido à falta de melhoras na produtividade, que está estagnada desde 1980 devido, entre outros fatores, à baixa qualidade de educação, à burocracia no ambiente de negócios e a um setor público ineficiente. 
 “Avançamos muito em diversos indicadores sociais e várias pessoas saíram da miséria, no entanto, nosso desempenho foi aquém dos demais países emergentes. Desde 2011, descolamos dos demais países. Enquanto o resto do mundo continuou crescendo, o Brasil passou a andar para trás”, disse Lisboa. Caso o País mantenha a taxa de crescimento dos últimos 20 anos, acrescentou, terá uma economia como a do Chile apenas daqui a 38 anos – daí, a necessidade de reformas.
 “Necessitamos de uma reforma urgente ou vamos ficar piores, ou teremos mais crise nos Estados, com consequências na saúde, na educação e na segurança, ou crise no governo federal, com inseguranças como aumento de impostos, ou risco de inflação ou calote. Com esse ambiente de risco, não se deve estranhar que, mesmo com queda de juros, a economia ainda ande de lado”, destacou Lisboa. 
Investimento. Um dos entraves da produtividade brasileira, para os economistas, é o baixo nível de investimento em infraestrutura, que não apresentou avanços significativos desde 2010. No ano passado, o Brasil estava na 73ª posição entre 137 países em termos de qualidade da infraestrutura, segundo o Global Competitiveness Index (GCI), do Fórum Econômico Mundial. O Chile estava em 41º, o Uruguai em 45º e a Turquia em 53º. 
“O fato de que a produtividade é baixa é sinal de que investimos mal em capital, investimos em máquinas que não foram usadas, em capacidade excessiva. Há evidências de que investimentos muito mal”, disse Vinicius Carrasco. O professor da PUC-Rio lembrou do caso do aeroporto de Viracopos, que recebeu uma injeção de investimentos, mas opera com grande ociosidade.
Ouro problema que impede o País de aumentar sua produtividade é a educação. A qualidade do ensino no Brasil melhorou entre 2006 e 2009, mas não manteve essa tendência nos anos posteriores. A nota dos estudantes brasileiros no Programa Internacional de Avaliação Escolar (PISA) é bastante inferior a dos países emergentes, o que, de acordo com o relatório, indica que a qualidade do ensino não acompanhou o aumento da escolaridade média verificado no País. “O que aconteceu com a educação? Por que aumentamos tanto o gasto (em educação) e nossos indicadores ficaram para traz? Entender esse quadro será nosso objetivo?”, afirmou Lisboa. 
Outros temas abordados na discussão foram a demografia desfavorável à frente, com aumento drástico da razão de dependência (idosos sobre população ativa) até 2050, e a reforma do Estado, com destaque para o peso excessivo da folha salarial nas despesas dos Estados. “Precisamos de uma reforma para melhorar o serviço público. Consumimos 39% do PIB com a máquina pública e temos os serviços públicos avaliados como os piores de mundo”, disse Ana Carla.  
Cadastro positivo. Lisboa e Ana Carla defenderam ainda o cadastro positivo e criticaram os cartórios que se opõem à medida, que aumentaria a concorrência entre os bancos. Para Lisboa, é preciso discutir a eliminação dos cartórios no País. “Por que precisamos de cartórios? Eles dão segurança, geram benefício ou são apenas um pedágio que temos de pagar para o Brasil velho?”, questionou. “O mundo já utiliza outras formas de fazer registros”.

O diagnóstico da Oliver Wyman e do Insper

Marcos Lisboa, presidente do Insper, explica o que é o projeto Panorama Brasil, que junta a Oliver Wyman, consultoria global, e o Insper, instituição de ensino superior e pesquisa. Além disso, e separadamente da agenda Brasil, Lisboa fala de como vem conversando com políticos e técnicos envolvidos com várias candidaturas, com quais candidatos não se interessa em falar, e da necessidade de o País enfrentar os interesses do "velho Brasil" que são um freio ao crescimento da produtividade.

Fernando Dantas 
Envolvido na montagem de um grande e detalhado diagnóstico dos problemas brasileiros baseado na melhor pesquisa acadêmica, o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper, instituição de ensino superior e pesquisa, diz que o papel dos técnicos como ele é o de mostrar quais as prováveis consequências das diferentes opções de política públicas. Cabe aos políticos decidir os caminhos a tomar.
Porém, ao fim da sua apresentação no evento ocorrido ontem na sede do Insper em São Paulo de lançamento do primeiro documento – “Renda e produtividade nas duas últimas décadas” – da série “Panorama Brasil”, uma parceria entre a Oliver Wyman, empresa global de consultoria, e o Insper, Lisboa já estava propondo o fim dos cartórios no Brasil tal como hoje funcionam. O técnico não resiste a ser propositivo.
Lisboa, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda e ex-presidente do IRB no primeiro governo Lula, está conversando intensamente com políticos e técnicos envolvidos em diferentes candidaturas a presidente da República.
Ele faz questão de separar, porém, o projeto da Oliver Wyman e do Insper das suas iniciativas pessoais. Mas ambos são apartidários. No projeto Panorama Brasil, ele é apenas um dos três coordenadores, em pé de igualdade com Ana Carla Abrão, da Oliver Wyman e ex-secretária da Fazenda de Goiás, que vem trabalhando com afinco no tema da reforma do Estado, e do economista Vinicius Carrasco, ex-diretor de Planejamento do BNDES.
Referindo-se às suas iniciativas pessoais, e não ao Panorama Brasil, Lisboa diz que conversa com qualquer candidatura desde que não seja daquelas que “defendem que a Venezuela é uma democracia com dois lados (legítimos) em disputa”, ou “de gente que propõe fechar museu”. É uma clara alusão à extrema esquerda e à extrema direita na atual eleição, da qual quer distância.
Já Ciro Gomes, que não se encaixa em nenhum dos dois grupos acima, também não conta com a simpatia de Lisboa. Ele vê qualidades no candidato do PDT, “extremamente inteligente e com um bom histórico de gestor no Ceará”. Adicionalmente, seu irmão e aliado político Cid Gomes é responsável pela grande inovação bem-sucedida no ensino fundamental da cidade cearense de Sobral, que depois se espalhou pelo País.
“O problema é que o Ciro tem ideias meio confusas, que oscilam de um extremo ao outro”, diz Lisboa. Ele se refere a ideias desenvolvimentistas de economistas ligados ao candidato que “acham que o problema do Brasil é câmbio e que a abertura comercial e a integração com o resto do mundo pode ser um problema”.
Para o presidente do Insper, “é uma agenda que mistura um pouco o sabor do Brasil velho com a superficialidade da análise que a gente assistiu nos últimos anos, e que deixou resultados muito ruins para o País”. Lisboa acha “surpreendente que economistas que erraram tantas vezes, que foram autores de planos heterodoxos que deram tão errado, que fizeram tão mal ao país, continuem participando do debate sem nenhuma autocrítica”.
Ele acrescenta que a janela de oportunidade para o Brasil resolver os seus problemas está se fechando.
Por vezes Lisboa soa bastante pessimista, como quando diz que “o problema hoje não está na política, mas sim na sociedade, que não quer fazer o ajuste”.
Ele menciona uma longa lista de grupos que se beneficiam de distorções do “Brasil velho” e que resistem a mudanças para melhorar o país: corporações de servidores entre o 1% mais rico do País que se opuseram à reforma da Previdência; o Estado do Rio que, mesmo mais rico que o resto do País, “pede o tempo todo para a União pagar pelos seus (do Rio) pecados”; empresários que não querem pagar tributos ou contribuir com a Previdência; e – algo que está deixando-o especialmente irado no momento – a aliança esdrúxula entre movimentos de defesa do consumidor e cartórios contra o cadastro positivo.
Por outro lado, o presidente do Insper diz que “já esteve mais pessimista”, porque em 2012 e 2013, quando ele e outros economistas alertavam sobre os desastres que estavam por vir, “a negação dos problemas era muito maior”.
Cadastro positivo é um tema que encoleriza Lisboa no momento e o faz pronunciar frases sarcásticas como a de que “o Brasil não é um pais pobre à toa, a gente faz muito esforço para ser pobre”.
Ele considera inacreditável que o País não tenha um sistema funcional de cadastro positivo, algo disseminado entre os países da OCDE e mundo afora, e que existe em “pares” do Brasil como o México.
Para o economista, o cadastro positivo é uma questão de cidadania, e sua ausência é uma grande injustiça com os mais pobres que “só tem a sua reputação” na hora de pedir crédito. Ricos como ele mesmo, explica Lisboa, têm imóvel próprio, automóvel, etc., que podem oferecer como garantia.
“A defesa do consumidor no Brasil foi contra o pobre poder usar o seu bom nome para pegar empréstimo”, atacou o presidente do Insper.
Ele explicou que, pelo sistema proposto de cadastro positivo que emperrou no Congresso, apenas as informações sobre pagamento ou não de créditos são repassadas pelos bancos para os três “birôs” de crédito (o mais conhecido é a Serasa), que são aprovados e supervisionados pelo Banco Central e devem ter patrimônio líquido mínimo de R$ 70 milhões. Os birôs então divulgam apenas as notas de créditos dos consumidores, e se vazarem qualquer informação sobre pagamento ou não de créditos podem ser processados no âmbito da lei de sigilo bancário.
Lisboa comparou o sistema aos “ratings” que praticamente todos os países e muitas empresas recebem de agências de classificação de risco como Moody’s, S&P’s e Fitch. “O país, as empresas e os cidadãos são avaliados com notas de crédito, isso é o normal, o básico”, ele disse.
Porém, na sua visão, as associações de defesa do consumidor, aliadas aos cartórios, “inventaram espantalhos de quebra de sigilos de informações e dados, e não apenas jogaram o bebê fora junto com a água do banho, como afogaram o bebê”.
Lisboa ressalva que a defesa do consumidor tem uma maioria de pessoas bem intencionadas, “mas que mostram um desconhecimento técnico muito impressionante”.
Ele não faz a mesma ressalva positiva em relação aos cartórios, que, para o economista, “hoje são um obstáculo a reformas para melhorar o Brasil”.
O presidente do Insper prossegue no ataque, dizendo que “se tem um exemplo do Brasil velho, do retrocesso, são os cartórios”. Segundo o economista, nas mais diversas partes do mundo já se substituíram sistemas como o que funciona no Brasil por alternativas “mais eficientes, sofisticadas e seguras de controlar registros do que o velho cartório, que não é apenas um custo para o País, mas que ainda por cima impede avanços”.
A série de documentos do Panorama Brasil, segundo Lisboa, na qual a participação da Oliver Wyman é fundamental, busca sair do “debate superficial de câmbio e juro” para investigar com rigor acadêmico a imensa quantidade de problemas específicos que precisam ser enfrentados no Brasil, como a complexidade tributária e o comércio exterior fechado, e que não se resolvem “com uma, duas ou três leis”.
Assim, a proposta da série de estudos é investigar temas como os tipos de reformas de crédito que deram certo no mundo, os efeitos de intervenções setoriais e regulatórias, os impactos das mudanças nas regras de cálculos das concessões, como se dá o arcabouço e a governança dos investimentos em infraestrutura bem sucedidos em outros países, qual o papel das agências reguladoras, como devem ser os mandatos dos diretores do Banco Central, como tratar a remuneração dos servidores públicos, como outros países enfrentaram o corporativismo do funcionalismo quando isto criou asfixia fiscal, etc.
“O Brasil não é um país que se descolou do resto do mundo à toa, nós temos muito coisa torta e esses velhos grupos de interesse que se beneficiam do País atrasado. Essa é uma agenda longa, trabalhosa, mas urgente – podemos não a seguir, tem muito exemplo de pais latino-americano que ficou para trás e está cada dia mais pobre. Mas eu espero que o Brasil não seja um deles”, conclui o economista.
Mas ele ressalva novamente que o trabalho com a Oliver Wyman não é uma agenda de propostas, e sim um mapeamento de diagnósticos, e que cabe aos políticos escolher os caminhos e aos técnicos indicar as prováveis consequências dessas escolhas. (Fernando.dantas@estadao.com)