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Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
domingo, 29 de abril de 2018
Economistas defendem nova agenda - Marcos Lisboa, Ana Carla Abrão e Vinicius Carrasco (Insper)
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quarta-feira, 9 de março de 2016
Voce prefere ser mais rico e mais desigual, ou mais pobre e mais igualitario? - Vinicius Carrasco e Joao Manoel Pinho de Melo
Paulo Roberto de Almeida
A fábula do contrato social e as políticas ineficientes e injustas do PT
Vinicius Carrasco e João Manoel Pinho de Mello
Nexo Ensaio, sem data
(link: https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2016/A-f%C3%A1bula-do-contrato-social-e-as-pol%C3%ADticas-ineficientes-e-injustas-do-PT)
No mundo real, o governo não é nem onisciente, nem onipotente. É preciso induzir produção, o que o dictum socialista não faz
Os cidadãos são idênticos quando celebra-se o contrato. Portanto, é razoável supor que concordem que o contrato produza o maior bem-estar esperado para um cidadão arbitrário. Também é razoável supor que o cidadão seja avesso ao risco de se descobrir inábil; razão pela qual a sociedade se importa com redistribuição.
Consideremos, primeiro, o caso, ainda mais hipotético, do governo – que fará valer o contrato – onisciente, que saiba quem tirou a sorte grande no sorteio das habilidades. O governo, também onipotente, pode, ainda, obrigar cada um a produzir. Como consequência da onisciência e onipotência do governo, não é preciso prover incentivos para produção. Por sua vez, a aversão ao risco faz com que o cidadão arbitrário deseje seguro completo contra o “sinistro” de ser improdutivo. O contrato social, então, satisfará o dictum socialista: “de todos conforme com suas habilidades, a todos conforme com suas necessidades.” Igualitarismo total. Os trabalhadores hábeis trabalharão mais do que os inábeis e o governo transferirá recursos para os menos hábeis. Parece hipotético esse mundo? Alguns acreditaram nele (vide a sublime História Concisa da Revolução Russa, de Richard Pipes).
No mundo real, o governo não é nem onisciente, nem onipotente. É preciso induzir produção, o que o dictum socialista não faz. Tendo o mesmo nível de bem-estar independentemente do que fizerem, não haverá incentivos para produção em acordo com as habilidades. Sem produção, não há redistribuição. Em nossa fábula, antecipando esse desastre, os cidadãos não escolherão por um contrato social que tente implantar o mesmo nível de bem-estar para todos. Historiadores como Leon Litwack enfatizam o papel da ausência de provisão de incentivos no fracasso econômico da União Soviética. Alguma desigualdade é necessária para incentivar produção, sem a qual não há redistribuição.
Os anos recentes foram pródigos na implantação de políticas ineficientes e injustasO laissez-faire radical, ao prover o montante máximo de incentivos, é o caso oposto. Ninguém é tributado na margem. O bolo é o maior possível, mas não há o que redistribuir porque não se coleta impostos. Por trás do véu da ignorância, os cidadãos rejeitarão o laissez-faire radical.
Os dois extremos ilustram o conflito que a sociedade enfrenta: escolher entre distribuição e eficiência. A solução depende das preferências por redistribuição. Os EUA dão menos peso à redistribuição que a Suécia. No entanto, a teoria econômica – e alguma reflexão sobre sociedades exitosas em produzir e redistribuir – aponta que a eficiência é muito importante, mesmo em casos extremos de preferência por redistribuição, como quando só o bem-estar do cidadão que virá a ser o mais inábil importa (caso chamado, com algum abuso, de Rawlsiano por economistas): é preciso incentivos para gerar renda; sem ela, não há o que redistribuir para o mais inábil. De fato, no caso Rawlsiano, sob certas condições, o agente mais hábil da sociedade (o Mark Zuckerberg) não deve enfrentar taxação de sua última hora trabalhada.
Se a solução do conflito entre redistribuição e eficiência depende das preferências da sociedade quanto à primeira e sempre requer atenção à segunda, algo é inquestionável: o contrato original não deve conter arranjos que, simultaneamente, concentrem renda e sejam ineficientes (desestimulem o crescimento econômico). Sob a ótica do contrato social original, a desigualdade que não gere incentivos é uma forma de apropriação indevida de recursos.
Infelizmente, os anos recentes foram pródigos na implantação de políticas ineficientes e injustas. Três exemplos:
O BNDES concedeu empréstimos subsidiados para os campeões nacionais. O Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) financia, em parte, o banco. Os recursos do FAT vêm da tributação de receita das empresas (o que introduz ineficiência ao reduzir a produção). O FAT obteria remuneração bem mais alta se administrado por gestores privados. Portanto, transferem-se recursos dos trabalhadores para empresas, que poderiam se financiar no mercado. Tem mais. A política de campeões nacionais suprime a competição. O campeão recebe financiamento barato à custa do trabalhador para esfoliar o consumidor. Além de ineficiente, é injusto.
Regras de conteúdo nacional impõem que produtores usem um percentual de insumos produzidos localmente. O objetivo alegado é estimular a produção e criar empregos. Na verdade, a política desestimula produção (ineficiente, portanto), pois dá poder de mercado ao produtor de insumo. Ele reduz produção e aumenta preço, majorando o custo do produtor de bens finais que, consequentemente, produz menos. A agonia da Petrobras se deve, em parte, à exigência de comprar sondas e plataformas com conteúdo nacional. Transfere-se, neste caso, renda para os escolhidos à custa da renda do contribuinte brasileiro (e do pessoal do FGTS Petro).
O Tesouro Nacional financiou o Programa de Sustentação ao Investimento (PSI), cujo objetivo era estimular o investimento. O PSI produziu ineficiências e concentrou renda. Exemplo: financiou, com subsídios, a aquisição de caminhões, gerando excesso de oferta de frete. O resultado foi a redução substancial de seu valor, um sinal de mercado da ineficiência induzida pela política. Os caminhoneiros entraram em greve e conseguiram que um dos eixos do caminhão não pagasse pedágio quando trafegasse sem carga. Isso ensejará uma renegociação com os operadores de estradas, aumentando a percepção de risco regulatório. Os concessionários cobrarão por esse risco exigindo maior taxa de retorno em concessões futuras. Resultado? Mais pedágios para todos (ou, pior, falta de interesse em concessões). A solução? Mais subsídio via BNDES para turbinar os retornos dos concessionários. O ciclo se reinicia.
Políticas protecionistas, empresas apostando no câmbio com dinheiro barato do BNDES, resgate de controladores de bancos que cometeram fraudes. É longa a lista de escolhas ineficientes e injustas. Sem elas, estaríamos mais ricos e menos desiguais. Por que prevaleceram por tanto tempo sem parecer afetar a população? O maná externo do boom das commodities nos anestesiou. Parecia que todos ganhavam.
Findo o maná, as consequências dessas políticas ficam claras. "E esse não é o nosso destino." Confrontados com o resultado, os mentores – apresentando a conta a quem já paga pelos equívocos – redobram, ainda que de maneira por ora tímida, a aposta fracassada. "Dois cavaleiros se aproximavam e o vento começou a uivar," diz o fim da canção, que enseja seu recomeço num laço infinito.
Vinicius Carrasco e João Manoel Pinho de Mello são PhDs em Economia pela Universidade Stanford e professores, respectivamente, na PUC-Rio e Insper
sábado, 26 de dezembro de 2015
Avaliando o desempenho do PT no poder (mediocre) - Vinicius Carrasco e João Manoel Pinho de Mello
Nossa desgraça atual não é culpa do ajuste fiscal que não houve. É culpa da falta de construção de uma base sólida para o crescimento
Anos depois escrevemos o artigo "A Década Perdida: 2003 – 2012". Nele, respondemos uma questão distinta mas parecida: o Brasil foi bem sob o comando do PT no governo federal? Quase todos dirão: claro! Crescemos mais do que na década anterior, e com inflação controlada. A pobreza e a desigualdade caíram e milhões foram incorporados ao mercado de consumo. Resposta simples para uma pergunta tola. Por que então dizemos que a década foi perdida? Porque a resposta simples é, na verdade, simplista.
Apesar de intuitiva, e por isso conveniente para as narrativas eleitorais, a comparação antes-e-depois é enganosa. Não seria se nada mudasse entre o antes e o depois. Mas muito mudou. Um exemplo cotidiano ajuda a entender. Imagine que o trânsito diminua no mês seguinte à adoção do rodízio de carros de passeio. A intervenção melhorou o trânsito? Sim, sugere o antes-e-depois. Mas e se o rodízio foi adotado no final de dezembro e, consequentemente, o mês de trânsito bom foi em um janeiro? As condições “externas” são diferentes: no mês de Natal as pessoas se movimentam mais pela cidade; em janeiro, mês de férias, muita gente viaja. Logo, a melhora em janeiro (depois) em relação a dezembro (antes) não pode ser exclusivamente atribuída ao rodízio.
Elimina-se a sazonalidade comparando janeiros, uma adaptação do método antes-e-depois. Imagine que o trânsito piorou em relação a janeiro do ano anterior. O tiro do rodízio saiu pela culatra? Não. A frota pode ter aumentado entre janeiros. Para que dois janeiros sejam comparáveis, é preciso que a frota de automóveis seja a mesma. E que sejam os mesmos o preço da gasolina, a quilometragem de metrô, e assim por diante. Necessitaríamos saber como teria sido o trânsito sem o rodízio, algo que não aconteceu. Temos que saber o contrafactual.
Os cientistas laboratoriais constroem contrafactuais usando experimentos aleatorizados. Aplicam um tratamento – e.g. remédio - em um grupo de pacientes, e um placebo no outro. Este, chamado de grupo de controle, faz o papel do contrafactual, o que ocorre sem o remédio. Para o trânsito, ou para governos, é difícil usar o método experimental. Sortearíamos quais cidades aplicarão rodízio de automóvel? Ou se o PT ou o PSDB ocupará o Palácio do Planalto?
Felizmente, os cientistas sociais bolaram métodos engenhosos para emular, ainda que imperfeitamente, desenhos experimentais e fazer comparações educadas. Usamos um deles: o método do controle sintético.
O nome é assustador mas a ideia é simples. Avaliamos o desempenho de um país comparando-o com países similares. O PIB brasileiro cresceu mais ou menos do que o resto da América Latina? A comparação faz sentido. Mas o incômodo persiste: qual a comparação correta? Com a média da América Latina? Ou melhor comparar só com a Argentina, parceira comercial importante? Ou com o Chile, também grande exportador de riquezas minerais? Ou com o México, industrializado como o Brasil? Por que não comparar com outros emergentes, como a Índia, economia tão fechada quanto a brasileira?
Em suma, a escolha não é óbvia. Parece fadada à arbitrariedade. Aí está a beleza do método do controle sintético: ele ata as mãos do pesquisador, diminuindo a arbitrariedade. Escolhe-se como grupo de comparação a combinação de países que melhor emule o Brasil antes de 2003. Em outras palavras: cria-se um país sintético que aproxime nossas características, o país “gêmeo” do Brasil. Os dados decidem, não o pesquisador. Sendo suficientemente parecido com o Brasil antes do “tratamento” – a chegada do PT ao poder – quaisquer diferenças que apareçam depois de 2002 são mais facilmente atribuíveis ao tratamento.
O desempenho de um país pode ser avaliado em várias dimensões. Comecemos com o PIB per capita. Encontramos um país “gêmeo” cuja renda antes de 2003 era parecida com o Brasil, tanto no nível quanto na trajetória, mostrando o êxito do método. O “gêmeo”, talvez contra-intuitivamente, tem pouco de América Latina. A Turquia aparece com grande peso. Por quê? Porque é um dos poucos países grandes e industrializados que tinha renda parecida com a brasileira antes de 2003.
Depois de 2002 o Brasil cresceu mais do que no período imediatamente anterior. Mas o país “gêmeo” também cresceu ainda mais. Tendo enfrentado condições externas menos favoráveis, cresceu 21% mais do que o Brasil entre 2003 e 2015. No “gêmeo”, a produtividade, medida pelo PIB por pessoa empregada, dobrou (até 2012); no Brasil, ficou parada.
O Brasil, em relação ao gêmeo, investiu menos, adicionou menos valor na indústria e teve inflação um pouco mais alta; perdeu competitividade, avançou menos em pesquisa e desenvolvimento, piorou sensivelmente a qualidade regulatória, e foi mal em quase todos os setores importantes. No social, a desigualdade de renda, a subnutrição e a pobreza caíram, mas em linha com o “gêmeo”. Educação e saúde andaram em linha, apesar de termos gasto mais; a segurança pública foi mal. No mercado de trabalho, o desempenho foi misto: o salário mínimo real aumentou tanto quanto; o salário médio real aumentou menos. A principal conquista foi no emprego: aumentou a massa salarial no PIB através da incorporação de mais pessoas na força de trabalho e da queda no desemprego. Ou seja, o crescimento veio de mais gente trabalhando, e não de maior produtividade.
Terminamos onde começamos, sem conseguir responder a pergunta do Nicolini. Mas aprendemos que, à luz dos nossos pares, crescemos pouco e assentamos bases frágeis para o futuro. Nesse sentido, desperdiçamos a década.
Por fim, um comentário sobre o período mais recente. O crescimento brasileiro perde fôlego a partir de 2011, ano da chegada de Dilma ao poder. De fato, em 2014 já houve queda no produto per capita medido em dólares constantes. Ou seja: não, André Singer! Nossa desgraça atual não é culpa do ajuste fiscal que não houve. É culpa da falta de construção de uma base sólida para o crescimento quando os tempos eram de bonança. Além de uma grande dose de irresponsabilidade nos anos recentes.
Vinicius Carrasco e João Manoel Pinho de Mello são PhDs em economia pela Stanford University. São, respectivamente, professores no Departamento de Economia da PUC-Rio e no Insper.
sexta-feira, 1 de agosto de 2014
Heranca maldita dos companheiros: a decada perdida na area economica - Carrasco et al.
Década Perdida (Carrasco et al.)
por Vinicius Carrasco, João M. P. de Mello e Isabela Duarte
publicado pela PUC Rio; link: http://www.econ.puc-rio.br/uploads/adm/trabalhos/files/td626.pdf
Exceto pelo mercado de trabalho, em todas as outras dimensões socioeconômicas relevantes, o Brasil foi tão bem quanto ou, mais frequentemente, pior do que o melhor grupo de comparação...Em suma, crescemos menos e assentamos bases mais frágeis para o futuro do que países similares.