Falta futuro para Venezuela e Cuba
Editorial O Globo, 16/06/2010
Os adversários de Hugo Chávez são sempre acusados de corrupção e de crimes financeiros ou contra o povo. Feito isto, vão para trás das grades. A máquina de propaganda do governo, tipo rolo compressor, se encarrega de convencer os chavistas de que os adversários são os vendilhões do templo. Mas qualquer observador imparcial vê que não é assim.
Chávez é ferrenho inimigo da imprensa independente do país, particularmente das grandes redes de TV. Já tirou do ar a RCTV e vive perseguindo a única que ainda adota uma postura crítica a seu governo - a Globovisión. Não espanta, portanto, que um tribunal de Caracas tenha emitido ordem de prisão contra o dono da rede, Guillermo Zuloaga, acusado de especulação. Se não estivesse foragido, já estaria preso. Qualquer semelhança com Cuba não é mera coincidência. Na verdade, é muito mais que isto. Conforme reportagem do GLOBO, Fidel Castro, depois de uma reunião com Chávez, em 2006, saiu-se com esta: "Somos venecubanos." Raúl Castro, sucessor do irmão, numa visita a Caracas, confirmou: "Cada dia mais somos a mesma coisa."
Com a economia cubana à míngua, o regime chavista surgiu como a grande tábua de salvação. A Venezuela fornece a Cuba diariamente 100 mil barris de petróleo, e o comércio bilateral atinge US$7 bilhões anuais, segundo o ex-general venezuelano Antonio Rivero, contrário à aproximação. Cuba paga em serviços que vão muito além dos 15 mil médicos que atendem venezuelanos pobres em programas sociais chavistas como o Barrio Adentro. A própria segurança de Chávez é cubana.
Os dois governos se entrelaçaram de tal forma que "um país entrega sua soberania ao outro", conforme disse ao GLOBO, em Caracas, o ex-chanceler venezuelano Simón Alberto González. A forte relação bilateral tem, obviamente, motivação ideológica. Chávez, o mentor do "socialismo bolivariano", quer assegurar seu lugar no panteão das esquerdas como o sucessor da Revolução Cubana que, ao longo do tempo, se radicalizou e se tornou a grande inimiga do "império" - os Estados Unidos. O autoritário coronel venezuelano já ocupa espaços nesse sentido, desde que, é claro, os americanos não deixem de comprar seu petróleo sulfuroso.
O grande problema é que o modelo é insustentável. A matriz ideológica (Cuba) depende da ligação umbilical com a matriz econômica (Venezuela) para se manter viva. Cuba enfrenta condições cada vez mais difíceis e, se não democratizar o regime, não conseguirá atrair os investimentos de que necessita para melhorar a vida da população, ficando dependente de forma crescente de Chávez.
Este, ao tornar seu regime cada vez menos democrático, cada vez mais parecido com o de Cuba e cada vez mais dependente do petróleo, arrisca-se a afundar de vez um país rico como a Venezuela, cuja economia já cambaleia, com crescimento negativo do PIB e a maior inflação da América do Sul. Não há futuro para a ditadura cubana, que mantém prisioneiros políticos e os deixa morrer em greve de fome. Nem para um regime vociferante como o da Venezuela, que quer empurrar o país na contramão da História. A continuarem assim, morrerão abraçados.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.