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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Contra a mentira e a manipulacao - Ruth Rocha

Sempre admirei a Ruth Rocha (que não era do meu tempo de menino, mas foi do tempo dos meus filhos): eu comprava seus livros para ler para as crianças pequenas, geralmente na hora de dormir.
Uma grande escritora e uma grande personalidade. Gostaria de ter o dom que ela tem para escrever de forma simples e descomplicada. Infelizmente não tenho, e meus leitores são obrigados a conviver com a minha prolixidade horrível no estilo da escrita, frases longas demais, apostos, complementos, enfim, esses monstros metafisicos que poluem o meu texto e fazem alguns leitores desistir de me ler.
O que vou fazer? Eu não nasci Ruth Rocha e não aprendi a escrever como ela. Ruim para mim.
No meio do meu caminho, tinha várias pedras, claro, mas também tinha uma coisa chamada Escola Paulista de Sociologia, que comecei a ler desde muito cedo. Aí, infelizmente, fiquei com esse jeito florestânico de escrever que é uma praga de construção verbal, um estilo horrendo e prolixo, justamente.
Mais, passons.
Não comecei a escrever este post para falar de estilos literários.
Atualmente andamos mal de estilos, com um sujeitinho que polui o ambiente com suas frases estropiadas e seu estilo que não tem nem nome: é dele só, e espero que nos livremos rapidamente, pois já não aguento mais ler ou ouvir esse estilo se espalhando nas minhas notícias.
Mais, passons, à nouveau...

O que eu queria era simplesmente transcrever um texto da Ruth Rocha, que achei digno e necessário. Elegante, educado, mas firme e decidido.
Ela está nesse jogo por algo maior do que a escolha de um (ou uma) candidato(a). Ela pretende, como eu, simplesmente defender a verdade, ser contra as manipulações da história, e ser independente.
Comme il faut...
Paulo Roberto de Almeida

Carta à candidata Dilma
Ruth Rocha

Meu nome foi incluído no manifesto de intelectuais em seu apoio. Eu não a apóio. Incluir meu nome naquele manifesto é um desaforo! Mesmo que a apoiasse, não fui consultada. Seria um desaforo da mesma forma. Os mais distraídos dirão que, na correria de uma campanha... “acontece“. Acontece mas não pode acontecer. Na verdade esse tipo de descuido revela duas coisas: falta de educação e a porção autoritária cada vez mais visível no PT. Um grupo dominante dentro do partido que quer vencer a qualquer custo e por qualquer meio.

Acho que todos sabem do que estou falando.

O PT surgiu com o bom sonho de dar voz aos trabalhadores mas embriagou-se com os vapores do poder. O partido dos princípios tornou-se o partido do pragmatismo total. Essa transformação teve um “abrakadabra” na miserável história do mensalão . Na época o máximo que saiu dos lábios desmoralizados de suas lideranças foi um débil “os outros também fazem...”. De lá pra cá foi um Deus nos acuda!

Pena. O PT ainda não entendeu o seu papel na redemocratização brasileira. Desde a retomada da democracia no meio da década de 80 o Brasil vem melhorando; mesmo governos contestados como os de Sarney e Collor (estes, sim, apóiam a sua candidatura) trouxeram contribuições para a reconstrução nacional após o desastre da ditadura.

Com o Plano Cruzado, Sarney tentou desatar o nó de uma inflação que parecia não ter fim. Não deu certo mas os erros do Plano Cruzado ensinaram os planos posteriores cujos erros ensinaram os formuladores do Plano Real.

É incrível mas até Collor ajudou. A abertura da economia brasileira, mesmo que atabalhoada, colocou na sala de visitas uma questão geralmente (mal) tratada na cozinha.

O enigmático Itamar, vice de Collor, escreveu seu nome na história econômica ao presidir o início do Plano Real. Foi sucedido por FHC, o presidente que preparou o país para a vida democrática. FHC errou aqui e ali. Mas acertou de monte. Implantou o Real, desmontou os escombros dos bancos estaduais falidos, criou formas de controle social como a lei de responsabilidade fiscal, socializou a oferta de escola para as crianças. Queira o presidente Lula ou não, foi com FHC que o mundo começou a perceber uma transformação no Brasil.

E veio Lula. Seu maior acerto contrariou a descrença da academia aos planos populistas. Lula transformou os planos distributivistas do governo FHC no retumbante Bolsa Família. Os resultados foram evidentes. Apesar de seu populismo descarado, o fato é que uma camada enorme da população foi trazida a um patamar mínimo de vida.

Não me cabem considerações próprias a estudiosos em geral, jornalistas, economistas ou cientistas políticos. Meu discurso é outro: é a democracia que permite a transformação do país. A dinâmica democrática favorece a mudança das prioridades. Todos os indicadores sociais melhoraram com a democracia. Não foi o Lula quem fez. Votando, denunciando e cobrando foi a sociedade brasileira, usando as ferramentas da democracia, quem está empurrando o país para a frente. O PT tem a ver com isso. O PSDB também tem assim como todos os cidadãos brasileiros. Mas não foi o PT quem fez, nem Lula, muito menos a Dilma. Foi a democracia. Foram os presidentes desta fase da vida brasileira. Cada um com seus méritos e deméritos. Hoje eu penso como deva ser tratada a nossa democracia. Pensei em três pontos principais.

1) desprezo ao culto à personalidade;

2) promoção da rotação do poder; nossos partidos tendem ao fisiologismo. O PT então...

3) escolher quem entenda ser a educação a maior prioridade nacional.

Por falar em educação. Por favor, risque meu nome de seu caderno. Meu voto não vai para Dilma.

SP, 25/10/2010

Ruth Rocha, escritora
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/

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Addendum (necessário), mas emprestado de um colega de lista:

Entrei no blog do Noblat, para ler os comentários sobre a carta da Ruth Rocha, e fiquei estarrecido. Apesar de não ter lido todos (já são mais de 100), constatei que há dezenas de comentários destratando a Ruth Rocha como se ela fosse uma bandida por se queixar do uso indevido de sua assinatura. As pessoas perderam completamente a noção do que é certo, do que é decência. Antigamente, um peão de fazenda analfabeto sabia que não se pode agir assim com alguém, atentando contra a sua vontade, tanto que palavra dada era documento. Hoje, depois de meio século de pregação esquerdizante, a honradez individual foi assassinada — só existe a tal "ética" do grupo, de quem grita mais alto. O problema do Brasil já não é mais político — é civilizacional. Estamos chafurdando na barbárie.

Comento eu (PRA):
De fato, eu também me dou ao hábito, que me toma um tempo indevido em face de minhas leituras e outras obrigações, de ler comentários de leitores, cartas de leitores nos jornais impressos, ou mensagens enviadas no seguimento de uma coluna ou matéria postada num site ou blog.
Confesso que fico estarrecido. As cartas em jornais são filtradas, e portanto evitam a linguagem chula, as expressões ofensivas, os exemplos mais deletérios de paixões incontidas. Já não é o caso das mensagens não moderadas dessas matérias de jornal ou colunas assinadas em blogs: é inacreditável como a educação se degradou no Brasil.
Além de palavrões escabrosos, que apenas revelam a indigência mental de seus autores, existem argumentos tão raivosamente enviesados que me confirmam, sim, que o Brasil está irremediavelmente dividido entre os a favor ou contra este ou aquele candidato. A violência verbal é tamanha que me faz imaginar um desses enfrentamentos reais, caso a oportunidade se apresente, similar às brigas de gangues de torcidas organizadas de futebol, um exemplo supremo de que, como naqueles países dominados por tribos fanatizadas por alguma crença qualquer, também temos nossos energúmenos para provocar mortes e destruição.
Infelizmente, parece que vamos continuar descendo na escala da civilização, o que é triste, muito triste.
PRA (28.10.2010)

2 comentários:

mah.... mais uma gauche na vida... disse...

Há alguns meses li na Folha de S. Paulo sobre um estudo de um professor da USP, Vladimir Safatle, contestando a idéia de que a internet serviria como espaço para a discussão de idéias (ai, não consigo me acostumar com esse acordo ortográfico).

"A internet está mais para grande espaço fragmentado de posições, onde cada território está ocupado por opiniões muito bem definidas e que não entram em contato com ideias diferentes. Manifestações dissonantes são reprimidas ou ignoradas."

http://www1.folha.uol.com.br/poder/768934-internet-nao-criou-espaco-para-debate-diz-professor.shtml

mah.... mais uma gauche na vida... disse...

Recentemente li um artigo na Folha de S. Paulo sobre um estudo feito por um professor da USP, Vladimir Safatle, contestando a noção da internet como um espaço para a discussão de idéias.

"A internet está mais para grande espaço fragmentado de posições, onde cada território está ocupado por opiniões muito bem definidas e que não entram em contato com ideias diferentes. Manifestações dissonantes são reprimidas ou ignoradas."

(http://www1.folha.uol.com.br/poder/768934-internet-nao-criou-espaco-para-debate-diz-professor.shtml)