Raramente concordo com o keynesianismo exacerbado de Paul Krugman, mas agora, neste artigo sobre Chipre, ele relata simplesmente a verdade. A ilha se tornou uma lavanderia russa, para dinheiro legal e ilegal, o que obviamente não pode ser tolerado.
A conta vai sair cara, para todas as partes...
Paulo Roberto de Almeida
Barbeiragem em Chipre
22 de março de 2013 | 2h 09
Editorial O Estado de S.Paulo
Em meio aos gigantes da economia europeia que estão em
dificuldades, coube a Chipre, um minúsculo país de 1 milhão de
habitantes, com um Produto Interno Bruto de apenas US$ 23,6 bilhões,
protagonizar uma crise financeira que ameaça despejar gasolina no
incêndio da zona do euro. O caso todo é uma mistura de arrogância
política e erros de avaliação.
A própria presença de Chipre na União Europeia (UE) - uma óbvia
anomalia, já que nem o sistema financeiro do país nem sua economia
respeitam os padrões mínimos exigidos pela UE - é fruto de um jogo de
conveniências. Os reticentes dirigentes europeus tiveram de engolir
Chipre em 2004 por pressão da Grécia, que ameaçava vetar o ingresso da
Polônia e da República Checa, entre outros países do Leste Europeu, caso
os cipriotas não fossem aceitos. Como se sabe, a ilha é dividida entre
cipriotas gregos e turcos desde 1974, e o interesse de Atenas ao forçar a
adesão de Chipre à UE era deslegitimar de vez a porção sob influência
turca, que já não tem reconhecimento internacional. A UE, por sua vez,
esperava que houvesse a reunificação de Chipre antes de aceitar seu
ingresso, mas cedeu aos gregos. Pouco depois, os cipriotas gregos
rejeitaram a reunificação em referendo, enterrando de vez as ilusões de
que a entrada de Chipre no clube do euro pudesse facilitar o processo de
paz. Assim, não surpreende a má vontade com que os cipriotas estão
sendo tratados neste momento pelas autoridades europeias.
Chipre já não gozava de nenhuma confiança no resto do continente, o
que explica a violência do pacote de socorro proposto pela UE e pelo FMI
- que previa, além da tradicional exigência de austeridade fiscal, o
confisco de parte dos depósitos bancários para ajudar a pagar a conta do
resgate. Mas os duros termos do resgate revelam que os eleitores das
potências europeias, a esta altura, não acreditam mais nos argumentos de
seus governantes para socorrer países quebrados e só admitem que a
ajuda seja liberada se esses países forem submetidos a condições muito
mais severas do que as impostas até agora. A crise na zona do euro,
portanto, não é apenas econômica, mas também de credibilidade política.
Não é de hoje, aliás, que os europeus do norte consideram os do sul
irresponsáveis, corruptos e perdulários - portanto, indignos de
solidariedade em momentos de penúria. A necessidade de consolidar a
União Europeia abafou esse sentimento, mas a aguda crise na Grécia, na
Espanha e na Itália tirou o gênio da garrafa e escancarou a dificuldade
de conciliar culturas políticas tão distintas. Nesse contexto, a
chanceler da Alemanha, Angela Merkel, que deveria ter defendido o
resgate cipriota a despeito de sua impopularidade, ante o potencial
explosivo da crise, preferiu o conforto de uma solução demagógica e
irresponsável - teme-se, com razão, que o precedente aberto pelo
confisco deflagre uma corrida aos bancos também na Itália, na Espanha,
em Portugal e na Grécia, justamente no momento em que essas economias
lutam para reequilibrar-se.
Ademais, as exigências da UE para o resgate cipriota não tocam em
outro ponto importante: Chipre é uma lavanderia de dinheiro para
milionários russos envolvidos em negócios obscuros. O certo seria
controlar parte desses depósitos, mas o governo cipriota não quis
melindrar a Rússia, responsável por uma ajuda de US$ 3,3 bilhões ao
país, e decidiu que seriam taxadas as contas com valores abaixo de 100
mil, atingindo os correntistas comuns, cujos depósitos são garantidos
pela legislação europeia. Não surpreende, portanto, que o Parlamento
cipriota tenha rejeitado a exigência.
Discute-se a alternativa de que a Rússia possa socorrer Chipre
novamente, em troca da exploração de suas reservas de gás - calcula-se
que a ilha tenha o equivalente a 40% das necessidades da UE, hoje
dependente do gás que vem da Rússia. Logo, um dos efeitos importantes da
crise cipriota pode acabar sendo o aumento da influência russa no
continente, algo que os dirigentes europeus certamente não esperavam
quando aceitaram Chipre na UE.
===============
The New York Times, March 21, 2013
Treasure Island Trauma
A couple of years ago, the journalist Nicholas Shaxson published a fascinating, chilling book titled “
Treasure Islands,”
which explained how international tax havens — which are also, as the
author pointed out, “secrecy jurisdictions” where many rules don’t apply
— undermine economies around the world. Not only do they bleed revenues
from cash-strapped governments and enable corruption; they distort the
flow of capital, helping to feed ever-bigger financial crises.
One question Mr. Shaxson didn’t get into much, however, is what happens
when a secrecy jurisdiction itself goes bust. That’s the story of Cyprus
right now. And whatever the outcome for Cyprus itself (hint: it’s not
likely to be happy), the Cyprus mess shows just how unreformed the world
banking system remains, almost five years after the global financial
crisis began.
So, about Cyprus: You might wonder why anyone cares about a tiny nation
with an economy not much bigger
than that of metropolitan Scranton, Pa.
Cyprus is, however, a member of the euro zone, so events there could
trigger contagion (for example, bank runs) in larger nations. And
there’s something else: While the Cypriot economy may be tiny, it’s a
surprisingly large financial player, with a banking sector four or five
times as big as you might expect given the size of its economy.
Why are Cypriot banks so big? Because the country is a tax haven where
corporations and wealthy foreigners stash their money. Officially, 37
percent of the
deposits in Cypriot banks come from nonresidents;
the true number, once you take into account wealthy expatriates and
people who are only nominally resident in Cyprus, is surely much higher.
Basically, Cyprus is a place where people, especially but not only
Russians, hide their wealth from both the taxmen and the regulators.
Whatever gloss you put on it, it’s basically about money-laundering.
And the truth is that much of the wealth never moved at all; it just
became invisible. On paper, for example, Cyprus became a huge investor
in Russia — much bigger than Germany, whose economy is hundreds of times
larger. In reality, of course, this was just “roundtripping” by
Russians using the island as a tax shelter.
Unfortunately for the Cypriots, enough real money came in to finance
some seriously bad investments, as their banks bought Greek debt and
lent into a vast real estate bubble. Sooner or later, things were bound
to go wrong. And now they have.
Now what? There are some strong
similarities between Cyprus now and Iceland
(a similar-size economy) a few years back. Like Cyprus now, Iceland had
a huge banking sector, swollen by foreign deposits, that was simply too
big to bail out. Iceland’s response was essentially to let its banks go
bust, wiping out those foreign investors, while protecting domestic
depositors — and the results weren’t too bad. Indeed, Iceland, with a
far lower unemployment rate than most of Europe, has weathered the
crisis surprisingly well.
Unfortunately, Cyprus’s response to its crisis
has been a hopeless muddle.
In part, this reflects the fact that it no longer has its own currency,
which makes it dependent on decision makers in Brussels and Berlin —
decision makers who haven’t been willing to let banks openly fail.
But it also reflects Cyprus’s own reluctance to accept the end of its
money-laundering business; its leaders are still trying to limit losses
to foreign depositors in the vain hope that business as usual can
resume, and they were so anxious to protect the big money that they
tried to limit foreigners’ losses by expropriating small domestic
depositors. As it turned out, however, ordinary Cypriots were outraged,
the plan was rejected, and, at this point, nobody knows what will
happen.
My guess is that, in the end, Cyprus will adopt something like the
Icelandic solution, but unless it ends up being forced off the euro in
the next few days — a real possibility — it may first waste a lot of
time and money on half-measures, trying to avoid facing up to reality
while running up huge debts to wealthier nations. We’ll see.
But step back for a minute and consider the incredible fact that tax
havens like Cyprus, the Cayman Islands, and many more are still
operating pretty much the same way that they did before the global
financial crisis. Everyone has seen the damage that runaway bankers can
inflict, yet much of the world’s financial business is still routed
through jurisdictions that let bankers sidestep even the mild
regulations we’ve put in place. Everyone is crying about budget
deficits, yet corporations and the wealthy are still freely using tax
havens to avoid paying taxes like the little people.
So don’t cry for Cyprus; cry for all of us, living in a world whose leaders seem determined not to learn from disaster.
Nenhum comentário:
Postar um comentário