Um texto ainda mais antigo, da época do Mensalão, que, visto retrospectivamente, parece brincadeira de criança perto do Petrolão e de outras coisas ainda piores, das quais sequer desconfiamos.
Enquanto o castigo não vem, nossa única arma é a denúncia, a demonstração de que estamos conscientes de que eles são patifes, e sempre serão.
Paulo Roberto de Almeida
Dicionário Político dos Novos Pecados Capitais
Paulo
Roberto de Almeida
Como todos sabem, os sete pecados capitais da tradição cristã são,
sem ordem particular de prioridade, os seguintes:
1) inveja
2) avareza
3) cobiça
4) orgulho (ou soberba)
5) preguiça
6) luxúria e
7) gula
Sobre eles não precisamos nos alongar indevidamente, tendo em vista
toda a exegese já registrada na história, a começar por São Tomás de Aquino até
exemplos mais recentes na literatura. Pode-se questionar, inclusive se esses
“pecados” continuam sendo “capitais” ou se a sua presença na vida diária já não
vem sendo admitida com alguma tolerância pelos mais diversos personagens da
vida pública. Afinal de contas, todos eles, com alguma discrição para a
luxúria, vêm sendo exibidos por esses personagens, até mesmo com certa
desfaçatez, sem que autoridades morais ou religiosas venham a público condenar
atos e atores com a veemência que seria de se esperar.
Deixando de lado esses pecados da velha tradição, proponho-me agora
listar alguns novos pecados da moderna vida política, da brasileira em
particular. Os políticos, em geral, exibem uma penca deles, não todos os
políticos, em bloco, nem todos os pecados, ao mesmo tempo, mas vários
desses personagens da vida pública
ostentam alguns de forma cumulativa e, o que é pior, de maneira reincidente.
Não vou deter-me agora sobre casos concretos da vida pública
brasileira, tanto porque eles estão sendo expostos de maneira recorrente, nas
comissões parlamentares de inquérito e nas páginas da imprensa e em outros
meios de comunicação.
Parafraseando uma frase famosa, pode-se dizer que nunca, tantos
podres da vida pública foram assumidos de forma tão aberta, para o conhecimento
de tantos cidadãos, estupefatos. Assistimos, desde vários meses, a uma
enxurrada de denúncias, várias delas já substanciadas por provas contundentes,
sem que se tenha visto, até aqui, nenhuma condenação moral, ou qualquer
condenação de fato. Resta saber se velhos e novos pecados serão, de alguma
forma, julgados e condenados no futuro previsível.
Esperando que chegue o “dia do julgamento final”, proponho-me,
assim, a apresentar alguns novos pecados da vida política brasileira que, numa
lista não exaustiva, poderiam ser identificados com os seguintes:
1) corrupção
2) hipocrisia
3) fraude
4) desfaçatez
5) volubilidade
6) inconstância
7) mentira
8) mediocridade
9) transferência de encargos para terceiros
10) ignorância deliberada de fatos de sua
competência
11) irresponsabilidade quanto ao desempenho
de funções
12) pretensão
13) eleitoralismo desenfreado
14) propaganda indireta, com meios públicos
15) uso da máquina estatal para fins
particulares
16) populismo (velho e novo)
17) demagogia (aparentemente, uma segunda
natureza)
18) arrogância
19) clientelismo
20) fisiologia
21) nepotismo
22) fuga da realidade (autismo político)
23) esquizofrenia (defesa de objetivos
conflitantes na vida política)
24) ofensa à inteligência alheia (“eu não
sei”, “eu não vi”, “não estou sabendo”...)
Paro provisoriamente por aqui, e não pretendo, no momento, elaborar
sobre cada um desses novos pecados, esperando ao menos que eles sejam
auto-explicativos. Os fatos que poderiam substanciar cada um desses verbetes do
novo dicionário de costumes políticos da vida brasileira são conhecidos de
todos e não requerem nova descrição.
Termino parafraseando Dante Alighieri (1265-1321), o poeta italiano
autor de “A divina comédia”, que numa de suas frases memoráveis disse o
seguinte: “Não menos do que saber, me agrada duvidar.”
Paulo
Roberto de Almeida
Brasília,
26 de janeiro de 2006
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