Excelente estudo de Artur Manoel Passos, sobre o qual tenho algumas observações.
1) Quando se fala de declínio, ou ascensão, numa série histórica de valores, sempre se deve perguntar, em relação a quê, exatamente?
Pode ser em relação a um ponto na trajetória -- e se escolhermos um outro ponto a tendência pode mudar, certo? -- mas pode ser em relação à referência escolhida para comparação.
2) Neste caso, é dito é que se trata de relação aos preços de serviços, mas não se apresenta qual o indicador preciso desses serviços, e quais serviços são computados na série.
3) A tendência secular de queda de commodities poderia sustentar o famoso argumento prebischiano sobre "deterioração dos termos do intercâmbio", mas na verdade o desmente, pois diz que os manufaturados também caem.
4) Precisaria ficar claro que manufaturados SEMPRE vão cair, absoluta e relativamente, dados os ganhos de escala, de produtividade, de inovação nessa área.
5) Preços agrícolas também devem cair tendencialmente, com o crescimento progressivo da produtividade, incorporação de novas terras, diminuição do crescimento demográfico, etc, mas sempre depende da relação oferta e demanda, e a primeira reage a expectativa de ganhos futuros.
6) Metais e minerais são estoques fixos e dependem de infraestrutura, efeito substituição, mas não são "renovaveis", como agrícolas e manufaturas.
7) O principal problema, no entanto, são os serviços, que constituem uma gama enorme de itens, alguns com ganhos contínuos de produtividade -- telecomunicações, por exemplo -- e outros de ganhos nulos, ou de custos crescentes (corte de cabelo, por exemplo).
Sugeriria que o estudo tivesse mais aperfeiçoamentos metodológicos para responder a tais tipos de questionamentos.
Paulo Roberto de Almeida
Declínio secular das commodities, de volta à tendência?
MACRO VISÃO
Itaú Macroeconômica
31/03/2015
A queda dos últimos anos trouxe os preços reais das commodities de volta à tendência de declínio secular.
O declínio secular é concentrado nas commodities agrícolas, mas os manufaturados também caíram em termos reais. A queda de ambos é em relação aos preços de serviços.
Queda de 2014 marca retorno à média de longo prazo
Construímos uma série desde 1913 dos preços agregados de commodities em dólar, deflacionada pelo índice de preços ao consumidor dos EUA. A série combina dados mensais de índices de preços ao produtor nos EUA (1913 - 1956), índices agregados históricos (1957 - 1989) e o Índice de Commodities Itaú (1990 - 2014). O anexo 1 traz mais detalhes.
A série (gráfico 1) possui informações importantes sobre o ciclo e tendência de longo prazo das commodities.
O ciclo de forte alta dos preços iniciado em 2002 (associado à China) foi precedido de três ciclos anteriores. O primeiro, entre 1915 e 1919, pode estar associado à 1ª Guerra Mundial. O próximo coincide com a 2ª Guerra Mundial e a reconstrução da Europa no pós-guerra. O terceiro ciclo parece ter começado com a crise do petróleo em 1973 e deve ter continuado com o repasse de custos maiores de energia para as demais commodities.
A queda dos preços entre 2011 e 2014 trouxe os preços para a tendência de longo prazo. Por esta ótica, não é possível rejeitar uma continuidade da queda, já que os ciclos de alta anteriores foram sucedidos por preços abaixo da tendência.
O padrão cíclico observado nos preços encontra uma explicação nos fundamentos. Os ciclos de alta tendem a ser causados por aceleração da demanda. A alta dos preços incentiva investimentos. A maturação dos investimentos aumenta a capacidade de produção. Quando este aumento coincide com o fim do ciclo de crescimento anormal da demanda, os preços recuam por um longo período, até que o balanço entre oferta e demanda volte a níveis equilibrados.
Dos quatro ciclos observados nos últimos 100 anos, três deles se encaixam neste comportamento (1ª Guerra Mundial, 2ª Guerra Mundial e reconstrução de Europa, boom da China).
A crise do petróleo de 1973 apresentou características distintas. Neste caso, a alta começou a partir de um choque de oferta do petróleo, levando a repasse de custos para as demais commodities. A queda dos preços ocorreu com a política desinflacionaria dos EUA a partir do fim da década de 70.
Quanto à tendência de longo prazo, observamos uma queda das commodities agregadas em termos reais. A queda dos preços agregados em termos reais traz duas perguntas adicionais:
- Os três componentes (agrícolas, metais e energia) mostram a mesma tendência?
- A tendência de queda reflete um desempenho inferior de commodities em relação a bens manufaturados ou serviços?
A tendência de queda é restrita às commodities agrícolas
Para avaliar se os todos os três grupos de commodities mostram esta queda em termos reais, criamos séries de commodities agrícolas, metálicas e energéticas desde 1926[1].
As commodities agrícolas recuaram em termos reais ao longo do período (gráfico 2). Além disso, os principais ciclos de alta coincidem com as altas do índice agregado.
Ao contrário dos preços agregados, a commodities metálicas e energéticas mostram ligeira tendência de alta em termos reais (gráfico 3). Nas duas séries, o ciclo de alta da década passada é mais intenso do que os ciclos anteriores.
Bens manufaturados também mostram tendência secular de queda de preços em termos reais
A tendência de queda das commodities em termos reais não é em relação a bens manufaturados. Tanto o índice agregado de commodities quanto o índice de preços de bens finais (da séries de preços ao produtor dos EUA) mostram queda em termos reais desde 1947 (ver gráfico 4). A queda em termos reais de commodities e manufaturados é resultado da tendência de alta dos preços de serviços.
Desse modo, os termos de troca de um país que exporta commodities e importa manufaturados não não mostra uma tendencia de queda no longo prazo.
Artur Manoel Passos
Itau Macroenômica
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