Reflexões sobre as manifestações cidadãs de 15 de
março de 2015 e sobre as tarefas à frente
Paulo Roberto de Almeida
Os órgãos de imprensa,
repercutindo cálculos das PMs estaduais, falam de “2 milhões de pessoas nas
ruas”. Talvez tenha sido o caso, estritamente falando, mas examinando a questão
um pouco mais detidamente, afirmo que foi muito mais do que isso, e dou as razões.
Estas manifestações foram
maiores do que as das Diretas Já: em primeiro lugar, quantitativamente, pois
elas mobilizaram muitos milhões mais, pelas redes sociais, coisas que não
existiam naquela época, ainda que as pessoas não tenham se deslocado
fisicamente, inclusive porque não havia organização para isso em determinados
lugares (e se houvesse, teríamos tido virtualmente metade do país nas ruas).
Em segundo lugar, qualitativamente,
ou seja, do ponto de vista dos temas que mobilizaram a cidadania. Vejamos
primeiro a comparação elementar com as manifestações pelas Diretas Já, em 1984.
Quem é que pode ser contra
a eleição direta dos seus mandatários? Uma causa fácil, compreensível, que
dispunha, portanto, do apoio de partida de 99,99% dos brasileiros. Não querendo
depreciar as Diretas Já, não há muita glória em aderir a uma causa elementar
como essa: voto direto para a presidência.
Desta vez, se tratava de
aferir uma situação mais complexa: inépcia dos governantes, e sua conivência
com os crimes que vem sendo praticados contra o país. Portanto, se necessita de
muito mais consciência, conhecimento do que anda pelo mundo da política, e
sentido de cidadania e responsabilidade em relação a coisa pública.
Por isso digo e reafirmo:
estas manifestações foram as maiores já ocorridas na história do Brasil.
Pelo menos essa “coisa”
devemos agradecer aos mafiosos petralhas: o fato de terem despertado o sentido
de cidadania nos brasileiros.
Eles estão transformando
um mero país numa nação.
Mas quero igualmente
tratar de aspectos mais relevantes, que devem estar conosco em previsão das
manifestações que devem previsivelmente ocorrer em 12 de abril, convocadas
pelas mesmas organizações apartidárias que se empenharam no sucesso destas manifestações
de 15 de março. Quero falar do Fundo Partidário e da campanha em prol da extinção
do financiamento empresarial e pelo financiamento público das campanhas políticas,
ainda que concorrentemente ao financiamento privado, individual, regulado.
A cidadania pode até estar legitimamente indignada com
a roubalheira dos petralhas, e mobilizada contra a conivência dos políticos em
geral, e a dos políticos petistas em particular, contra a excepcional inépcia
do governo e dos seus principais mandatários, contra a corrupção em geral, e a
dilapidação da Petrobras em particular, mas ela precisa ficar atenta também ao
que ocorre nos bastidores, que não atrai os holofotes da “mídia”, mas que é
potencialmente muito mais prejudicial ao futuro do país do que os casos tópicos
de roubalheira e incompetências.
Roubos e inépcia podem ser “corrigidos” em prazos
relativamente curtos, digamos de seis meses a um ano, desde que as corretas
políticas econômicas sejam aplicadas, e que a Justiça faça o seu trabalho (mas
ela se empenha em alongar os seus prazos), mas regulação legal sobre
funcionamento do sistema político pode ficar conosco durante anos e anos, senão
décadas, como essa vergonha do Fundo Partidário.
Os cidadãos precisam estar conscientes desse tipo de
assalto ao seu bolso perpetrado pela classe -- no sentido estrito e lato do
termo -- política, e também se empenhar em que isso mude.
Simples:
partidos políticos são entes de direito privado, ainda que regulados por
lei de caráter geral, nacional, e como tal devem ser financiados pelos seus
aderentes, membros, simpatizantes, não pelo Estado --- ou seja, por todos
nós -- que não tem nada a ver com a livre organização dos cidadãos.
Campanhas políticas são feitas para políticos se perpetuarem no poder. Se
é de interesse privado, devem ser financiadas privadamente. Não ao
financiamento público de campanhas.
Proibição de financiamento empresarial é uma violência
constitucional e uma hipocrisia.
As empresas devem poder fazer o que desejarem do seu dinheiro, e elas
geralmente apoiam todos os partidos, sem qualquer distinção ideológica. Estão
fazendo investimento? É possível, mas o dinheiro é delas e não temos nada a ver
com isso. Façam o que quiserem do seu dinheiro, mas que isso não entre nas
receitas e despesas públicas.
Fragmentação partidária é um dado da realidade e condiz com a liberdade de
se constituir um partido, o que está ao alcance de qualquer um. O que não se
pode é ter representação no Congresso sem um mínimo de votos em escala
nacional, e sobretudo não poderia, e NÃO DEVERIA, ter direito a qualquer Fundo
Partidário, que deve simplesmente ser extinto.
Paulo
Roberto de Almeida
Hartford, 2792: 16 de março de 2015, 3 p.
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