05fev16
Quero minha cota no tríplex
Ignácio de Loyola Brandão
Foi essa palavra, cota, que me chamou a atenção, ao ler o noticiário do apartamento triplex no Guarujá, tristemente célebre. Tristemente porque me incluo no rol dos lesados pela famigerada cooperativa dos bancários. Anos atrás, até compareci a uma comissão de inquérito na Assembleia Legislativa, onde um deputado de nome Mentor, ou coisa semelhante, cada vez que ia me fazer uma pergunta, começava:
“Senhor Luiz Ignácio de Loyola Brandão...”.
Não respondi, ele insistiu irritado:
“Estou fazendo uma pergunta ao senhor”.
“Não, o senhor está perguntando ao presidente. Deve amá-lo sobremaneira. Não sou Luiz Ignácio. Sou apenas Ignácio de Loyola.”
“Pois então me diga, o senhor é cooperado da Bancoop?”
“Não, minha mulher é.”
“Então, não há perguntas, o senhor nem devia estar aqui. Quem paga a mensalidade é ela.”
“Talvez o senhor não tenha noção do que se chama família. Muito menos renda familiar. O contrato está em nome de minha mulher, mas decidimos comprar a unidade depois de conversas, avaliações financeiras, discussões, considerações conjuntas. A mensalidade sai de nossa renda familiar. Portanto, somos ambos cooperados.”
“Não tenho nada a perguntar, desconsidero sua presença aqui, senhor Luiz Ignácio de Loyola Brandão...”
Aquela CPI deu em nada. Nem sei se anda por aí. O que sei é que perdemos o apartamento, o grupo conseguiu se reunir, se desvincular da quadrilha formada, contratou-se uma construtora e, após anos, estamos pagando de novo o que já tínhamos pago. O PT nos deve uma boa quantia. Ainda vamos pagar mais um ano de mensalidades.
Ao ler o noticiário, a palavra cota do triplex me intrigou. Se o apartamento do Guarujá foi dividido em cotas, cadê os outros compradores? Quantas são as cotas? Posso trocar o que me devem por uma cota? Por que nós, roubados, não podemos ficar com uma cota no triplex?
O cinismo e a ironia são escárnios em cima dos brasileiros. Falar que o sítio do homem é um puxadinho? Eles sabem o que é um puxadinho? Revirando esses excrementos de nossa vida pública me lembrei de um episódio passado com o ex-presidente Harry Truman, quando deixou o posto nos Estados Unidos. Retirou-se para sua casa no interior, em Independence, Missouri, casa que ele e a mulher Bess tinham comprado quando se casaram. Ele era procurado por grandes empresas que ofereciam cargos altíssimos e recusava:
“Vocês estão oferecendo esse cargo ao presidente da nação. Não sou mais, fui”.
Ao deixar a presidência, Truman recebia um salário de US$ 112,56 (cerca de R$ 500,00, hoje). O parlamento soube um dia que ele respondia a centenas de cartas e pagava os selos do próprio bolso. Foi quando se criou um Fundo de Aposentadoria para ex-presidentes no valor de US$ 25.000 anuais. Um dia, ele foi homenageado em Washington. Foi em avião de carreira, pagou a passagem e o hotel, recebeu a honraria e regressou. Talvez não tenha sido grande estadista, como muitos dizem. Mas era íntegro.
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