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terça-feira, 14 de março de 2017

Dez grandes desafios da política externa brasileira (alternativos) - Paulo Roberto de Almeida


Dez grandes desafios da política externa brasileira
Uma visão alternativa dos problemas diplomáticos atuais, e constantes

Paulo Roberto de Almeida

Existem muitos desafios, claro, mas os meus são mais prosaicos, e nem são, na verdade, atuais, e sim permanentes, recorrentes, até invisíveis, ao que parece. Para ser mais exato, eles são característicos dessa coisa chamada psique nacional, mas que também podem impactar a sua política externa, das formas mais imprevistas. Ressalvo, entretanto: eles têm pouco a ver com o Itamaraty, enquanto burocracia relativamente impenetrável (et pour cause), e tem mais a ver com a sociedade como um todo, ou se quisermos, com o governo e o Estado, em especial. Somos um país construído pela superestrutura patrimonialista de velha extração lusitana, mas os portugueses não têm nenhuma culpa pelo que construímos nos últimos duzentos anos. Esses desafios são, como diria Nelson Rodrigues, coisas nossas…
Aqui vão os meus desafios (ou seriam obsessões?):
1)  Protecionismo: esse é tradicional, velho, anacrônico, mas, por mais que isto seja contraditório ou paradoxal, ele está sempre jovem e saudável, pronto para se exercer a cada viragem da política nacional;
2)  Preferência pela indústria, em detrimento de todos os demais setores, o que é uma inversão dos séculos anteriores, quando a agricultura era gloriosa e a salvação da nação; depois ele virou a danação, uma vergonha nacional, até ser novamente restabelecida para salvar a lavoura, mas continua mal amada;
3)  Substituição de importações: uma decorrência dos anteriores, mas bastante alimentada pela ideologia cepaliana, de muito sucesso no Itamaraty, desde sempre;
4)  Desenvolvimentismo superficial, uma obsessão histórica, geralmente apenas um slogan, que esconde políticas frequentemente anti-desenvolvimentistas; se essa ideologia funcionasse, depois de mais de meio século de aplicação, o Brasil deveria já ter se convertido numa grande potência;
5)  Isolacionismo: os brasileiros, em geral, amam o capital estrangeiro, mas detestam o capitalista estrangeiro; eles querem o capital, mas não os seus donos; eles acham que vão proteger as nossas riquezas proibindo os estrangeiros de comprarem terras e explorá-las honestamente; eles são contra a exportação de 100% da soja…;
6)  Forte teologia estatal, quase fundamentalista: os brasileiros amam o Estado, querem mais Estado, para tudo e qualquer coisa eles pedem mais Estado (coitados); assim é, se me parece: 95% dos meus alunos querem fazer concurso público;
7)  Inflacionismo burocrático, ou seja, aquele que alimenta a si próprio e se transforma num sanguessuga impérvio a todos os remédios: até para combater a corrupção, em lugar de subtrair responsabilidades a cargo do Estado, os brasileiros criam mais uma burocracia para combater os golpes contra a burocracia; isso atinge a política externa também, pois os diplomatas estão sempre querendo reforçar o dinossauro onusiano;
8)  Nacionalismo rastaquera, aquele do último refúgio dos canalhas (que na verdade é mais o patriotismo, mas que é muito parecido), que tem orgulho de preservar os fabulosos recursos nacionais contra a sanha da exploração estrangeira; o pessoal fica orgulhoso ao impedir estrangeiros de explorar os brasileiros;
9)  Solidariedade com os pobres, o que acaba se traduzindo num mínimo denominador comum com base nas políticas mais intervencionistas supostamente em favor da soberania nacional e de outros mitos desenvolvimentistas, ou seja, elas conseguem preservar os pobres na pobreza (como aquele papa peronista);
10)          Conservadorismo imobilista, o que significa preservação de todas as opções, escolhas e iniciativas anteriores, inclusive aquelas mais irracionais e deformadas, legadas pelos companheiros, com todas as consequências nefastas derivadas dessas escolhas mal concebidas, mal implementadas e apenas suportadas; ou seja, falta coragem para ficar sozinho no mundo.

Sei que vou ser criticado pelas minhas alternativas de desafios, mas é porque as pessoas consideram que eu estou falando sério, quando eu estou apenas me divertindo.
Ou tudo isso não seria engraçado, quando adotamos o ponto de vista de princípio de que temos sempre, em qualquer circunstância, a melhor política externa possível no melhor dos mundos que nos é oferecido? Pangloss concordaria…

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 14 de março de 2017.

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