Já postado anteriormente aqui, posto novamente com pequenas correções de digitação.
Dez desafios da politica externa brasileira -
CEBRI
Resumo de
livro por:
Paulo
Roberto de Almeida
Spektor, Matias
(editor executivo):
10 Desafios da Política Externa Brasileira
(Rio de Janeiro:
Centro Brasileiro de Relações Internacionais; Fundação Konrad Adenauer, 2016,
144p.; ISBN: 978-85-89534-11-6)
O Cebri
possui diferentes grupos de trabalho para pesquisar e debater assuntos
relevantes da política internacional e das relações internacionais do Brasil.
Um deles é especificamente voltado para a política externa e a diplomacia
brasileira, coordenado pelo historiador Matias Spektor. Ele foi o editor
executivo desta publicação, que reuniu colaborações de diferentes grupos de
trabalho, reunidos sob o conceito que empresta seu título à publicação:
desafios à política externa brasileira, que eles limitaram a dez (mas num
sentido amplo).
Em sua “carta
de Editor Executivo”, Spektor acredita que a política externa assume um papel
central na recuperação econômica brasileira: “Se há uma tese central a unir os
capítulos que seguem é esta: a política externa é um instrumento essencial para
a recuperação do crescimento econômico com justiça social, pois o sistema
internacional afeta em cheio a capacidade que as autoridades nacionais tem para
conduzir políticas efetivas.”
A seguir
uma apresentação sumária de seu conteúdo.
1. Por uma nova
doutrina de política externa brasileira, Matias Spektor
Spektor
abre o volume com uma análise sobre as ideias e conceitos que guiam a política
externa brasileira. Ele argumenta que a doutrina herdada dos 20 anos de
condomínio entre PT e PSDB caducou, e tenta conceber uma nova doutrina. FHC
teria aderido às teses da globalização, ao passo que Lula teria tentado
aproveitar as brechas do sistema para projetar o Brasil. A nova doutrina
precisaria emergir de um consenso suprapartidário, sem estar concentrada num
ministério ou grupo particular. Para tal se necessitam estudos empiricamente
embasados e debates em todos os setores da opinião pública, levando-se em conta
os impactos redistributivos da política externa, dadas as enormes carências da
sociedade brasileira.
2. Uma política
externa para a atração de investimentos estrangeiros, Carlos Góes
Analisa
as reformas necessárias para que o Brasil possa atrair mais investimentos, sendo
que o fator crucial é o aumento da produtividade do trabalhador brasileiro. A
governança global dos investimentos é indissociável da regulação sobre o
comércio internacional, e os fluxos globais de IED para países em
desenvolvimento aumentam muito com sua participação em tratados de livre
comércio, assim como com a qualidade de suas instituições. “Nesse aspecto, a
política exterior brasileira parece estar defasada” (p. 33). O Brasil nunca
aderiu, por exemplo, à Convenção 87, da OIT, e jamais considerou ingressar no
ICSID.
3. O problema do
comércio exterior, Diego Bonomo
O Brasil
é a economia mais fechada do G20, e os seus dirigentes impuseram ao país um
fechamento incompatível com as necessidades de sua inserção global. O “custo
Brasil” é um entrave a um maior crescimento econômico no país. A política
comercial, por sua vez, padece de conflitos de competência entre diferentes
órgãos nacionais. A recente onda de corrupção, evidenciada pela Operação Lava
Jato também refreou a expansão dos interesses econômicos brasileiros no
exterior. O Brasil precisar desonerar completamente suas exportações e melhorar
as condições de logística e de infraestrutura. A burocracia e a legislação
laboral também constituem grandes entraves a progressos nessa área. A
prevalência do multilateralismo na diplomacia comercial também tornou mais
lenta a negociação de acordos bilaterais de comércio.
4. Diplomacia
anticorrupção, Marcos Tourinho
Por ter importantes componentes transnacionais, o combate
à corrupção, ao desvio de recursos e à evasão fiscal é âmbito onde a política
externa tem o potencial de oferecer contribuição concreta para o
desenvolvimento e a democracia no país. Recomenda-se: 1) atuação concertada do
Itamaraty com Ministérios da Fazenda, da Justiça, Polícia Federal, Judiciário e
Ministério Público; 2) elaboração de guia de conduta de autoridades na promoção
e proteção de interesses de empresas brasileiras no exterior; 3) recuperação da
imagem de empresas brasileiras envolvidas em corrupção por meio de adesão a
mecanismos como o Pacto Global da ONU; 4) adesão a mecanismos internacionais
existentes e liderança na criação de novos regimes; 5) celebração de acordos
bilaterais de combate à corrupção.
5. Segurança e defesa,
Érico Esteves Duarte
Depois
de dez anos de ter elaborado uma estratégia nacional de defesa, é preciso
revisar a estrutura atual do setor, com base em crédito público à indústria
nacional, mas também com base nas novas ameaças emergentes. O mais grave
problema é o tráfico internacional de cocaína. A articulação entre o MD e o MRE
é insuficiente. “Recomenda-se que a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE)
ganhe um corpo mais efetivo e estruturado no âmbito da Casa Civil” (p. 83). Ela
deveria amparar e subsidiar um Conselho de Planejamento Nacional, incluindo um
setor de inovação, incorporando quadros do Itamaraty e das FFAA.
6. Política externa
brasileira e a nova geopolítica da energia, João Augusto de Castro Neves
A
diplomacia energética mudou bastante na era Lula, passando da tentativa de
transformar o etanol e commodity global até a reversão para os combustíveis
fósseis no pré-sal e novas incursões na energia nuclear, ambas iniciativas
tingidas por forte corrupção. Está em curso uma reestruturação do setor
elétrico que pode aumentar a participação do capital estrangeiro na provisão de
energia. A decisão de alterar o marco regulatório no petróleo causou uma
virtual paralisia no setor, a que se soma o protecionismo exacerbado, que
diminuiu o fluxo de investimentos. A diplomacia brasileira pode atuar de forma
relevante na captação de recursos para investimentos em energia no país.
7. Bens públicos,
grupos de interesse e política externa, Eduardo Mello
De que
forma as opções de diplomacia acarretam ganhos e perdas para diferentes grupos
sociais no Brasil? O autor sugere mensurar os efeitos domésticos das opções
externas adotadas pelos diferentes governos.
8. Diplomacia da
saúde global, Umberto Mignozzetti
As
epidemias do subdesenvolvimento colocaram novamente o Brasil no centro do
debate internacional sobre doenças globais. As práticas nacionais podem
dificultar a aplicação de normas internacionais de combate a essas epidemias.
Seria preciso aumentar a cooperação regional para melhor combater epidemias.
9. Promoção da
democracia e dos direitos humanos, Oliver Stuenkel
Novas
dúvidas surgiram sobre a resiliência da democracia na região, a partir de um
aparente esgotamento do ciclo da esquerda nas políticas da região. A proteção
dos direitos humanos apresenta implicações para as questões da não-intervenção
e da soberania nacional. Mas o silêncio brasileiro em relação às crescentes
violações à democracia e aos direitos humanos na Venezuela “criou uma fissura
na imagem do Brasil como líder regional” (p. 125). Empréstimos do BNDES
deveriam levar em conta esses aspectos na concessão de créditos subsidiados.
10. Análise
estratégica para as relações internacionais do Brasil, Matias Spektor
Qual
seria o papel da análise estratégica em política externa? “Não existe hoje uma
instância com poderes delegados da presidência da República para coordenar o
trabalho de reflexão prospectiva dos numerosos órgãos governamentais que
conduzem algum tipo de atividade internacional. Ou seja, não há uma estrutura
análoga ao National Security Council (Estados Unidos), ao Prime Minister’s
Strategy Unit (Reino Unido) ou aos conselhos mais ou menos informais que
alimentam com análises estratégicas o processo decisório dos chefes de governo
em países como Rússia, Índia e China” (p. 135). Ou seja, o trabalho de análise
estratégica é pulverizado em diversas agências.
“A
cultura diplomática é rica e fonte de enorme vantagem comparativa para o Brasil
no sistema internacional. No entanto, cinco de suas principais características
distintivas dificultam o nascimento de uma cultura arraigada em análise
estratégica” (p. 136). 1) valoriza a ação prática em detrimento do trabalho
analítico; 2) existe um culto das gerações mais antigas e pouca interação com
instituições de fora do país; 3) existe aversão ao dissenso e adesão ao
pensamento grupal; 4) existe mais burocracia administrativa do que reflexão
estratégica no dia a dia do diplomata; 5) a hierarquia estrita traz coerência
mas também enormes custos: “Existem barreiras tácitas e explícitas à cultura de
questionamento e criatividade que é essencial a qualquer trabalho sério de
análise estratégica” (p. 137).
Paulo Roberto de
Almeida
Brasília, 10 de
fevereiro de 2017
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