O COMANDO DOS GENERAIS
AYLÊ-SALASSIÊ QUINTÃO
Chumbo Gordo, 29/04/2020
… Agora, apesar dos sucessivos pedidos de impeachment contra o atual Presidente, o Palácio do Planalto, centro do Poder do Estado, tornou-se habitat de militares de alta patente, comandados por um capitão proscrito. O capitão não dá vez aos generais. Demite-os sem mais, nem menos, e cobra alinhamento às suas loucas atitudes e pensamentos confusos. Parece mesmo uma desforra…
Um marechal? Não, não existe mais. É um capitão, que saiu pela porta dos fundos das forças armadas, quem agora comanda generais de quatro estrelas no Brasil. Sua força vem dos 57 milhões de votos, mas a persistência, que nesse momento, diante de um cenário totalmente adverso, é o que conta. Parece ser a manifestação explícita de um Ego ferido pela interrupção compulsória da carreira militar, há 20 anos, por desobediência e insubordinação.
Fala mais alto um Ego inflado e, aparentemente, ressentido que a vitória nas urnas, em 2018, entregue de bandeja pelos concorrentes de oposição. No esforço de perpetuar-se no Poder, vinham confundindo a população com falsos candidatos, falsas retóricas e falsos programas sociais. O viés permite inferir que a insistência nesse caminho conduziu o retorno dos militares.
Agora, apesar dos sucessivos pedidos de impeachment contra o atual Presidente, o Palácio do Planalto, centro do Poder do Estado, tornou-se habitat de militares de alta patente, comandados por um capitão proscrito. O capitão não dá vez aos generais. Demite-os sem mais, nem menos, e cobra alinhamento às suas loucas atitudes e pensamentos confusos. Parece mesmo uma desforra, fruto de uma personalidade duvidosa.
Aliás, vale lembrar que esse encolhimento da autoridade dos generais, já vinha ocorrendo desde a criação do Ministério da Defesa, no governo do cientista presidente Fernando Henrique, seguida da designação de civis, antes condenados na Justiça, para dirigi-lo. A própria ex-presidente guerrilheira Dilma Rousseff, ordenou um general sair de um elevador no Planalto, porque ela queria descer sozinha para a garagem.
O quartel de comando do Exército no Planalto reúne, hoje, alguns dos principais oficiais superiores das forças armadas : os generais Braga Neto, ex-chefe da intervenção contra a violência no Rio de Janeiro, agora chefe da Casa Civil; o general da ativa Luiz Eduardo Ramos , chefe da Secretaria de Governo; o general da reserva Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional; o major da reserva da Polícia Militar, Jorge Oliveira, chefe da Secretaria Geral Presidência; o almirante Flávio Rocha, chefe da secretaria de Assuntos Estratégicos. Lá estão ainda o vice-presidente, general Hamilton Mourão, que hoje chefia um vazio Conselho da Amazônia Legal.
A nomeação, para o Ministério da Defesa, do general Fernando Azevedo, que passou um tempo assessorando a presidência do Supremo Tribunal Federal, pretende dar a impressão de que as Forças Armadas assumiram uma nova postura. Desde a posse do presidente capitão, os generais insistem em vender a versão de que este é um governo com militares, mas não dos militares. Com a chegada de Braga Netto, essa ilusão acabou. Ele, que gosta de planejamento, já apresentou até um plano estratégico de recuperação da economia, chamado Pró-Brasil, quase que desqualificando os esforços do Ministério da Fazenda.
… A questão é saber até quando os generais vão conviver neste cenário. Eles tem medo dos eleitores de Bolsonaro que, provavelmente, já não são mais 57 milhões de cidadãos. Mas o Congresso não tem esse constrangimento, porque também foi votado…
Esses oficiais no Poder entendem que é melhor tentar influenciar o governo Bolsonaro de dentro do que se omitir, e arcar com os ônus elevados à frente. A coisa assumiu tal proporção que, para alguns, o eventual fracasso do governo Bolsonaro cairia sobre os seus ombros, como ocorreu na queda do regime militar, em 1985. A presença do ex-juiz Moro no Ministério da Justiça ajudava a minimizar os ranços hierárquicos entre os militares, ao reforçar o carisma justiceiro do capitão Presidente, relação agora um pouco estremecida com a demissão de Moro.
Mas, o capitão está com tudo e não está prosa. Será?
A explicação não vem das forças armadas, nem do Tribunal Superior Eleitoral, mas de Freud: a interação do ser humano com a realidade que lhe cerca, expõe publicamente a psiquê do capitão: o Ego, com seus instintos primitivos representados pelo Id , componente nato dos indivíduos, que administra vontades e pulsões, formadas pelos instintos e desejos rudimentares. A partir do ID, desenvolvem-se as outras partes da personalidade humana: o Ego e Superego. Este expressão da impulsividade, da racionalidade e da moralidade.
As frustrações pessoais estendem-se à família que, também aparentemente, administra a governabilidade com o suposto apoio de milicianos, e não de generais. A manifestação em frente ao Forte Apache não foi convocada pelo Exército, nem por supostos seguidores.
A questão é saber até quando os generais vão conviver neste cenário. Eles tem medo dos eleitores de Bolsonaro que, provavelmente, já não são mais 57 milhões de cidadãos. Mas o Congresso não tem esse constrangimento, porque também foi votado. O Supremo Tribunal não pode dizer a mesma coisa, nem alguns ministros. Distraída pelo coronavírus, a população assiste tudo abestalhada.
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Aylê-Salassié F. Quintão* – Jornalista, professor, doutor em História Cultural. Vive em Brasília
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