O processo orçamentário brasileiro: um estupro institucionalizado e normalizado
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata, professor
(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)
Em países normais, estimam-se as receitas e depois se fixam as despesas. No Brasil, o processo orçamentário é exatamente o inverso: as despesas são fixadas, geralmente acima dos recursos existentes, e depois o governo vai buscar as receitas, na forma que todos conhecemos, no nosso bolso e no caixa das empresas. Isso é histórico e vem dos tempos do Império.
De uns tempos para cá, o processo não é apenas o contrário do que recomendam todos os manuais de contas públicas; ele é também propriamente CRIMINOSO. Começou com um presidente da CD ultra corrupto, Eduardo Cunha (que sozinho equivalia a meio PT em matéria de roubalheira em estatais), que tornou as emendas parlamentares compulsórias, incontigenciáveis e irredutíveis. Evoluiu para substituir rachadinhas e caixa dois de parlamentares normalmente corruptos, que se tornaram anormalmente extratores e predatórios do orçamento público: eles já dispunham do Fundo Partidário, passaram a dispor de Fundos Eleitorais pornográficos que triplicam a cada nova eleição e, recentemente, passaram a contar também com vários tipos de emendas — individuais, de bancada e do relator (secretas e obscuras estas) — que praticamente os dispensam de praticar a extorsão habitual contra seus financiadores capitalistas e as empresas públicas e privadas, pois todo aquela montanha de dinheiro praticamente chove nas suas hortas.
O Brasil chegou ao cúmulo da distorção do processo orçamentário: é um estupro permanente das contas públicas, contra uma aplicação transparente dos recursos já saqueados da nação inerme, devidamente “legalizado” por disposições “constitucionais” e legislativas fixadas pelos próprios usufrutuários das receitas públicas.
Mal comparando: é como se a Máfia já não precisasse atuar clandestinamente, à margem da Lei: ela se apropriou do Estado, e passa a administrar a seu bel prazer de TODAS as receitas da nação e a fixar todas as aplicações de recursos públicos.
Em síntese, é isso no qual se converteu o Brasil: o patrimonialismo tradicional analisado por Raymundo Faoro foi transformado num patrimonialismo gangsterista pela ação de bandidos políticos que se apossaram do Estado.
No fundo, o Brasil já não é mais uma República presidencialista: é um parlamentarismo mafioso e impossível de ser corrigido pelas vias normais. O “estamento burocrático” de Faoro se converteu numa corporação de bandidos unidos no ato de assaltar continuamente o Estado e toda a nação.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 4004: 30 outubro 2021, 2 p.
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