Lula recebe hoje o chanceler da Rússia em meio a declarações sobre guerra da Ucrânia e críticas dos EUA
Sergei Lavrov também terá reunião com ministro Mauro Vieira no Itamaraty
Por Daniel Gullino — Brasília
O Globo, 17/04/2023
Um dia após dizer que a Ucrânia também é responsável pela guerra iniciada pela Rússia há pouco mais de um ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebe nesta segunda-feira pessoalmente, no Palácio do Planalto, o chanceler de Vladimir Putin, Serguei Lavrov, de acordo com agenda divulgada pelo Itamaraty. Lavrov desembarca em Brasília para uma viagem na qual discutirá, entre outros assuntos, o conflito.
As últimas declarações de Lula incomodaram a integrantes do governo americano, cujas percepções são de que o Brasil tem adotado um tom aberto contra Washington e de alinhamento a Moscou e Pequim, como mostrou ontem O GLOBO. A viagem de Lavrov pode ampliar essa percepção.
O chanceler russo se reúne com o ministro das Relações Exteriores brasileiro, Mauro Vieira, pela manhã. A agenda com Lula será durante a tarde e está prevista para durar uma hora, segundo a agenda.
A guerra na Ucrânia será um dos principais assuntos da agenda. Nos últimos dias, o presidente Lula criticou o papel dos Estados Unidos e da própria Ucrânia no conflito.
O governo brasileiro se colocou à disposição para ajudar a costurar um acordo de paz e tem defendido a cessão imediata de ataques e hostilidades. Lula tratou do tema durante visitas à China e aos Emirados Árabes Unidos. O presidente disse que é preciso que os Estados Unidos "parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz". Em outra declaração, disse que a Ucrânia também foi responsável pela decisão de entrar em guerra com a Rússia.
As críticas incomodaram o governo americano. Um integrante da diplomacia afirmou que o presidente brasileiro repetiu "propaganda russa e chinesa favorável a Moscou".
Lavrov ocupa o cargo desde 2004, no primeiro mandato de Vladimir Putin como presidente da Rússia. Ele e Vieira já tiveram uma reunião bilateral em marco, durante reunião de chanceleres do G20 (grupo formado pelas 20 maiores economias do mundo), em Nova Délhi, na Índia. Na época, os dois já trataram da guerra na Ucrânia.
Nesta segunda-feira, os dois ministros também discutirão as relações bilaterais. Em 2022, o comércio entre os dois países atingiu o recorde histórico de US$ 9,8 bilhões. A expectativa é que Vieira e Lavrov deem uma declaração à imprensa após o encontro, por volta de 13h.
Lula volta a dizer em Abu Dhabi que Ucrânia e Rússia são responsáveis pela guerra
Presidente afirma que decisão pelo conflito foi tomada por dois países e defende criação de grupo para paz
Folha de A. Paulo, 16.abr.2023
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a responsabilizar neste domingo (16) também a Ucrânia pelo conflito que se arrasta no Leste Europeu há 13 meses. A declaração foi feita em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos (EAU), onde o líder brasileiro fez uma parada ao retornar de viagem à China.
"O presidente [russo, Vladimir] Putin não toma a iniciativa de parar. [O presidente ucraniano, Volodimir] Zelenski não toma a iniciativa de parar. A Europa e os Estados Unidos continuam contribuindo para a continuação desta guerra. Temos que sentar à mesa e dizer para eles: 'basta'", disse Lula antes de encerrar sua visita à nação árabe. Ele acrescentou que a "decisão pelo conflito foi tomada por dois países".
O petista voltou a defender sua proposta de um "clube da paz" para o fim da Guerra da Ucrânia. Segundo ele, as negociações deveriam ser conduzidas por um grupo semelhante ao G20, que reúne as maiores economias do mundo. A iniciativa não gerou entusiasmo entre líderes ocidentais até agora.
"Ontem conversei com o xeique [do EAU, Mohammed ben Zayed al Nahyan] sobre a guerra. Falei com o [líder chinês] Xi Jinping sobre paz. E acho que estamos encontrando um grupo de pessoas que prefere falar sobre paz do que guerra. Acho que teremos sucesso", disse o brasileiro.
Lula desembarcou em Abu Dhabi no sábado (15), depois de se reunir com Xi em Pequim e fechar 15 acordos comerciais com a nação asiática. Pouco antes de sair do país, o brasileiro cobrou dos EUA que "parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz".
A declaração incomodou integrantes do governo americano ouvidos pela Folha, cujas percepções são de que a política externa do Brasil tem adotado um tom aberto de antagonismo contra Washington e de alinhamento com Moscou e Pequim. Nesta segunda (17), o chanceler russo, Serguei Lavrov, desembarca em Brasília para uma viagem de dois dias ao país na qual discutirá, entre outros assuntos, o conflito provocado por seu país.
Para o Itamaraty, a visita é uma prova de uma saudável independência brasileira. Dois meses antes de ir à China, Lula visitou o presidente americano, Joe Biden, na Casa Branca. Na ocasião, seu governo cedeu à pressão do democrata e aceitou uma declaração conjunta que condenava nominalmente a Rússia pela violação territorial na Ucrânia, pelo desrespeito ao direito internacional, pelas mortes e pelos ataques à infraestrutura essencial do país.
No mês passado, porém, o Brasil não assinou a declaração final da segunda edição da Cúpula da Democracia, evento promovido pelo mesmo governo Biden. O texto trazia uma série de críticas à invasão da Ucrânia pela Rússia. Lula ainda se opôs recentemente ao envio de armas e de munições aos ucranianos por Brasília, e é contra sanções a Moscou.
Em Abu Dhabi, Lula foi recebido ainda no aeroporto por Suhail bin Mohammed Al Mazrouei, ministro de Energia e Infraestrutura dos EAU. Depois, foi ao encontro do xeique Mohammed bin Zayed Al Nahyan no palácio presidencial. A reunião foi saudada por uma salva de 21 tiros de canhão, e a Guarda Nacional tocou o hino brasileiro. Os líderes participaram de alguns compromissos e de um jantar.
"Os Emirados são o país da região que mais investe no Brasil, serão sede da COP-28 neste ano e irão ampliar investimentos em biocombustíveis e energias renováveis", escreveu o petista nas redes sociais. "Volto ao país 20 anos depois para reforçar a [nossa] relação".
Antes da viagem, o Itamaraty havia anunciado que nela seriam discutidos temas relacionados ao comércio, transição energética, mudanças climáticas e segurança global. Integravam a comitiva brasileira cerca de 30 empresários de diversos setores, como mineração e carne.
A pasta informou ainda que, desde 2008, os Emirados Árabes Unidos estão entre os três principais parceiros do Brasil no Oriente Médio. Em 2022, ele foi o principal destino das exportações brasileiras entre as nações árabes, e o comércio entre os dois países somou US$ 5,7 bilhões (R$ 27 bilhões) —um aumento de 74,5% em relação ao ano anterior. Brasília registrou superávit de US$ 740 milhões (R$ 3,6 bilhões).
Dos US$ 3,2 bilhões (R$ 16 bilhões) faturados, o principal produto de exportação brasileiro foi a carne de frango (29% do total), seguida de açúcar (14%), ouro (14%), celulose (8,2%) e carne bovina (8%). Já nas importações, 89% do valor total correspondeu à compra de petróleo e materiais derivados de hidrocarbonetos.
Com AFP
Nenhum comentário:
Postar um comentário