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domingo, 7 de janeiro de 2018

Governo quer gastar mais, transformar o Brasil num Rio de Janeiro - Marcos Lisboa

'Governo dá sinais na contramão', diz ex-secretário do Ministério da Fazenda”  
Entrevista Marcos Lisboa
Folha de São Paulo, 6/01/2018

A proposta em discussão pelo governo de suspender a chamada "regra de ouro" –que impede a União de captar recursos no mercado em volume superior aos investimentos– talvez seja inevitável, mas precisa ser acompanhada de contrapartidas, diz o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper e colunista da Folha. Para ele, que foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, sem essas contrapartidas o governo vai contratar uma grave crise e avisa: o Rio não está tão distante assim.
Folha - O que leva o governo a discutir a regra de ouro?
Marcos Lisboa - A realidade. Talvez seja inevitável essa mudança, mas ela pode ser feita em meio a ajustes mais severos. Junto, é preciso discutir acabar com as desonerações da folha de salários. Também não dá para aumentar limites para o Simples [regime tributário das pequenas empresas] como está sendo feito. Discutir a regra de ouro é extremamente preocupante. 
- Mas não é isso que o governo está tentando fazer?
- Espero que a discussão inclua flexibilizar a regra por algum tempo, mas com contrapartidas. O BNDES também tem que devolver o dinheiro que recebeu do Tesouro, é preciso fazer a reforma da Previdência e, no âmbito dos Estados, teremos que discutir o que significa direito adquirido, pois o problema deles é a folha de pagamentos. O que surpreende é que chegamos a esse nível de degradação com complacência da sociedade.
- Essa complacência atinge seus pares economistas?
- Todos nós. O governo, junto com o Congresso, teve uma agenda importante de avanços que têm que ser reconhecidos, como o teto de gastos, mas há muito a ser feito no ajuste fiscal de mais curto prazo para garantir o equilíbrio das contas públicas e enfrentar o deficit primário que temos hoje, na faixa de R$ 150 bilhões por ano. 
- O que precisa ser feito?
- Se um policial sem receber há dois meses não desperta um imenso alerta que reformas importantes têm que ser feitas, eu não sei mais o que desperta. E o governo dá sinais na contramão quando a Caixa volta a financiar Estados. Será que não aprendemos nada com o erro dos últimos anos? É melhor vedar de vez qualquer empréstimo da União aos Estados. A Caixa acabou de dar R$ 600 milhões para o Estado de Goiás. Será que a gente vai ter que assistir o Estado de Goiás em 2109 virar um novo Rio de Janeiro?
- O sr. acha que sim?
- Acho. Como a Caixa pode voltar a emprestar para os Estados? Como é que podem usar dinheiro dos trabalhadores [recursos do FGTS] para capitalizar a Caixa? 
- Mas a Caixa é a grande financiadora imobiliária do país.
- Talvez o país tenha que pensar em outros mecanismos menos sujeitos a pressões oportunistas ou gestão incompetente como vimos nos últimos anos. Se não conseguimos fazer uma gestão eficiente da Caixa, talvez o melhor seja mesmo privatizá-la.
- Incompetência deste governo também?
- Esse governo é dois para lá, dois para cá. Tem tido avanços importantes em algumas questões, como a discussão da reforma da Previdência, mas retrocessos também. Grandes. Volta e meia há um retorno ao passado de usar recursos públicos para empurrar os problemas para 2019. Mais ainda: não se consegue fazer os ajustes. Acaba se optando por, em vez de tratar o tumor, dar morfina porque ela tira a dor e dá um barato. 
- O prazo político para isso não acabou?
- Temo isso porque, se não fizermos ajustes em 2018, teremos problemas mais severos em 2019. Mas é sempre possível piorar. A Venezuela que o diga.
- O próximo passo pode ser atacar o teto de gastos?
- O país pode sempre escolher tomar mais morfina do que enfrentar a doença. Nós nos acostumamos com tudo. Aprovar mudanças na regra de ouro sem contrapartida seria contratar uma crise mais grave no futuro. Se isso não for parte de um pacote que garanta a estabilização da dívida sobre o PIB nos próximos anos, o cenário pode ser muito ruim. O Rio de Janeiro não está tão distante assim.


domingo, 16 de outubro de 2016

Marcos Lisboa discute os problemas econômicos correntes, no Brasil e no mundo


Seminário PEC 241 e a dimensão fiscal da crise
Publicado em 28 de set de 2016
Marcos Lisboa. 23/09/2016

Parte 1 (de 8):
 22.678 visualizações (até 16/10/2016)

Parte 2 (de 8): 
https://www.youtube.com/watch?v=zRSMu7Adfj4&list=PLSp7l06tKgYBNNVIOgu4nxfs64t-K4yn9&index=2

Parte 3 (de 8), aqui com uma contraposição por parte de Laura Carvalho: 

https://www.youtube.com/watch?v=_TKdx6vgO9g&list=PLSp7l06tKgYBNNVIOgu4nxfs64t-K4yn9&index=3

etc....

Nos videos 6 e 9, o economista Marcos Lisboa desmantela os argumentos canhestros da economista Laura Carvalho, uma típica representante do desenvolvimentismo primário, maniqueista, falsamente progressista, e notoriamente pobre em fundamentos empíricos de suas opiniões impressionistas. Dá até dó da moça. E isso é uma professora da prestigiosa FEA-USP, que já tem uma outra do gênero, ou pior, marxista primária, que é a Leda Paulani. Pobres alunos...
Paulo Roberto de Almeida 


segunda-feira, 30 de março de 2015

Economia brasileira: nova decada perdida? - Entrevista Marcos Lisboa (OESP)

Um amigo e colega de carreira me manda a entrevista publicada neste domingo no Estadão, sobre a (péssima) situação atual da economia brasileira, ou seja, na verdade, sobre as políticas econômicas alopradas adotadas pela soberana ignorante em economia, mas arrogante mesmo assim.
Eis o que ele escreveu: 

On Mar 29, 2015, at 19:52, renato l. r. marques <xxxxxx@hotmail.com> wrote:
Entrevista dura e realista. Não deve agradar aos ouvidos da FIESP, onde estão situados os principais interesses na preservação da política de desoneração fiscal, subsídios e altos impostos de importação, como forma de sobreviver apesar de sua reconhecida falta de competitividade .
E São Paulo é vilão até na área agrícola e extrativista. Os altos preços do açúcar e a taxa da borracha, sempre anunciados com vistas a viabilizar a combalida lavoura açucareira do Nordeste e a preservação dos seringueiros, beneficiam sobretudo a Paulisteia, onde se concentra a maior lavoura açucareira e os maiores seringais.
Mas eu diria que o problema econômico é até solúvel, se comparado ao problema político e social , onde o equilíbrio federativo evita a tomada de decisões acertadas e a ausência de valores de eficiência e produtividade nos condena a uma mão de obra despreparada ( mas reivindicativa) e à adoção de políticas sociais de desestímulo ao mérito. Tudo isso com um contingente crescente de imigrantes (haitianos, ganenses, sírios, palestinos) que, por coincidência (!), é dirigido para áreas de tradição política antipetista , como forma de virar os votos regionais.
Enfim, nada que promova o otimismo e restabeleça a credibilidade do país. Abraço

 Renato Marques


 Ao que eu (PRA) respondi:
    Concordo com a parte política. Na parte econômica, também concordo, mas os capitalistas corporativos da FIESP, que são realmente protecionistas e tudo o mais, poderiam argumentar que não conseguiriam se manter sem esses favores especiais do Estado por causa, justamente, da alta carga fiscal com que são extorquidos.
    Deveriam, então, se organizar conjuntamente para barrar o Estado e reverter a carga fiscal, mas não conseguem, por isso vão setorialmente a Brasilia, pedir, cada um do seu lado, essas medidas paliativas. Também compram os seus políticos, etc.
    Ou seja, tanto o sistema político quanto o econômico estão completamente viciados e distorcidos.
    Como resolver isso numa federação, com uma classe política totalmente inepta, incompetente (o que é a mesma coisa), mas perdulária, rentista, extrativista, é muito difícil. Precisariamos de uma crise muito forte, e estadistas de visão.
    Mas o que vamos ter é uma longa e lenta decadência, apenas isso. Está na nossa vez de nos argentinizarmos em médio prazo, se não for pior…
    Esté parece ser o nosso futuro (ou falta de) previsível.
Paulo Roberto de Almeida 


O autor do envio, escreveu um resumo, e uma crítica implacável, em CAIXA ALTA, que reproduzo como está, pois também coloca em perspectiva, numa linguagem crua, todo o mal cometido pelos petralhas incompetentes contra a economia do país e contra os brasileiros.

EXCELENTE ENTREVISTA DE MARCOS LISBOA ELE ANALISA O PROBLEMA ECONOMICO BRASILEIRO SOB DOIS ANGULOS. O PRIMEIRO, DE MAIS CURTO PRAZO, DIZ RESPEITO AO ENFRENTAMENTO DO ENORME DESIQUILIBRIO FISCAL CAUSADO PELOS DESCALABROS DOS GOVERNOS PETISTAS, EM PARTICULAR PELO GOVERNO DE DILMA.
O PROBLEMA FISCAL É  UM PROBLEMA DE SANGRIA DESATADA,TEM DE LEVAR O PACIENTE PARA A UTI  COM URGENCIA, CASO CONTRARIO ELE MORRE - E CONDICAO NECESSARIA E URGENTE PARA UMA EVENTUAL RECUPERACAO ECONOMICA DO BRASIL.
E NECESSARIA, POREM NAO SUFICIENTE.

COMO LISBOA  DESTACA MUITO BEM, OS DANOS A ECONOMIA BRASILEIRA FORAM MUITO MAIS SERIOS E PROFUNDOS. OS" POLICY MAKERS" PETISTAS  TRATARAM, NA SUA ENORME IGNORANCIA, DE ENFRENTAR  UMA CRISE  CONJUNTURAL DE ESCASSEZ DE DEMANDA CONJUNTURAL COM MEDIDAS PERMANENTES, TIPICAS  DO MAL-FADADO NACIONAL-DESNVOLVIMENTISMO, MESCLADO  COM UM KEYNESIANISMO  CAIPIRA E COM  UM VERSAO ATUALIZADA DA MALFADADA  ADMINISTRACAO ECONOMICA "POR PACOTES" DA ERA DELFIM NETTO. 
DILMA E ASSECLAS RESOLVERAM RESSUCITAR, DE UMA SO VEZ : JK, CELSO FURTADO, PREBISH, MARIA CONCEICAO, GEISEL, BELLUZZO, MARIA CONCEICAO, LUCIANO COUTINHO,  NAKANO, BRESSER PEREIRA, DELFIM NETTO  E OUTROS JURASSICOS  MENOS VOTADOS DA ESCOLA ECONOMICA DA CEPAL, DE  CAMPINAS E DA FGV DE SAO PAULO.  
MUITA IDEIA ULTRAPASSADA  PARA UM PAIS SO!!
COMO MARCOS LISBOA DESTACA COM EXTREMA ACUIDADE, O CUSTO DA CORRUPCAO DA PETROBRAS É MINIMO COMPARADO COM O CUSTO DAS POLITICAS DE ISENCAO DE TRIBUTOS, DE SUBSIDIOS, DE FINANCIAMENTOS PUBLICOS FAVORECIDOS  E DE PROTECIONISMO INDUSTRIAL IMPLEMENTADOS POR ESTE GOVERNO.

COMO ELE DIZ, UM CUSTO  DE CENTENAS DE BILHOES DE REAIS.
QUANTO MAIOR O VOLUME DE INCANTIVOS, PIOR TEM SIDO A PERFORMANCE DA ECONOMIA, EM PARTICULAR DA INDUSTRIA.
ISTO FAZ LEMBRAR UMA CITACAO DE MARIO HENRIQUE SIMONSEN DE QUE É MAIS BARATO PAGAR OS DEZ POR CENTO DE PROPINA DE CORRUPCAO AOS  AGENTES POLITICO-GOVERNAMENTAIS, DO QUE PEMITIR QUE ESTES FAÇAM BOBAGENS CONCEITUAIS  QUE PREJUDIQUEM  OS  90 PORCENTO REMANESCENTES  DO GASTO TOTAL RELATIVO A POLITICAS E PROJETOS PUBLICOS .

MARIO HENRIQUE NAO SE DAVA CONTA DA IMENSIDAO DO PODER DESTRUIDOR DOS AGENTES PUBLICOS DOS GOVERNOS DO PT QUE ESTAVAM POR VIR.
ESTES NÃO SÓ CONSEGUIRAM ENTRAR  FUNDO NOS 90% COMO -- TRAGEDIA SEM TAMANHO -- CONSEGUIRAM TRANSFORMAR OS 90% EM VERDADEIRA MESCLA DE FRANKESTEIN COM VAMPIRO DEDICADO A COMPROMETER  A PERFORMANCE E SUGAR OS RECURSOS DA ECONOMIA POR UM FUTURO QUASE SEM FIM. 
DAI A  PRINCIPAL RAZAO DE PODERMOS  ESPERAR  POR UMA  DECADA PERDIDA  SEM MAIORES ESPANTOS.
SEGUNDO MARCOS LISBOA A REVERSAO DESTA SITUACAO SERA MUITO DIFICIL DEVIDO  A CONSTITUICAO  DE  SOLIDOS  GRUPOS DE INTERESSE QUE  FORAM CRIADOS  AO REDOR DO GOVERNO DE ORIGEM SINDICALISTA AO LONGO DE DOZE ANOS -- PRINCIPALMENTE NA INDUSTRIA, ATRAVES DE FIESP, CNI E CONGENERES E SINDICATOS OPERARIOS. 
NUNCA É DEMAIS LEMBRAR QUE QUANDO SE DA UM PIRULITO PARA UMA CRIANCA OU UMA" MEIA ENTRADA" PARA UMA CLASSE DE FAVORECIDOS (FINANCIADOS PELOS NÃO FAVORECIDOS) E DIFICILIMO TIRÁ-LO DE VOLTA, QUASE IMPOSSIVEL..
SERIA  PRECISO MAIS DO QUE  UM SERGIO MORO PARA CONSEGUIR O MILAGRE.

Entrevista. Marcos Lisboa
'Brasil corre o risco de viver anos de baixo crescimento econômico' 

Para vice-presidente do Insper, política econômica atual, parecida com a implantada nos anos 1970, precisa ser revista.
ALEXA SALOMÃO
LUIZ GUILHERME GERBELLI
RICARDO GRINBAUM
O Estado de S.Paulo, 29 Março 2015 | 02h 03

Marcos Lisboa faz parte da ala dos economistas mais desencantados com o futuro da economia brasileira. No curto prazo, vê a necessidade de a equipe econômica evitar uma crise aguda no Brasil. Se o País passar por esse sufoco, acha que a década de 1980 - chamada de perdida - pode se repetir. "Eu acho que o Brasil corre o risco de, escapando da crise aguda, viver muitos anos de baixo crescimento", afirmou Lisboa.

Na vice-presidência do Insper, Lisboa foi secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005 e participou da equipe que promoveu ajustes na economia com uma agenda de reformas que permitiu, por exemplo, o avanço do crédito no País.

A seguir, trechos da entrevista concedida ao Estado.

Como o sr. analisa a economia?
O momento é de preocupação. Há o descontrole fiscal que, nos últimos anos, levou a essa inflação elevada, à estagnação da economia e que começa a afetar de forma preocupante o mercado de trabalho. Todo o esforço que existe hoje por parte da equipe econômica tenta evitar uma crise aguda.

É possível evitar a crise aguda?
Vai depender da capacidade de o governo fazer o ajuste fiscal firme. Na medida em que for feito, ajuda no combate à inflação. Infelizmente, nessa área, o Banco Central perdeu um pouco de credibilidade nos últimos anos, não só pela leniência com a inflação, mas pela falta de agenda. O BC fez uma condução atabalhoada da política monetária. Faz anúncios de juros para cá. Comunica outra coisa para lá. Sem falar das decisões infelizes, como o processo contra o Alex (Alexandre Schwartsman, ex-diretor de assuntos internacionais do BC que quase foi processado por ter criticado a instituição em seus artigos) e agora a história do Pastore (Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, fez avaliação negativa sobre a instituição em um evento e foi criticado pelo presidente do BC, Alexandre Tombini). Com tudo o que a gente viu nos últimos anos, a sua capacidade de ter uma política eficaz é baixa. Perdi muitos amigos aqui.

O Tombini é amigo?  

Eu gosto de gente ali.

Quer comentar as polêmicas?
Não tenho muito a dizer. Acho lamentável. Já falei de passagem.

O sr. falou que é preciso ser firme com o ajuste fiscal. Está nos jornais a informação de que a presidente Dilma pode ceder em algumas medidas...
Há uma preocupação grande com a qualidade do ajuste. O descontrole que houve nos últimos anos foi grave. A gente saiu de um superávit primário de 3% do PIB para um déficit primário de 1,6% - sem levar em consideração receitas extraordinárias. Com as extraordinárias, são 0,6%. Estamos falando em R$ 200, R$ 300 bilhões de variação no gasto público. Reverter essa trajetória vai ser benéfico para tentar evitar uma crise aguda. Mas vai depender da capacidade de o governo negociar com o Congresso. Até agora, o que o Executivo conseguiu fazer são ajustes temporários. Agora, de fato, medidas estruturais são aquelas anunciadas em dezembro. Aquelas medidas, sim, vão gerar um ajuste fiscal sustentável para os próximos anos. Elas são suficientes? Não, estão longe de serem suficientes, mas vão na direção correta.

O sr. acredita que as medidas passam no Congresso?
Não sei, aí a entrevista teria de ser com um analista político (risos).

Política e economia estão se misturando. São duas crises paralelas e uma contaminando a outra.
Eu acho que isso é um pouco resultado da campanha. Venderam a ideia de que o Brasil teria recursos públicos para financiar de tudo, assim como teria água e energia. A má notícia? Os recursos públicos estão acabando, a água está acabando e a energia está acabando. Ao que parece, o governo ficou refém de um discurso, mas agora precisa trocá-lo. Vendeu uma coisa que não é capaz de entregar. É por isso que se faz um ajuste de maneira um pouco atabalhoada. Não há um plano claro, estruturado, com medidas de longo prazo que vão permitir não apenas evitar a crise aguda, mas retomar o crescimento. O que a gente tem é um conjunto de medidas que estão disponíveis para evitar o pior. São as melhores para o crescimento? Não. Mas são melhores do que não fazer. Infelizmente, vivemos o custo do que se vendeu na campanha eleitoral.

Para muitos, se o ministro da Fazenda, Joaquim Levy conseguir parte do que está prometendo é sinal de que consegue reverter a situação.
Foi grave o que fizeram nos últimos anos. Um ajuste fiscal profundo e relevante evita uma crise aguda, mas não retoma o crescimento. Essa crise não é igual a 1999 e 2003. Em 2003, tivemos uma bendita herança. Pegamos um país arrumado. Houve erros na gestão do Fernando Henrique Cardoso? Claro. Erros levaram ao racionamento de energia, por exemplo. Mas o governo de FHC assumiu o problema de frente: "Erramos, fizemos bobagem". Tiveram hombridade e liderança pública - o que não temos tido recentemente. Basta ver o caso da água em São Paulo ou o da energia no governo federal. Todo mundo tenta dar um jeitinho para evitar o racionamento. Agora, o problema fiscal é apenas a superfície de uma política econômica equivocada, que gerou uma série de distorções na atividade econômica.

Por quê?
Enquanto vários países procuraram arrumar a casa para sair da crise, a gente inventou que a crise não iria chegar aqui. Retomamos os mesmos mecanismos dos anos 70. Retomamos o nacional-desenvolvimentismo aplicado lá atrás: fecha a economia, protege, concede subsídios. Foram essas medidas que geraram aquela década e meia de atrasos pelos anos 80. Mas aquela crise forçou o País a enfrentar a realidade. Nos anos 90 vieram a abertura econômica, privatizações, agências reguladoras, equilíbrio fiscal e política monetária equilibrada. Este é um ponto importante. O Brasil viveu - com idas e voltas, avanços e retrocessos - uma trajetória de continuidade desde 1990. Infelizmente, veio a crise em 2008 e qual foi a resposta? Repetimos a mesma de 74 que tinha dado errado.

O sr. está querendo dizer que vamos viver outra década perdida?
Eu acho que o Brasil corre o risco de, escapando da crise aguda, viver muitos anos de baixo crescimento. O estrago que foi feito na produtividade é imenso. As pessoas estão muito preocupadas com a corrupção. A corrupção é a franja do problema. O estrago que a política nacional-desenvolvimentista fez na Petrobrás é incomparavelmente mais grave do que os números apresentados até agora pela corrupção. Não estamos falando de alguns bilhões de reais, mas talvez de centenas de bilhões de reais.

O que o sr. está vendo é uma situação como a dos anos 80?
Salvo o descontrole fiscal e monetário, sim. A desorganização é menos grave, mas a direção é a mesma.

Como se desmonta isso?
Esse tipo de política cria grupos de interesse. Estamos vendo o drama da indústria naval. Pela terceira vez, o Brasil tenta fazer uma indústria naval. A gente protege, dá um incentivo, dá um subsídio e cria regra de conteúdo nacional. Ainda assim, a indústria não se desenvolve. Mas condenamos o resto da economia a pagar mais caro pelo transporte naval. É o Custo Brasil. A política de proteção é benéfica apenas para quem recebe. Para o resto do País, é maléfica. Por que escolher empresas e setores para ter benefício? O ministro Levy, que é mais elegante do que eu, falou em patrimonialismo. Eu falo da meia-entrada. Todo mundo quer algum tipo de benefício e este governo apoiou essa proposta. Em parte, a culpa do que está aí é do governo, mas também da sociedade. O governo respondeu aos pedidos de grupos empresariais, de sindicatos, de entidades como a Fiesp. Eles foram a Brasília e falaram: "Baixa os juros, sobe o câmbio, concede proteção e estímulo que o País voltar a crescer". Pois é. Deu errado.

Há sinais de desmonte dessa visão econômica?
É difícil desmontar incentivos. Cada vez que você tentar, vai mexer com um grupo e provocar algum tipo de manifestação. Olha a discussão que se gerou por causa da mudança na desoneração da folha de pagamento. Existem propostas boas para desonerar a folha, mas conseguiram escolher a pior. Fizeram uma desoneração tecnicamente incompetente. Agora, para desmontar, vão ter de enfrentar os grupos de interesse.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Por que o Brasil nao avança? (petistas a parte, mas eles tambem) - Marcos Lisboa e Carlos Eduardo Gonçalves

O espantalho da crítica heterodoxa
Marcos Lisboa e Carlos Eduardo Gonçalves
Valor Econômico, 27/10/2014

Há países ricos que possuem sistemas de bem-estar social generosos, como os nórdicos; há países ricos com sistemas de bem-estar pouco generosos, como os EUA. Mas o que definitivamente não existe são países ricos com políticas macro e microeconômicas de viés heterodoxo com a extensão adotada no Brasil nos últimos cinco anos.
A receita dos que conseguiram saltar a difícil barreira do crescimento sustentável – conhecida como armadilha da renda média – é conhecida: plena liberdade política e econômica para amplos setores da sociedade, rigor na condução da área fiscal, estabilidade monetária e financeira, regras e regulamentação estáveis e, finalmente, investimento público eficiente em capital humano (saúde e educação) e infraestrutura.

Há saudável controvérsia sobre o efetivo papel desempenhado por políticas desenvolvimentistas em alguns casos de sucesso, como, por exemplo, as políticas industriais adotadas pelos Tigres Asiáticos, há cerca de três décadas. De um lado alega-se que essas políticas foram cruciais para que eles desenvolvessem parques industriais importantes. De outro, argumenta-se que elas foram irrelevantes, e o que de fato os teria levado aos atuais patamares de renda por habitante foram os investimentos maciços em capital humano. A verdade, possivelmente, está no meio do caminho. Contudo, frise-se que esses casos de sucesso são contrabalançados por um número muito maior de casos de fracasso, como na maioria dos experimentos levados a cabo na América Latina, por exemplo. Por estas bandas, fizemos bastante política industrial, mas não conseguimos os mesmos resultados.
Não avançamos na educação por má governança no setor público e incertezas regulatórias
Políticas de proteção existem, de fato, em muitos países, mas o que nos soa mais significativo é que os detalhes das políticas desenvolvimentistas mais bem sucedidas apresentam diferenças marcantes com a política industrial “à brasileira”, como, por exemplo, a fixação de metas claras de desempenho e a natureza temporária da proteção. O Brasil recente destoa pela extensão da intervenção pública, pela sua longevidade e pela falta de transparência dos benefícios concedidos sem avaliação de resultados.
Voltando à nossa lista de condições necessárias ao desenvolvimento, existe liberdade política no Brasil, mas a nossa democracia ainda é carente de controles sobre a concessão pública de benefícios a grupos escolhidos, além de sujeita a recorrentes casos de corrupção. Tudo isso, claro, afetando a produtividade final da economia. Adicionalmente, são enormes as barreiras burocráticas à entrada nos mercados de bens por parte de empresas novas, fato que, em conjunto com a política de escolha de vencedores via crédito público, restringe o que chamamos de liberdades econômicas.

O rigor fiscal, duramente conquistado após 2000, foi abandonado. O superávit primário real nesse ano, por exemplo, está para perto de 0% do PIB, ou menos. Além disso, os mecanismos criativos reduziram a transparência e a credibilidade da política fiscal, marcos da LRF de 1999. Por sua vez, a condução equivocada da política monetária, reduzindo o juro na base do voluntarismo, resultou em inflação resiliente e em desancoragem das expectativas.
Seguindo na lista: o aumento das restrições ao comércio exterior, por meio de barreiras tarifárias e não tarifárias, isolou ainda mais a economia brasileira do comércio internacional. E as intervenções discricionárias, como no caso da energia, fragilizaram empresas, prejudicaram a produtividade e comprometeram o ambiente de negócios. Por fim, não conseguimos avançar na educação e na infraestrutura por má governança no setor público e incertezas regulatórias.
O resumo é que a produtividade estagnou, o que compromete nosso crescimento econômico sustentado, e a nova matriz macroeconômica resultou apenas em um legado de inflação alta num mundo de inflação baixa, além de graves desequilíbrios fiscais a serem enfrentados nos próximos anos.

Como reagem alguns dos economistas heterodoxos, direta ou indiretamente ligados ao governo, a essa crítica? Criando um argumento-espantalho. A invencionice vai na seguinte linha: os economistas que pregam rigor fiscal e reformas querem na verdade desfazer as conquistas sociais, estão contra a redução de desigualdade, alcançada via programas governamentais como o Bolsa-Família.

Não é verdade, é cortina de fumaça. Não defendemos o fim de programas sociais eficientes para redução da pobreza, nem algo que se assemelhe a “Estado Mínimo”, nem impostos mais baixos para os mais ricos, ou coisas do tipo. Essa tentativa de desqualificação da divergência é instrumento utilizado pelo baixo clero do debate intelectual. Inventam-se pretensos argumentos para rejeitar outros pontos levantados pelos críticos. Inventa-se, enfim, um espantalho.
Defendemos políticas sociais focalizadas nos mais necessitados; a maior qualidade da política pública em educação e saúde por meio da melhora da gestão e do reconhecimento meritocrático, permitindo melhores resultados com os recursos já disponíveis; a volta do rigor fiscal e do combate à inflação; transparência dos subsídios e proteção setoriais, que preferencialmente deveriam ser horizontais e submetidos a constante avaliação de resultados, para que não joguemos mais dinheiro público em empresas ineficientes; maior abertura econômica, que favoreça o consumidor brasileiro e diversas empresas que usam insumos importados, aumentando nossa inserção nas cadeias produtivas globais e, portanto, alavancando a produtividade.

Ser crítico dos equívocos da política econômica dos últimos anos não tem nada a ver com defender o fim das conquistas sociais alcançadas desde 1990. Argumentar nessa direção é fugir do debate sobre a condução da economia nos últimos anos. O espantalho pode ser eficaz para afastar os corvos. O debate, porém, merece mais. O país também.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Politica economica companheira: entrevista com Marcos Lisboa

Marcos Lisboa:"O retorno ao desenvolvimentismo deu errado"
por Ludmilla Amaral
IstoÉ, 17/07/2014
Ex-secretário de Política Econômica de Lula, Marcos Lisboa classifica o comportamento da economia brasileira de medíocre e diz que o País deve retomar agenda que antecedeu a 2008

Ex- secretário de Política Econômica do governo Lula, o economista Marcos Lisboa avalia o comportamento da economia do País, desde 2009, como "medíocre". "Quando eu digo medíocre é um baixo crescimento, inclusive em comparação com nossos pares no resto do mundo. As dificuldades dos países desenvolvidos têm contaminado os países emergentes, mas nós temos sofrido mais do que os demais", afirmou Lisboa em entrevista à ISTOÉ concedida na terça-feira 15 na sede do Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) em São Paulo, entidade da qual ele é vice-presidente. O economista atribui esse cenário, que, segundo ele, afeta o setor de serviços e ameaça o mercado de trabalho, à volta ao velho nacional-desenvolvimentismo dos anos 50 e 70, baseado na intervenção na economia.
 Para caracterizar esse movimento, ele menciona medidas como o aumento das barreiras protecionistas e da concessão de créditos subsidiados por meio dos bancos públicos, em particular o BNDES, e a reintrodução de políticas públicas discricionárias e intervencionistas em diversos mercados. "Apostava-se que ao proteger a economia e com a concessão pelo governo de subsídios e benefícios, que são pagos com nossos impostos, direcionados para esses setores, se estimularia o crescimento da demanda, do consumo e do investimento e se garantiria a aceleração do crescimento econômico. Má notícia: não funcionou", lamentou.

ISTOÉ -  As perspectivas quanto à economia brasileira não são positivas. A inflação está em alta e o crescimento muito aquém das expectativas. Como o sr. analisa esse cenário?
 MARCOS LISBOA - A economia brasileira tem tido um comportamento medíocre nos últimos anos. Quando eu digo medíocre é um baixo crescimento, inclusive em comparação com nossos pares no resto do mundo. O Brasil tem crescido menos do que a média do mundo e menos do que os países comparáveis.  Apesar da crise nos países desenvolvidos, os emergentes como Chile, Colômbia, Peru e mesmo outros países desenvolvidos, como Austrália e Nova Zelândia, têm conseguido manter taxas mais elevadas de crescimento que a economia brasileira. Em particular, a indústria no Brasil sofreu muito nos últimos anos. Até recentemente, no entanto, o setor de serviços no Brasil ainda apresentava um bom desempenho com crescimento robusto, o que garantia a geração de empregos. A má notícia é que recentemente o setor de serviços também começou a demonstrar sinais de enfraquecimento, ameaçando o mercado de trabalho.
ISTOÉ -  A que o sr. atribui isso?
 MARCOS LISBOA - As dificuldades dos países desenvolvidos têm contaminado os países emergentes, mas nós temos sofrido mais do que os demais. Então, existem dificuldades que são específicas da economia brasileira. Nós estamos abaixo, inclusive, da média de crescimento da América Latina. E o Brasil é grande na América Latina. Então, nós estamos puxando a média de crescimento para baixo. Quando analisamos os dados, verificamos que o Brasil estava até os anos de 2008/2009 com um crescimento muito maior do que no passado, chegando a pouco mais de 4%, e isso estava associado ao maior crescimento da produtividade. Com os mesmos recursos, a economia brasileira produzia mais do que antes. Infelizmente, a partir de 2008/2009 a produtividade da economia brasileira declinou.
 ISTOÉ -  Por que a economia brasileira apresentou essa queda?
 MARCOS LISBOA - Esse período de 2008/2009 marca uma significativa inflexão da política econômica no Brasil. O País até 1990 era uma economia fechada, com uma série de restrições ao comércio exterior, muito protegida da concorrência internacional, com forte desequilíbrio fiscal. Isso tudo se traduzia na alta inflação. A partir da década de 90, a economia brasileira entrou em uma agenda de profundas transformações: equilíbrio fiscal, ou seja, acertou as contas públicas, cujo grande passo é a Lei de Responsabilidade Fiscal. A abertura da economia permitiu importar bens de consumo, bens de produção e máquinas. E veio a estabilização dos preços. 
 ISTOÉ -  Qual foi a importância do Plano Real nessa mudança?
  MARCOS LISBOA - O Plano Real conseguiu depois de tanto tempo garantir um nível de inflação compatível com o dos demais países e, do ponto de vista institucional, uma série de reformas modernizando as relações do Estado com o setor produtivo. Essa agenda passou pelo governo Fernando Henrique e foi até o início do segundo mandato de Lula. A partir de 2007/2008, mas sobretudo de 2009 para cá, houve um retorno ao antigo nacional-desenvolvimentismo.
 ISTOÉ -  Como o sr. vê esse retorno?
 MARCOS LISBOA - Há um aumento das barreiras protecionistas, da concessão de créditos subsidiados por meio dos bancos públicos, em particular o BNDES, e a reintrodução de políticas públicas discricionárias e intervencionistas em diversos mercados. Isso é um pouco a volta ao velho nacional-desenvolvimentismo dos anos 50 e dos anos 70, baseado na intervenção na economia. Há uma crítica frequente de que o governo fez um modelo baseado no consumo. Acho injusta essa crítica ao governo. O governo tem um diagnóstico de que o desenvolvimento parte da proteção, do estímulo e da concessão de benefícios e estímulos da demanda. E o governo destinou uma grande parte de recursos ao investimento. Basta olhar o que aconteceu com os recursos do BNDES nesse período, por exemplo, entre 2007 e o começo de 2011. O problema é que deu errado. O investimento não reagiu na proporção com que os recursos foram concedidos. Agora, essa não foi uma agenda apenas do governo. Essa agenda foi defendida por muitas lideranças do setor privado. Apostava-se que ao proteger a economia e com a concessão pelo governo de subsídios e benefícios, que são pagos com nossos impostos, direcionados para esses setores, se estimularia o crescimento da demanda, do consumo e do investimento e se garantiria a aceleração do crescimento econômico. Má notícia: não funcionou. 
 ISTOÉ -   É possível voltar atrás? 
 MARCOS LISBOA - Acho que retomar aquela agenda prévia de 2008 é uma parte importante desse processo. Os trabalhos acadêmicos indicam, por exemplo, que quando você inicia um processo cuidadoso de abertura da economia, há aumento na competição e também no acesso a bens de capital e insumos tecnologicamente mais eficientes. Trabalhos acadêmicos mostram também como a produtividade da indústria aumentou na década de 90 pelo acesso a bens de capital. Uma agenda importante é a que estabeleça justiça econômica e simplificação. Também temos que voltar a fortalecer o Estado. Nos últimos anos a gente enfraqueceu o Estado em favor da discricionariedade do governo. É preciso voltar a fortalecer as agências reguladoras. 
 ISTOÉ – E as políticas públicas? Não acha que é preciso qualificá-las?
 MARCOS LISBOA - Sem dúvida. Certamente outra agenda importante é a da qualidade da política pública. A política social brasileira até 88 estava delegada a um plano inferior. Por exemplo, a educação nunca foi prioridade no Brasil até 88, tal como boa parte da política social, ao contrário de outros países. Para se ter uma ideia, em 1960 o Brasil era quase três vezes mais rico que a Coreia e, no entanto, 20 anos depois, a Coreia ficou tão rica quanto o Brasil e hoje apresenta indicadores de educação impressionantemente superiores. Isso não vale só para a Coréia. Se compararmos com nossos vizinhos, o Brasil destoa deles pelos baixos indicadores de educação. E não à toa o Brasil apresenta uma realidade desigual de renda. E isso está associado à desigualdade dos indicadores de escolaridade.
 ISTOÉ -  Nos últimos 25 anos aumentamos muito o investimento em educação. Mas por que nossos indicadores ainda estão defasados em relação a nações vizinhas e a outros países em desenvolvimento?
 MARCOS LISBOA - Felizmente, o Brasil mudou, em parte. A partir de 1988 começou a destinar mais recursos para a área social. Em particular na educação, o Brasil conseguiu massificar o ensino fundamental e isso foi um avanço. Ainda há um desafio no ensino médio, mas resta, sobretudo, um desafio na qualidade da educação. A nossa educação ainda é de baixa qualidade. Com a descentralização da política de educação, ela passou a ser de responsabilidade tanto do governo federal como do estadual e do municipal. E nós sabemos hoje, com alguns dados disponíveis, que alguns governos foram muito bem-sucedidos em melhorar a qualidade da educação. Sobral, por exemplo, no Ceará, conseguiu melhorar seus indicadores de qualidade de educação em menos de uma década e hoje tem indicadores melhores que São Paulo gastando muito menos. Parece que não tem muita magia aqui. O segredo é boa gestão.
 ISTOÉ -  O que seria uma boa gestão para melhorar a qualidade de educação, na  opinião do sr.?
 MARCOS LISBOA - Primeiro, avaliação, independentemente de resultado. Não pode o próprio gestor avaliar a qualidade daquilo que ele fez. É preciso ter órgãos independentes avaliando, aplicando provas, para saber quanto o aluno aprendeu, quem está ensinando bem e quem não está. Segundo, boa gestão nas salas de aula. Plano de aula bem definido, com acompanhamento periódico do aluno. Nós sabemos hoje que é preciso aprender na idade certa. O atraso na educação é muito custoso para a formação. O impacto que a educação tem na vida das pessoas depende da qualidade e de quão cedo começou. É preciso também valorizar o bom professor. O problema do Brasil é muito mais de gestão da sala de aula do que de recurso.
 ISTOÉ -  O desenvolvimento econômico passa pelo investimento na qualidade da educação?
 MARCOS LISBOA - O desenvolvimento econômico passa pela melhora do bem institucional, regras homogêneas, princípios gerais e criação de mecanismos de resolução de conflitos. Mas passa também, e nós sabemos do peso disso, pelo impacto da educação sobre a produtividade. Uma maior qualidade da educação melhora a produtividade, gera crescimento econômico e provoca uma melhor distribuição de renda. Nesse processo, foram fundamentais as políticas de transferência de renda que começaram no governo Fernando Henrique com o Bolsa Escola, que é a origem do Bolsa Família. O Bolsa Escola era uma política compensatória que procurava garantir condições mínimas de vida a pessoas com dificuldade no mercado de trabalho por causa da baixa escolaridade. Mas também era uma política estrutural, porque a contrapartida desse auxílio era que o filho tinha de ir para a escola. Então, o Brasil tem hoje uma agenda de produtividade pela frente. E a educação é parte dessa equação. Melhorar a qualidade na educação tem um impacto na produtividade da pessoa, na capacidade de geração da renda pessoal e, portanto, da renda do País. Essa agenda de produtividade passa por melhorar a qualidade da política pública em geral, e a educação é parte fundamental.

domingo, 14 de julho de 2013

Democracy and Growth in Brazil - Marcos Lisboa, Zeina Latif (discussion paper)

Já referido em post anterior, quero remeter aqui diretamente ao trabalho seguinte:

Democracy and Growth in Brazil
Marcos Lisboa, Zeina Latif
2013, 58 p.

Brasil, ainda o pais da meia-entrada - Marcos Lisboa, Zeina Latif (Fernando Dantas)

Fernando Dantas
Blog Estadão, 13 de julho de 2013

As manifestações de junho continuam a estimular o debate sobre o modelo político-econômico brasileiro, e seus problemas. Recentemente, como tratado na minha coluna de segunda-feira, desenrolou-se a discussão sobre as causas mais profundas do mau funcionamento do Estado brasileiro.
Em longo artigo, o economista André Lara Resende, um dos pais do Plano Real, apontou para um setor público voltado para si mesmo, enquanto que Samuel Pessôa, do Ibre/FGV e Mansueto Almeida, do Ipea, responderam com comentários e artigos em que enfatizam que foram as demandas de transferências pela sociedade que debilitaram a capacidade do Estado de investir e de alocar recursos de forma mais eficiente.
Uma excelente contribuição a esse debate é um trabalho recente dos economistas Marcos Lisboa, diretor vice-presidente do Insper, e Zeina Latif, intitulado (na versão em inglês a que teve acesso este colunista) “Democracy and Growth in Brazil” (Democracia e Crescimento no Brasil). O artigo na íntegra está aqui.
O estudo é longo, e centra-se na ideia de que o Brasil é um país onde é particularmente forte o “rent-seeking”, expressão em inglês da literatura econômica que significa, nas palavras dos autores, “o processo pelo qual grupos especiais conseguem obter privilégios e benefícios de agências do governo”.
O trabalho de Lisboa e Zeina (que é colunista da Agência Estado) historia as causas do “rent-seeking” no Brasil e descreve as suas atuais manifestações, além de mostrar como a literatura econômica explica o fenômeno, e como essas tentativas de interpretação se aplicam ao caso brasileiro. Há também uma detalhada análise das relações entre crescimento, democracia e rent-seeking, de forma geral e no Brasil.
É um longo estudo, do qual eu destacaria dois aspectos: as quatro diferentes formas pelas quais o rent-seeking se manifesta no Brasil de hoje, e as sugestões dos autores para atacar o problema, o que seria positivo tanto para o crescimento econômico como para o fortalecimento da democracia.
A primeira forma de rent-seeking nacional, segundo Lisboa e Zeina, vem por meio de impostos e transferências. Eles notam que o aumento da carga tributária e dos gastos sociais não é um fenômeno isolado do Brasil, mas sim uma tendência global que se fez presente sobretudo no século XX. O problema nacional, acrescentam, é que o Estado brasileiro arrecada de uma forma demasiadamente complicada, o que atrapalha a atividade econômica, e distribui mal.
Assim, apesar da introdução de programas bem elaborados e bem sucedidos, como o Bolsa Família, a ação do governo brasileiro, em termos de taxar e redistribuir, não melhora a distribuição de renda de forma agregada, segundo alguns estudos citados por Lisboa e Zeina. Uma das razões é que os benefícios distribuídos pelo governo são muito concentrados. Assim, o sistema previdenciário é responsável por 85% das transferências do governo para as famílias, o que equivale a 11% do PIB. Mas a distribuição dos benefícios previdenciários é concentrada, não contribuindo para reduzir a desigualdade de renda disponível.
Um exemplo de “rent-seeking” tributário citado pelos autores é a Zona Franca de Manaus, cujos subsídios foram criados para ser temporários, mas vêm se estendendo indefinidamente. Incentivos fiscais de pelos menos R$ 24 bilhões teriam sido concedidos em 2011, o que equivale a 0,6% do PIB, para um sistema de produção que exporta muito pouco (menos de 3% do faturamento das empresas) e “sobrevive com base na demanda doméstica cativa e barreiras ao comércio que protegem a produção local”.
O segundo mecanismo de “rent-seeking” listado pelos autores sãos “as transferência compulsórias de dinheiro fora do orçamento do governo”. Lisboa e Zeina exemplificam com o Sistema S, que se alimenta de deduções em folha salarial, e que arrecadou 0,3% do PIB em 2010. Outro caso semelhante é o FGTS, que captou perto de 1,7% do PIB em 2010. Segundo Lisboa e Zeina, “não há nenhum mecanismo transparente para avaliar o custo-benefício desses instrumentos e o seu custo de oportunidade em relação a utilizações alternativas ou aumentos do salário real”.
O terceiro item da lista são os subsídios cruzados, que vão da regulação do seguro-saúde aos serviços de infraestrutura, incluindo até a “meia-entrada” para eventos artísticos e culturais.
Uma faceta particularmente importante dos subsídios cruzados envolve o setor de crédito, onde, como os autores observam, a parcela de 20% dos empréstimos subsidiados (excluindo o BNDES) pagou um spread médio de 3,5% em 2012, comparado com 20% para o crédito livre.
No caso do BNDES, eles notam que os empréstimos aumentaram “dramaticamente” de 6% para 11% do PIB depois da crise global, com subsídios implícitos calculados em R$ 22,8 bilhões em 2011.
O quarto mecanismo, finalmente, é o protecionismo comercial. O Brasil está no grupo das economias mais fechadas do mundo, quando se mede o nível e a complexidade das tarifas e das barreiras não tarifárias, e a eficiência dos procedimentos de importação.
Propostas
Lisboa e Zeina têm duas propostas básicas para ajudar a iniciar o desmonte da “República da Meia Entrada”, como já vem sendo ironicamente descrito o Brasil que sai dessa chave interpretativa onde o “rent-seeking” é o elemento central.
A primeira seria a criação de uma agência governamental responsável por contabilizar os objetivos e os resultados de todas as políticas públicas. Para os dois autores, “transparência e responsabilização são essenciais para prover ferramentas democráticas que permitam à sociedade decidir sobre intervenções governamentais”.
A segunda sugestão é que toda intervenção governamental tenha de ser inteiramente contabilizada no Orçamento, acabando assim com o ocultamento do custo dos milhares de “meias-entradas” distribuídas pelo Estado brasileiro. Eles admitem que, dada a dimensão do “rent-seeking” no Brasil, esta segunda proposta “está longe de ser modesta”.
Lisboa esteve à frente, em 2002, da elaboração da chamada “Agenda Perdida”, um documento de propostas econômicas, com foco na microeconomia e na regulação, que foi adotado pelo ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, no início do primeiro mandato presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva.
Lisboa foi para o governo junto com a “Agenda Perdida”, como secretário de Política Econômica da Fazenda. Lá, comandou a bem sucedida implementação de boa parte das propostas, com destaque para a área de crédito, com o deslanche do consignado e dos empréstimos imobiliários.
Com a campanha eleitoral de 2014 já virtualmente iniciada, não seria má ideia que os pré-candidatos olhassem o que ele e Zeina têm para dizer.
 Esse artigo foi publicado originalmente na AE-News/Broadcast

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Brasil: economistas do ano, Alexandre Tombini e Marcos Lisboa

Economistas do Ano 2010
Ordem dos Economistas do Brasil, 9 de Setembro de 2010

A festa do Economista do Ano, realizada no último dia 23 de agosto, foi marcada este ano por discursos da mais alta importância e que desde já se inscrevem como documentos históricos para a Ordem dos Economistas: depoimentos pessoais inéditos, análises originais de processos de crescimento e de desenvolvimento econômico e exemplos de reformas institucionais coroadas com êxito, bem como sua importância para o futuro do país, dominaram as manifestações.

O Governador Laudo Natel, às vésperas do seu 90º aniversário, foi muito aplaudido ao trazer para a comunidade econômica suas memórias e pontos principais de sua “carreira de bancário”, como ele mesmo definiu, malgrado todo o êxito de sua vida pública. Relembrou suas origens e fatos pitorescos de seu relacionamento com personalidades representativas como Amador Aguiar e Adhemar de Barros.

Alexandre Antonio Tombini, Diretor de Normas e Organização do Sistema Financeiro, do Banco Central do Brasil, que recebeu o prêmio de economista do Setor Público de 2010, ressaltou o trabalho realizado no âmbito do Banco Central do Brasil, especialmente o que resultou na excelente regulamentação e supervisão bancárias do Brasil, de resto elogiada internacionalmente. Relembrou o papel crucial do sistema de metas para a inflação, da taxa de câmbio flutuante, da política de acumulação de reservas internacionais, e dos esforços realizados pelo Banco Central para a fluidez da expansão do crédito. Foi com esse resultado recente que empresas e consumidores puderam alongar seus horizontes e tomar decisões a prazo mais dilatado, mantendo elevado o nível da demanda agregada. Ressaltou a importância estratégica que, durante a recente crise, teve o “colchão de liquidez” introduzido por aquela instituição. Elogiou a supervisão que foi permeável a um moderno processo de licenciamento de instituições financeiras e propugnou pela ampliação dos estudos sobre a “regulação prudencial” e pelo papel pro-ativo do Brasil nessa matéria em fóruns internacionais.

O Diretor do Banco Central reconheceu o pioneirismo da Ordem dos Economistas do Brasil na introdução dos estudos sobre a regulação prudencial.

Marcos de Barros Lisboa, o homenageado com a láurea de “Economista do Ano 2010”, apresentou documento intitulado “Instituições e Crescimento Econômico”, um denso discurso, em parte acadêmico, em parte histórico e até filosófico e por fim reencontrou teoricamente o que o discurso de Tombini apresentara para o caso concreto do Banco Central.

Marcos Lisboa partiu do que considerou os fatos novos que iluminaram a ciência econômica nos anos 80: o advento dos modelos em que a competição entre firmas engendraria o aumento da produtividade, abrindo (novamente) espaço para as teorias de Schumpeter e a construção quase que exaustiva de uma base de dados de cerca de uma centena de países, o que possibilitou um salto qualitativo da análise empírica da diferenças entre os diversos países.

Esse procedimento, aplicado dentro de um país, aponta para a necessidade de análise sistemática dos resultados das políticas públicas, que podem ser muito diferentes dos esperados quando da formulação, em que pesem as boas intenções. Por outro lado, anotou a redenção da micro-economia para iluminar as políticas públicas, em particular no desenho ideal das instituições que dela participam. Defendeu, em grande parte do seu discurso, o desenho das instituições como peça central do processo de mudança e do processo de crescimento da renda.

As reformas institucionais são assim cruciais para provocar o aumento de produtividade que leva a um aumento da renda e do consumo da produção e do emprego. Elas nesse papel substituem muitas vezes as inovações tecnológicas. Trouxe vários exemplos em defesa dessa tese, tanto de países e regiões quanto de práticas dentro de um mesmo país: o custo elevado de execução de dívidas, por exemplo, que, dentre outros fatores, leva à inadimplência, que por sua vez eleva os juros praticados, afetando os investimentos.

Concluindo, propugnou pela consideração de que os resultados da política econômica são condicionados pelo sistema legal e pelo desenho de suas instituições.

Analisando o caso brasileiro defendeu as reformas introduzidas nos últimos vinte anos que levaram à consistente estabilidade econômica. Um novo mercado de crédito é, segundo Lisboa, a espinha dorsal desse novo edifício, sem esquecer a nova lei de falências, a descentralização dos recursos para saúde e educação e os programas de transferência de renda.

Defendeu um sistema de avaliação da eficácia das políticas públicas e adoção de várias reformas pontuais para dar maior fluidez aos investimentos e assim engendrar um novo ciclo virtuoso da economia brasileira. Dentre estas é oportuno citar o incentivo à captação e ao financiamento de longo prazo, de longa data uma limitação do sistema de crédito brasileiro.

Encerrou sua fala com homenagem aos colegas de trabalho, ao trabalho em equipe e com palavras de pungente emoção à sua família. Um belíssimo discurso!

Clique aqui para fazer o download do discurso.