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quarta-feira, 27 de março de 2024

A tardia e tímida crítica do Itamaraty a Maduro - Editorial Estadão

A tardia e tímida crítica do Itamaraty a Maduro
O Estado de S. Paulo | Opinião O Estado de S. Paulo

27 de março de 2024 

NOTAS E INFORMAÇÕES

A tardia e tímida crítica do Itamaraty a Maduro

Mesmo quando finalmente resolve manifestar 'preocupação' diante das novas arbitrariedades do ditador, o governo Lula acha que é possível fortalecer' a inexistente democracia na Venezuela

N ão surpreende que o regime ditatorial de Nicolás Maduro tenha impedido o registro da candidatura da principal chapa de oposição na eleição presidencial de julho, pois é a culminação de um processo integralmente eivado de irregularidades, fraudes e violência política, aliás característico do chavismo desde sempre. Tampouco surpreende que só agora o governo brasileiro, por meio do Itamaraty, tenha manifestado alguma "preocupação" com a evidente destruição da democracia venezuelana.

Antes tarde do que nunca, mas mesmo no momento em que tomou coragem de reconhecer que o regime do companheiro Nicolás Maduro, ora vejam, está descumprindo suas promessas de permitir uma eleição minimamente competitiva e limpa, o Itamaraty o fez escolhendo bem as palavras, para não melindrar o ditador amigo de Lula da Silva - aquele mesmo Lula da Silva que não escolheu palavras quando comparou Israel à Alemanha nazista.

Diz a nota envergonhada do Itamaraty que, "com base nas informações disponíveis", a candidata Corina Yoris, indicada pela Plataforma Unitaria, força política de oposição, "sobre a qual não pairavam decisões judiciais", foi "impedida de registrar-se", o que "não é compatível com os acordos de Barbados" - em referência ao acerto em que Maduro garantiu a lisura da eleição para presidente em troca da suspensão das sanções dos EUA à Venezuela.

Ora, há tempos o regime chavista vem impedindo sistematicamente que os principais nomes de oposição possam disputar as eleições, seja prendendo-os, seja impedindo que se candidatem. O caso mais escandaloso foi o da ex-deputada María Corina Machado, que foi considerada inelegível pela Justiça Eleitoral, inteiramente controlada pelo governo. María Corina era líder de intenção de voto nas pesquisas independentes.

Em vez de denunciar a evidente arbitrariedade da ditadura venezuelana, Lula da Silva achou que era o caso de criticar María Corina, recomendando que ela parasse de "chorar" e escolhesse outro candidato para disputar em seu lugar.

Pois foi o que María Corina fez: escolheu Corina Yoris. De nada adiantou. Corina Yoris não conseguiu registrar sua candidatura porque simplesmente não teve acesso ao sistema de inscrição. O prazo se encerrou ontem. Com razão, María Corina suspeita que qualquer candidato que ela indicasse teria o mesmo destino: a impossibilidade de disputar a eleição. Somente "opositores" chancelados pelo regime conseguiram registrar suas chapas.

Ainda assim, pisando em ovos, o Itamaraty reiterou sua crença de que é possível fazer da eleição de julho "um passo firme para que a vida política se normalize e a democracia se fortaleça na Venezuela, país vizinho e amigo do Brasil". Se isso já era difícil antes, agora é virtualmente impossível. Não é possível "fortalecer" a democracia na Venezuela porque há décadas não existe democracia na Venezuela, e a ditadura só se aprofunda.

A diplomacia de Lula da Silva para a Venezuela em seu terceiro mandato é coerente com a dos dois anteriores, na década de 2000, quando assistiu passivamente à gradual captura do Legislativo, do Judiciário, das Forças Armadas e das instituições de controle de Estado pelo regime de Hugo Chávez. Não houve um pio de Brasília diante da demolição do Estado de Direito venezuelano e da imprensa livre e da brutal perseguição à oposição política. O silêncio de Lula jamais resultou em arrefecimento do regime. No entanto, essa mesma estratégia pusilânime prevalece como posição oficial do Brasil.

O governo Lula jamais considerou a possibilidade de integrar o grupo de países da região - entre os quais, os três sócios do Brasil na fundação do Mercosul - que manifesta coletivamente sua preocupação a cada arbitrariedade de Maduro nos últimos meses. Brasília tem se mantido apartada até mesmo de vozes respeitáveis da esquerda, como a do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica, que condenam sem rodeios o caráter autoritário do regime venezuelano.

O tardio esboço de surpresa do Itamaraty com a mais recente prova de autoritarismo de Maduro ainda está longe, na forma e no tom, de fazer jus ao interesse brasileiro na condenação inequívoca a qualquer regime autoritário, independentemente de sua coloração ideológica.*


segunda-feira, 11 de março de 2024

A farsa eleitoral da ditadura venezuelana e a cumplicidade de Lula - Lourival Sant’Anna (OESP)

Lamentável essa confirmação de que o Brasil de Lula está totalmente conivente com o assalto continuado do regime chavista contra os direitos democráticos do povo venezuelano. Lula está sendo cúmplice devum CRIME POLÍTICO!

Na Venezuela, ditadura de Maduro prepara uma farsa eleitoral

Regime tenta dar ar de legitimidade ao precário processo eleitoral do país

Lourival Sant'Anna, O Estado de São Paulo, 09/03/2024

O regime venezuelano prepara mais uma farsa eleitoral. E o governo Lula participa alegremente dela. Até aí, nenhuma novidade. Dessa vez, porém,  a manobra vem acompanhada da ameaça de invasão de outro vizinho do  Brasil, a Guiana. Um aliado comum de Nicolás Maduro e de Lula, o ditador russo Vladimir Putin,  tem interesse nessa guerra. Lula trocou o apoio incondicional à ditadura venezuelana pelo adiamento do conflito. É um arranjo precário.

Os  partidos de oposição venezuelanos se uniram no ano passado para eleger  candidato único contra Maduro. A chamada Plataforma Unitária Democrática  pediu para o Conselho Nacional Eleitoral supervisionar o pleito. Para  negar legitimidade ao processo, os conselheiros obedientes ao regime,  que eram a maioria, renunciaram. Um novo Conselho, exclusivamente  chavista, foi nomeado, e o órgão público se recusou a cumprir a função  constitucional de fiscalizar a votação.

Apesar  das ameaças de represália do regime, 2,4 milhões de corajosos  venezuelanos participaram, e 92% votaram na ex-deputada María Corina  Machado, incontestável líder da oposição. Em 2015, Machado foi tornada  inelegível pela Justiça venezuelana, controlada pelo regime, por  supostas irregularidades em sua prestação de contas como deputada. Isso,  num país em que centenas de milhões de dólares são desviados por  integrantes do regime.

O  Tribunal Supremo de Justiça, 100% composto por chavistas, confirmou em  janeiro a inelegibilidade de Machado, até 2036.Machado é a terceira  líder de oposição competitiva excluída de disputas eleitorais com  Maduro, no rastro de Henrique Capriles e Leopoldo López, presos por  crimes sem provas. Segundo organismos independentes de defesa dos  direitos humanos, 1.400 venezuelanos perderam direitos políticos desde  2002. Há atualmente 288 presos políticos.

A  manobra viola o Acordo de Barbados, firmado cinco dias antes das  primárias da oposição. O governo venezuelano se comprometeu a realizar  eleições livres e justas, sem a exclusão de oposicionistas. O acordo  levou os EUA a suspender as sanções contra a Venezuela, que pode ter  vendido em torno de US$ 1 bilhão em petróleo, antes de a Casa Branca  concluir que foi enganada.

O  acordo incluiu também a libertação do colombiano Alex Saab, preso na  Flórida sob acusação de desvio de US$ 350 milhões dos cofres  venezuelanos. Segundo o FBI, parte desse dinheiro é destinada a Maduro,  do qual Saab é considerado testa-de-ferro. A trama envolve lavagem de  dinheiro do narcotráfico.

A  exclusão da oposição leva há uma década a população a boicotar  maciçamente as eleições promovidas pelo regime. Para fazer frente a  esses boicotes, que retiram a aparência de legitimidade dos pleitos, o  regime toma uma série de providências. Ao chegar às seções eleitorais,  os venezuelanos passam seu “cartão da pátria” em máquinas  estrategicamente instaladas ao lado dos equipamentos de identificação  dos eleitores. O registro do comparecimento garante a entrega mensal da  cesta básica pelo governo, da qual muitos venezuelanos dependem para  sobreviver: 90% estão abaixo da linha de pobreza e 68%, na extrema  pobreza.

Funcionários  públicos são obrigados a votar. Militantes chavistas remunerados pelo  governo nos bairros pobres exercem pressão para os moradores  comparecerem. Nada disso é suficiente. Eu cobri as eleições para a  Assembleia Constituinte de 2017, boicotadas pela oposição. As seções  eleitorais permaneceram semidesertas o dia todo, enquanto dezenas de  milhares de corajosos venezuelanos se manifestavam contra o regime, sob  forte repressão. Mesmo assim, o CNE anunciou comparecimento de 41%.

A  propósito, enquanto Lula se reunia com Maduro, há uma semana, em San  Vicente e Granadina, durante a cúpula da Celac, o Tribunal Penal  Internacional rejeitava em Haia apelação do regime chavista e levava  adiante a investigação da morte de 125 manifestantes durante as eleições  da Assembleia Constituinte. Eu presenciei algumas dessas mortes a  tiros, disparados contra a multidão.

Lula  tem longa história de interferência nos assuntos venezuelanos, ao lado  do autoritarismo e da corrupção do regime chavista. Em novembro de 2006,  Lula aproveitou a inauguração de uma ponte sobre o Rio Orinoco  construída pela Odebrecht com dinheiro do BNDES para pedir votos para Hugo Chávez, três semanas antes de mais uma de suas múltiplas reeleições.

Em  abril de 2013, logo depois da morte de Chávez, Lula gravou um vídeo  para pedir voto para Maduro: “Sempre foi visível sua profunda afinidade  com nosso querido e saudoso amigo Hugo Chávez.  Os dois compartilhavam as mesmas ideias sobre o destino do nosso  continente e os grandes problemas mundiais. Mais do que isso, Chávez e  Maduro tinham as mesmas concepções em relação aos desafios que a  Venezuela tinha pela frente: em defesa dos mais pobres”.

Por  isso, a oposição e a maioria da população da Venezuela não confiam em  Lula e ele não tem credenciais para intermediar uma distensão no país.  Isso fica provado mais uma vez agora. Depois que Maduro marcou a eleição  para 28 de julho, aniversário de Chávez, o presidente brasileiro  afirmou que “não se pode colocar dúvidas antes de as eleições  acontecerem”, em nome da “presunção de inocência”.

Assessores  do presidente têm dito que não gostam de Machado, porque ela fala em  punir os crimes do regime, e aprovam os nomes do governador de Zulia,  Manuel Rosales, e de Gerardo Blyde, coordenador da Plataforma Unitária  Democrática. Lula disse em fevereiro que não tem informações sobre o que  acontece na Venezuela, quando indagado sobre a expulsão de funcionários  do escritório de Direitos Humanos da ONU no país.

Só  isso explicaria as maquinações de seus assessores. Além do óbvio  absurdo de um governo querer triar candidatos à presidência de outro  país, Rosales é popular em Zulia mas não tem projeção nacional, enquanto  Blyde é leal ao processo das primárias e não se candidataria no lugar  de Machado, analisa Omar Lugo, editor do site independente de notícias  El Estímulo, de Caracas.

Na  antevéspera do Dia Internacional da Mulher, Lula sugeriu que a líder da  oposição não deveria ficar “chorando” e sim escolher um substituto,  como ele fez quando estava condenado e preso por corrupção, em 2018. O  presidente parece não saber também o que está acontecendo no Brasil, um  Estado democrático de direito que não pode ser comparado à ditadura  venezuelana. Sem contar o conteúdo grosseiro, misógino e injusto do  ataque: se tem uma coisa que não falta a Machado é coragem, ao percorrer  o país em campanha, enfrentando um regime sanguinário.

Depois  de duas décadas de abusos contra os direitos humanos na Venezuela e de  arbitrariedades para manter os chavistas no poder, a única inocência dos  envolvidos é a do próprio Lula. Se é que ele acredita no que diz. O  mais provável é que Lula tenha penhorado seu apoio a Maduro em troca de o  ditador recuar de sua decisão de invadir a Guiana para tomar a região  de Essequibo, rica em petróleo e outros minérios.

A  aventura não faria grande sentido econômico: a Venezuela tem as maiores  reservas de petróleo do mundo. O que lhe falta é competência para  explorá-lo. Em razão do sucatamento da estatal PDVSA, antes uma  respeitada petroleira, a exploração despencou de 3 milhões de barris  diários em 2002 para 800 mil.

O  sentido da ameaça é político: o velho expediente, aliás usado por  Putin, de criar um inimigo comum para justificar a perpetuação no poder,  como único “protetor da nação”. E geopolítico: servir ao interesse  russo de criar uma distração para os Estados Unidos na América Latina. A  guerra de Gaza, provocada por outro aliado da Rússia, o Irã,  patrocinador do Hamas, divide as energias dos Estados Unidos e  enfraquece seu apoio à Ucrânia. Numa escala menor, o apoio americano à  Guiana teria o mesmo efeito.

Dois  dias antes de os russos invadirem a Ucrânia, em fevereiro de 2022,  Maduro declarou: “A Venezuela está com Putin, está com a Rússia, está  com as causas valentes e justas do mundo”. Cinco dias depois da invasão,  o ditador venezuelano ligou para o russo. “Nicolás Maduro expressou seu  forte apoio às ações-chave da Rússia, condenando a atividade  desestabilizadora dos Estados Unidos e da Otan e enfatizando a  importância de combater a campanha de mentiras e desinformação lançada  pelos países ocidentais”, relatou o Kremlin.

Lula também culpa os EUA e a Europa pelo fato de a Rússia ter invadido a Ucrânia.

Chávez  já havia apoiado a invasão da Geórgia pela Rússia em 2008. Assim, a  anexação do Essequibo pareceria algo legítimo dentro do repertório moral  do chavismo. Na época, a Venezuela ainda conseguia produzir petróleo em  grande quantidade, e usava o dinheiro para comprar armas russas, como  sofisticados caças Sukhoi-30, baterias antiaéreas S-300, tanques,  navios, artilharia e fuzis kalashnikov.

Essa  tensão interessa às ditaduras venezuelana e russa, e não ao Brasil, que  tem 2.199 km de fronteira com a Venezuela e 1.605 km com a Guiana, no  delicado território amazônico. Além disso, ao menos 262 mil imigrantes e  refugiados da Venezuela vivem no Brasil, por causa do flagelo no país  vizinho. Portanto, enquanto subsistir o regime chavista, o Brasil não estará seguro.