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segunda-feira, 11 de março de 2024

A farsa eleitoral da ditadura venezuelana e a cumplicidade de Lula - Lourival Sant’Anna (OESP)

Lamentável essa confirmação de que o Brasil de Lula está totalmente conivente com o assalto continuado do regime chavista contra os direitos democráticos do povo venezuelano. Lula está sendo cúmplice devum CRIME POLÍTICO!

Na Venezuela, ditadura de Maduro prepara uma farsa eleitoral

Regime tenta dar ar de legitimidade ao precário processo eleitoral do país

Lourival Sant'Anna, O Estado de São Paulo, 09/03/2024

O regime venezuelano prepara mais uma farsa eleitoral. E o governo Lula participa alegremente dela. Até aí, nenhuma novidade. Dessa vez, porém,  a manobra vem acompanhada da ameaça de invasão de outro vizinho do  Brasil, a Guiana. Um aliado comum de Nicolás Maduro e de Lula, o ditador russo Vladimir Putin,  tem interesse nessa guerra. Lula trocou o apoio incondicional à ditadura venezuelana pelo adiamento do conflito. É um arranjo precário.

Os  partidos de oposição venezuelanos se uniram no ano passado para eleger  candidato único contra Maduro. A chamada Plataforma Unitária Democrática  pediu para o Conselho Nacional Eleitoral supervisionar o pleito. Para  negar legitimidade ao processo, os conselheiros obedientes ao regime,  que eram a maioria, renunciaram. Um novo Conselho, exclusivamente  chavista, foi nomeado, e o órgão público se recusou a cumprir a função  constitucional de fiscalizar a votação.

Apesar  das ameaças de represália do regime, 2,4 milhões de corajosos  venezuelanos participaram, e 92% votaram na ex-deputada María Corina  Machado, incontestável líder da oposição. Em 2015, Machado foi tornada  inelegível pela Justiça venezuelana, controlada pelo regime, por  supostas irregularidades em sua prestação de contas como deputada. Isso,  num país em que centenas de milhões de dólares são desviados por  integrantes do regime.

O  Tribunal Supremo de Justiça, 100% composto por chavistas, confirmou em  janeiro a inelegibilidade de Machado, até 2036.Machado é a terceira  líder de oposição competitiva excluída de disputas eleitorais com  Maduro, no rastro de Henrique Capriles e Leopoldo López, presos por  crimes sem provas. Segundo organismos independentes de defesa dos  direitos humanos, 1.400 venezuelanos perderam direitos políticos desde  2002. Há atualmente 288 presos políticos.

A  manobra viola o Acordo de Barbados, firmado cinco dias antes das  primárias da oposição. O governo venezuelano se comprometeu a realizar  eleições livres e justas, sem a exclusão de oposicionistas. O acordo  levou os EUA a suspender as sanções contra a Venezuela, que pode ter  vendido em torno de US$ 1 bilhão em petróleo, antes de a Casa Branca  concluir que foi enganada.

O  acordo incluiu também a libertação do colombiano Alex Saab, preso na  Flórida sob acusação de desvio de US$ 350 milhões dos cofres  venezuelanos. Segundo o FBI, parte desse dinheiro é destinada a Maduro,  do qual Saab é considerado testa-de-ferro. A trama envolve lavagem de  dinheiro do narcotráfico.

A  exclusão da oposição leva há uma década a população a boicotar  maciçamente as eleições promovidas pelo regime. Para fazer frente a  esses boicotes, que retiram a aparência de legitimidade dos pleitos, o  regime toma uma série de providências. Ao chegar às seções eleitorais,  os venezuelanos passam seu “cartão da pátria” em máquinas  estrategicamente instaladas ao lado dos equipamentos de identificação  dos eleitores. O registro do comparecimento garante a entrega mensal da  cesta básica pelo governo, da qual muitos venezuelanos dependem para  sobreviver: 90% estão abaixo da linha de pobreza e 68%, na extrema  pobreza.

Funcionários  públicos são obrigados a votar. Militantes chavistas remunerados pelo  governo nos bairros pobres exercem pressão para os moradores  comparecerem. Nada disso é suficiente. Eu cobri as eleições para a  Assembleia Constituinte de 2017, boicotadas pela oposição. As seções  eleitorais permaneceram semidesertas o dia todo, enquanto dezenas de  milhares de corajosos venezuelanos se manifestavam contra o regime, sob  forte repressão. Mesmo assim, o CNE anunciou comparecimento de 41%.

A  propósito, enquanto Lula se reunia com Maduro, há uma semana, em San  Vicente e Granadina, durante a cúpula da Celac, o Tribunal Penal  Internacional rejeitava em Haia apelação do regime chavista e levava  adiante a investigação da morte de 125 manifestantes durante as eleições  da Assembleia Constituinte. Eu presenciei algumas dessas mortes a  tiros, disparados contra a multidão.

Lula  tem longa história de interferência nos assuntos venezuelanos, ao lado  do autoritarismo e da corrupção do regime chavista. Em novembro de 2006,  Lula aproveitou a inauguração de uma ponte sobre o Rio Orinoco  construída pela Odebrecht com dinheiro do BNDES para pedir votos para Hugo Chávez, três semanas antes de mais uma de suas múltiplas reeleições.

Em  abril de 2013, logo depois da morte de Chávez, Lula gravou um vídeo  para pedir voto para Maduro: “Sempre foi visível sua profunda afinidade  com nosso querido e saudoso amigo Hugo Chávez.  Os dois compartilhavam as mesmas ideias sobre o destino do nosso  continente e os grandes problemas mundiais. Mais do que isso, Chávez e  Maduro tinham as mesmas concepções em relação aos desafios que a  Venezuela tinha pela frente: em defesa dos mais pobres”.

Por  isso, a oposição e a maioria da população da Venezuela não confiam em  Lula e ele não tem credenciais para intermediar uma distensão no país.  Isso fica provado mais uma vez agora. Depois que Maduro marcou a eleição  para 28 de julho, aniversário de Chávez, o presidente brasileiro  afirmou que “não se pode colocar dúvidas antes de as eleições  acontecerem”, em nome da “presunção de inocência”.

Assessores  do presidente têm dito que não gostam de Machado, porque ela fala em  punir os crimes do regime, e aprovam os nomes do governador de Zulia,  Manuel Rosales, e de Gerardo Blyde, coordenador da Plataforma Unitária  Democrática. Lula disse em fevereiro que não tem informações sobre o que  acontece na Venezuela, quando indagado sobre a expulsão de funcionários  do escritório de Direitos Humanos da ONU no país.

Só  isso explicaria as maquinações de seus assessores. Além do óbvio  absurdo de um governo querer triar candidatos à presidência de outro  país, Rosales é popular em Zulia mas não tem projeção nacional, enquanto  Blyde é leal ao processo das primárias e não se candidataria no lugar  de Machado, analisa Omar Lugo, editor do site independente de notícias  El Estímulo, de Caracas.

Na  antevéspera do Dia Internacional da Mulher, Lula sugeriu que a líder da  oposição não deveria ficar “chorando” e sim escolher um substituto,  como ele fez quando estava condenado e preso por corrupção, em 2018. O  presidente parece não saber também o que está acontecendo no Brasil, um  Estado democrático de direito que não pode ser comparado à ditadura  venezuelana. Sem contar o conteúdo grosseiro, misógino e injusto do  ataque: se tem uma coisa que não falta a Machado é coragem, ao percorrer  o país em campanha, enfrentando um regime sanguinário.

Depois  de duas décadas de abusos contra os direitos humanos na Venezuela e de  arbitrariedades para manter os chavistas no poder, a única inocência dos  envolvidos é a do próprio Lula. Se é que ele acredita no que diz. O  mais provável é que Lula tenha penhorado seu apoio a Maduro em troca de o  ditador recuar de sua decisão de invadir a Guiana para tomar a região  de Essequibo, rica em petróleo e outros minérios.

A  aventura não faria grande sentido econômico: a Venezuela tem as maiores  reservas de petróleo do mundo. O que lhe falta é competência para  explorá-lo. Em razão do sucatamento da estatal PDVSA, antes uma  respeitada petroleira, a exploração despencou de 3 milhões de barris  diários em 2002 para 800 mil.

O  sentido da ameaça é político: o velho expediente, aliás usado por  Putin, de criar um inimigo comum para justificar a perpetuação no poder,  como único “protetor da nação”. E geopolítico: servir ao interesse  russo de criar uma distração para os Estados Unidos na América Latina. A  guerra de Gaza, provocada por outro aliado da Rússia, o Irã,  patrocinador do Hamas, divide as energias dos Estados Unidos e  enfraquece seu apoio à Ucrânia. Numa escala menor, o apoio americano à  Guiana teria o mesmo efeito.

Dois  dias antes de os russos invadirem a Ucrânia, em fevereiro de 2022,  Maduro declarou: “A Venezuela está com Putin, está com a Rússia, está  com as causas valentes e justas do mundo”. Cinco dias depois da invasão,  o ditador venezuelano ligou para o russo. “Nicolás Maduro expressou seu  forte apoio às ações-chave da Rússia, condenando a atividade  desestabilizadora dos Estados Unidos e da Otan e enfatizando a  importância de combater a campanha de mentiras e desinformação lançada  pelos países ocidentais”, relatou o Kremlin.

Lula também culpa os EUA e a Europa pelo fato de a Rússia ter invadido a Ucrânia.

Chávez  já havia apoiado a invasão da Geórgia pela Rússia em 2008. Assim, a  anexação do Essequibo pareceria algo legítimo dentro do repertório moral  do chavismo. Na época, a Venezuela ainda conseguia produzir petróleo em  grande quantidade, e usava o dinheiro para comprar armas russas, como  sofisticados caças Sukhoi-30, baterias antiaéreas S-300, tanques,  navios, artilharia e fuzis kalashnikov.

Essa  tensão interessa às ditaduras venezuelana e russa, e não ao Brasil, que  tem 2.199 km de fronteira com a Venezuela e 1.605 km com a Guiana, no  delicado território amazônico. Além disso, ao menos 262 mil imigrantes e  refugiados da Venezuela vivem no Brasil, por causa do flagelo no país  vizinho. Portanto, enquanto subsistir o regime chavista, o Brasil não estará seguro.


quarta-feira, 15 de novembro de 2023

A diplomacia ultra pessoal de Lula é um problema para a diplomacia profissional: Lula e o clube dos autoritários - Lourival Sant’Anna (OESP)

Introdução PRA:

A antiga diplomacia lulopetista (2003-2010) também tinha uma grande carga de personalismo de quem se acreditava o melhor de todos os diplomatas, com seus improvisos que frequentemente desprezavam os discursos burocraticamente bem escritos pelo Itamaraty. Mas ela conseguia preservar certo equilíbrio de racionalidade ideológica entre os três grandes formuladores e executores: Lula, Amorim e Marco Aurélio Garcia.

O que temos atualmente é personalismo em estado puro, sem qualquer controle de seres mais racionais, uma altíssima dose de histrionismo à base do “eu sei, eu faço”, que beira a loucura nos improvisos destrambelhados, o que prejudica enormemente a diplomacia profissional, o que era mais raro nos dois mandatos anteriores. O touro está solto e investe contra suas miragens e obsessões pessoais. Ainda não percebeu que prejufica a si próprio, ao país, e ninguém tem coragem para lhe dizer na cara: “Pare com as invectivas improvisadas!” Vai ser triste.

Lourival Sant’Anna demonstra cabalmente como Lula está fazendo mal a si próprio e ao pais. E isso começou lá atrás, ainda na campanha, no caso da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia. Pode continuar de maneira dramática para nós no caso de uma guerra de agressão da Venezuela contra a Guiana. Lula não têm conhecimento, nem estatura de estadista para conduzir a diplomacia da nação: ele está destruindo a sua reputação e credibilidade, a da diplomacia (ele nunca as teve, a não ser pelas mentiras populistas e altamente demagógicas, servidas e apoiadas por um bando de cortesãos mediocres e temerosos).

Paulo Roberto de Almeida 

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Lula ainda não percebeu que o mundo já se deu conta de sua minúscula estatura internacional, um ‘anão diplomático’, nas palavras de um porta-voz da chancelaria israelense em 2014. Uma das consequências disso foi a longa espera dos 34 brasileiros para sair da Faixa de Gaza, enfim encerrada hoje.

PS: o artigo foi publicado antes das notícias da saída deles esta manhã. (Walmir Buzzatto)

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Lula e o clube dos autoritários

Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo, 

12 de nov. de 2023

As manifestações de simpatia do presidente Lula pelos regimes do Irã, Rússia, China e Venezuela podem colocar em risco a segurança de cidadãos brasileiros e a reputação do País. Isso ficou claro mais uma vez na forma como os brasileiros ficaram no fim da fila de autorizações de saída da Faixa de Gaza e na revelação da Polícia Federal de que o Hezbollah poderia estar tramando ataques no Brasil.

Dez dias depois das atrocidades cometidas pelo Hamas em Israel, Lula telefonou para o presidente iraniano, Ebrahim Raisi, para discutir a crise e a autorização para a saída dos 34 brasileiros e parentes. O Irã patrocina o Hamas e o Hezbollah. É o principal inimigo de Israel e adversário também do Egito, os dois países que têm a chave do posto de fronteira de Rafah.

SIGILO. A principal inimiga da ditadura militar egípcia, a Irmandade Muçulmana, inspirou a criação do Hamas, em 1987, e é sua aliada, com presença estratégica na Península do Sinai, que liga o Egito à Faixa de Gaza.

Se o presidente acreditava que essa gestão era absolutamente imprescindível para obter do Hamas a liberação dos brasileiros, ele deveria ter mantido a conversa em sigilo. Entretanto, como tem feito também em relação a outros governantes que desafiam o status quo e o direito internacionais, Lula fez alarde sobre a aproximação.

Aparentemente, o propósito era demonstrar sua estatura internacional e capacidade de articulação. Além disso, em uma live inflamada, Lula chamou de “insanidade” o bombardeio israelense à Faixa de Gaza. Para completar, o assessor do presidente para assuntos internacionais, Celso Amorim, acusou Israel de “genocídio”, em conferência internacional em Paris, na quinta-feira.

CRIMES. A discussão aqui não é isentar um dos lados do conflito. Como disse Volker Türk, comissário da ONU para os direitos humanos, tanto o Hamas quanto Israel cometeram crimes de guerra no mês que passou. É melhor deixar isso na boca de um especialista como ele. E, definitivamente, evitar palavras com uma grande carga de acusação.

No auge da crise nuclear iraniana, Lula tratava o então presidente Mahmoud Ahmadinejad como amigo. Junto com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, outro autocrata violador de direitos humanos, Lula negociou uma suposta solução para a crise que só atendia aos interesses iranianos.

Em 2014, durante uma das cinco guerras que o Hamas provocou com Israel, a então presidente Dilma Rousseff convocou seu embaixador de volta de Tel-Aviv, por considerar os bombardeios israelenses à Faixa de Gaza desproporcionais. Um porta-voz da chancelaria de Israel chamou o Brasil de “anão diplomático”.

O histórico de atritos entre Israel e os governos petistas contrasta com o período róseo do governo de Jair Bolsonaro,

interessado em agradar sua base evangélica. Essa corrente se identifica com o Velho Testamento, que define os judeus como povo escolhido, e profetiza que, quando eles construírem o Terceiro Templo em Jerusalém, o Messias voltará para o Juízo Final.

A exemplo de Donald Trump, Bolsonaro prometeu transferir a embaixada de TelAviv para Jerusalém, o que viola a lei internacional. Segundo inúmeras resoluções da ONU, Israel ocupa Jerusalém ilegalmente e o status final da cidade será negociado junto com a criação de um Estado palestino. Bolsonaro recuou por causa da reação negativa do mundo árabe, importante destino das exportações brasileiras.

PREFERÊNCIA. A predileção de Israel por Bolsonaro foi explicitada pelo encontro, na terça-feira, do embaixador israelense Daniel Zohar Zonshine com o ex-presidente e deputados de direita na Câmara, aonde ele foi mostrar vídeos dos ataques do Hamas. O encontro violou a etiqueta diplomática e azedou de vez as relações entre os dois governos.

Com cerca de 7 mil palestinos com dupla nacionalidade desesperados para deixar a Faixa de Gaza bombardeada há mais de um mês, Israel e Egito priorizaram os cidadãos de países amigos, ou pelo menos que não sejam gratuitamente hostis. Funcionários israelenses garantiram publicamente que Israel não interferia na seleção dos cidadãos. Tanto não era verdade que foi o chanceler de Israel, Eli Cohen, que comunicou o do Brasil, Mauro Vieira, que os brasileiros tinham sido finalmente autorizados a sair. O órgão israelense encarregado dessa tarefa é a Coordenação das Atividades do Governo nos Territórios (Cogat).

ATENTADOS. O Hezbollah é acusado de ter cometido, com apoio de agentes iranianos, dois atentados a bomba nos anos 90 em Buenos Aires, contra a Embaixada de Israel e a Associação Mutual Israelita Argentina, que deixaram um total de 115 mortos.

Alberto Nisman, um dos procuradores do caso, acusou em 2015 a então presidente Cristina Kirchner de tentar acobertar o envolvimento do Irã. Horas antes de apresentar evidências disso ao Congresso argentino, ele foi morto com um tiro na cabeça em seu apartamento.

Lula é muito próximo de Kirchner, além do próprio Irã e de seus principais aliados: China, Rússia e Venezuela. Isso poderia servir de incentivo para Hezbollah e Irã agirem no Brasil, com a expectativa, mesmo que injustificada, de contar com a complacência do governo. Reputação é algo muito importante, e indissociável da segurança. •

segunda-feira, 24 de julho de 2023

O falso salvador do mundo - Lourival Sant’Anna O Estado de S. Paulo

 Grato a Augusto de Franco pela transcrição em seu blog, de onde copiei este artigo de Lourival Sant'Anna. Meus comentários iniciais: 

Não são só posições ideológicas ou princípios moralmente indefensáveis que movem a péssima diplomacia de Lula 3 (como aliás já era em Lula 1 e 2). Ele também exibe distorções notáveis em termos de cálculo estratégico, ao apostar num rápido e incontornável declínio americano e numa indefenida e propriamente indesejável “nova ordem global” numa aliança estreita com duas grandes autocracias que estão a anos-luz de distância de nossa própria régua moral, em democracia e DH. Pretende levar o Brasil a embarcar na canoa furada do Brics, claramente dominado pelo peso dos interesses nacionais chineses? E agora russos? O Itamaraty se submete passivamente a todas essas loucuras? (PRA)


O falso salvador do mundo

Lourival Sant’Anna, O Estado de S. Paulo (23/07/2023)

Lula embarcou em uma fantasia calcada em premissas moralmente indefensáveis

O forte viés ideológico da política externa do governo Lula cria fraturas na América Latina e inviabiliza o exercício da liderança que naturalmente caberia ao Brasil. A complacência de Lula com as ditaduras russa, venezuelana e nicaraguense, assim como sua repulsa ao livre-comércio e ao Ocidente, anulam o peso da credencial do presidente no que realmente interessa ao mundo quando olha para o Brasil: a proteção ambiental.

O desmatamento da Amazônia foi reduzido em 34% no primeiro semestre deste ano. A conquista confirma as incomparáveis credenciais de Lula e da ministra Marina Silva, que conseguiram reduzir o desmatamento em 84% entre 2004 e 2012, enquanto o PIB do agronegócio crescia espetaculares 75%.

Lula poderia surfar nesse inestimável capital, para extrair concessões de Europa e EUA. Mas prefere atacar a ambos, responsabilizando-os pelo flagelo da Ucrânia, pela corrida armamentista e pela inflação de alimentos, como se não fossem consequências da guerra expansionista de Vladimir Putin.

A palavra “Rússia” não pôde sequer constar da declaração final da cúpula União Europeia-América Latina, por causa da preocupação do governo brasileiro em não melindrar o ditador russo. Para indignação do presidente do Chile, Gabriel Boric: “Hoje é a Ucrânia, amanhã pode ser qualquer um de nós”.

Outro presidente de esquerda, Gustavo Petro, da Colômbia, também criticou o imperialismo russo. Depois descambou para denunciar a invasão de Iraque, Líbia e Síria. Cobri as três guerras para o Estadão. A invasão do Iraque foi um crime, mas os EUA não colonizaram o país, como a Rússia tenta fazer com a Ucrânia. Líbia e Síria foram palcos de revoluções populares que receberam apoio ocidental.

FRATURAS. Boric e os presidentes do Paraguai, Mario Abdo Benítez, e do Uruguai, Luis Alberto Lacalle Pou, já haviam se insurgido contra o desagravo de Lula ao ditador Nicolás Maduro na véspera da cúpula sulamericana, em 30 de maio, em Brasília. Lula justificou com a pérola “democracia é um conceito relativo”. Os presidentes de Equador e Peru também rejeitam essas posições.

Por causa de seu apoio ao chavismo desde sempre, Lula não goza da confiança da oposição venezuelana para mediar uma negociação entre ela e o regime.

Por fim, com sua iniciativa de reabrir o acordo com a UE para proteger o mercado de compras governamentais, Lula também frustra Uruguai e Paraguai, e futuramente a Argentina, com a saída de cena de seu amigo Alberto Fernández, nas eleições de outubro.

Lula trocou oportunidades reais de liderança e benefícios para o Brasil por uma fantasia de salvador do mundo, calcada em premissas moralmente indefensáveis.

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia: SALVANDO A PRÓPRIA PELE! - Lourival Sant’Anna (O Estado de S. Paulo)

 SALVANDO A PRÓPRIA PELE!


Lourival Sant’Anna
O Estado de S. Paulo, 09/10/2022 

Ao longo desses sete meses de guerra, uma pergunta me tem sido feita constantemente: como ela vai terminar? A resposta sempre residiu na situação política de Vladimir Putin. Pois sempre sustentei que essa não é uma guerra movida por fatores geopolíticos, mas pela intenção de Putin de se perpetuar no poder.

Nas últimas semanas, os ucranianos recuperaram milhares de quilômetros quadrados no nordeste e centenas no sul. Desde a fantasiosa anexação das províncias de Luhansk, Donetsk, Kherson e Zaporizhzia, no dia 30, os russos perderam território nas quatro, deixando para trás soldados mortos e equipamentos.

Estima-se que 60 mil militares russos tenham sido mortos desde fevereiro, entre eles integrantes das forças especiais e oficiais de alta patente. A mobilização decretada no dia 21 apenas agravará o problema. Os recrutas estão sendo enviados sem treinamento, equipamento e comando adequados.

INVERNO. Tragicamente, eles desempenharão o papel de carne de canhão – uma contenção temporária aos avanços ucranianos, enquanto Putin imagina os próximos passos, com o auxílio do inverno, que também pode frear a contraofensiva.

A dinâmica no terreno tornou realista o objetivo ucraniano de recuperar todo o território perdido, desde a primeira invasão, em 2014. Isso inclui a Crimeia. Essa reconquista teria impacto político devastador sobre Putin: como justificar a morte de dezenas de milhares de russos?

O emprego de uma ou mais armas nucleares táticas não mudaria o quadro. Os ucranianos, motivados e equipados, continuariam avançando. E o cruzamento dessa linha vermelha causaria envolvimento mais direto da Otan.

MANOBRA. Restaria a Putin tentar mascarar a derrota como vitória, recrudescer o controle sobre a internet e calar os ultranacionalistas, que têm denunciado a incompetência das Forças Armadas russas.

A probabilidade de golpe continua baixa. Os russos com ambições políticas estão exilados, presos ou mortos. A Rússia não tem histórico de golpes militares. Mas as tensões internas crescem rapidamente.

Depois de se queixar do sacrifício de seus homens e do alto custo das derrotas na Ucrânia, o líder checheno Ramzan Kadyrov foi condecorado general por Putin na tentativa de apaziguá-lo. Yevgeni Prigozhin, amigo de Putin e dono do grupo mercenário Wagner, também tem criticado acidamente as Forças Armadas.

Segundo a página gulagu.net no Telegram, um mercenário atirou contra um tenente-coronel em Donetsk, e não foi o primeiro incidente. A ascensão dessas milícias, a desmoralização das Forças Armadas e a revolta da população com as mortes e a mobilização poderiam conduzir a uma guerra civil. Para se concentrar em salvar a própria pele, Putin pode ter de se desengajar da Ucrânia.