O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quarta-feira, 5 de junho de 2024

As ideias conservadoras (novamente) explicadas a revolucionários e reacionários - livro de João Pereira Coutinho - Martim Vasques da Cunha

 Edmund Burke foi o nosso Virgílio nos labirintos da ideologia política

They understood that wisdom comes of beggary.

W.B.Yeats, “The seven sages”

A reedição brasileira de um livro como As ideias conservadoras (novamente) explicadas a revolucionários e reacionários (Editora Almedina), de João Pereira Coutinho, é de grande importância para o nosso mundo intelectual não porque o autor seja meu amigo (afinal, somos obrigados a fazer full disclosure de nossas relações em homenagem à honestidade intelectual que nos une), mas sim porque o seu assunto, mesmo que pareça cifrado ou distante demais do nosso cotidiano, é essencial para que se entenda as engrenagens políticas que estão em jogo, seja no aspecto nacional como internacional. 

O tópico sobre qual é o significado destas palavras repletas de insinuações maliciosas – conservadorismoconservadorreacionáriofascista – chegou a tal ponto de incompreensão, para não dizer de estultice, que a mera leitura de algumas páginas deste pequeno e elegante volume é uma lufada de ar fresco em um debate que não existe mais – e, se alguma vez existiu, é certeza de que já começou viciado.

João Pereira Coutinho tem um estilo claro, direto que, sobretudo, não banaliza o assunto – muito pelo contrário, ele faz algo improvável para um livro de apenas 107 páginas: contribui com novas ideias, faz o leitor pensar em novas perspectivas e, mais, o retira daquela zona de conforto da qual a suposta “nova direita” tupiniquim sempre caiu, constituída no binômio maniqueísta do “nós” contra “eles” quando, na verdade, todos estão no mesmo barco e ignoram se rumam ou não rumo a um naufrágio.

Todavia, ao mesmo tempo, o livro apresenta um problema, cuja culpa não é sua ou a de seu autor, mas sim do leitor que irá encarar suas linhas. A pergunta que ficará para este sujeito será a seguinte: E o que eu tenho a ver com isso? Porque o livro não dialoga – e nem é mesmo a sua intenção primeira – com o público brasileiro, sequer o lusitano, apesar de ser escrito justamente na língua de ambos os países. O seu público é o anglo-saxão – e isto não é uma má notícia. Pelo contrário: Pereira Coutinho nos apresenta a um mundo que todos nós deveríamos ter acesso – e que foi infelizmente negado por causa de anos de lobotomia em uma cultura da estupidez institucionalizada. E quando falo de “mundo anglo-saxão”, não estou a falar de The Smiths, Echo & The Bunnymen, Lennon & McCarthy e Monty Phyton; falo do filósofo Roger Scruton, do cientista político Anthony Quinton, do grande Michael Oakeshott – e do honorável Sir Edmund Burke (1729-1797), considerado o pai do conservadorismo e, no caso de Pereira Coutinho, “o seu Virgílio nos labirintos da ideologia política”.

O honorável Edmund Burke falando ao deserto da Wasteland...


sexta-feira, 31 de março de 2023

A Rússia estaria de volta ao século XIX? O que teria a nos dizer um italiano autor do melhor livro de história intelectual sobre a Rússia?

 Coloco novamente neste espaço algumas notas de leitura do ano passado, já em plena invasão da Ucrânia por Putin, tendo lido o que afigura ser o melhor livro sobre a formação do totalitarismo na Rússia, ainda que dedicado apenas a certa intelligentsia que foi submergida pelo bolchevismo.

Paulo Roberto de Almeida

sábado, 7 de maio de 2022

Os intelectuais, a revolução e o totalitarismo - Franco Venturi sobre os narodniks

   O absolutismo czarista foi combatido, em primeiro lugar, pelos “dezembristas”, no início do século XIX, depois pelos narodniks, os populistas revolucionários, em parte anarquistas, da segunda metade daquele século, depois pelos socialistas de diversas tendências, no início do século XX, para renascer com toda força, sob o disfarce do stalinismo, entre os anos 1930-50, já sob o peso do comunismo


leninista. Depois do fim do comunismo, em 1991, o absolutismo neoczarista assumiu a forma do putinismo cleptocrático e imperialista. Ele já não precisa de Gulags, pois manda assassinar ou encarcerar seus opositores, e não hesita em invadir outros países, como faziam os czares e o tirano Stalin. O novo déspota de Moscou é tão cruel quanto eles, tendo ao seu lado o poder “espiritual” da Igreja Bizantina. Como Stalin, ele não precisa de nenhum Rasputin, mas tem alguns ideólogos a seu serviço. E ainda tem o apoio internacional de muitos idiotas estrangeiros, de esquerda e de extrema-direita. O livro de Franco Venturi (1952) fica nos narodniks; o resto fui eu que opinei.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Cartografia da Esquerda no Brasil - Leandro Eliel (Revista Espaco Academico)


Cartografia da esquerda no Brasil
LEANDRO ELIEL*
Este texto tem uma pretensão modesta: apresentar de maneira sintética o conjunto das organizações de esquerda atuantes, hoje, no Brasil. Certamente haverá erros de informação e resumos polêmicos, motivo pelo qual pedimos a ajuda dos leitores para que possamos corrigir os erros e registrar as divergências na próxima edição desta revista.
Partido dos Trabalhadores
Partido dos Trabalhadores (www.pt.org.br) foi fundado em 1980. Quatro grandes setores confluíram na sua criação:
a) sindicalistas do chamado “novo sindicalismo”, especialmente os metalúrgicos, bancários e petroleiros;
b) militantes de organizações de esquerda atuantes na oposição contra a ditadura (alguns entraram em caráter individual no PT, outros entraram por decisão de suas respectivas organizações);
c) lideranças populares formadas pelas pastorais e comunidades da Igreja Católica, especialmente do setor progressista;
d) parlamentares e lideranças atuantes no Partido do Movimento Democrático Brasileiro, o PMDB (durante muitos anos, o único partido de oposição legalizado no país).
Desde a sua fundação, o PT abrigou diferentes correntes de opinião, geralmente denominadas de tendências. A primeira tentativa de disciplinar a existência de tendências no interior do Partido ocorreu no 5º Encontro Nacional do PT, em 1987. A segunda tentativa ocorreu no Primeiro Congresso do PT, em 1991.
Uma compreensão do papel jogado pelas tendências no interior do PT deve levar em conta pelo menos duas variáveis: as posições políticas defendidas por estes grupos e a atitude geral que adotavam frente ao Partido.
De 1983 a 1993, por exemplo, existia uma tendência hegemônica e majoritária em âmbito nacional: a Articulação, cujas posições se refletiam nas resoluções partidárias.
Competindo com a Articulação, havia algumas lideranças e agrupamentos informais com posições mais moderadas (exemplo disso são os parlamentares que defenderam votar em Tancredo Neves no Colégio Eleitoral). E havia, também, lideranças e agrupamentos com posições mais radicalizadas.
A maioria destes agrupamentos tivera origem anterior ou exterior ao PT. É o caso da Democracia Socialista (Organização Revolucionária Marxista/Democracia Socialista), do Partido Revolucionário Comunista (PRC), do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, da Organização Socialista Internacionalista (O Trabalho), da Ala Vermelha, da Convergência Socialista, entre outros.
Entre 1991 e 1995, em decorrência dos acontecimentos e debates descritos, ocorrem profundas alterações na vida interna do PT. Em primeiro lugar, todas as tendências passam a se considerar como “tendências internas” de um “partido estratégico”. Em segundo lugar, a Convergência Socialista e outros grupos saem do PT, criando o PSTU. Em terceiro lugar, a tendência majoritária passa por um processo de cisão, dando origem à Articulação Unidade na Luta e à Articulação de Esquerda. Em quarto lugar, lideranças e tendências situadas à esquerda e à direita da Articulação, invertem seus papéis (é o caso de Plínio de Arruda Sampaio, líder moderado nos anos 1980 e líder radical nos anos 1990; é o caso, também, de José Genoíno, que faz o percurso inverso).
De 1995 até o final de 2003, o quadro interno se estabiliza da seguinte forma. Um grupo majoritário denominado, talvez para que não restasse dúvida, de “Campo majoritário”, composto basicamente pela Articulação Unidade na Luta e pela Democracia Radical (esta por sua vez, oriunda da aliança do ex-PRC com outros setores). Uma esquerda, com quatro expressões mais conhecidas, a saber: a Democracia Socialista, a Articulação de Esquerda, a Força Socialista e O Trabalho. E um centro, cuja expressão principal viria a formar o chamado “Movimento PT”, agrupamento de lideranças parlamentares e grupos regionais.
No final de 2003, a expulsão de Heloísa Helena e de três deputados federais é o marco inicial de um novo processo de alteração no quadro interno. Em primeiro lugar, o Movimento de Esquerda Socialista e a Corrente Socialista dos Trabalhadores (duas tendências oriundas da antiga Convergência Socialista), acompanhadas de um número significativo de lideranças de esquerda independentes, saem do PT ainda em dezembro de 2003 e criam o PSOL. Outro grupo expressivo de petistas filia-se ao PSOL entre os meses de setembro e outubro de 2005. É o caso da Ação Popular Socialista (tendência resultante da fusão da antiga Força Socialista com outros grupos), de Plínio de Arruda Sampaio, de vários deputados federais e de certo número de militantes oriundos de várias tendências da esquerda petista ou independentes. Em segundo lugar, lideranças até então vinculadas ao “Campo majoritário” ou independentes de expressão desligam-se do PT, indo para outros partidos ou ficando sem filiação partidária (é o caso, por exemplo, de Hélio Bicudo, Cristovam Buarque e de Chico Whitaker). Em terceiro lugar, a crise de 2005 e o processo de eleição das novas direções partidárias altera a força do antigo “Campo majoritário”, que deixa de ter a maioria absoluta no Diretório Nacional do PT.
De 2005 em diante a esquerda partidária passa por um processo de divisão e redução de sua influência, que se expressa nos resultados das eleições internas. Em 2007 a correlação de forças se mantém quase inalterada, com a diferença de que dois representantes moderados disputam o segundo turno, Ricardo Berzoini (CNB) contra Jilmar Tatto (PTLM), com a vitória de Berzoini. Em 2009, a CNB compõe uma chapa com o PTLM e NR elegendo a maioria absoluta dos membros no Diretório Nacional e, no primeiro turno, conquistam também a presidência do PT com José Eduardo Dutra, que logo depois, por problemas de saúde, se afasta da presidência. O Diretório Nacional elege Rui Falcão para ocupar a presidência. Em 2013, num processo eleitoral bastante criticado, setores partidários que estavam no centro ou na esquerda petista aderem a candidatura do grupo majoritário para a presidência do PT.
As principais tendências do PT
Construindo um novo Brasil(www.contruindoumnovobrasil.com.br), também conhecida pela sigla CNB: oriunda da Articulação dos 113, passando pela Articulação Unidade na Luta e pelo Campo Majoritário. Reivindica o programa democrático e popular, concentrando esforço cada vez maior na luta institucional como caminho para as mudanças. No PED 2013 apoiou Rui Falcão, da tendência Novo Rumo, à presidência nacional do PT.
Novo Rumo (NR), originalmente uma cisão paulista da Articulação de Esquerda. Possui uma orientação política similar à da CNB, privilegiando uma estratégia institucional.
Partido de Luta e de Massas (PTLM, www.ptlmnacional.org.br): originário da Articulação Unidade da Luta. Também possui uma trajetória política similar à da CNB, privilegiando uma estratégia institucional. No PED 2013 apoiou Falcão à presidência nacional do PT.
Movimento PT (MPT, www.movimentopt.com.br): reúne oriundos de diferentes setores do Partido. Busca situar-se no centro, fazendo críticas ao campo majoritário e a esquerda petista. No PED 2013 apoiou Rui Falcão à presidência nacional do PT.
Esquerda Popular e Socialista (EPS, www.esquerdapopularsocialista.com.br): grupo originário da fusão entre a Tendência Marxista e um grupo que em 2011 saiu da AE. Define-se como marxista, defende a articulação das lutas sociais e institucionais na construção de uma sociedade socialista. No PED 2013 apoiou Rui Falcão à presidência nacional do PT e participou da chapa do Movimento PT.
Brasil Socialista (BS): tendência oriunda do antigo PCBR, compondo durante quase toda a história do PT o campo de esquerda. Foi a principal corrente a impulsionar a fundação do Movimento de Libertação dos Sem Terra (MLST). No PED 2013 apoiou Rui Falcão à presidência nacional do PT.
Mensagem ao Partido (www.mensagemaopartido.com.br): campo integrado por diversas personalidades, grupos regionais e por uma tendência nacional, a Democracia Socialista (DS). Entre 2003 e 2005, ao mesmo tempo que uma parte de seus integrantes funda o PSOL, o grupo majoritário na DS rompe seus vínculos com o Secretariado Unificado da Quarta Internacional e reorienta-se internamente no PT, passando a defender uma estratégia conhecida como “revolução democrática”. A Mensagem ao Partido lançou candidatura própria no PED 2007, 2009 e 2013. Antes disso, a DS já havia lançado candidatura própria no PED 2001 e 2005.
Militância Socialista (MS, www.militanciasocialista.org): fusão de diversas tendências regionais. Defende a articulação da luta social com a luta institucional, na defesa de reformas estruturais mais amplas. Compõe a esquerda petista. No PED 2009 apoiou a candidatura da Articulação de Esquerda. No PED 2013 lançou candidatura própria.
Articulação de Esquerda (AE, www.pagina13.org.br): cisão da Articulação dos 113, surgida em 1993 com o lançamento do manifesto “Hora da Verdade”. A AE defende uma estratégia e um programa democrático-popular e socialista. Lançou chapa e candidatura própria em todos os PED, desde 2001 até 2013. Edita o jornal Página 13.
O Trabalho (OT, www.otrabalho.org.br): oriunda da Organização Socialista Internacionalista, a tendência trotskista O Trabalho passou por uma importante cisão nos anos 1980, quando parte importante de sua militância adere a Articulação dos 113. Outra cisão ocorreu por volta de 2007, dando origem a um agrupamento denominado Esquerda Marxista. Reivindica a Quarta Internacional. Edita o jornal O Trabalho. Lançou chapa e candidatura própria em todos os PED, desde 2001.
Esquerda Marxista (EM, www.marxismo.org.br): cisão de O Trabalho. Filiada à Corrente Marxista Internacional, luta pela reconstrução da Quarta Internacional. Sua estratégia política é orientada pelo Programa de Transição de Trotski. Edita o jornal Esquerda Marxista. Desde que surgiu, participou com chapa e candidatura própria no PED nacional.
Partido Democrático Trabalhista (PDT)
O PDT, criado em 1979, é fruto da reorganização do trabalhismo histórico que atuava no PTB até extinção dos partidos políticos pela ditadura militar. Impedido pelos militares de controlar a legenda do PTB, Leonel Brizola, junto com outras lideranças, funda o PDT. Defende que a propriedade privada deve ser preservada e submetida ao bem estar social e a um Estado normativo. Em 1989, nas eleições presidenciais, Leonel Brizola quase foi para o segundo turno, momento em que apoiou a candidatura de Lula contra a de Collor. Em 1994, candidata-se novamente e obtém uma votação muito baixa. Em 1998, é candidato a vice-presidente na chapa de Lula, quando são derrotados por Fernando Henrique Cardoso. Nas eleições de 2002, o PDT apoia a candidatura de Ciro Gomes (PPS). Em 2006, lança Cristovam Buarque. Em 2010 apoia a candidatura de Dilma Rousseff (PT). O PDT edita o jornal O Trabalhador.
Partido Socialista Brasileiro (PSB)
O PSB, fundado em 1947 pela Esquerda Democrática, reorganiza-se em 1985, mantendo o mesmo programa e estatuto de origem. Defende um programa socialista gradual e legal, que preserve a propriedade privada. Nas eleições presidenciais de 1989, 1994 e 1998, o PSB apoiou a candidatura de Lula. Em 2002, lançou candidatura própria, a de Antony Garotinho, apoiando Lula no segundo turno. No primeiro turno de 2006 não apoiou formalmente nenhuma candidatura, apoiando Lula no segundo turno. Em 2010 apoiou a candidaturas Dilma Rousseff. Em 2013, sem conseguir organizar a própria legenda, Marina Silva filia-se ao PSB e soma esforços com os socialistas para viabilizar a oposição ao Governo Dilma.
Partido Socialismo e Liberdade (PSOL, www.psol50.org.br)
Em 2003, o PT expulsa a deputada federal Luciana Genro e os deputados federais Babá e João Fontes, assim como a senadora Heloisa Helena. O motivo imediato da expulsão foi a reforma da previdência. Afirmando que o PT havia abandonado seu projeto estratégico socialista, esses parlamentares e setores da esquerda petista (como o Movimento de Esquerda Socialista e a Corrente Socialista dos Trabalhadores) iniciam a construção de um novo partido, regularizado em 2005, com o nome de PSOL. Naquele mesmo ano ganham o reforço de outros setores petistas, entre eles a tendência APS e lideranças como Plínio de Arruda Sampaio, Chico Alencar e Marcelo Freixo, entre outras.
Em 2006, o PSOL lança a candidatura de Heloisa Helena para a Presidência da República, numa coligação que contava com o PSTU e o PCB. Tendo como vice César Benjamin, até então um dos teóricos da chamada Consulta Popular, Heloisa Helena obtém 6,85% dos votos, ficando em terceiro lugar na corrida presidencial. Nas eleições de 2010, Heloisa Helena não aceita a candidatura a Presidência, preferindo a candidatura ao Senado pelo estado de Alagoas. Apesar da eleição dada como certa, não obteve sucesso, ficando em terceiro lugar. Em seguida, a ex-senadora renuncia a seu mandato na presidência do PSOL. Nesse ano, Plínio de Arruda Sampaio é o candidato do PSOL à presidência da República, sem conseguir fazer aliança com PSTU e PCB, que lançam suas próprias candidaturas presidenciais. Plínio recebe apenas 0,87% dos votos, ficando em quarto lugar. Em 2014, depois de um Congresso partidário marcado por denuncias de fraudes e pela rejeição de prévias internas, o senador Randolfe Rodrigues é escolhido como candidato do PSOL à Presidência da República. Em seguida, a Insurgência, tendência da esquerda psolista, lança a candidatura de Renato Roseno e reivindicou a realização de uma Conferência Eleitoral. Edita o jornal Página 50.
Atualmente, dois campos disputam o controle do partido: um setor moderado e majoritário (Unidade Socialista), capitaneado atualmente pela APS e por diversos grupos regionais; e um setor radicalizado (Bloco de Esquerda), composto por Insurgência, MES, APS-Corrente Comunista, CST, LSR, Plínio de Arruda Sampaio, Carlos Gianazzi, entre outras organizações e lideranças. Entre eles o Coletivo Rosa Zumbi, que lançou tese própria (PSOL Necessário) no último Congresso, originando-se de um racha da APS.
Recentemente, o MES, segunda maior corrente interna, indicou Luciana Genro candidata a vice na chapa à Presidência da República, consolidando uma nova maioria na agremiação.
A relativa hegemonia do campo moderado foi consolidada após a renúncia de Heloisa Helena, que foi presidente do partido entre 2004 e 2010, e que teve sua filiação ao PSOL questionada pela colaboração com a construção da Rede Sustentabilidade de Marina Silva. Afrânio Bopré (APS), naquele momento, assumiu a presidência do PSOL, ficando até 2011, quando Ivan Valente (APS) foi eleito para o cargo num mandato de dois anos. Em 2013, o setor moderado, a Unidade Socialista, obteve 52% dos votos dos/as delegados/as, indicando Luiz Araújo (APS) como presidente do PSOL, enquanto o Bloco de Esquerda conquistou 45% e o PSOL Necessário 3% dos votos. Na atual executiva nacional o setor moderado possui dez representantes, enquanto o Bloco de Esquerda possui nove, configurando um acirrado processo de disputa interna.
As principais tendências do PSOL
Ação Popular Socialista / Corrente Comunista (APS-CC,http://pt.wikipedia.org/wiki/A%C3%A7%C3%A3o_Popular_Socialista): oriunda do Movimento Comunista Revolucionário e da Força Socialista, antigas tendências internas do PT, a APS adere ao PSOL em 2005, tornando-se a principal corrente partidária, mesmo com o racha de 2012/2013. No último congresso elegeu o presidente do Partido, compondo o campo moderado.
Movimento Terra, Trabalho e Liberdade (MTL): organização anterior à fundação do PSOL, que inicialmente reunia organizações atuantes no campo (MLST de Luta, MT e MLS) e que atraiu militantes de setores urbanos, principalmente do serviço público, tornando-se uma tendência do PSOL. Em 2012, com críticas “ao processo de moderação”, importantes lideranças do RJ e ES rompem com a tendência. Após as denuncias de retenção de verbas de assessores contra uma parlamentar do PSOL-RJ, o MTL dissolveu-se, tendo parte de seus integrantes aderido a Rede Sustentabilidade.
Movimento de Unidade Socialista-MUS / Fortalecer o PSOL (www.fortaleceropsol.com.br): oriunda da antiga Convergência Socialista, da CST e do MES, entre outros militantes que atuavam no PT. Também conhecidos como Fortalecer o PSOL, título da tese apresentada no 3º Congresso. No último congresso, junto com a APS e o MTL, compôs o campo moderado.
Somos PSOL : tendência com pouca expressão e que no último congresso compôs o campo moderado. Defende uma visão “de que estamos vivendo um momento histórico de transição do capitalismo da Era Industrial, a Era da Informação, que estaria em pleno desenvolvimento, a internet e sua arquitetura interna — em sua versão de uso 2.0 –, seria uma nova geografia, digitalizada, que permitiria aos seres humanos uma experiência sensorial intersubjetiva única e revolucionária na história da humanidade”.
Insurgência (www.insurgência.org): surge em 2013, fruto da fusão entre o Coletivo Socialismo e Liberdade (CSOL), racha do PSTU; o ENLACE e o Coletivo Luta Vermelha, filiado ao Secretariado Unificado da Quarta Internacional. Publica a revista À Esquerda, critica o processo de moderação do PSOL, a institucionalização e as alianças promovidas nas últimas eleições.
Movimento Esquerda Socialista (MES, www.lucianagenro.com.br/mes/): oriunda da antiga Convergência Socialista, o MES entra no PSOL e torna-se a segunda maior tendência interna, atuando inicialmente próximo à Senadora Heloisa Helena e ao MTL. Defendia posições mais moderadas, inclusive a aliança com o PV, que ocorreu nas eleições de 2008, em Porto Alegre. Desde o II Congresso disputa com a APS o controle do partido. Compõe o Bloco de Esquerda. Luciana Genro, do MES, foi confirmada como candidata a vice-presidência de Randolfe Rodrigues.
Corrente Socialista dos Trabalhadores (CST, www.cstpsol.org): oriunda da antiga Convergência Socialista, atuava no PT. É filiada à Unidade Internacional dos Trabalhadores – Quarta Internacional (UIT-QI). Possui o periódico mensal Combate Socialista. A CST, que compõe o Bloco de Esquerda, acusa a Unidade Socialista de igualar o PSOL aos partidos do sistema.
Coletivo Resistência Socialista (CRS, http://www.resistenciapsol.xpg.com.br/): compõe o Bloco de Esquerda, apresenta críticas a condução da maioria e, alegando fraude, não aceita os resultados do último Congresso e a candidatura de Randolfe Rodrigues à Presidência, exigindo um novo processo.
Ação Popular Socialista / Nova Era (APS/NE, http://psol50sp.org.br/files/2013/07/Tese-da-APS-Congresso-Estadual-Psol.pdf): entre 2012 e 2013 a corrente majoritária APS sofre uma cisão. Surgem daí três agrupamentos: a APS/CC, o coletivo Rosa Zumbi e a APS/Nova Era ou APS de Esquerda, que reuniu, majoritariamente, setores sindicais de juventude críticos às alianças realizadas pela APS em Macapá e Belém. No último congresso compôs o Bloco de Esquerda.
Coletivo Primeiro de Maio (http://primeirodemaio.org/): tendência oriunda do Coletivo Rosa do Povo, é crítica do setor majoritário e da ampliação de alianças promovidas pelo PSOL no último período. No último congresso compôs o Bloco de Esquerda.
Coletivo Rosa Zumbi (http://coletivorosazumbi.wordpress.com/): tendência oriunda do racha da APS, é crítica tanto do setor moderado, por sua excessiva institucionalização, quanto dos setores à esquerda, pelo seu sectarismo. Defende a validade e atualização do Programa Democrático e Popular. No último congresso lançaram chapa própria com apoio do Deputado Federal Chico Alencar.
Liberdade, Socialismo e Revolução (LSR, http://www.lsr-cit.org/): fusão das tendências Socialismo Revolucionário (SR) e Coletivo Liberdade Socialista (CSL), filiada ao Comitê por uma Internacional do Trabalhadores (CIT), trotskista, publica o jornal Ofensiva Socialista. Crítica dos rumos adotados pela maioria, assinou junto com o Grupo de Ação Socialista (GAS) e o Reage Socialista uma tese no último congresso, compondo também o Bloco de Esquerda.
Trabalhadores na Luta Socialista (TLS, http://trabalhadoresnalutasocialista.blogspot.com.br/): agrupamento com maior expressão em São Paulo, crítico do setor majoritário e compôs o Bloco de Esquerda no último congresso.
Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU,www.pstu.org.br)
O PSTU originou-se da Convergência Socialista, tendência petista expulsa em 1991. No interior do PT, não consideravam o partido como estratégico pra a revolução socialista. Entre 1991 e 1994, a partir da junção com outros setores, fundam o PSTU. Posteriormente, romperam com a CUT e construíram a CONLUTAS, que originou a Central Sindical e Popular (CSP) – Conlutas. Trotskista, está vinculado à Liga Internacional dos Trabalhados – Quarta Internacional (LIT-QI).
O PSTU não prioriza o processo eleitoral, alegando que é um jogo de cartas marcadas, sendo apenas um momento de propaganda do programa. As eleições de parlamentares do partido servem como “ponto de apoio para as lutas sociais”. Participou das eleições de 1994, apoiando criticamente Lula. Em 1998, 2002 e 2010 lançou candidatura própria, a do metalúrgico José Maria. Em 2006, em aliança com PSOL e PCB, apoiou a candidatura de Heloisa Helena (PSOL).
Defende uma estratégia socialista, revolucionária, liderada pelo operariado industrial, aliado aos setores explorados do campo e da cidade, sem alianças com outras classes ou setores de classes, que impulsionaria a revolução internacional. Defende a construção de um partido revolucionário, coeso e sem tendências. As divergências são expressas apenas durante os processos congressuais. Publica o jornal Opinião Socialista.
Partido Comunista Brasileira (PCB, www.pcb.org.br)
Fundado em 1922, o Partido Comunista do Brasil muda de nome em 1962, passando a chamar-se Partido Comunista Brasileiro. O grupo contrário a esta mudança de nome dá origem, também em 1962, ao PCdoB. Após o Golpe Militar, o PCB passa por diversas cisões, originando agrupamentos que optaram pela luta armada contra a ditadura. No início da década de 1980, Luis Carlos Prestes, até então a principal liderança comunista do Brasil, também rompe com o PCB. Lança Roberto Freire candidato à Presidência da República em 1989. Em 1992, um congresso partidário aprova a extinção do PCB e a criação do Partido Popular Socialista (PPS). A minoria do congresso não aceita a decisão e consegue recuperar na justiça o direito a utilizar a sigla PCB. Nas eleições presidenciais de 1994 a 2002, o Partido Comunista Brasileiro apoia o candidato do PT. Nas eleições de 2006, em coligação com o PSOL e PSTU, apoia a candidata presidencial Heloisa Helena (PSOL). Em 2010, lança candidatura própria, a de Ivan Pinheiro. Para 2014, a pré-candidatura de Mauro Iasi foi lançada.
O PCB atual faz uma autocrítica da visão etapista da revolução brasileira, defendendo que as transformações necessárias seriam de caráter socialista. Essa análise inclui a crítica do programa e da estratégia democrático-popular proposta pelo PT. O PCB defende a construção do Poder Popular, que não é apenas um fórum de organizações de esquerda, mas um processo de articulação tática e estratégica de construção de espaços contra hegemônicos na luta cotidiana que evolua para a construção da dualidade de poderes, construindo assim o embrião do Estado proletário.
O PCB não permite a existência de correntes internas, defendendo um partido formado por militantes e quadros. Sua principal publicação é o jornal Imprensa Popular.
Partido Comunista do Brasil (PCdoB, www.pcdob.org.br)
O PCdoB, organizado em 1962, reivindica a tradição histórica do Partido Comunista fundado em 1922. Durante a ditadura militar, o PCdoB organizou a guerrilha do Araguaia. Desde 1962 até os anos 1990, o PCdoB defende uma estratégia etapista. Possui forte presença na UNE e na Ubes, através da União da Juventude Socialista (UJS); uma importante presença no movimento sindical, através da CTB; e uma representação institucional em todos os níveis. O PCdoB não permite tendências internas. Mantém o site Vermelho e publica o jornal A Classe Operária. Desde 1989, apoiou todas as candidaturas presidenciais do PT, participando dos governos Lula e Dilma.
Partido Pátria Livre (PPL)
Oriundo do Movimento Revolucionário 8 de Outubro, que não se legalizou como partido e atuava no interior do PMDB. Em 2008 o MR-8 decidiu sair do PMDB e criar um partido. O PPL orienta-se, segundo seu estatuto, pela teoria do socialismo científico, defendendo a constituição de uma ampla frente nacional, democrática e popular para completar a independência do Brasil.
Partido da Causa Operária (PCO)
O PCO originou-se de uma cisão da OSI, organização trotskista existente anteriormente ao PT. Ingressa no PT como tendência interna, desde 1980. Conhecida como Causa Operária, denominação do seu jornal, publicado até hoje, durante o processo eleitoral de 1989 questiona as alianças do PT com o PSB, iniciando um processo de rompimento com o partido. A partir de 1991, o PCO inicia seu processo de legalização, obtendo o registro provisório em 1995. Em 1997, consegue o registro definitivo. Nas eleições de 1994, apoia criticamente a candidatura de Lula. Em 2002, 2006 (candidatura indeferida pelo TSE) e 2010 lançou candidato à Presidência, o jornalista Rui Costa Pimenta.
Defende uma estratégia socialista revolucionária, baseada na aliança operário-camponesa, liderada pela classe operária. Defende a construção de um partido revolucionário para cumprir esse papel, sem tendências internas.
Partido Comunista Revolucionário (PCR)
O PCR foi formado inicialmente por militantes que romperam com o PCdoB em 1966. Organizado principalmente no nordeste brasileiro, quase desaparece durante a ditadura, fundindo-se com o MR-8 em 1981. Em 1995, por conta das divergências com a linha nacionalista do MR-8, o núcleo original do PCR rompe com a organização e refunda o partido. O PCR edita o jornal A Verdade e defende a reconstrução de uma Internacional Comunista, participando da Conferência Internacional de Partidos e Organizações Marxistas-Leninistas (CIPOML).
Liga Bolchevique Internacionalista (LBI,http://www.lbiqi.org)
A LBI é uma cisão à esquerda da Causa Operária, motivada pela avalição de que esta organização adaptou-se à burocracia lulista. Defende a reconstrução trotskista da Quarta Internacional. É contrária a formação de Frentes de Esquerda, sendo que em 1998 defendeu o voto nulo nas eleições presidenciais. Defende a greve geral revolucionária para a derrubada imediata do Estado. Edita o jornal Luta Operária e a revista Marxismo Revolucionário.
Liga Estratégica Revolucionária (LER-QI, http://www.ler-qi.org/)
A LER-QI foi fundada em 1999, com duras críticas ao PSTU e ao morenismo, criticadas por serem “variantes deformadoras do trotskismo”. Defende o programa de transição de Trotski e um programa revolucionário de tomada do poder, desferindo duras criticas às possibilidades institucionais. Edita o jornal Palavra Operária.
Partido Operário Revolucionário (POR,http://www.pormassas.org/site/index.htm)
O POR, fundado em 1989, trotskista, é uma cisão à esquerda da Causa Operária, motivada pela avaliação de que esta teria abandonado a perspectiva da ditadura do proletariado. Em 1990 defende o voto nulo nas eleições. Define-se como um embrião do partido revolucionário. Edita o jornal Massas.
Movimento Negação da Negação (MNN,http://www.movimentonn.org/?cat=4)
O MNN, trotskista, foi criado em 2005 com críticas ao PT por sua conciliação de classes e com o capital internacional. Critica o PT e a esquerda petista por duas questões principais: a ilusão que nutre sobre as possibilidades de administração do Estado e ao rebaixamento da luta sindical. Defende um programa transitório para o socialismo expresso no Programa Único, na construção da dualidade de poderes como preparação da construção do socialismo.
Fundada em 1997, em torno de um programa nacionalista de esquerda (o Projeto Popular para o Brasil). A Consulta Popular é crítica do que denomina de esquerda eleitoral.
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LEANDRO ELIEL é historiador, professor da Faculdade Fleming-Uniesp. Publicado originalmente na Revista Esquerda Petista, n. 1, março de 2014.

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