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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

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terça-feira, 17 de agosto de 2010

Brasil: grande exportador de commodities, mas nao mais de café

Um século atrás, mais de 70% do valor das exportações brasileiras era café: o café era o Brasil e o Brasil era o café.
Cem anos depois, o café representa menos de 3% das exportações totais do Brasil. Uma história de sucesso na substituição... por outras commodities, pois a soja vai a mais de 10% da pauta...
Brasil, bastante diferentes, mas sempre igual...
Paulo Roberto de Almeida

O café decola
Celso Ming
O Estado de S.Paulo, 13 de agosto de 2010

A colheita de café deste ano está terminando. Se as estimativas da Conab se confirmarem, serão 47 milhões de sacas de 60 kg. O IBGE prevê pouca coisa menos, 45,8 milhões. Alguns analistas do setor, mais otimistas, confiam numa safra recorde de 55 milhões de sacas. A conferir.

Mas a principal novidade não está no volume da produção e, sim, no preço em que será vendida. As cotações, que vinham a mais de uma década se arrastando, estão em franca recuperação. Em junho, o produto atingiu o maior preço em 12 anos na Bolsa de Nova York e, desde então, não parou de subir. Neste ano, foi a segunda commodity agrícola que mais valorizou: 29,09%, só ultrapassada pelo trigo (alta de 29,73%). Na Bolsa de São Paulo, a esticada no mesmo período segue ritmo parecido: 25,76%. Sexta-feira, no mercado futuro em Nova York, os contratos com vencimento em setembro terminaram o dia a 174,10 centavos de dólar por libra-peso. Aqui em São Paulo, a saca de 60 kg foi negociada a U$$ 209,00.

São três as molas propulsoras dos preços: quebra de produção nos anos anteriores, redução dos estoques e mais consumo. O mercado está cada vez mais interessado por cafés do tipo arábica. Os produtores da Colômbia e da América Central, fornecedores importantes dessa variedade, vêm apresentando quedas na produção em consequência de clima adverso e só voltarão a abastecer o mercado no fim deste ano.

Os estoques mundiais (de todos os tipos de café) estão caindo. Em 2003, eram de 73 milhões de sacas. Neste ano, devem ser de apenas 33,5 milhões de sacas. No Brasil, encolheram ainda mais: caíram de 23 milhões de sacas em 2003 para 9 milhões de sacas em 2009.

Por outro lado, cada vez mais gente no mundo não abre mão do seu cafezinho ou, como preferem os americanos, da sua xícara grande de café. É o fator que, desde 1990, vem puxando o consumo global a uma média anual de 2,2%. Em 2010, o consumo deve atingir 134 milhões de sacas contra uma produção que não deverá passar das 130 milhões de sacas (as estimativas são da Organização Internacional do Café – OIC).

As projeções de aumento do consumo para o Brasil, o segundo maior mercado do mundo, são ainda mais expressivas. Estatísticas da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), puxadas pelas boas previsões para o crescimento do PIB, dão conta de que o consumo brasileiro deverá aumentar 5% em volume neste ano, para 19,31 milhões de sacas de 60 kg.

Diante desse quadro de baixa oferta e de forte demanda, grande parte dos analistas acredita que os preços altos irão se manter por um bom tempo, tanto no mercado internacional quanto no doméstico.

O cafeicultor Luiz Suplicy Hafers está farejando mais. Está prevendo um “squeeze” na Bolsa de São Paulo, ou seja, uma escassez repentina. Mas os analistas Tito Gusmão, da XP Investimentos, e Rodrigo Costa, da corretora Newedge, entendem que esta é uma aposta pouco provável, já que a safra cheia em fase final de colheita por aqui será mais do que suficiente para honrar os contratos.

No gráfico, você acompanha o comportamento, ano a ano, dos estoques mundiais de café.

A história mudou. O Brasil continua sendo o maior produtor e o maior exportador de café do mundo. Mas, se até os anos 70, o café era o principal produto de exportação, hoje a história já é bem diferente…

Participação modesta. Em 2009, as exportações do produto correspondiam a 2,8% das exportações brasileiras, enquanto a fatia da soja alcançava 11,3%.

COLABOROU ISADORA PERON

O Estado sequestrado pelo governo - o caso das agencias reguladoras

Parece que vai ser difícil reconstruir, reconstituir a independência, a autonomia e a seriedade das agências reguladoras. O governo conseguiu colocá-las a seu serviço, numa das involuções mais vergonhosas a que se assistiu nos oito anos do governo atual.
Uma marca lamentável para o Estado brasileiro.
Paulo Roberto de Almeida

Um plano em execução

Editorial - O Estado de S.Paulo, 17.08.2010

O caos nos principais aeroportos brasileiros registrado no início do mês, por causa da mudança do sistema de escala das tripulações da Gol, bem como o ocorrido no fim do ano passado, em decorrência da adoção de um novo sistema de check-in pela TAM, deixaram claras a incompetência operacional da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e sua incapacidade de evitar colapsos como o ocorrido.

Mas a Anac é apenas um exemplo de como, por meio de asfixia financeira, de nomeações de dirigentes sem as qualificações técnicas necessárias para exercer o cargo e até de redução de responsabilidades, o governo Lula vem esvaziando as agências reguladoras, na execução daquilo que tem todas as características de um plano preconcebido.

Agências imunes aos interesses políticos do governo são incompatíveis com a política petista de açambarcamento do Estado Nacional. Por isso, desde o início deste governo, boa parte das verbas orçamentárias das agências vem sendo retida pelo Tesouro Nacional, a pretexto de assegurar o cumprimento das metas de superávit fiscal. No ano passado - como mostrou o Estado na segunda-feira, em reportagem de Renée Pereira - o contingenciamento dessas verbas atingiu um nível recorde.

Deixaram de ser repassados às agências nada menos do que 85,7% das receitas totais a que elas tinham direito, o que tornou impossível a realização de serviços essenciais, especialmente os de fiscalização. Esse número foi levantado pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), com base em dados do Tesouro Nacional.

Criadas para regular e fiscalizar a prestação de serviços públicos por empresas privadas ou estatais, as agências são órgãos do Estado brasileiro, que não deveriam estar subordinados ao governo. Por isso, não estão vinculadas à estrutura dos Ministérios e, assim, não deviam receber ordens do presidente da República, de ministros ou de outros funcionários do Executivo. Para exercer sua função, devem dispor de autonomia financeira, administrativa e operacional, além de amplos poderes de fiscalização e de liberdade para impor sanções.

Mas, com o contingenciamento das suas verbas, o Executivo limita drasticamente a sua capacidade de atuação. Em 2009, por exemplo, a Anac só dispôs de R$ 20 milhões para garantir a operação da aviação civil de acordo com os padrões internacionais de qualidade e segurança. Em 2010, foram autorizados para essa função R$ 34 milhões, mas R$ 10 milhões foram contingenciados.

A sequência de apagões elétricos iniciada em 2009 e que se estendeu até este ano poderia ter sido pelo menos contida, se a Agência Nacional de Energia Elétrica mantivesse a amplitude das fiscalizações. No ano passado, estavam previstas 2.017 fiscalizações, mas, por causa do corte de verbas, só foram executadas 1.866, um número menor do que o de 2008.

A Agência Nacional de Telecomunicações dispõe de receitas que, em 2009, estavam orçadas em R$ 3,8 bilhões. Desse valor, porém, só recebeu R$ 302 milhões.

É isso que explica boa parte da piora da qualidade da atuação das agências nos últimos sete anos.

Mas o governo recorre a outros meios para asfixiar as agências. Um deles é a atribuição a empresas estatais, controladas pelo Executivo, de tarefas típicas de agências independentes. Os contratos para a exploração do petróleo da camada pré-sal, por exemplo, serão definidos pela nova estatal, a Petro Sal. “Esse tipo de medida reduz o poder de decisão das agências”, adverte o professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Carlos Ari Sundfeld.

Há ainda a interferência direta do governo nas agências, por meio da nomeação de diretores de acordo com critérios político-partidários, como acaba de ocorrer com a Agência Nacional de Transportes Terrestres, para a qual foi nomeado um ex-dirigente de basquete cuja experiência mais importante no setor público foi a de assessorar um ex-senador do PMDB. Na verdade, só uma derrota da candidata do PT em outubro salvaria as agências. Se Dilma Rousseff for eleita, a sentença de morte será executada.

Provavelmente não por asfixia, mas por apedrejamento…

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Aos companheiros, tudo
Celso Ming
O Estado de S.Paulo, 16 de agosto de 2010

O governo Lula tem feito enorme confusão entre atribuições de governo e atribuições de Estado, para grande prejuízo do interesse público. A mais gritante está no desempenho das agências reguladoras.

Logo depois de sua posse, em 2003, Lula estranhou que as agências reguladoras, criadas para garantir a observância das regras do jogo nos principais setores da atividade econômica, se comportavam com certa autonomia. Não entendeu que não são organismos do governo, mas são organismos do Estado, como o são o Judiciário e o Banco Central.

Seu aparecimento ficou necessário após o processo de privatização, de maneira a que o Estado (e não o governo) regulasse e fiscalizasse setor por setor. A relativa autonomia e neutralidade é uma decorrência de sua natureza. Para regular isentamente o mercado, as agências não podem ser reféns dos políticos que orbitam o poder. Para isso, os dirigentes de cada agência deveriam ter mandatos fixos, cassáveis apenas em casos de graves transgressões comprovadas da lei.

No entanto, apenas chegou ao Palácio do Planalto, Lula tratou de submeter os cargos de direção das agências às barganhas políticas, dentro do jogo franciscano do “é dando que se recebe”, que vem caracterizando a administração do PT.

Assim, um a um, os dirigentes das agências foram sendo removidos ou enquadrados às determinações comandadas pela Presidência da República. Foi assim que a Anatel, o organismo que deveria regular o mercado de telefonia, passou a permitir estranhos movimentos e outras tantas fusões e confusões, cujo resultado mais importante foi beneficiar controladores de algumas companhias.

Outro exemplo de desmandos e incompetência teve como foco a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), onde dirigentes, apadrinhados por figurões do governo, permitiram o mergulho do setor e a administração dos aeroportos brasileiros no caos em que se encontram hoje.

Anomalia semelhante acontece na Agência Nacional do Petróleo (ANP), cujo comando foi entregue a um prócer do PCdoB, Haroldo Lima, dentro do jogo de alianças da administração Lula. Depois de passar bom tempo do seu mandato tentando arrancar dinheiro da Petrobrás para satisfazer o interesse de alguns políticos por supostas diferenças no repasse de royalties a Estados e municípios, Haroldo Lima advoga agora o pagamento máximo da Petrobrás à União pela cessão onerosa, a transferência de 5 bilhões de barris de petróleo ainda no chão, a título de subscrição da parcela correspondente ao Tesouro no capital da empresa.

Em princípio, nada haveria de errado na fixação de um preço ainda que máximo desses barris, se a própria ANP não tivesse estabelecido como critério o que viesse a ser certificado pela consultoria Gaffney, Cline & Associates, especialmente contratada para isso. Outra vez, a direção da ANP está mais interessada em fazer o jogo político da hora do que em impor o critério técnico previamente acertado.

Essas e outras deformações acontecem porque o governo Lula permite e incentiva o aparelhamento do Estado em benefício da companheirada política. O maior prejudicado é o interesse público.

Tony Judt: escritos no New York Review of Books

Um grande historiador desapareceu recentemente. Inglês, trabalhando nos Estados Unidos, Judt foi um colaborador constante da melhor revista de resenhas críticas -- review-articles, na verdade -- do mundo, a New York Review of Books.
Nem todos os artigos estão disponíveis (alguns apenas para assinantes), mas tem muita coisa interessante.
Paulo Roberto de Almeida

Tony Judt na New York Review of Books
link

Tony Judt (1948–2010) was the founder and director of the Remarque Institute at NYU and the author of Postwar: A History of Europe Since 1945, Ill Fares the Land, and The Burden of Responsibility: Blum, Camus, Aron, and the French Twentieth Century, among other books.

Meritocrats, August 19, 2010

Words, July 15, 2010

Magic Mountains, May 27, 2010

America, My New-Found-Land, May 27, 2010

‘Edge People’, May 13, 2010

Toni, May 13, 2010

Austerity, May 13, 2010

An Open Letter About ALS, April 29, 2010

Work, April 8, 2010

Girls! Girls! Girls!, April 8, 2010

What Happened in May 1968?, April 8, 2010

Ill Fares the Land, April 29, 2010

Cheers for the École Normale, April 29, 2010

Lord Warden, March 25, 2010

Edge People, March 25, 2010

Saved by Czech, March 11, 2010

In Love with Trains, March 11, 2010

Paris Was Yesterday, March 11, 2010

Revolutionaries, February 25, 2010

The Green Line, February 25, 2010

Food, February 25, 2010

Kibbutz, February 11, 2010

Joe, February 11, 2010

‘Night’, February 11, 2010

Bedder, February 11, 2010

Night, January 14, 2010
(...)
[Articles from 1990 to 2009 (...)]

Fired in Belgrade, March 29, 1990

Os banqueiros votam em Dilma (nao sei o que dirao os companheiros)

Bem, a gente já sabia que os banqueiros preferem Lula. Não podendo tê-lo outra vez, como seria desejável, eles se contentam com a sua indicada a sucedê-lo certos de que haverá perfeita continuidade na política de favorecimento de banqueiros e capitalistas em geral.
Não sei o que diriam os companheiros a esse respeito, eles que tanto odiavam os banqueiros e outros representantes do grande capital.
Pior ainda, vários desses banqueiros fazem parte daquilo que os petistas, naquela linguagem antiga, antiquada e portanto anacrônica, sempre chamaram de capital monopolista financeiro internacional, ou seja, a pior espécie de banqueiro que possa existir, aqueles vampiros sugadores da seiva financeira dos países explorados e periféricos como o nosso.
Pois bem, esse pessoal detestável está agora, de corpo e alma, com os seus bolsos cheios, se ouso dizer, com a candidata oficial, a sucessora do grande benefactor, o homem que deu aos banqueiros muito mais que eles poderiam desejar.
Aqui vai portanto o relatório dos banqueiros internacionais sobre o processo eleitoral (suponho que os companheiros não se incomodarão com essa intervenção estrangeira nos assuntos internos do Brasil).
Paulo Roberto de Almeida

Brazil - We expect Mrs. Rousseff to win in the first round
Citi: Emerging Markets Daily, Latin American Edition, 17 August 2010

Brazil – We expect Mrs. Rousseff to win in the first round. We now expect the government-backed presidential candidate to win in the first round given the latest round of opinion polls and our 2H'10 activity outlook. (p. 4)

Latest round of opinion polls show the government-backed candidate is ahead in voting intention. According to Datafolha institute, Dilma Rousseff leads polls with 41% of voting intention, whereas Jose Serra has 33%. The previous Datafolha poll, on July 23, showed a technical tie, as Mrs. Rousseff had 36% and Mr. Serra, 37%.In third-place, Marina Silva’s voting intention remained at 10%. On the spontaneous survey, without mentioning the candidates’ names in the questionnaire, voting intention for Mrs. Rousseff’s increased to 26% from 21% and Mr. Serra remained at 16%. Simulations of a runoff between these two candidates also showed the same trend, as Mrs. Rousseff reached 49% while Mr. Serra came at 41%. Regarding rejection rates, Mrs. Rousseff is also in a more comfortable position, as she scored 20% while 28% reject Mr. Serra.
Overall, Mrs. Rousseff’s popularity has been on a steady upward trend whereas the opposition candidate’s has remained stable until July and now seems to be experiencing a slight downward trend.

Governor elections are favoring Mrs. Rousseff. The Datafolha polls for regional elections showed that candidates from within Mrs. Rousseff’s alliance are leading in vote intention. Strong results in local elections tend to be positive for presidential candidates and the Datafolha survey seems to reinforce this view.
In the Northeastern region, where the income transfer programs are more widespread, voting intention for Mrs. Rousseff’s stands at 49%, while Mr. Serra has 25%. In the Southeastern region − the most relevant as it encompasses the states of São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) and Minas Gerais (MG) − Mr. Serra is now trailing Mrs. Rousseff (35% vs. 37%). The latter, considering the PMDB’s strong showings in MG and RJ, where the candidates likely to win in the first round, are supporting the government-backed candidate. Finally, in the Southern region, Mr. Serra holds the lead with 41% vs. Mrs. Rousseff’s 34%.
President Lula’s influence in the campaign has been remarkable and we believe there is more to come. President Lula has pushed hard for connecting his image to Mrs. Rousseff’s, in order to transfer some of his popularity over to her.
His first step was to tag her as the “mother of the PAC” (Growth Accelerating Program). In the Datafolha poll, 42% answered that the President’s support would be key in the voting definition, while an additional 22% declared they would take such information into account. Finally, 29% disregarded the President’s support as playing any role in the voting decision. In addition, the Datafolha poll showed that 7% did not know that Mrs. Rousseff is President Lula’s candidate and would be certain to vote for the President-backed candidate. This could be considered as an additional upside for Mrs. Rousseff, which could eventually lead to a first-round definition. Moreover, President
Lula managed to keep his record-high approval rating at 77%, while only 4% regard his administration as bad.

We now believe the presidential elections will be decided in the first round. We held a view of a tight race all the way trough the first round, with a bias toward Mrs. Rousseff’s victory. We are now changing this view to a Rousseff victory in the first round. Mrs. Rousseff needs only three more points to finish off the race, because in the ballot only the valid votes are taken into account. The latest poll showed 5% of invalid votes (null and blank votes). Therefore, she already has 47% of the valid votes. The above-mentioned aspects of the latest Datafolha poll are already self-assuring but there is more. Previous elections indicate a small effect from media campaign, which is to begin this week on Tuesday August 17. Leaders in polls ahead of the TV and radio campaigns usually remain in that place throughout the first round. Finally, the economic deceleration in 2Q’10 was temporary and the labor market conditions continued to improve while consumption resumed the upward trend, according to the latest retail sales results. Overall, these are all signs supporting Mrs. Rousseff’s candidacy and making Mr. Serra's task of reaching the runoff evermore difficult.

A Ignorancia Letrada: um exemplo involuntario (e no mais alto nível)

Escrevi e publiquei, recentemente, um artigo sobre a mediocrização das nossas academias. Obviamente não pretendia tratar desse assunto doloroso, tanto que convivo parte do tempo com colegas universitários, publico em revistas acadêmicas, dou aulas e, aparentemente, tenho alguma coisa no Lattes que me habilita a falar como um desses.
Este o artigo:

A Ignorância Letrada: ensaio sobre a mediocrização do ambiente acadêmico
Espaço Acadêmico (vol. 10, n. 111, agosto 2010, p. 120-127).
Publicados n. 985; Originais n. 2169.

Fui levado a escrever coisas um pouco severas sobre meus colegas pelo fato de receber muitos artigos para dar parecer e me surpreendo, a cada vez, com a deterioração constante da língua pátria, essa inculta e bela, que justifica o "inculta" e dispensa o "bela", já que está cada vez mais feia, torturada como vem sendo pelo nossos colegas de academia. Quanto ao conteúdo, então, dispenso-me de comentários, pois é evidente que eu recuso vários artigos -- provavelmente mais do que meus colegas pareceristas -- não tanto pelas agressões ao Português, mas pelos atentados à lógica formal, pelas crueldades cometidas com a verossimilhança, a falta de fidelidade ao mundo real, as loucuras surrealistas que brotam aqui e ali de textos que dificilmente mereceriam esse nome.
Mas, quando escrevi esse trabalho cáustico (o que reconheço) estava pensando mais naquele típico acadêmico de humanidades, que não aprendeu quase nada nos originais, mas que leu vários livros de vulgarização, e que se permite emitir julgamentos perempetórios sobre a política mundial, sobre a cultura universal e o universo mental de seus pares, que não ultrapasse uma colina de dez metros. Ou seja, o "gramsciano de baixa extração", ou o militante de chinelo de dedo que se considera acadêmico.
Eu nunca tinha pensado que um reitor de uma universidade pudesse alcançar -- se o termo se aplica -- esse nível de mediocridade. Pois é, parece que já chegamos ao ápice da mediocridade até mesmo nas reitorias.
Querem a prova?
Sigam esta matéria de um jornalista conhecido, sobre um ministro conhecido...
Paulo Roberto de Almeida

Mais um exemplo da “nova era democrática”: a barbárie intelectual da universidade. Ou: como formar ignorantes orgulhosos e patriotas
Reinaldo Azevedo, 16.08.2010

Manguei outro dia do “consenso” (!?) de três intelectuais, segundo os quais o Brasil está vivendo uma “nova era” democrática. E expus, num longo texto, as muitas agressões que o estado de direito vem sofrendo no Brasil. E não porque eu queira ou não goste do governo, mas porque são fatos. Se uma nova “era” existe, dadas aquelas violações, ela não é boa. Um fato ocorrido na semana passada, no Rio, caracteriza bem esse “novo ambiente”. Talvez vocês também fiquem um tanto chocados, embora certamente não surpresos.

Abaixo, há um áudio que está no canal que o Itamaraty tem no Youtube. Ele traz a “aula inaugural” ministrada no último dia 11 por Celso Amorim, o Colosso de Rhodes da diplomacia brasileira, no curso de história da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro — é a Uni-Rio, não a UFRJ. Sigam com o texto e ouçam depois se tiverem paciência.

http://www.youtube.com/mrebrasil#p/u/0/Y4LW97Vy99w

Falarei alguma coisinha sobre o discurso deste gigante, o homem que perdeu todas as disputas internacionais em que se meteu — e que se transformou, por isso, num formidável sucesso. Mas ele é o de menos nessa história porque se limitou a repetir a glossolalia de sempre, com aquele orgulho muito típico dos derrotados. Chocante mesmo, verdadeiramente estupefaciente, foi a fala da “Magnífica reitora, professora doutora Malvina Tuttman”. Nunca antes na história destepaiz se viu algo parecido na academia. A primeira intervenção da “magnífica” começa ali pelos 6 minutos e se estende mais ou menos até os 11. Transcrevo em vermelho [em itálico, neste blog] alguns trechos de sua fala (dando destaque a algumas palavras e expressões) e vou comentando em azul [normal].

Começo observando que a gramática da “professora doutora magnífica” rivaliza com a de Dilma Rousseff nos transes da ventura sintática e nos dons do pensamento truncado. Numa ousadia realmente digna de nota, Malvina diz que Celso Amorim contribuiu para elevar até a auto-estima dos “nossos irmãos estrangeiros”. Não tentem identificar, em sua fala, sujeito, verbo, complemento, aquelas coisas antigas que caracterizavam os discursos de “magníficos” no passado. Isso passou. Malvina é expressão de uma parcela da universidade brasileira desta “nova era”. Teria dificuldade para trabalhar em telemarketing. A ela:

(…) Celso Amorim, um dos homens deste país que, atualmente, vem imprimindo e mostrando a seriedade desse país não só para fortalecer a auto-estima nossa, do povo brasileiro, mas, em especial, dos nossos irmãos estrangeiros, que, por meio de uma política governamental importante de relações exteriores e, sem dúvida alguma, falava há pouco com o ministro, por conta da capacidade, da força, da história de vida do ministro, do embaixador Celso Amorim, o nosso país, hoje, não só por isso, mas também por isso, tem um reconhecimento e um valor importante internacional. (…) Uma das pessoas que eu considero (…) um dos nomes mais representativos da história deste país…
Bem, é o que costumo chamar de “sintaxe na fase da miséria”. A vontade de agradar é tal que a gente nota até uma certa aerofagia, uma emoção verdadeiramente genuína. Imagino a excitação intelectual desta senhora. E vocês já perceberam o vício de linguagem da “companheira”, não? Essa história de “auto-estima” é peça de resistência de todas as campanhas oficiais — e das estatais. Será que Malvina sabe que Celso Amorim perdeu todos os embates em que se meteu, sem uma só exceção? Eu acho que não. Isso não significa que pudesse dizer coisa diferente se soubesse, mas acho que ela ignora mesmo…
(…)
O ministro, ele não ficará historicamente lembrado, já que estamos numa aula inaugural de história, apenas por sua passagem neste momento político do nosso país, mas enquanto aquilo que ele representa como brasileiro que se orgulha de ser brasileiro e que leva esse orgulho para fora dos muros, das fronteiras do nosso país.
Esse “o ministro, ele” — a anteposição de uma espécie de aposto do sujeito — é um dos vícios de linguagem que mais me irritam e que, vênia máxima, viu, magnífica?, considero índice de ignorância e de pensamento vago. É coisa típica desses pastores televisivos. E o que dizer disto: “O ministro ficará lembrado enquanto aquilo que ele representa…”? Paulo Francis, nessas horas, costumava apelar ao chicote — metafórico, claro…
(…)
E posso lhe [a Amorim] dizer que, além da satisfação de estar reitora neste momento político importante do nosso país, onde as universidades têm recebido um justo olhar para aquilo que ela produz de importante, de ciência para esse país, e isso tem acontecido, nós podemos ter um marco importante, antes de 2003 e depois de 2003, e, por isso, eu posso me orgulhar de estar reitora neste momento, desde 2004, ministro, e completarei o meu mandato até 2012…
Interrompo aqui, mas o trecho abaixo é seqüência deste, sem corte. Amorim já entendeu, eu acho. O mandato dela vai até 2012… ENTENDEU, AMORIM??? Ninguém pode dizer que ela não está se esforçando para dar vôos maiores. Vejam ali a mistificação do discurso oficial repetida na fala da magnífica: o Brasil começou em 2003. Sigamos:

, mas eu quero também lhe cumprimentar e lhe dizer da grande satisfação de Malvina Tuttman, cidadã brasileira, estar, neste momento, sentada ao lado de um grande homem, um homem que fortalece o nosso país, um país que vem crescendo e que irá, se ainda não surpreendeu, irá surpreender não só alguns brasileiros incrédulos, mas Irá surpreender ao mundo.
Ah, apareceram os “brasileiros incrédulos”, aquela gente nefasta que insiste em não acreditar nas verdades eternas do petismo e do governo. A gente nota que Malvina é mesmo entusiasmada. Não lhe basta falar como reitora, não! Ela quer dar seu testemunho pessoal, falar também como “cidadã”, evidenciando que seu engajamento não é apenas profissional. Ela está nessa de corpo e alma mesmo. Dona Malvina poderia “cumprimentá-LO”, mas “lhe cumprimentar” jamais! A língua é democrática, magnífica! Oferece pronomes oblíquos tanto para verbos transitivos diretos como para os indiretos. Se a senhora servisse cafezinho na Uni-Rio, eu não lhe faria tal cobrança, mas como é a reitora…

Aí veio a intervenção do gigante, com aquele seu incrível dom de dizer coisas que estão em desacordo com a verdade. Deteve-se um pouco mais demoradamente na brilhante negociação que o Brasil empreendeu no Irã, asseverando que se alcançou lá um acordo fabuloso, mas, vocês sabem,as grandes potências, invejosas do talento brasileiro, não aceitaram… Seguiram-se algumas perguntas de estudantes e coisa e tal.

Malvina achou que a sua fala inicial não tinha sido convincente o bastante. Afinal, seu mandato vai até 2012 apenas… ENTENDEU, AMORIM??? No encerramento do evento, ela retoma a palavra (1h40min). E conclui a sua obra. Desta feita, atingiu o estado de arte nas manhas da adulação patriótica

Ministro, que quero lhe dizer que o senhor verdadeiramente nos deu uma aula. Uma aula de auto-estima, uma aula de mediação de combinação de habilidade de negociação com, se o senhor me permite, uma certa ousadia, ou muita ousadia, diplomática importante.
Vocês ainda respiram ou sufocaram na “aula de mediação de combinação de habilidade de negociação”? Adoro o “se e o senhor me permite”. Imaginem se Amorim não permitiria. Melhor do que isso só mesmo se Malvina dissesse: “Ministro, se o senhor me permite, o senhor é um gigante!” Atenção que a magnífica vai, agora, alertar Amorim para o fato de que sempre existem pessoas “do contra”. E vai aconselhá-lo.

E eu acho que essa é a grande diferença, essa habilidade conjugada à ousadia, mas uma ousadia que sabe aonde quer chegar, uma ousadia respeitosa. Isso fez e faz com que o nosso país, internamente, se veja de uma outra maneira e que, externamente, tenha essa representatividade internacional que nós temos. Do contra, ministro, nós sempre vamos encontrar. E é bom até, porque as opiniões muitas vezes contrárias nos fazem repensar e, algumas vezes, se temos essa habilidade, nos fazem crescer também e verificar que as diversas vozes contribuem, se elas não vêm para atrapalhar, elas contribuem para o nosso avanço.
Uau!!! Nem parece que Celso Amorim tentou nomear um brasileiro duas vezes para a OMC e perdeu as duas; que tentou nomear outro brasileiro para o BID e perdeu; que tentou uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU e perdeu; que apostou todas as fichas na Rodada Doha e perdeu; que tentou reinstalar o bandido Manuel Zelaya em Honduras e perdeu; que deu apoio a um egípcio anti-semita para comandar a Unesco e perdeu; que tentou evitar sanções ao Irã na ONU e perdeu. Leitor, se você quiser relembrar todas as besteiras e derrotas de Celso Amorim, clique aqui.

Mas o que mais me encantou na fala de Malvina foi o seu entendimento do que vem a ser “tolerância”. Vejam que ela até admite que as pessoas “do contra” têm lá o seu lugar na sociedade. Generosa, ela se dispõe a aprender com elas. Tem apenas uma ressalva: “se elas não vêm para atrapalhar”. Do contra, pode; não pode, pelo visto, é manifestar essa contrariedade. A isso está reduzida boa parte da universidade brasileira.

O senhor falou tantas coisas importantes, mas eu destacaria, se o senhor me permite, uma palavra importante, que, para nós, é especial e que marca também a visão da política no nosso país em todos os sentidos, principalmente neste momento das relações exteriores. E é alguma coisa que tem de ser inserida no nosso modo de estar no mundo, que é a paz. E o nosso governo, por meio do nosso presidente e do senhor, tem dado também essa lição para o mundo, para nós e para o mundo.
Bem, não poderia faltar o puxa-saquismo explícito, evocando o presidente. O Brasil, com efeito, tem investido na paz. De que modo? Adulando todos os ditadores do planeta e enviando à ONU um documento que pede mais diálogo com esses facínoras. Em Honduras, o governo brasileiro investiu na paz tentando promover a guerra civil e não reconhecendo um governo eleito legitimamente. Em Cuba, investe na paz comparando prisioneiros políticos a delinqüentes brasileiros. No Sudão, investe na paz impedindo censura ao tirano que governa o país. Na Colômbia, investe na paz mobilizando-se contra o governo contitucional do país e flertando com as Farc. Em Israel, investe na paz querendo bater papinho com o Hamas. No Irã, bem, no Irã… A gente chega lá.

Eu fiquei orgulhosa, orgulhosa, ministro, da atitude que o Brasil teve especificamente, há muitas, mas especificamente ao fato do Irã. Gostei. E sou judia! E aí fico muito á vontade de dizer dessa minha satisfação, desse meu orgulho, porque, acima de tudo, nós somos homens e mulheres, crianças e pessoas mais amadurecidas, mas que temos convicções muitas vezes contraditórias, mas alguma coisa tem de nos unir, a condição de sermos humanos, e, por isso, a paz é imprescindível. Eu acho que a atuação do presidente Lula e a atuação do ministro das Relações Exteriores pode, no meu entendimento, podem ser caracterizadas e definidas, para mim, numa palavra que, nesse momento, é a mais importante de todas: paz. Muito obrigada, ministro, seja muito saudado pela nossa comunidade!
Malvina acredita que o fato de ela ser judia e de apoiar o governo Lula muda o caráter do regime iraniano. E daí que é judia? Por que isso faria seu adesismo deixar de ser o que é? Mais: ao evocar essa condição, parece que tenta representar outras mulheres e homens judeus. E não representa, não! E isso, eu, que não sou judeu, asseguro. Porque esse povo não vem de tão longe para flertar com um anti-semita delirante, negador do Holocausto, que promete varrer Israel do mapa. Nesta segunda, dia 16, cinco dias depois da fala de Malvina, o Irã anunciou mais um passo em seu programa nuclear, numa clara provocação ao Ocidente, à ONU e à Agência Internacional de Energia Nuclear. Fale em seu próprio nome, minha senhora!

Encerrando
A fala de Malvina é uma colcha de retalhos de bordões oficiais e das muitas mistificações do petismo. Até nos vícios, repete a linguagem “companheira”. Seu discurso é a expressão daquela maçaroca de bobagens entre nacionalistas e patrióticas, que mal escondem o viés militante.

A universidade é o local da pesquisa e do pensamento, não da justificação do poder. Por mais que os centros de excelência, no mundo democrático, sejam integrados ao establishment, essa integração se dá na esfera dos valores, de uma cultura votada para o progresso, para a diversidade e para a tolerância. Servilismo ao governo de turno é outra coisa. É patente na fala da “magnífica” a satanização do passado, a exemplo do que faz o governo que Celso Amorim representa, com o seu discurso recheado de clamorosas imposturas. Ok, dona Malvina não precisa concordar comigo. Mas há um modo decoroso até mesmo de puxar o saco.

Imaginem: esse “bobajol” está sendo cotidianamente repetido nas salas de aula Brasil afora, especialmente, como é o caso, nos chamados cursos da área de humanas. E depois nos perguntamos por que a escola brasileira é tão ruim. Eis aí: Malvina dá a receita para a formação de ignorantes orgulhosos e patriotas.

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Comento rapidamente (PRA):
Confesso que estou sem palavras, ou melhor, não sei o que dizer. A reitora da Uni-Rio conseguiu me desmentir em meu artigo preocupado com a mediocrização da universidade brasileira, mas o quadro é muito pior do que eu imaginava, muito piormente pior, se ouso dizer, e se a reitora me permite este atentado à língua dela.
Eu vou ser obrigado a reescrever o meu artigo, ou escrever um novo, para me corrigir: não existe um processo de mediocrização, pois a universidade já desceu muito fundo, e o conceito deve ser outro.
Se uma reitora consegue falar daquela maneira, é porque a universidade já se encontra lá no fundo do poço. Nem sei de que curso é essa "senhora" -- sinto muito, mas não consigo chamá-la de reitora, mas eu recomendaria que ela se tornasse pelo menos "leitora", que é reitora em chinês, se ela me entende -- mas acredito que não faça muita diferença hoje em dia: todos os cursos estão indo para o brejo, pelo menos no que se refere à linguagem -- se o termo se aplica -- utilizada...

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Addendum (a partir da Wikipedia):
Deve ter sido escrito por ela mesma. Tudo se explica:

Malvina Tuttman
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.
Ir para: navegação, pesquisa

Malvina Tania Tuttman é a atual reitora da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Possui graduação em Pedagogia pela Universidade Santa Úrsula (1976), mestrado em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1981) e doutorado em Educação pela Universidade Federal Fluminense (2004). Tem experiência na área de Educação, com ênfase em Planejamento e Avaliação Educacional, especialmente nos seguintes temas: flexibilização curricular, extensão universitária, cotidiano na educação, metodologias participativas e planejamento.

A cerimônia de posse de seu atual e segundo mandato ocorreu no dia 3 de setembro de 2009, na sede do Ministério da Educação – MEC, em Brasília.

A Reitora recebeu o Prêmio Mais Mulheres, recém instituído pela Secretária Especial de Políticas para Mulheres, Nilcéia Freire, no dia 09 de março de 2009, em Brasília.

Atualmente, a reitoria da Unirio está envolvida com as mudanças necessárias para que a universidade se encaixe nos moldes do Reuni. O campus da Urca está recebendo um novo prédio para laboratório, novos cursos estão sendo oferecidos, em novos turnos, e o ensino à distância está ganhando força.

Eca de Queiroz: um diplomata abusado

Leio no excelente blog do embaixador Francisco Seixas da Costa, representante de Portugal em Paris, estes trechos, retirados de alguma crônica "faminta" do grande escritor português, que não poupava seus colegas diplomatas. Aliás, me parece que ele foi cônsul de Portugal na Grã-Bretanha, mas caberia verificar ao certo.
Paulo Roberto de Almeida

Eça de Queiroz
Francisco Seixas da Costa
Blog Duas ou Três Coisas..., 16.08.2010

Há 110 anos, foi a enterrar Eça de Queirós.

Eça de Queirós foi diplomata. Se, como escritor, Eça foi um génio, como diplomata situou-se numa mediania que nem o esforço laudatório de alguns conseguiu disfarçar. Eça utilizou a sua carreira consular para escrever algumas das obras-primas da literatura portuguesa e, só por isso, valeu largamente a pena que o Ministério dos Negócios Estrangeiros lhe tenha pago o salário. O qual, no seu entender, não era suficiente, a crer no que escreve em "Uma Campanha Alegre":

Os diplomatas portugueses passam por agradar no estrangeiro pela sua palidez! Mas não se sabe que a sua palidez vem, não da beleza da raça peninsular, mas da fraqueza de legação mal alimentada. Onde um embaixador português mais se demora, não é diante das instituições estrangeiras com respeito, é diante das lojas de mercearia com inveja! E se eles não podem alcançar bons tratados para o País – é porque andam ocupados em arranjar mais rosbife para o estômago. Se não fossem os jantares da corte e as ceias dos bailes, a posição do diplomata português era insustentável. E ainda veremos os jornais estrangeiros, noticiarem:

“Ontem, na Rua de… caiu inanimado de fome um indivíduo bem trajado. Conduzido para uma botica próxima o infeliz revelou toda a verdade – era o embaixador português. Deram-lhe logo bifes. O desgraçado sorria, com as lágrimas nos olhos.”

Que o país atenda a esta desgraçada situação! Que tenha um movimento generoso e franco! Dê aos seus embaixadores menos títulos e mais bifes! Embora lhes diminua as atribuições, aumente-lhes ao menos a hortaliça. Eles pedem ao seus país uma coisa bem simples: não é um palácio para viver, nem um landau para passear, nem fardas, nem comendas! É carne! Que o País no número do pessoal diplomático – diminua os adidos e aumente os bois.”

Keynes vs Hayek: vale a pena ver de novo

Já informei aqui sobre este video sobre o enfrentamento das teorias opostas de John Maynard Keynes e Friedrich A. Hayek. Uma paródia, mas absolutamente realista e informativa sobre todos os elementos do debate, em forma de enfrentamento musical.
Vale assistir, desta vez com legendas em Português.

Fear the Boom and Bust Portuguese Subtitles

Universidades europeias desgostosas com o seu ranking

De fato, existem muitos critérios pelos quais podem ser avaliadas as universidades, alguns sendo muito subjetivos, como por exemplo, saber que tipo de grande contribuição à elevação cultural ou "espiritual" da humanidade são dados por cursos de letras, de filosofia ou de artes (música, artes plásticas, etc).
A maior parte dos rankings universitários se baseia em critérios objetivos -- artigos publicados e citados, patentes extraídas, prêmios Nobel ou outras atribuições, etc. -- pois os critérios subjetivos, ou qualitativos, não encontrariam consenso entre todos os aferidores.
Como o "produtivismo" das universidades americanas as coloca nos primeiros lugar, as universidades européias reclamam do viés, mas em lugar de reclamar, elas deveriam estabelecer seus, ou outros, critérios, e discutir os indicadores com os especialistas da área.
Elas podem tentar propor um critério que valorize, por exemplo, quão mais agradável é comer camembert na mensa universitária, em lugar de hamburguer e batata frita (que eles também tem), ou tomar vinho, em lugar de refrigerante. Em todo caso, critérios são critérios, e os chineses estão jogando o jogo ao estilo americano. Pode não ser o melhor, mas parece que é o único, até agora, que deu resultados tangíveis em favor da humanidade (nas ciências médicas e biológicas, por exemplo, ou na física e na química).
Os europeus também contribuem, mas seu ritmo é mais lento e irregular. E existem muitos prêmios Nobel dados a europeus que trabalham nas universidades e laboratórios americanos. Em lugar de reclamar, os europeus deveriam se interrogar por que.
Paulo Roberto de Almeida

Europeans claim bias in college rankings
Qian Yanfeng and Wu Yiyao
China Daily, 17/08/2010

SHANGHAI - An annual Chinese ranking of the world's top 500 universities, which was dominated by educational institutions from the United States, has stoked criticism from Europe for using criteria "biased" against European schools.

European institutions were outnumbered by their US counterparts in the annual ranking compiled by Shanghai Jiaotong University's Center for World-Class Universities (CWCU).

The US retained its commanding position on the list, with eight schools in the top 10 and 54 in the top 100, while only two European schools made the top 10 and 33 were in the top 100.

Harvard University continued to top the ranking for the eighth successive year, followed by Berkeley, Stanford and MIT.

The highest-ranking institution in the UK was the University of Cambridge in fifth place, followed by the University of Oxford at number 10 on the list.

European media reacted strongly to the ranking, saying it had failed to accurately reflect an institution's overall performance by "focusing almost entirely on a university's achievements in scientific research", AFP reported.

First released in 2003, the Shanghai list uses criteria such as the number of staff and alumni who have won Nobel prizes and Fields medals, the number of researchers who are highly cited and the number of articles published in nature and science magazines.

Times Higher Education, a London-based magazine that publishes an annual supplement ranking the top 200 world universities, said on its website that the Shanghai list is based "almost entirely on scientific research", whereas it uses a sophisticated and transparent method to compile its own annual list.

Cheng Ying, executive director of CWCU, conceded there are "shortcomings" in the ranking's methodology, which does not lend sufficient weight to an institution's performance in the humanities.

But he said it is a technical problem, since it is much more difficult to assess an institutions' performance in the humanities than in scientific research.

Cheng also said the list is designed to compare the performance of Chinese universities and their overseas counterparts, in order to help the country create more world-class universities.

In that sense, he added, it was never intended to be used as an index for Chinese students who want to compare different institutions before they go abroad to study.

Difamacao contra o agro-negócio: retratos da estupidez acadêmica

Alertado pelo blog de meu amigo iconoclasta -- um epíteto que eu também me atribuo com muita honra -- Orlando Tambosi, fui olhar alguns materiais acadêmicos relativos à difamação do (obviamente, contra o) agronegócio, e a constatação é realmente de estarrecer.

1) Primeiro a chamada no blog do Orlando Tambosi:

A demonização do agronegócio
O professor Luis Lopes Diniz Filho, da Universidade Federal do Paraná, desmonta as falsas informações divulgadas contra o agronegócio, um dos setores mais demonizados do país.

O agronegócio é o setor de atividade que vem sofrendo os piores e mais injustificados ataques por parte de amplos setores da imprensa e do sistema de ensino, sem falar nos ditos “movimentos sociais”. Já participei de duas mesas redondas sobre agricultura, em eventos dirigidos a pesquisadores e professores, e procurei refutar as visões distorcidas que vêm sendo divulgadas sobre o assunto. Os dados estatísticos e a bibliografia que utilizei para elaborar tais refutações podem ser consultados no artigo Agricultura e Mercado no Brasil. Neste texto, vou destacar apenas algumas teses da geografia escolar brasileira sobre agricultura e as evidências que demonstram os equívocos que vêm sendo transmitidos a crianças e adolescentes nas últimas três décadas.(Continua).

2) Agora a íntegra do curto artigo, referido acima, do professor Luis Lopes Diniz Filho:

Difamação contra o agronegócio vai continuar
Luis Lopes Diniz Filho
Blog Escola sem Partido, 17.08.2010

O agronegócio é o setor de atividade que vem sofrendo os piores e mais injustificados ataques por parte de amplos setores da imprensa e do sistema de ensino, sem falar nos ditos “movimentos sociais”. Já participei de duas mesas redondas sobre agricultura, em eventos dirigidos a pesquisadores e professores, e procurei refutar as visões distorcidas que vêm sendo divulgadas sobre o assunto. Os dados estatísticos e a bibliografia que utilizei para elaborar tais refutações podem ser consultados no artigo Agricultura e Mercado no Brasil. Neste texto, vou destacar apenas algumas teses da geografia escolar brasileira sobre agricultura e as evidências que demonstram os equívocos que vêm sendo transmitidos a crianças e adolescentes nas últimas três décadas.

A primeira distorção é a tese de que a produtividade agrícola só aumenta nos setores de exportação, conforme dizem o MST e muitos livros didáticos, como os de José William Vesentini. Ora, os dados do IBGE mostram que, sobretudo dos anos 80 em diante, culturas como as de tomate, cebola, batata, arroz e feijão alcançaram ganhos expressivos de rendimento físico, geralmente maiores do que aqueles verificados nas culturas de soja, laranja e cana.

Outra distorção é essa ideia de que a agropecuária brasileira se divide ainda num segmento de exportação e noutro de mercado interno. Essa tese é falsa simplesmente porque a maior parte da produção de soja, óleos vegetais em bruto e carne bovina do Brasil é consumida no mercado interno mesmo. Além disso, a expansão da indústria de alimentos vem alterando o padrão de consumo alimentar da população brasileira, de sorte que a alimentação dos mais pobres já não é mais tão dependente do arroz, feijão e mandioca como era há algumas décadas atrás.

Daí ser completamente absurda a visão de que o Brasil estaria vivendo o paradoxo da fome em meio à abundância de produtos agrícolas. A Pesquisa de Orçamentos Familiares 2002-2003 - POF, do IBGE, comprova que a exposição das pessoas à desnutrição declinou de forma rápida nas últimas décadas, até quase desaparecer. No período dessa pesquisa, a desnutrição atingia apenas um pequeno percentual da população feminina das áreas rurais do Nordeste e das mulheres do estrato mais pobre da população brasileira, formado pelas famílias com rendimento mensal per capita de até um quarto de salário mínimo. De outro lado, essa mesma fonte mostra que 24% dos homens e mais de 40% das mulheres desse estrato estavam então com excesso de peso ou obesidade!

Mas é claro que, diante disso, algum leitor poderia perguntar se tais informações não são contestadas pelos indicadores de segurança alimentar, segundo os quais há no Brasil cerca de 14 milhões de pessoas que passam fome. A verdade, porém, é que os dados de segurança alimentar não desmentem os resultados da POF. Ao contrário, são as informações desta última que revelam a fragilidade e incoerência da pesquisa sobre segurança alimentar, conforme explico em detalhes no artigo já mencionado.

Mas o interessante é que, embora a reação da maioria dos ouvintes às minhas palestras tenha sido negativa, a ninguém ocorreu contestar os resultados da POF com a citação de dados sobre segurança alimentar. Ao invés disso, os pesquisadores e professores que me contestaram fizeram uso de argumentos puramente retóricos ou saídos do senso comum, como esses abaixo:

“A questão agrária é mais complexa”. Ela “envolve uma multiplicidade de fatores”. Ora, mencionar outros fatores, por si só, não invalida em nada o diagnóstico de que a desnutrição está no fim. O que se tem aí é apenas uma retórica que procura descartar uma avaliação baseada em dados sem discutir sua consistência lógica e empírica.

“Não é isso o que a gente vê na rua”. “Você já visitou a periferia de Curitiba ou o Nordeste? Já viu a soja partindo do Porto de Paranaguá?”. Esse argumento supõe que o IBGE deveria ser fechado, pois mobiliza milhares de pesquisadores e gasta milhões de Reais para fazer pesquisas cujos resultados podem ser derrubados por uma única pessoa em visita a certos lugares. Esse tipo de argumento demonstra que alguns professores não entendem que a função das estatísticas é permitir fazer generalizações com base em um número relevante de observações.

O simplismo dos argumentos demonstra que o agronegócio continuará sendo difamado diariamente por professores e autores de livros didáticos que falam sobre agricultura e fome sem nunca terem consultado a POF e as informações do IBGE sobre produtividade agrícola. A visão torta dos professores deriva da má qualidade dos livros didáticos e também da falta de leituras outras que não a desse tipo de livro. Mas a causa principal está mesmo é no alinhamento incondicional dos professores e pesquisadores aos movimentos de “luta pela terra”. É por se apegarem aos dogmas ideológicos de organizações como o MST que os professores persistem no engano mesmo quando confrontados com indicadores que nunca tinham se dado ao trabalho de consultar. Como diz o ditado: “o pior cego é aquele que não quer ver”.

3) Finalmente o principal, mas parcialmente:
Transcrevo apenas os parágrafos iniciais e finais de um trabalho de 30 páginas, que pode ser lido aqui.

Agricultura e mercado no Brasil: revendo as visões da geografia sobre os condicionantes da produção agrícola no capitalismo
Versão de 10 março de 2010.
Luis Lopes Diniz Filho
Departamento de Geografia da UFPR

Nossos homens de ciências e de letras [...] têm de criticar, mostrar problemas, participar da vida nacional. Mas o que deve falar é sua consciência, e não a vontade de ganhar palmas. Esperamos deles a coragem dos comunistas que denunciaram o stalinismo ou dos direitistas que denunciaram o macarthismo. O primeiro dever é o da impopularidade”. CLAUDIO DE MOURA CASTRO. O dever da impopularidade. Veja, 07 nov. 2001.

Introdução
Este artigo se divide em três partes. A primeira expõe o conteúdo que serviu de base para minha fala no XIX Encontro Nacional de Geografia Agrária – Enga, e resulta de pesquisas que venho realizando sobre os pressupostos da geografia crítica e as consequências de sua hegemonia entre os geógrafos brasileiros. A segunda parte discute as polêmicas que se seguiram à apresentação, as quais demonstram que a geocrítica continua realmente a pautar a visão que a maioria dos geógrafos tem da agricultura. Daí a urgente necessidade de chamar atenção para os equívocos e anacronismos contidos nessa visão que se formou há cerca de trinta anos. A última seção retoma as conclusões das anteriores para tecer alguns questionamentos sobre as relações entre ciência e ideologia nos estudos sobre o tema da reforma agrária ou rural.

Os equívocos da dicotomia agronegócio versus campesinato
Os geógrafos críticos, por sua opção incondicional pela utopia e recusa a ver qualquer positividade no capitalismo, são incapazes de apresentar propostas de políticas públicas que sejam a um só tempo radicais e consistentes, sendo que o IX Colóquio Internacional de Geocrítica é a melhor demonstração disso. Embora Horacio Capel (2007) tenha afirmado, no discurso de abertura do evento, que não seriam aceitas comunicações que não contivessem explicitamente uma proposta para resolver o problema que estivesse sendo analisado, verifica-se que há trabalhos nos quais a proposta é radical mas imprecisa e outros que propõem soluções com algum detalhamento, mas que não conseguem ser alternativas ao capitalismo.
O artigo Soberania alimentar como alternativa ao agronegócio no Brasil, de Christiane S. S. Campos e Rosana S. Campos (2007), prima pela primeira característica, pois, das quatorze páginas que o constituem, são dedicadas cerca de duas páginas e meia para explicar a alternativa anunciada no título, enquanto todo o resto da exposição é dedicado a lançar acusações contra a agricultura patronal . Além de realçar a crise das teorias críticas e radicais no domínio prático, esse artigo é bastante útil para demonstrar os equívocos em que a geografia agrária brasileira vem incorrendo por haver incorporado tais pressupostos, já que os ataques feitos pelas autoras ao agronegócio estão sendo reproduzidos há décadas em livros didáticos e trabalhos científicos de geografia. Vejamos esta afirmação inicial:

Sob a forma de agronegócio as atividades agropecuárias vêm sendo cada vez mais controladas por conglomerados econômicos que atuam em escala mundial determinando o que, quanto, como e onde devem ser produzidos e comercializados os produtos de origem vegetal e animal” (Campos; Campos, 2007).

Independentemente de essa afirmativa estar correta ou não, cumpre lembrar que o processo de concentração e centralização de capital em determinado setor só pode ser visto como algo negativo de per si caso se considere que os interesses das grandes empresas são antagônicos aos da maioria da população. No entanto, se for levado em conta que a natureza simultaneamente competitiva e cooperativa da economia de mercado impõe a satisfação das necessidades dos consumidores como condição necessária para a obtenção de lucros, tal raciocínio perde o sentido. É no intuito de vender produtos alimentícios com uma relação custo/benefício que os consumidores avaliem como superior à oferecida pelos concorrentes que os conglomerados do setor agroalimentar tomam decisões sobre o tipo e características dos alimentos a serem produzidos, bem como sobre a localização da produção.

(...)

Considerações finais
Conforme esclareci durante os debates realizados no XIX Enga, não ignoro a multidimensionalidade do rural e também não tenho nenhuma objeção a que se defenda a necessidade de políticas de reforma agrária com base em argumentos de ordem ambiental, social e cultural. Mas é preciso deixar claro que, dentre os argumentos que costumam ser usados para defender esse tipo de política, há alguns que já perderam sua validade há décadas. Um deles é justamente a tese de que o Brasil precisa de uma “reforma agrária ampla e massiva” para resolver o problema da fome. Não! Esse é um problema residual e controlável com programas emergenciais de distribuição de alimentos em certas localidades (como algumas aldeias indígenas) ou políticas focalizadas de renda mínima – algo muito diferente do conteúdo populista e assistencialista que o atual governo deu aos programas de transferência de renda instituídos pelo governo anterior. À medida que a renda per capita e a produtividade agropecuária crescerem, como ocorreu nas últimas décadas, mesmo o pequeno percentual de pessoas que podem estar emagrecidas por alimentação insuficiente irão melhorar seu padrão de consumo alimentar, independentemente de receberem bolsas do governo ou não. Essa é a realidade que explica porque o Partido dos Trabalhadores abandonou o objetivo de fazer uma reforma agrária maciça e limitou-se a dar continuidade à política fundiária do governo anterior, à qual havia se oposto tão fortemente .
Portanto, se há bons argumentos ambientais, sociais e culturais para defender a reforma agrária, então os pesquisadores e professores devem usar esses argumentos para defendê-la, ao invés de recorrerem a qualquer ideia que possa servir a essa causa, sem preocupações com lógica e com verificação empírica. Afinal, já existem os políticos e os militantes de partidos, ONGs e “movimentos sociais” para defenderem causas (e interesses) com o uso da retórica política. Os acadêmicos só prestam uma contribuição original aos debates públicos quando se recusam a fazer retórica para defender causas e se concentram no esforço de produzir conhecimentos tão objetivos quanto possível. Um dos grandes males trazidos pela geocrítica está exatamente na dissolução das fronteiras entre discurso científico e retórica política, a qual é fruto de uma interpretação equivocada das pertinentes críticas que já foram feitas à noção de objetividade científica (em particular, nas ciências humanas e sociais) e ao princípio positivista da neutralidade do método. O uso de métodos tidos como adequados não dá garantias absolutas de que os enunciados científicos são de fato objetivos e neutros em relação a valores e interesses, mas a objetividade e a neutralidade têm de continuar existindo como compromissos que o cientista assume quando elabora e aplica seus métodos de pesquisa.
É por se preocuparem mais em servir à causa da reforma agrária do que em manter um compromisso com a busca de objetividade que muitos trabalhos de pesquisa e livros didáticos se equivocam ao aplicar um diagnóstico que fazia certo sentido nos anos 1970 para explicar a agricultura das décadas seguintes. E se os pesquisadores e professores continuarem a pensar o tema da reforma agrária com base na dicotomia agronegócio versus campesinato, correrão o risco de cometer equívocos tão grandes ao refletir sobre os benefícios ambientais, sociais e culturais dessa reforma quanto aqueles em que incorreram ao supor que o agronegócio não tem interesse em atender às necessidades dos consumidores por se preocupar apenas com lucros.

Fim do texto do professor Luis Lopes Diniz Filho (seguido de apêndices estatísticos e bibliografia)

Leia a íntegra neste link.

Sem filigranas diplomaticas - continuidade de um caso confuso (Brasil-Iran)

Cada vez que o assunto é abordado, nos meios oficiais ou pela imprensa, tem-se a impressão que se trata de um diálogo de surdos, ou melhor, de pessoas que não querem ouvir.
De vez em quando alguém que não sabe falar também mete a sua colher no assunto.
E assim vai se aprofundando a confusão, até o desenlace fatal...
Paulo R. de Almeida

Ministro de Lula chama líder do Irã de ditador e diz que Brasil segue negociando asilo a Sakineh
De São Paulo
Folha.com, 16.08.2010

O governo brasileiro continua "pressionando diplomaticamente" o "ditador" do Irã para que enviar ao Brasil a iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, 43, condenada por adultério e sentenciada à morte por apedrejamento, afirmou o ministro brasileiro dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, nesta segunda-feira em São Bernardo do Campo (SP).

"O governo Lula está pressionando diplomaticamente o governo iraniano para que permita que ela venha para o Brasil. E se esse ditador [o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad] tiver um mínimo de bom senso, deveria permitir que ela venha morar no Brasil e seja salva", disse Vannuchi.

Para Vannuchi, o Brasil é o único país que pode negociar com o Irã, após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, junto com o governo turco, ter mediado as negociações entre o Irã e a Agência Internacional de Energia Atômica pelo programa nuclear iraniano.

Brasil e Irã trocaram várias mensagens nas últimas semanas pelo caso de Sakineh Mohamadi Ashtiani, 43 anos, mãe de dois filhos, condenada à morte por apedrejamento no Irã por adultério e também acusada de homicídio.

A sentença de apedrejamento contra Sakineh levou à condenação internacional e a grande pressão contra Teerã. O país adiou a execução da condenação, mas acrescentou ao processo uma acusação de participação no assassinato de seu marido, em 2005. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que mantém um diálogo aberto com o Irã, ofereceu asilo a Sakineh no Brasil.

OFERTA DE ASILO
No dia 31 de julho, o presidente Lula disse que iria usar sua "amizade" com Ahmadinejad para propor que a iraniana tivesse asilo do Brasil. Três dias depois, Ramin Mehmanparast, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores iraniano, disse que Lula fizera a oferta, provavelmente, com base em informações erradas.

No último dia 9, o embaixador brasileiro no Irã, Antônio Salgado, se reuniu com o governo local para apresentar aos canais oficiais, formalmente, a oferta de asilo à iraniana. A visita é um recurso conhecido diplomaticamente como gestão, quando o ministro das Relações Exteriores ou mesmo o presidente de um país manda o embaixador procurar a chancelaria da capital onde atua para estabelecer relações formais.

Dias depois, diplomatas disseram que não faz sentido Teerã aceitar a oferta brasileira, já que Sakineh é uma iraniana criminosa condenada.

ABRIGO A CRIMINOSOS
O governo do Irã questionou nesta segunda-feira as "consequências" da oferta brasileira de asilar uma iraniana condenada à morte por apedrejamento, e perguntou se o "Brasil precisará ter um local para criminosos de outros países", em uma nota emitida por sua embaixada em Brasília.

"Em relação à presença ou ao exílio [da condenada] Sakineh Mohamadi no Brasil, é necessário considerar alguns pontos e questões significativas. Quais são as consequências desse tipo de tratamento aos criminosos e assassinos?", questiona o governo do Irã em seu comunicado.

"Esse ato não promoverá e não incitará criminosos a praticar crimes?", completou.

"Será que a sociedade brasileira e o Brasil precisarão ter, no futuro, um lugar para os criminosos de outros países em seu território?", questionou.

Segundo a nota divulgada nesta segunda-feira, o Irã "considera as declarações e o chamado" de Lula "um pedido de um país amigo", que atribuiu a "sentimentos puramente humanitários" do presidente brasileiro.

OFERTA RECUSADA
O presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, afirmou nesta segunda-feira que não vai enviar Sakineh ao Brasil. "Eu acho que não há necessidade de criar problema para o presidente [Luiz Inácio] Lula [da Silva] e levá-la ao Brasil", disse Ahmadinejad.

Em entrevista divulgada na televisão iraniana de língua inglesa Press TV, Ahmadinejad disse acreditar que não há necessidade de enviar Sakineh ao Brasil e afirmou esperar que o assunto "seja resolvido". Ele não deu mais detalhes.

"Há um juiz no fim do dia e os juízes são independentes. Mas eu falei com o chefe do judiciário e o judiciário também não concorda com a proposta do Brasil", disse Ahmadinejad.

Pequeno retrato da imoralidade reinante (com o seu dinheiro, caro leitor...)

...e com o meu também.
Não pretendo comentar extensamente o que considero ser uma indústria de indenizações e uma fábrica de imoralidades.
Basta transcrever o que segue.
Paulo R. Almeida

Presidente da comissão de anistia critica TCU por revisar indenizações
Eduardo Bresciani, do G1
São Paulo, 16.08.2010

O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abraão, criticou nesta segunda-feira (16) o Tribunal de Contas da União (TCU) por ter decidido revisar as indenizações pagas a anistiados políticos. A decisão do TCU foi tomada na semana passada, após uma reportagem do jornal “O Estado de S.Paulo”, e atinge R$ 4 bilhões pagos ou aprovados em pouco mais de sete anos.

Para Abraão, todas as indenizações concedidas pela comissão estão dentro dos critérios determinados na constituição e na lei que regulou o pagamento. Na visão, ao defender a revisão o TCU não está levando em conta os aspectos históricos e políticos do pagamento de indenização.

“Se o Tribunal de Contas discorda dos critérios da constituição e das leis pode pedir ao Congresso que faça alterações. (…) O que não pode é um órgão de contas transformar um processo histórico e político em um processo contábil”, afirmou Abraão.

Ele destacou que qualquer cidadão pode questionar junto ao órgão as indenizações concedidas e que já houve casos de revisão. O presidente da Comissão de Anistia afirmou que seria um “retrocesso” a redução de direitos dos perseguidos pela ditadura militar. “Seria um grande retrocesso se nós voltássemos atrás numa jornada que temos empreendido nestes anos e passássemos a reduzir os direitos das vítimas”.

A presidente da Associação Brasileira de Anistiados Políticos, Alexandrina Kristensen, destacou que só recebem o benefício as pessoas que comprovam terem sido perseguidas pelo regime militar.

“Essa indenização por anistia só é conseguida quando a pessoa comprova a perseguicao da ditadura. O regime militar massacrou as pessoas. Tirou os direitos de trabalho, torturou barbaramente, matou inclusive. (…) Tem que ficar claro a quem interessa acabar com a anistia no Brasil. As pessoas já foram perseguidas pela ditadura e agora estão sendo porque recebem indenização”, afirmou.

Abraão e Alexandrina participaram de um seminário na Câmara dos Deputados que discute anistia e direitos humanos na América Latina.

Comento [Reinaldo Azevedo]:
Presidente da Comissão de Anistia deve achar que “processos históricos” anulam a matemática…

Paulo Abraão está fazendo de conta que a comissão não está INTERPRETANDO as leis. Tanto está que ele próprio admite: já se fizeram revisões. Se elas fossem, assim, tão estritas e auto-aplicáveis, rever o quê? Um processo, por ser “histórico” e “político”, deixa de ser contábil? Acho que não. O que a fala do valente omite é o seguinte:

1 - eles decidem o “processo histórico” e “político;
2 - os brasileiros arcam com o “processo contábil”.

A concessão escandalosa de prebendas sob o pretexto de reparação está dada pelos fatos, não é uma questão de juízo de valor. Uma das coisas mais curiosas nessa história é a progressão imaginada para a carreira do “punido”: todos eles virariam “chefes”, chegariam ao topo da carreira se não tivessem sido “perseguidos”… É mesmo, é? Penso no caso de Carlos Heitor Cony, por exemplo. Ele certamente não teria chegado a ser, sei lá, o diretor de Redação do Correio da Manhã porque o jornal… fechou! E Ziraldo? E Jaguar?

O caso do “Pasquim” renderia uma tese acadêmica. A censura fazia bem ao jornal, não mal. É um fato. E isso não quer dizer que a ditadura tivesse um lado bom. Quer dizer apenas que o Pasquim não soube fazer humor na democracia. Foi “perseguido” pela falta de leitores, que não lhe faltaram enquanto combatia o regime. O período todo fez bem a Ziraldo, por exemplo. Na redemocratização, a fama de resistente e sábio lhe render o cargo de presidente da Funarte, no governo Sarney, quando pôde expor plenamente a sua visão para uma política pública na área da cultura: incentivo a bandinhas de música, valorização da cachaça como patrimônio cultural e pesquisas sobre a metafísica da broa de milho. E isso não é brincadeira. Mistificação rende indenização; mico não rende multa…

A lei que garante a reparação, com efeito, é cheia de licenciosidades? É, sim! Mas é evidente que se dá ao texto a interpretação mais larga e generosa possível, já que a Comissão fica com a generosidade do “processo histórico e político”, e os contribuintes, com o ônus do “processo contábil”. O TCU tem de zelar pelo uso responsável do dinheiro público. Se indenizar alguns notórios partidários de tiranias é, em si, um escândalo, que não se exagere ao menos. Não se recupera a moral essencial do “processo”, mas, ao menos, se aplica uma política de redução de danos aos cofres públicos.
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Ainda sobre a Lei da Anistia e as generosíssimas concessões de prebendas, fico cá a pensar: já são milhares os indenizados. O espeto nos cofres públicos passa de R$ 4 bilhões. Os “anistiados” têm advogados, não? Tenho certa curiosidade de saber quantos são. E também quem são.
- Trabalham de graça, já que a causa é tão nobre?;
- cobram uma taxa de sucesso? De quanto?;
- quanto a concessão de indenizações já teria rendido a escritórios especializados?;
- a Comissão de Anistia não pode ter-se transformado num cartório de “especialistas” em anistia, tudo pago com o dinheiro dos bobalhões que não pegaram na metranca para “fazer revolução”?
[RA]

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Mexico: um Estado (quase) falido? - o problema das drogas

O Brasil tem sorte de não estar perto dos EUA, não pelas razões habitualmente invocadas, como aquela bobagem do império e sua dominação sobre o coitado do México. Mas porque os EUA são um mercado muito atrativo para as drogas e um grande fornecedor de armas pesadas para as gangues de traficantes mexicanos, que adotam táticas criminosas próximas das situações de guerra na Somália, no Iraque ou no Afeganistão.
Temos sorte, mas talvez não por muito tempo.
Melhor aprender com a experiência do pobre México, uma situação terrivel...
Paulo Roberto de Almeida

The U.S. is turning away from Mexico's failing drug war
Editorial The Washington Post
August 14, 2010

Give Mexican President Felipe Calderon credit for honesty as well as courage. Last week he presided over a three-day public conference to assess the results of nearly four years of war against Mexico's drug cartels. Most of the facts were grim:
-- According to the chief of the national intelligence service, 28,000 people have died violently since Mr. Calderon deployed the Mexican army against the drug gangs in December 2006. That number represents an increase of 3,000 over the death toll the government reported earlier this summer.
-- There have been 963 incidents involving federal forces and the gangs since the offensive began -- or just about one per day.
-- Mexican authorities have seized more than 84,000 weapons, including thousands of high-powered assault rifles, grenades and other military-caliber equipment. More than 80 percent of the guns whose provenance could be traced came from the United States.
-- The ferocity of the violence continues to escalate as drug gangs import the tactics of al-Qaeda and the Taliban. To kidnappings, beheadings and massacres of innocent civilians and even children can now be added car bombs -- two of which have been detonated in northern cities in the past few weeks.
Mr. Calderon bluntly spelled out the threat the cartels represent to Mexico. "The behavior of the criminals has changed and become a defiance to the state, an attempt to replace the state," he said. Drug lords are collecting their own taxes from businesses in some areas. According to the secretary of public security, they are spending $1.2 billion a year to buy the allegiance of 165,000 police officers.
Preventing the sort of cartel takeover that Mr. Calderon warned of is a vital interest of the United States -- which is why the Obama administration and Congress could benefit from their own truth-telling session about Mexico. Congress has appropriated $1.3 billion since 2008 to help Mexico fight drug trafficking, but because of poor implementation and bureaucratic delays, only a fraction of the money has been spent. Mexican forces are still waiting for badly needed U.S. helicopters, surveillance planes and drones as well as training programs in areas such as money laundering.
Worse, the Obama administration has shrunk from the duty of cracking down on the illegal trafficking of guns to Mexico, including improper sales by many of the 7,000 gun shops along the border. During his last visit to the United States, in May, Mr. Calderon pleaded with the White House and Congress to reinstate the ban on sales of assault weapons. As so often when it comes to the needs of this important neighbor, there has been no response.

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This Week at War: Is Mexico's Drug War Doomed?
Learning to live with drug cartels

BY ROBERT HADDICK
Foreign Policy, August 13, 2010

What happens if Mexico settles with the cartels?

The U.S. Department of Defense defines irregular warfare as "a violent struggle among state and non-state actors for legitimacy and influence over the relevant populations." By this definition, Mexico is fighting an irregular war. The Mexican government's campaign against the drug cartels is far more than a law enforcement problem; the two sides are engaged in a violent struggle for influence over the Mexican population.

Four years after Mexican President Felipe Calderón threw 80,000 soldiers at the cartels, their businesses remain as strong as ever. According to the Los Angeles Times, the overall drug trade continues to flourish, bringing in by one estimate $39 billion a year to the Mexican economy, equal to 4.5 percent of Mexico's economic output in 2009. The cartels, formerly just smuggling businesses operating largely out of sight, have evolved into political insurgents, and Calderón has openly wondered whether the Mexican state will survive. Neither side has the capacity to crush the other. This implies an eventual compromise settlement and with it a de facto or actual legalization of the drug trade in Mexico. When Calderón and the cartels make such a deal, the United States will have to deal with the consequences.

Calderón's war has managed to inflict pain on the cartels; government forces killed two top cartel leaders and have set the syndicate into a violent struggle with each other for smuggling routes. According to the Los Angeles Times story, the Mexican government estimates 28,000 people have been killed in the war, the vast majority of whom were cartel employees and associates who died in battles between the various gangs. Responding to the pressure, the cartels have transformed themselves into political insurgencies in an attempt to persuade the government to back off and to attract the support of local populations. Their actions are right out of an insurgency's standard playbook: attacks on the police (recently with car bombs), employees of state oil company Pemex -- the cornerstone of the government's revenue -- and the media.

In a speech to the nation last week, Calderón declared that the cartels' actions are "an attempt to replace the state." He pleaded with his countrymen to support the government and to report on local officials whom the drug gangs have co-opted. Calderón's plea comes as Mexico's main sources of foreign exchange are under pressure: The drug wars are chasing away tourism, competition from Asia threatens the manufacturing export sector in the north, the Pemex oil monopoly is in decline, and the struggling U.S. economy has hit expatriate receipts back to Mexico.

With Mexico's legitimate sources of foreign exchange wilting and with the government facing a bloody and open-ended war against the cartels, the prospect of a settlement must be increasingly attractive to Calderón. Legalization would legitimize the drug trade as another important export sector of the Mexican economy, along with oil, tourism, light manufacturing, and expatriate labor receipts. According to the New York Times, Calderon has opened up a dialogue with opposition political leaders in a search for possible alternatives, and has called for a national discussion on the possibility of drug legalization. Calderón's two predecessors, Vicente Fox and Ernesto Zedillo, now support some form of drug legalization.

Should Mexico call a truce and legalize its drug business, where would this leave the United States, the prime market for Mexico's drug exports? Many Americans would view Mexican legalization harshly and call for suspending Merida initiative aid and perhaps closing the border. But even if this were physically possible, vast legitimate commercial trade and the presence of so many family relationships on both sides of the border, the consequence of past migrations, would make a closure politically impossible. Should Calderón or his successors eventually choose this means of escape, the United States will simply have to cope with the consequences.

Robert Haddick is managing editor of Small Wars Journal.

Fim de consenso na diplomacia brasileira - Pedro da Motta Veiga

Muito tempo atrás, há pelo menos quatro anos, eu já havia detectado o desaparecimento desse suposto consenso, neste pequeno trabalho:

Fim de consenso na diplomacia?
O Estado do Paraná
(Curitiba, sexta-feira, 27/10/2006, Opinião, p. 4)

Não estando mais disponível online, transcrevo-o in fine.
Paulo Roberto de Almeida

A política externa sob Lula - o fim do consenso
Pedro da Motta Veiga
O Estado de S. Paulo, 16/08/2010

No final dos anos 90 e início da primeira década do século 21, o que chamava a atenção dos analistas da política externa brasileira era a resiliência do paradigma de política. Essa continuidade se impunha apesar das importantes mudanças por que o País passara na década de 90: liberalização comercial e do regime de investimentos, participação num número significativo de negociações comerciais ambiciosas, etc. Em relação a este quadro, a década que termina trouxe importantes alterações. Novos fatores domésticos se desenvolveram e passaram a influenciar o desenho da política externa. De um lado, registra-se o surgimento de interesses econômicos ofensivos nas negociações internacionais, em contraste com nossa tradição defensiva. De outro, emergiram objetivos propriamente políticos na agenda internacional do Brasil.

Enquanto o primeiro fator traduz transformações estruturais da economia - o surgimento do agribusiness competitivo e de empresas transnacionais brasileiras -, o segundo resulta de decisão política, mas certamente se apoia em evoluções internas e externas que tornam possível sua emergência.

A principal modificação introduzida pelo governo Lula no paradigma que dominou a estratégia externa brasileira nas últimas décadas é a valorização da dimensão propriamente política da estratégia e o condicionamento dos objetivos econômicos à "variável política". Agora, eles passam a ser perseguidos dentro de um quadro de prioridades e restrições definido por uma visão política.

Em algumas frentes, política e economia podem divergir, como atestam críticas empresariais à submissão das negociações comerciais a objetivos políticos. Em outras, porém, política e economia convergem e se alimentam reciprocamente, na lógica do que Luiz Werneck Vianna chamou "um bismarquismo tardio": campeões nacionais apoiados pelo Estado se projetam em escala transnacional e fazem o contraponto empresarial à busca estatal por protagonismo internacional. Negócios privados significativos são gerados para empresas brasileiras na esteira das amizades presidenciais na América Latina e legitimam, no setor empresarial, a entrada da Venezuela no Mercosul.

A perda de relevância relativa da lógica econômica em beneficio da política está na origem do distanciamento do País, nos últimos anos, do pragmatismo que prevaleceu nas décadas anteriores. Os que criticam a política externa de Lula por ter abandonado os princípios de uma política de Estado, substituindo-a por uma linha de ação ideológica, referem-se a duas evoluções. Primeiro, apontam para essa distância em relação ao pragmatismo e aos objetivos econômicos que a introdução da política gera na estratégia externa brasileira. Mas esse tipo de crítica à "ideologização" da política externa ainda aponta para uma divergência quanto aos valores (políticos) que estariam guiando a estratégia externa do País recentemente. Ora, um valor político central veiculado pela diplomacia do governo Lula é o explícito questionamento da distribuição do poder no cenário global. A importância dessa "grade de leitura" da ordem internacional para a estratégia externa do governo aparece na já citada esfera das negociações comerciais, mas também nas alianças preferenciais (Brics, Ibas, etc.) feitas pelo País em diferentes foros nos últimos anos.

A prioridade concedida à redistribuição de poder em escala mundial justificaria, para os defensores dessa visão, não só uma postura de resistência a regimes internacionais politicamente injustos e economicamente intrusivos, mas também a aproximação com países cuja estratégia de emergência internacional se baseia num anti-hegemonismo ostensivo.

Mas, no debate interno do Brasil atual, a passagem do questionamento da hierarquia de poder definida pela ordem global vigente - considerado legítimo por críticos da política - à aproximação com regimes de estratégia de emergência internacional anti-hegemônica tem sido cada vez mais criticada. Esse questionamento tem duas dimensões. Uma é de ordem estratégica: aproximar-se de países anti-hegemônicos é uma política adequada para promover a emergência de um mundo multipolar e nele posicionar o Brasil como interlocutor incontornável? Outra é da ordem dos valores políticos: questionar a ordem global estabelecida justifica desconsiderar preocupações com a defesa dos direitos humanos e das liberdades democráticas?

Na diplomacia de Lula - e sobretudo na do seu segundo governo - o questionamento da ordem global como fim (e não meio) assumiu a posição de valor político principal, sobrepondo-se a outros, como o respeito aos direitos humanos. Estes são vistos, por alguns defensores da política, como problemas essencialmente domésticos dos Estados nacionais e, por outros, como valores "ocidentais" promovidos para ocultar os interesses estratégicos dos países hegemônicos.

Uma presença maior do País na agenda mundial exige efetivamente o enfrentamento, pela política externa, da questão dos valores políticos que a devem nortear. Em vez de criticar a "ideologização" da política externa de Lula, que nada mais é do que a expressão de uma visão política do mundo e da estratégia do País, seus críticos devem explicitar e defender seus próprios valores e sua concepção de ordem internacional.

DIRETOR DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (CINDES)

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Fim de consenso na diplomacia?
Paulo Roberto de Almeida

Um levantamento efetuado com base nas matérias sobre a diplomacia do governo Lula, publicadas em revistas especializadas e na imprensa diária, revela algo inédito nos anais da política externa: pela primeira vez, ela deixou de beneficiar-se do tradicional consenso a que essa diplomacia estava habituada. Com efeito, mesmo em momentos nos quais a política externa apresentou aspectos de ruptura – como a “política externa independente” de Jânio-Jango (1961-1964) ou o “pragmatismo responsável” da dupla Geisel-Azeredo (1974-1979) –, ela recolhia, ainda assim, a aprovação da opinião pública, que julgava que as inflexões eram necessárias e mesmo bem-vindas.
Não parece ser o caso agora, quando diversos setores– empresários, jornalistas de opinião ou mesmo diplomatas aposentados – manifestam-se contra a atual diplomacia, acusando-a de ser partidária, ideológica e anacrônica. Em contraste, no seio da esquerda e entre vastos segmentos da universidade ela goza de virtual consenso, o que não ocorre, por exemplo, com a política econômica, acusada, nesses mesmos meios, de “neoliberal”. Iniciada sob promessas de mudanças na forma e no estilo, assim como em sua substância, a política externa de Lula – que guarda conexões evidentes com as posições de política internacional do PT – vem sendo calorosamente defendida por simpatizantes na academia e na imprensa, tanto quanto vem sendo atacada, com o mesmo ardor, por outros analistas.
No primeiro grupo figuram acadêmicos e jornalistas que sempre foram solidários com o PT, quando não integram seus quadros. Existem também aqueles que, sem dar apoio direto, encaram positivamente a política externa, naquilo que ela representaria de defesa dos interesses nacionais, em face, por exemplo, de pressões dos EUA para favorecer a criação da Alca ou no sentido da adoção de uma posição mais dura em relação a regimes considerados “desviantes” na América Latina.
O segundo grupo abriga os que se mantêm em postura independente ou que têm assumido uma atitude crítica em relação a essa política, ademais dos que poderiam ser classificados como “oposicionistas declarados”. Alguns analistas do meio acadêmico se opõem à política externa, não por qualquer predisposição oposicionista, mas por julgá-la em seu próprio mérito e concluir que ela rompe tradições diplomáticas. Os mais críticos julgam que a política externa atual não logra alcançar, ao contrário do que é proclamado, os objetivos pretendidos, sacrificando posições de princípio e os interesses nacionais.
Os “apoiadores benevolentes” consideram a política externa de Lula adequada e necessária ao Brasil, que deveria ser capaz de afirmar-se de forma soberana nos contextos regional e mundial, possuir um projeto nacional de desenvolvimento e buscar reduzir o arbítrio e o unilateralismo ainda presentes no cenário internacional. Trata-se de um grupo expressivo, tendo em vista a conhecida dominação da academia pelo pensamento de esquerda, pelo menos na área das humanidades.
Os opositores declarados, por sua vez, consideram essa política uma emanação tardia do terceiro-mundismo dos anos 1960-80, exacerbada pela adesão equivocada a regimes autoritários e marcada por um antiimperialismo infantil. Eles criticam a retórica “terceiro-mundista”, contrariamente a uma atitude pró-ativa em favor da globalização que seria seguida, aliás, pela China e pela Índia, os dois “parceiros estratégicos”. As iniciativas “mudancistas” representariam ilusões de mudança nas “relações de força” ou da “geografia comercial” do mundo e os fracassos nas negociações comerciais adviriam do próprio estilo de atuação, chamado por alguns de “ativismo inconseqüente”.
O governo investiu na nova postura, representada pela multiplicação de iniciativas nas mais diversas frentes de atuação, daí a caracterização de “ativa e altiva” dada pelo chanceler à nova diplomacia. A postura foi bem acolhida nas bases do governo e recolheu apoio dos aliados, ao passo que os críticos preconizam o abandono dos “velhos mitos”. À medida que reveses foram sendo registrados em algumas frentes de atuação, como nas relações com os vizinhos, a condescendência com as “novas roupas” da diplomacia foi dando lugar a críticas cada vez mais acerbas quanto a seus resultados efetivos.
Os elementos inovadores da política externa do governo Lula não deveriam, talvez, ser buscados no seu discurso e na atuação diplomática, mas sim no próprio fato de que, pela primeira vez na história da diplomacia brasileira, a palavra e a prática nesse campo já não recolhem o consenso da sociedade.

Paulo Roberto de Almeida é doutor em ciências sociais, diplomata de carreira e autor do livro O Estudo das Relações Internacionais do Brasil (www.pralmeida.org).

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Publicado no jornal O Estado do Paraná (Curitiba, sexta-feira, 27.10.2006, Opinião, p. 4;

King's College, Londres: Wanted, a Lecturer on Brazil

LECTURESHIP AT THE KING’S BRAZIL INSTITUTE, KING’S
COLLEGE LONDON
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The details of our lectureship are now in the job vacancies list
on the King’s website at
http://www.kcl.ac.uk/depsta/pertra/vacancy/external/pers_detail.php?jobindex=9214

The King's Brazil Institute was created in 2008 to encourage the development of stronger Brazil-related teaching and research capabilities within King's College London, as well as paving the way for firmer links with Brazilian organizations in education, the cultural and creative sectors, business and government. The Institute now wishes to appoint a Lecturer. The field for the appointment is open, but themes of particular interest for the Institute are Brazil and global politics; creative and cultural industries; environmental policy; the political economy of energy; law, justice, and human rights; public health and social policy; and Brazilian history. Full details of the vacancy are available on the King’s website.
For an informal discussion of the post please contact Professor
Anthony Pereira, Director of the King's Brazil Institute, at
e-mail or on +44 (0)20 7848 2146.

www.kcl.ac.uk/brazilinstitute

Brasil, o tamanho do Estado - secao especial da revista Veja

Adeptos do Estado, mercantilistas e estatizantes em geral (muita gente o é, mesmo sem saber), socialistas em especial, keynesianos radicais talvez não gostem, mas essa é a realidade: o Brasil é um país "raptado" pelo Estado (não estou exagerando), mas no qual os cidadãos gostam do Estado, amam o Estado, e querem mais Estado.
Talvez eles não fossem assim, se se informassem melhor sobre esse personagem...

Vejam o caderno especial da Veja sobre o papel e o tamanho do Estado no Brasil, neste link: http://veja.abril.com.br/tema/desafios-brasileiros-o-tamanho-do-estado

Questões abordadas:

O tamanho do estado

O estado brasileiro gasta muito - e gasta mal. Um exemplo: de cada 100 reais despendidos pelo governo federal, apenas 8 viram investimentos em infra-estrutura, educação, saúde... Os demais 92 reais são tragados pelas engrenagens estatais. Fazer esta máquina mais eficiente é um desafio do próximo presidente


Um gigante gastador
De cada 100 reais, 25 vão para o pagamento de pessoal e 67 para o custeio da máquina. Sobram 8
Em 2009, o governo recebeu das estatais 26,683 bilhões de reais em dividendos
R$ 68 bilhões para as estatais

Balanço aponta gastos com empresas públicas de 2003 a 2007. Quase a metade foi para a Petrobras

A melhor saída é diminuir o tamanho do Estado e investir principalmente em educação" (Mônika)
Fórum: qual deve ser o tamanho do estado brasileiro?

Analista de contas públicas defende reformulação do papel do estado

Para Felipe Salto, governo tem de ser mais enxuto e eficiente - e atuar como um regulador implacável

Os analistas apostam num descontentamento crescente com a incompetência do estado
Enquete
Qual deve ser o papel do estado?

Leitores pedem governo enxuto e eficiente
O presidente Lula, pouco antes de participar de evento de campanha de Dilma Rousseff
Herança
Lula vai deixar conta de R$ 90 bilhões
Valor supera os R$ 72 bi pendurados em 2009

Concessões de estradas e aeroportos são uma saída lógica para complementar investimento do estado

Contas públicas
Peso do estado reduz a competitividade

Máquina responde por 92% dos gastos
Menos de 10% do orçamento é composto de despesas sobre as quais o governo tem liberdade para administrar

Orçamento
Despesa obrigatória dificulta reformas

Governo define como gastar apenas 10%

Os candidatos José Serra (PSDB), Marina Silva (PV) e Dilma Rousseff (PT)
Eleições 2010
O estado brasileiro na visão dos candidatos

Conheça as propostas dos presidenciáveis
Elevação de perspectiva de rating Brasil
Investimento
Brasil só perde do Turcomenistão

País só investe 2% do PIB há mais de 10 anos

Carga tributária
Analistas criticam elogio do imposto

Lula se equivoca ao justificar tributação
Maílson da Nóbrega
Lula adora falar em 'estado forte'
Para ele, crise justificaria dirigismo estatal

A inauguração do Palácio do Planalto, em 21 de abril de 1960, simboliza a transferência da Capital Federal para o interior do país.
Em VEJA de 17/02/2010
Sessenta servidores novos por dia

É o ritmo de contratação no governo Lula
Infográfico Eles já são um milhão
Infográfico
Servidores já são mais de 1 milhão

Em sete anos, o efetivo foi inchado em 153 000