O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Constituinte de 1988: Cesar Maia, constituinte, entrevista a si proprio

Seria preciso deixar claro, antes de tudo, que NÃO houve Assembleia Constituinte, e sim Congresso Constituinte.
Escrevi um imenso trabalho sobre as loucuras econômicas da Constituinte e a esquizofrenia econômica que foi consagrada na Constituição de 1988, este aqui:
2505. “A Constituição brasileira contra o Brasil: uma interpretação econômica da esquizofrenia constitucional”, Hartford, 8 Agosto 2013, 39 p. Ensaio interpretativo sobre os mais importantes dispositivos econômicos da Constituição de 1988, e dos que regulam direitos sociais com impacto na economia do país, enfatizando seu caráter distributivo, o que inviabiliza uma taxa de crescimento mais vigorosa para o país. Resumo em 20 p. em 08/08/2013, sob o título “A Constituição brasileira aos 25 anos: um caso especial de esquizofrenia econômica”, Publicado no Digesto Econômico (Julho-Agosto 2013, p. 64-74). Novo resumo em 25 p. em 12/08/2013, sob o título “A Constituição brasileira contra o Brasil: dispositivos constitucionais que dificultam o seu crescimento econômico”, como contribuição a livro sobre “A Constituição de 1988 - comemoração crítica”, organizado por René Marc da Costa Silva e Márcia Leuzinger, em fase de publicação.

Como é muito grande, vou publicar aos "pedaços".
Paulo Roberto de Almeida

ENTREVISTA COM O DEPUTADO CONSTITUINTE DE 87/88, CESAR MAIA!

            

1. Ex-Blog: Você tem sublinhado a importância de contextualizar a Constituinte de 87/88 (AC-88). Por quê? Cesar Maia: Há que se levar em conta 3 fatores. O primeiro foi a previsibilidade. As etapas do processo de redemocratização foram geridas pelo próprio regime militar, especialmente pela emenda constitucional 11/78, que revogou o AI-5, da lavra do ministro Petrônio Portela (que faleceu jovem, 55 anos, em seguida). Portanto, a participação do partido do regime na eleição de 1986 foi contínua, sem constrangimentos.
            
2. Ex-Blog: E os outros 2 fatores? CM: O segundo foi o plano cruzado, quando o PMDB elegeu 22 entre 23 governadores. 38 de 47 senadores e 260 de 487 deputados. Mas a força do PMDB-SP com Ulysses Guimarães levou o PMDB a se dividir ao meio, do ponto de vista ideológico na AC-88, diluindo sua expressão eleitoral. E, durante a AC-88, com a proximidade da queda do Muro de Berlim um ano depois, as teses em superação, da esquerda, ainda estavam vivas e explicam dispositivos que depois foram chamados de atraso, mas que na verdade foram a expressão daquele momento.
            
3. Ex-Blog: O que destacaria no processo constituinte? CM:Claro, a sua dinâmica. Todas as Constituintes têm como preliminar uma comissão que elabora o documento-base. E, a partir daí, a AC se organiza por temas que fazem emendas e depois todo o conjunto vai ser votado e –se for o caso- reemendado em plenário. Mas a AC-88 foi um caso único. O presidente Sarney criou a Comissão Arinos. Quando chegamos em fevereiro de 1987 recebemos o documento. Houve uma rejeição majoritária por três questões mais importantes: o parlamentarismo, a centralização federal do ICM (ganhou um S na AC-88) e a criação do ministério da defesa (aliás, criado anos depois).
            
4. Ex-Blog: E o processo em si? CM: Sem documento básico decidiu-se criar comissões temáticas e estas, subcomissões que escreveriam os respectivos capítulos da constituição. Seriam documentos básicos desarticulados. Por isso –após esse trabalho- criou-se uma Comissão de Sistematização, com sessões plenárias e votação para consolidar o texto básico. E esse foi submetido ao Plenário Geral para receber emendas e ser votado dispositivo por dispositivo sem limitações. Um processo de baixo para cima, que explica tanto o alto grau democrático conseguido, como os acertos para votação que culminaram em uma grande quantidade de dispositivos que teriam que ser regulamentados posteriormente por leis complementares, até hoje não finalizadas.
           
5. Ex-Blog: Como foi a divisão de força na AC-88? CM:Formou-se um “partido/frente parlamentar” para dar base ao governo: o Centrão. A esquerda teve hegemonia na oposição, bem articulada e com uma forte presença dos movimentos sociais. E os independentes. Com isso, quase todas as votações eram imprevisíveis. A ideia do parlamentarismo cresceu e o texto –no final- reduziu os poderes do executivo, o que levou à previsão de um plebiscito sobre sistema/regime de governo uns anos depois, que reafirmou o presidencialismo. E se criou a Medida Provisória para substituir o Decreto Lei, um desvio que minimizou o legislativo posteriormente.
          
6. Ex-Blog: E as críticas do governo que aquela Constituição quebraria o governo? CM: O deputado Nelson Jobim (sub-relator geral) dizia que o Brasil não tinha uma Assembleia do Povo, mas uma Câmara dos Estados, com voto por distrito (estados) e dentro de cada um, voto proporcional aberto. Com isso, o bolo tributário depois de distribuído ficou em 40% para o Governo Federal/Previdência Social, 40% para os Estados e 20% para os Municípios. Com aquele argumento, o Governo Federal passou a usar o artificio de Contribuições, driblando a Constituição e alterando em dois anos a distribuição aprovada. Hoje são mais ou menos 50% para a esfera federal, 18% para a municipal e 32% para a estadual.
        
7. Ex-Blog: E o Estado do Rio? CM: Perdemos a votação de cobrança do ICM sobre operações interestaduais de petróleo. Mas a negociação sobre as compensações terminou ampliando bastante as receitas do Estado e da Capital. Os 3 impostos Únicos sobre Combustíveis, Energia Elétrica e Telecomunicações, que eram federais e repassados em uma pequena fração a Estados e Municípios, foram extintos e transformados em ICM –e por isso o S: ICMS. Um ganho importante para os Estados e o nosso em particular. Basta ver hoje o quanto representam da arrecadação. E –claro- a inclusão dos Royalties do Petróleo na Constituição. Antes havia uma lei que alocava ainda modestamente estes recursos.
        
8. Ex-Blog: Mais alguma coisa? CM: O mais importante da AC-88 é que deu ao país estabilidade e previsibilidade institucionais e esse é um elemento básico para o desenvolvimento. Lembro a normalidade no afastamento de Collor e, apesar dos constituintes do PT não terem assinado a Constituição de 1988, a eleição de Lula se deu neste novo marco institucional, o que não permitiu que os radicais do partido prevalecessem. 

Fonte: Ex-Blog do Ex-Prefeito (sic) Cesar Maia, 8/10/2013

O debate sobre o PIB e a PNAD: renda e consumo dos mais pobres - EdmarBacha

O pibinho e a pnadona
Edmar Bacha
O Globo, 08/10/2013

Consta que o general Médici, então ocupando a Presidência do país, teria dito, no auge do chamado milagre econômico do regime militar, que "a economia vai bem, mas o povo vai mal". A frase me inspirou a criar, em 1974, a fábula sobre o reino da Belíndia, uma ilha em que poucos belgas eram cercados de muitos indianos. Recentemente, economistas do governo, preocupados com a sequência de "pibinhos" acompanhados de elevada inflação, resolveram partir para a luta e proclamar que "a economia vai mal, mas o povo vai bem". Marcelo Neri tem dado entrevistas dizendo que Belíndia agora tem novo significado: a renda de nossos "belgas" cresce pouco como a dos europeus, mas a renda de nossos "indianos" cresce igual à dos chineses. Será que o Brasil mudou tanto assim, e deixou de ser uma Belíndia para se tornar uma Indiabela? Antes fosse. A realidade é que desde 1980 o país está parado no meio do caminho, incapaz de sair da renda média para se tornar um país rico. A distribuição da renda melhorou a partir da estabilização em 1994 e especialmente nos anos da bonança externa da década passada. Mas essa melhora só foi suficiente para o Brasil deixar de ser o país com a pior distribuição de renda do mundo e continuar no grupo dos países mais desiguais do planeta. Marcelo Neri, em artigo no GLOBO (4 de outubro), se entusiasma com o resultado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2012, segundo a qual o crescimento da renda por brasileiro teria sido de 8% de 2011 a 2012, um número maior do que o da China. O contraste com o PIB per capita não poderia ser maior, pois este aumentou apenas 0,1% de 2011 a 2012. Como pode o PIB per capita ter se estagnado e a renda per capita na Pnad ter crescido tanto assim? Neri não explica. Apenas assevera que entender o Brasil não é tarefa para amadores e mantém seu otimismo de que em 2013 haverá uma alta na felicidade geral da nação. Euforia ministerial à parte, parece melhor adotar uma atitude mais cautelosa. Caberia, antes de tudo, entender por que os dados da Pnad destoam tanto daqueles do PIB. Tarefa para profissionais, diria o Neri! Infelizmente, os profissionais andam batendo cabeça a respeito desse assunto. Alguns acham que o PIB está subestimado. Outros acham que se trata de conceitos distintos de renda real, pois a renda da Pnad é corrigida pela inflação (INPC) e o PIB é corrigido pelo chamado deflator implícito. Outros notam que o PIB é um conceito muito mais amplo que a renda das famílias na Pnad e que a comparação deveria ser feita, não com o PIB, mas com o consumo das famílias nas contas nacionais. Outros salientam que a Pnad apenas pergunta às pessoas qual foi sua renda em setembro de cada ano, enquanto que o PIB engloba uma massa muito maior de informações e cobre o ano inteiro. Há, finalmente, a questão do salário mínimo, cujo valor real vem sendo reajustado bem acima da inflação há alguns anos. É possível que a renda reportada pelas pessoas à Pnad seja muito influenciada pelo valor do mínimo legal e supere os ganhos financeiros que elas de fato auferem, especialmente quando transitam da informalidade para a formalidade. A evidência de o consumo das famílias nas contas nacionais não acompanhar o crescimento da renda da Pnad seria um indício dessa superestimação. Enquanto os economistas debatem as respostas para o dilema PIB x Pnad, é bom lembrar que o PIB retrata o potencial de produção do país. Se o PIB se mantiver estagnado, mais cedo ou mais tarde toda a população sofrerá. Durante algum tempo, especialmente num país tão desigual quanto o nosso, é possível elevar a renda dos mais pobres através de taxação e transferências, por exemplo. Isso é válido, mas não é sustentável. O Brasil precisa encontrar um caminho em que a distribuição de renda se alie ao crescimento, algo que ainda não conseguimos.

Brasil: anarquia partidaria, caos politico, promiscuidade eleitoral, enfim, o horror - Reinaldo Azevedo

Não creio, sinceramente, que o sistema partidário brasileiro, e com ele as regras eleitorais, e, mais importante, a governabilidade política tenham conserto, no curto, no médio ou num prazo mesmo longínquo. Ele é simplesmente "inconsertável", se só mudará com uma grave crise política que coloque em cheque as condições atuais da governabilidade. Essa crise política não virá antes de uma crise econômica, que também não se antevê no futuro previsível, porque o Brasil vai continuar na sua trajetória medíocre de crescimento, como uma lesma, na sua trajetória segura de mediocridade política, de desmantelamento institucional, enfim, de erosão da governança e da governabilidade. Ou seja, vai demorar.
Vamos continuar na decadência econômica, política, social, cultura e institucional.
Belo futuro, hein?
Paulo Roberto de Almeida

 O mundo que funciona é bipartidário; Brasil caminha no sentido inverso. E não funciona!
Reinaldo Azevedo, 7/10/2013

Eu poderia começar o texto assim: “Toda grande democracia do mundo é bipartidária”. Mas seria inexato. De fato, todas as democracias do mundo, grandes ou pequenas, são bipartidárias, ainda que haja dezenas de partidos. Nos EUA, por exemplo, chegam perto de… 80!, mas só dois têm condições efetivas de governar o país: o Democrata e o Republicano. Na Alemanha, a CDU (União Democrata-Cristã) sempre aparece unida (ou separada) da CSU, a União Social-Cristã, por um hífen. É que particularidades regionais fazem com que a CDU se chame, na Baviera, CSU… Legendas médias, pequenas ou nanicas, mundo democrático afora, orbitam em torno de dois grandes núcleos: um poderia ser definido, genericamente, como “progressista”, e o outro, como “conservador”.
“Progressista” e “conservador” em relação a quê? Às mais diversas questões, que vão da economia (mais distributivista ou menos, mais estatista ou menos) aos valores (mais libertários ou menos em matéria de costumes). Cada um desses núcleos forma um imaginário, e os eleitores fazem as suas escolhas de acordo com as demandas tornadas urgentes. Nos EUA, há um virtual empate entre democratas e republicanos; na Alemanha (desconsidero a unificação), também: com particularidades nas quais não vou entrar, o fato é que a democracia-cristã deu as cartas entre 1949 e 1969; o comando do jogo passou para a social-democracia entre 1969 e 1982; voltou para a democracia-cristã entre 1982 e 1998, foi retomada pela social-democracia entre 1998 e 2005 e voltou para os conservadores — Merkel acaba de ser reeleita. Cito dois sistemas tão distintos para evidenciar que não é a forma de governo que determina nem a polarização nem a alternância. O regime parlamentarista pode ter ciclos mais longos de domínio de um partido — domínio que não implica esmagamento da oposição.
Se a livre organização partidária é própria das democracias, a fragmentação do Parlamento numa miríade de pequenos partidos pode ser um sintoma de doença, a atentar contra a saúde do próprio sistema. A bagunça existente no Brasil, que só tende a crescer, o evidencia à farta. É curioso: Banânia deve ser o país do mundo livre que mais estabeleceu regras e cláusulas para a formação de partidos. Não por acaso, creio, é aquele em que o Parlamento mais está fragmentado. Para a alegria e felicidade dos brasileiros? Não! Para a sua desgraça.
O que distingue, por exemplo, o PSD, a quarta maior bancada da Câmara, depois do troca-troca, do PMDB? São os métodos? É o credo (“nem de direita, nem de esquerda nem de centro)? É o quê? E o Solidariedade? Não é tucano — ou mesmo petista — por quê? Notaram que a imprensa, e não sem motivos, chama o primeiro de “o partido de Kassab” e o segundo de “o partido de Paulinho”? O tempo passa, e o sistema regride: era evidente que essa fragmentação passaria a conviver com uma espécie de privatização de partidos. Há uma afeganistanização do Parlamento, que passa a ser dominado por “Senhores da Guerra”.
Vejam que pitoresco. Mesmo depois de mais de 10% dos deputados terem mudado de legenda, o governo continua a contar com o apoio de escandalosos 75% da Câmara. Em nenhuma democracia do mundo se tem oposição tão nanica. Nem na ditadura venezuelana. É evidente que isso não reflete a vontade expressa nas urnas há três anos. Boa parte dos agora parlamentares do PSD, por exemplo, foi eleita para fazer oposição. E é situação. Há, sim, um ou outro que fizeram o caminho contrário, mas em menor número. O tal PROS, nascido para ser governista, já recebeu parlamentares eleitos para combater o petismo.
O que pesa nessas decisões? Convicção? Não! Grupos vão se organizando para arrancar benesses do poder. Não são direta, esquerda, centro; não são governistas nem oposicionistas; não são “progressistas” ou “conservadores”. São apenas candidatos a sócios do poder, qualquer que seja ele. Por mim, a criação de partidos seria ainda mais livre do que hoje, sem exigência de assinaturas ou sei lá o quê. Mas também não haveria fundo partidário, horário político gratuito — e eleitoral tampouco.
A bagunça na legislação que regula a formação dos partidos — de um lado, cartorial e burocratizada; de outro, relaxada a mais não poder — é uma das raízes do problema. A outra são os superpoderes de que dispõe o Executivo. Se as democracias que funcionam são, na prática, bipartidárias, a nossa, vejam vocês, vai caminhando no sentido inverso. O assunto está longe de se esgotar. Agora mesmo, saúda-se a união de Marina Silva com Eduardo Campos como rompimento de uma polarização que se julgava negativa. Muito bem: digamos que isso fosse verdade, cabe perguntar: ela estaria se rompendo em nome exatamente do quê?

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Professor de Portugues brasileiro para universidade de Toulouse: emprego...


Cherche professeurs de portugais - URGENT






La Section de portugais de l'Université de Toulouse le Mirail recherche un collègue titulaire de l'ensei­gnement secondaire (certifié ou agrégé), de norme brésilienne, pour assurer 384 heures annuelles (statut PRCE / PRAG). Il s'agit d'un poste pé­renne. Cours dispensés dans les filières LLCE et LEA. Pour candidater, suivre le lien suivant (urgent) :






O Premio Nobel do Erro: Enrico Fermi, Fisica 1938

Il y a 75 ans, le Nobel de physique récompensait… une incroyable erreur

Lundi 7 octobre s'ouvre la grande parade annuelle des prix Nobel, avec la catégorie "physiologie ou médecine". Suivront la physique (le 8 octobre), la chimie (le 9), la paix (le 11), les sciences économiques (le 14) et la littérature à une date qui n'est pas encore déterminée. 2013 est l'occasion d'un curieux anniversaire puisqu'on fête cette année les 75 ans de ce qu'on peut appeler le prix Nobel de l'erreur et ce dans le domaine qui est censé être le plus précis de tous ceux que cette récompense recouvre, à savoir la physique.
En 1938, c'est l'immense chercheur italien Enrico Fermi qui reçoit la distinction suprême pour, je cite, "sa découverte de nouveaux éléments radioactifs, développés par l’irradiation des neutrons, et sa découverte à ce propos des réactions de noyaux, effectuées au moyen des neutrons lents". Le communiqué explicite cette découverte ainsi : “Fermi a en effet réussi à produire deux nouveaux éléments, dont les numéros d’ordre sont 93 et 94, éléments auxquels il a donné le nom d’ausénium et d’hespérium.” Seulement voilà, d'ausénium et d'hespérium il n'y avait en réalité point dans l'expérience du savant transalpin. Fermi s'était trompé dans son interprétation et il avait néanmoins eu le prix Nobel pour la découverte de deux éléments imaginaires...
Pour comprendre cette erreur, il faut replonger dans les années 1930, ère des pionniers du noyau atomique. L'histoire illustre à merveille la manière dont la science se trompe, se corrige et, ce faisant, s'améliore. Que fait Enrico Fermi dans l'expérience qui lui vaut ce Nobel, relatée en 1934 dans Nature ? A l'époque, on ne connaît pas d'élément chimique dont le noyau contienne davantage de protons que l'uranium (92) et le chercheur italien se demande s'il est possible de synthétiser des éléments plus lourds. Son idée est de profiter de la radioactivité bêta qu'il vient de modéliser et grâce à laquelle un neutron peut se transformer en proton (ou le contraire). Pour son expérience, Fermi part de l'idée qu'en bombardant de neutrons des noyaux d'uranium, ceux-ci vont finir par absorber un neutron qui, sous l'effet la radioactivité bêta, se transformera en proton. Le noyau aura finalement gagné un proton, ce qui aura "transmuté" l'uranium à 92 protons en élément nouveau à 93 protons (que Fermi appellera ausénium). Après une nouvelle étape, celui-ci se métamorphosera en élément à 94 protons (nommé hespérium). La difficulté de l'expérience consiste à détecter la présence de ces nouveaux éléments. Fermi ne les identifie pas chimiquement : il se contente de constater que l'expérience produit deux "choses" radioactives dont les caractéristiques sont inconnues. Pour lui, c'est la preuve, certes indirecte, mais la preuve quand même, qu'il a synthétisé deux nouveaux éléments.
Comme l'explique Martin Quack, chercheur à l'Ecole polytechnique fédérale de Zurich, dans l'article qu'il a récemment consacré à cette histoire (publié parAngewandte Chemie International Edition), Enrico Fermi est au départ plutôt prudent dans sa formulation. Mais les années passant et rien ne venant contredire cette interprétation, cette prudence s'estompe et l'on considère le résultat comme acquis, d'autant que la stature scientifique de l'Italien est immense. La chimiste allemande Ida Noddack tente bien d'avancer que le niveau de preuve n'est pas suffisant, mais personne ne tient vraiment compte de ses objections. Un magnifique cas d'école de l'aveuglement des experts.
Tout se précipite à la fin 1938, comme dans un thriller scientifique où le temps se condense et s'accélère. Le 12 décembre, Enrico Fermi reçoit à Stockholm son prix Nobel des mains du roi de Suède. Il en profite pour fuir aux Etats-Unis, la situation de son épouse, qui est juive, étant de plus en plus précaire dans l'Italie mussolinienne. Une semaine plus tard, le 19, le chimiste allemand Otto Hahn, qui a, avec Fritz Strassmann, reproduit l'expérience de Fermi, envoie ses résultats à sa consœur Lise Meitner : les produits de l'expérience ne sont pas des éléments superlourds. Au contraire, cela ressemble à des isotopes inconnus d'éléments plus légers, notamment du baryum (56 protons). Mais comment diable de l'uranium peut-il donner du baryum ? Pendant les vacances de Noël, Lise Meitner discute avec son neveu, Otto Frisch de la possibilité théorique qu'un noyau d'uranium se brise pour donner des noyaux plus légers. Ils écrivent un article en ce sens qui sera publié en février 1939. Ce qu'avait réalisé Enrico Fermi sans le comprendre, c'était la première expérience de fission nucléaire !
Le coupable était dans l'uranium. Le minerai naturel d'uranium contient deux isotopes de cet élément. Le premier, l'uranium 238 (92 protons + 146 neutrons) est de très loin le plus courant puisqu'il représente plus de 99 % du minerai. Le second, l'uranium 235 (92 protons + 143 neutrons) est beaucoup plus rare (0,7 %) au point qu'on peut le considérer comme une impureté. C'est lui qui est fissile et que l'on emploie dans de nombreux réacteurs nucléaires. Et c'est aussi lui qui se trouvait dans la bombe atomique d'Hiroshima. Dans l'expérience de Fermi, le bombardement de neutrons n'a, contrairement à ce qu'espérait le savant italien, rien fait aux atomes d'uranium 238. En revanche, il a provoqué la fission des noyaux d'uranium 235. Les produits nouveaux qu'a détectés l'Italien étaient des produits de fission, des éléments plus légers, inconnus sous cette forme radioactive, comme le baryum 140.
Enrico Fermi méritait sans doute un Nobel et il est dommage qu'il l'ait reçu pour une expérience mal interprétée et pas assez approfondie. Dès qu'il apprit la découverte de Hahn et Strassmann, début 1939, il modifia son discours de réception du prix pour intégrer ce nouveau résultat, preuve d'une grande honnêteté intellectuelle. Les deux chercheurs allemands reçurent le Nobel de chimie 1944 pour la fission nucléaire (Lise Meitner étant scandaleusement oubliée dans l'histoire) et, d'une certaine manière, pour avoir corrigé l'erreur de Fermi. Ce dernier réalisa, en collaboration avec Leo Szilard, la première pile atomique en 1942, c'est-à-dire la première réaction nucléaire en chaîne contrôlée de l'histoire. Et, bien sûr, Fermi travailla pour le projet Manhattan qui mena à la bombe atomique. Quant aux éléments 93 et 94, le neptunium et le plutonium, ils furent bel et bien produits selon le processus qu'avait prévu Fermi. En 1951, on donna donc de nouveau un prix Nobel (de chimie) à ceux qui les avaient mis en évidence, mais cette fois-ci pour de vrai : Glenn Seaborg et Edwin McMillan.
Trois-quarts de siècle après le Nobel de l'erreur, l'histoire vient rappeler que la science a deux versants inséparables, le côté créatif et le côté critique. Comme le souligne Martin Quack dans son article, "la composante créative s'engage dans de nouvelles idées et dans des avenues inexplorées (...). Elle se vend bien grâce au terme chic de "nouveau". Cependant, la composante critique est tout aussi importante que la composante créative. Elle interroge le résultat "nouveau", soumettant ses faiblesses à une critique sévère, répétant et testant les résultats dans de longues enquêtes impliquant un dur labeur. Souvent elle rejette ou corrige le résultat original et mène parfois à une découverte encore plus frappante." Vérifier les résultats des autres a des airs austères et tristes de police scientifique mais conduit parfois à la révolution.
Pierre Barthélémy (suivez-moi ici sur Twitter ou bien là sur Facebook)

Programas eleitoreiros: governo descumpre a Lei de RF e o Estatuto da CEF

A “CAIXA” E OS RISCOS DOS SUBSÍDIOS DO PROGRAMA “MINHA CASA MELHOR”!
Estado de S.Paulo, 06/10/2013

A Caixa ignorou análises feitas pela própria área técnica ao bancar o programa Minha Casa Melhor, uma linha de crédito para a compra de móveis, computadores e eletrodomésticos. Da forma como foi feito, o programa, considerado uma vitrine eleitoral da presidente Dilma Rousseff, pode representar riscos para a saúde financeira do banco, segundo documentos obtidos pelo jornal "O Estado de S. Paulo". 

            Os documentos mostram que a possibilidade de calote nessa linha, que é direcionada para os mutuários do Minha Casa, Minha Vida, chega a 50,73% na faixa das famílias mais pobres da população, a 30,31% nas intermediárias e a 28,52% na faixa de maior renda atendida pelo programa. Com esses níveis potenciais de perda, apontam os documentos, a necessidade de compensação pelo Tesouro é de R$ 2,9 bilhões até 2016.

            O parecer técnico da Caixa, produzido poucas semanas antes do lançamento do programa, adverte que a decisão do Tesouro, prevista na então Medida Provisória 620, de dispensar a Caixa do recolhimento de parte dos dividendos para a cobertura do risco de crédito dos financiamento dos bens de consumo, faz, "contabilmente, com que a operação seja deficitária desde o começo".
            Segundo a nota técnica, a falta dessa cobertura poderá ser questionada pelo Tribunal de Contas da União, por caracterizar que a Caixa está subsidiando um programa de governo, o que é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. O entendimento técnico é de que a proposta de dispensar o recolhimento de parte dos dividendos para cobrir o risco de crédito vai contra o estatuto da Caixa.

O capitalismo estatal dos companheiros submergiu: adivinha quem paga o prejuizo?

Você caro leitor, eu também, todos nós, pois o BNDES se apropria de parte do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, que seria em teoria nosso (apenas em teoria). Você também paga pela dívida pública que o governo contrai para repassar recursos ao BNDES (280 bilhões nos últimos 3 anos), em juros e principal...
Ou seja, os companheiros afundam o Brasil com seus projetos chineses, e nós pagamos a conta...
Paulo Roberto de Almeida

As campeãs nacionais de desastres
ELIO GASPARI
Folha de S.Paulo, 6/1-/2013

O sonho petista de criar um bloco de empresas financiadas pelo BNDES reeditou um pesadelo
Em 2007, o BNDES ressuscitou o zumbi da anabolização de empresários amigos e anunciou que o governo queria criar um núcleo de "campeões nacionais", inserindo-o no mundo das grandes empresas mundiais. Nesse lance, botou perto de R$ 20 bilhões em empresas companheiras.
Numa mesma semana, dois fatos mostraram o tamanho do fracasso dessa política. O conglomerado da OGX, produção megalomaníaca de Eike Batista na qual o BNDES financiou R$ 10,4 bilhões, está no chão. A "supertele" Oi, produto da fusão pra lá de esquisita e paternal da Telemar com a Brasil Telecom, tornou-se uma campeã nacional portuguesa, fundindo-se com a Portugal Telecom. Em 2010, o BNDES e os fundos de pensão tinham 49% da empresa. A nova "supertele" nasce com uma dívida de R$ 45,6 bilhões. Novamente, receberá recursos do BNDES e dos fundos companheiros. O ministro Paulo Bernardo, das Comunicações, garante que essa fusão é uma "estratégia". Vá lá, desde que ele acredite que o Unibanco fundiu-se com o Itaú.
A carteira de ações do BNDESPar caiu de R$ 89,7 bilhões em 2011 para R$ 72,8 bilhões em 2012. A campeã do ramo de laticínios chamava-se LBR e quebrou. A Fibria, resultante da fusão da Aracruz (chumbada) com a Votorantim, atolou. O frigorifico Marfrig tomou R$ 3,6 bilhões no banco e acabou comido pela JBS, cujos controladores movem-se num perigoso mundo onde convivem a finança internacional e a política goiana. Já o Bertin teve que ser vendido logo depois de o BNDES entrar na empresa. (Até 2013, esse setor recebeu a maior parte dos investimentos do BNDES.)
O BNDES anunciou há meses que abandonou a estratégia da criação dos campeões nacionais. Falta só explicar quanto custou, quanto custará e que forças alavancaram os afortunados. Essa tarefa será fácil para alguns petistas e para o doutor Luciano Coutinho. Eles conhecem a história do banco.

(Folha de São Paulo e O Globo/06Out13)
===========
Materia da Veja.com, sobre o assunto:

A chamada política das ‘campeãs nacionais’, criada há seis anos pelo governo Lula e executada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), encontra na Oi seu mais novo exemplo de fracasso. A fusão da operadora brasileira de telefonia com a Portugal Telecom, encarada pelo mercado como ‘venda’, deve se concretizar nos próximos meses e criar um gigante com receita da ordem de 40 bilhões de reais. Os investidores estão otimistas com a fusão, afinal, a entrada do capital português poderá ajudar a empresa a investir em infraestrutura e conquistar maior participação de mercado em telefonia móvel e em banda larga. “Para a Oi, é benéfico porque a empresa sai de uma situação de dívida altíssima para uma empresa com uma estrutura de capital bem melhor, além de fazer parte, agora, de um grupo internacional”, diz Pedro Galdi, da SLW Corretora. Contudo, a venda enterra, mais uma vez, o discurso do chamado “capitalismo de estado”, em que empresas são ‘turbinadas’ com dinheiro público para se tornarem multinacionais.

Essa política previa que o estado investisse em alguns segmentos do setor privado por meio do BNDES (comprando participação ou emprestando dinheiro com taxas de juros subsidiadas pelo Tesouro), com o objetivo de criar empresas brasileiras fortes para competir no mercado global. O banco injetou cerca de 20 bilhões de reais em companhias como JBS, Marfrig, Lácteos Brasil (LBR), Oi e Fibria. O resultado, seis anos depois, não é nada animador: LBR pediu recuperação judicial, Marfrig teve de vender a Seara para a JBS para reduzir seu endividamento, enquanto a empresa dos irmãos Wesley e Joesley Batista, apesar de em melhor saúde financeira que a concorrente, também sofre para reduzir as dívidas adquiridas ao longo de seu processo de expansão.

A Oi é um caso de fracasso à parte não só porque envolveu a participação maciça do BNDES. Sua própria constituição foi um exemplo de intervencionismo — e a venda para os portugueses evidencia o plano equivocado. Em 2008, o governo mobilizou todos os seus esforços sob o comando do próprio Lula, da então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ministro das Comunicações, Hélio Costa, para mudar a legislação e permitir que a Oi comprasse a Brasil Telecom.

O negócio, visto como prejudicial para os acionistas minoritários porque diluía sua participação e porque eles tampouco concordavam com o preço (5,8 bilhões de reais), foi viabilizado depois de um lobby ostensivo que contou até mesmo com um decreto do presidente mudando as regras do setor. Segundo a legislação da época, um mesmo controlador não podia ser dono de duas concessionárias de telefonia fixa. O problema foi resolvido por meio de um decreto sem que o Congresso sequer participasse da decisão.

O argumento do governo era de que o país não podia deixar todas as suas empresas de telecomunicações nas “mãos de estrangeiros”. E, como a Brasil Telecom vinha sendo assediada por investidores de fora, como o bilionário egípcio Naguib Sawiris, dono da Orascom, houve uma movimentação sem precedentes para que ela fosse adquirida pela Oi. “O discurso era claramente de que o Brasil tinha de preservar a soberania e não deixar um ativo tão importante nas mãos de um estrangeiro”, afirma um executivo que participou da negociação da Brasil Telecom, em condição de anonimato. O BNDES entrou na negociação financiando 2,6 bilhões de reais, enquanto 4,3 bilhões de reais foram aportados pelo Banco do Brasil. Os fundos de pensão Previ, Petros e Funcef, que já detinham participação na Brasil Telecom, passaram a ser donos de 34% das ações da nova empresa.

A história começou a mudar quando, em 2010, numa negociação entre três partes, a Portugal Telecom vendeu sua participação na Vivo para a Telefonica e entrou na Oi. “Quando isso aconteceu, todos esperavam que os portugueses assumissem o controle cedo ou tarde. Era apenas uma questão de tempo”, afirma outra fonte próxima da empresa, que preferiu não ter seu nome citado. Assim, o anúncio da fusão apenas costura o desfecho de uma estratégia que começou errada e, no lugar de criar uma grande multinacional, deu origem a uma tele ineficiente financiada pelo capital do BNDES. “A Oi receberá um novo aporte de 7 bilhões que ajudará a companhia a aumentar investimento e reduzir dívida. Contudo, o aporte não resolve todos os problemas da empresa. Ela precisará montar um plano para reduzi-la”, afirma Arthur Barrionuevo Filho, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

O negócio entre Oi e Portugal Telecom ainda não foi assinado, mas foi chancelado pelo governo e pelo BNDES. Em um ‘mundo perfeito’, essa chancela poderia ser compreendida como um reconhecimento, por parte do PT, de que a estratégia de interferir de forma tão contundente no setor privado não poderia render boa coisa. Mas a realidade é bem outra. O governo continua valendo-se do discurso da soberania, mas com outro objetivo — até mais danoso. Ao tentar forçar empresas estrangeiras de tecnologia, por meio do marco civil, a montar seus datacenters no Brasil, numa ingênua tentativa de ‘espantar’ a espionagem internacional, ele mostra ainda não ter aprendido com certos erros do passado.

A Constituicao aos 25 anos: artigo de Jose Serra (FSP), caderno especial do Estadao

José Serra
Folha de São Paulo, 05/10/2013

Nos 25 anos da Constituição que Ulysses Guimarães classificou de “cidadã”, alinho-me com aqueles que avaliam que uma das virtudes da Carta é sua vocação garantidora de direitos. Foi, nesse caso, o bom uso que se fez de circunstâncias que não eram da nossa escolha. Explico-me: finda a ditadura militar, a Lei Maior procurou expressar o seu repúdio ao autoritarismo, precavendo-se de tentações golpistas e da agressão a direitos individuais. Mas também é preciso dizer que fizemos uma Carta excessivamente marcada por contingências, com o olhar, muitas vezes, posto no retrovisor. Seus defeitos, curiosamente, não foram obra nem da esquerda nem da direita, mas do atraso. No Brasil, infelizmente, os direitistas costumam deixar de lado o conservadorismo virtuoso, e os esquerdistas, o igualitarismo generoso.
Poucos parecem divergir, a esta altura, da constatação de que o principal mérito da Constituição de 1988 é a consagração das liberdades democráticas — de opinião, manifestação e organização — e das garantias individuais:  a criminalização inequívoca do racismo, a  abolição do banimento e da pena de morte, o livre exercício dos cultos religiosos, o repúdio à tortura e a tratamentos desumanos ou degradantes dos cidadãos,  etc. Isso tudo  ficou condensado no artigo 5º, o mais extenso da Carta, com quatro parágrafos e 78 incisos.
À parte o capítulo das liberdades públicas e individuais, destaco, em planos distintos, como os maiores avanços da Carta de 1988 a concepção do SUS;  a  criação de um fundo (posteriormente chamado FAT) que reuniu as contribuições do PIS PASEP para   tornar viável o seguro desemprego e , ao mesmo tempo, financiar investimentos;  o dispositivo que definiu o salário mínimo como o piso dos benefícios previdenciários de prestação continuada; os capítulos que lidam com finanças públicas e controle externo ao Executivo e ao Legislativo —  os tribunais de contas, por exemplo, foram extremamente fortalecidos nas suas atribuições; novos marcos para a política ambiental; o fortalecimento do Ministério Público e a instituição do segundo turno na eleição para presidente, governadores e prefeitos em cidades com mais de 200 mil eleitores.
Mas há também alguns defeitos severos, que apontei e combati quando deputado constituinte — muitas das críticas foram expressas em artigos semanais nesta Folha: a prolixidade;  as concessões de natureza corporativa; a prodigalidade fiscal; a falta de um regime geral de previdência mais homogêneo e adequado ao longo prazo; o atrelamento dos sindicatos ao Estado e a falta de inovação em matéria de sistema político e eleitoral. Deixo de mencionar aqui algumas aberrações aprovadas a respeito da ordem econômico-financeira, removidas nos quinze anos seguintes por intermédio de emendas constitucionais. Tomei a inciativa, como senador, de escoimar da carta os absurdos na área financeira. Contei com o apoio, faça-se justiça aos fatos, do então líder do PT no Senado, José Eduardo Dutra.
A prolixidade não precisa ser provada; é auto-evidente: 245 artigos e 97 disposições transitórias, com numerosos parágrafos e incisos, muitos  deles típicos de leis ordinárias, decretos, portarias ou simples declarações de intenção em discursos parlamentares. Um  exemplo pitoresco? A constitucionalização da existência da Justiça Desportiva e a garantia de “proteção e incentivo às manifestações desportivas de criação nacional”, o que, por óbvio, deixou de fora o futebol, o vôlei e o basquete…
Ao contrário do que se pensa, os interesses corporativos principais cravados na Constituição não foram os do setor privado, mas os da área da administração pública, de que é exemplo escancarado a estabilidade para os servidores não concursados de órgãos públicos que estavam empregados havia mais de cinco anos da data de promulgação da Carta. Abriu-se caminho  ainda para toda sorte de isonomias salariais, permanente e poderoso mecanismo gerador de despesas.
Esse aspecto corporativista da Constituição representou um fator decisivo na chamada prodigalidade fiscal. Outro foi a forte redistribuição federativa de receitas tributárias, sem que houvesse, paralelamente, nenhuma descentralização de encargos — feroz e eficazmente combatida pelas corporações de funcionários e de clientes dos setores envolvidos.
Se a força e a amplitude dos direitos e garantias fundamentais deveu-se à ruptura com um regime de força — tratava-se de esconjurar o passado —, os defeitos da Carta de 1988 estão relacionados a contingências políticas e às falsas expectativas que gerou. Afinal, a Assembleia Nacional Constituinte tinha sido uma bandeira da oposição ao regime militar desde a segunda metade da década de 1970. Não era vista apenas como o umbral da liberdade, mas também da prosperidade e da justiça social.
Havia uma expectativa de elevação imediata do bem-estar social, o que havia sido proporcionado, note-se, pelo Plano Cruzado, na sua fase bem-sucedida em 1986, proporcionando muitos votos ao PMDB nas eleições desse ano. Ocorre que a agonia do plano coincidiu com o início dos trabalhos da Constituinte, no começo de 1987.  A sombra da inflação de dois dígitos mensais, fator de profunda perturbação e instabilidade social, fez sombra na Assembleia até o fim. Parlamentares e partidos se moviam freneticamente para mostrar serviço aos eleitores e para responder a demandas da opinião pública, procurando mitigar insatisfações com a criação de preceitos constitucionais. Ou por outra: uma Carta Constitucional, que é feita, por definição, para durar e para estar acima de contingências, transformava-se em fator de ajuste de tensões sociais e conflitos distributivos corriqueiros.
O colapso da estabilidade econômica enfraqueceu rapidamente o governo Sarney e ampliou a distância entre o mandatário e o PMDB, partido ao qual se filiara exclusivamente para assumir a condição de vice na chapa encabeçada por Tancredo Neves. O setor mais influente do partido deu início aos trabalhos para redigir a nova Carta procurando diferenciar-se do governo. Ganhou força a ideia de uma Assembleia que editasse Atos Constitucionais que se sobrepusessem ao Executivo. Isso acabou não acontecendo, mas inaugurou um tipo de conflito que se manteria até o final do processo constituinte.
O confronto mais relevante teve como objeto a duração do mandato de Sarney, que tinha sido eleito com Tancredo para governar por seis anos, mas aceitava cinco. O então líder da bancada do PMDB, Mário  Covas, defendia quatro e emplacou esse número numa primeira versão da Constituição, vinda da Comissão de Sistematização, em meados de 1987, junto com a aprovação do parlamentarismo. O presidente Sarney propôs um acordo: apoiaria o parlamentarismo se lhe dessem cinco anos e o direito de indicar um primeiro ministro com estabilidade inicial de dez meses, se a memória não me falha. O PMDB recusou a oferta. O governo não mediu esforços para garantir os cinco anos, recorreu a todas as armas da fisiologia, para dizer o mínimo, e saiu vitorioso. O trágico é que o parlamentarismo acabou sendo tragado pela voragem.
A impopularidade e a insegurança do governo, determinadas pela inflação galopante e pelos conflitos com a Assembleia, retiraram do governo a capacidade de assumir um papel relevante na formação do texto constitucional. Na verdade, o Planalto se omitiu, especialmente em relação aos gastos — chegou a apoiar medidas nesse sentido.  O chamado “Centrão”, um agrupamento de parlamentares mais ligados ao governo, só tinha compromisso com os cinco anos e o presidencialismo. No mais, dispôs de plena autonomia para defender suas propostas.
É preciso destacar ainda as condições difíceis em que atuou o PMDB, o maior partido do Congresso. Era já uma força extremamente heterogênea, cindida por interesses regionais. Chegou à Constituinte sem uma concepção sobre a Carta ou a forma de organizar o trabalho. Além disso, ficou politicamente dividido entre suas duas figuras principais, ambos aspirantes à Presidência nas eleições seguintes: Ulysses Guimarães e Mário Covas. O primeiro era o presidente da Assembleia; o segundo, líder do partido, eleito contra o candidato de Ulysses.
Alguns analistas se confundem ao procurar entender o texto constitucional a partir da dinâmica de conflitos entre “esquerda” e “direita”. A chamada direita, no Brasil, não se expressa pelo conservadorismo, mas pelo atraso. Nem remotamente é austera. O texto substitutivo do Centrão era mais gastador e prolixo, mais recheado de casuísmos, privilégios corporativos, vinculações e isonomias do que o já pródigo projeto que fora por ele derrubado, da Comissão de Sistematização, este sim comandado pela fatia do PMDB que se afastara do governo.  Mesmo o Centrão, note-se, manteve no seu projeto todas as garantias democráticas do relatório que conseguiu derrubar. Estas não foram objeto de nenhum confronto significativo no desenrolar de todo o processo. E,  só por curiosidade, foi do Centrão, do deputado Gastone Righi, a criação do abono de férias para todos os assalariados…
O que se poderia chamar “esquerda”, à época, era dominada pela concepção do Estado varguista e as ideias das décadas de 50 e 60, alienadas das mudanças que já estavam acontecendo no mundo e que só começariam a tornar-se mais transparentes no Brasil depois da queda do Muro de Berlim. Para ela, eram exóticas as preocupações com inflação, quadro fiscal, travas ao investimento privado e paternalismo estatal, sem mencionar a confusão permanente e até contradição entre benefícios para corporações restritas e  os interesses sociais mais amplos.
Os dois lados exibiram seu antagonismo — o que politicamente convinha a ambos — com farta cobertura da imprensa. O tema foi a reforma agrária, e o confronto se deu em torno da função social da propriedade e da possibilidade de se desapropriarem propriedades produtivas. Tudo acabou resolvido em dois artigos. Noves fora as diferentes formas de lidar com o MST e  com a inconstitucional violência rural, nenhum governo posterior procurou mexer no texto desses artigos nem deixou de levar adiante o caríssimo processo da reforma agrária.

Não por acaso, os dois lados, com a cumplicidade de sucessivos governos, foram e continuem sendo integrantes ativos do mais consolidado de todos os partidos brasileiros: a FUCE – Frente Única Contra o Erário e a favor das corporações de interesses especiais. Ninguém é mais falsamente de esquerda do que ela. Ninguém é mais falsamente de direita do que ela. Ninguém, como ela, é tão objetivamente contra os interesses do Brasil e dos brasileiros.
===========
Editorial do Estadão e caderno especial: 

25 anos de Constituição

Editorial O Estado de S.Paulo, 6/10/2013

A Carta Magna chega aos 25 anos diante de um País que se mobiliza nas redes e vai às ruas por direitos sociais sem deixar de garantir a estabilidade democrática

Cidadã é o adjetivo que, com simplicidade e realismo, define a Constituição promulgada há 25 anos, em 5 de outubro de 1988. Comandada por Ulysses Guimarães, o político que ganhou a alcunha de “tetrapresidente”, a Assembleia Nacional Constituinte, formada por 559 membros (72 senadores e 487 deputados), foi o marco da transição democrática.
Nesse quarto de século, as mudanças de governo ocorreram todas sob normalidade institucional, mesmo quando um presidente foi afastado. 
O Brasil de 2013 foi às ruas usando as redes sociais como instrumento de mobilização por mais cidadania, e a liberdade de expressão se consolidou como regra do regime democrático. Esse direito, garantido em cláusula pétrea da Carta - não pode ser alterada nem por emenda -, acabou por se transformar em um dos principais valores para uma convivência harmoniosa no País.
Se a Constituição é cidadã, a Nação ainda é claudicante no quesito cidadania. Poucas iniciativas populares, como a Ficha Limpa, se transformaram em lei. Ao mesmo tempo, a Carta está pronta para enfrentar os desafios digitais que surgiram nos últimos 25 anos. 
Promulgada com 250 artigos no texto-base (e mais 97 disposições transitórias), a Constituição teve, ao longo de duas décadas e meia, 48% de seus artigos alterados por emendas. Os três últimos presidentes - FHC, Lula e Dilma - editaram e editam, em média, mais de três medidas provisórias por mês. O polêmico debate das MPs durante a Constituinte assegurou, no sistema presidencialista, excesso de poder ao Executivo e acaba por gerar desarmonia entre os Poderes. 
Fruto de uma construção coletiva, a Carta de 1988, ao idealizar o Estado de bem-estar social, serviu de justificativa para a elevação dos impostos. Municípios e Estados receberam mais recursos do bolo tributário, mas a descentralização dos serviços públicos não tira a discussão sobre o pacto federativo da pauta. 
O adjetivo dado por Ulysses não dá conta, porém, de toda a polêmica sobre o excesso de detalhes do texto. Ainda assim, esses 25 anos não apagaram o mantra do “Sr. Diretas”, morto em 1992: “Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca.”