O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 12 de outubro de 2013

Palestras academicas: PRA em universidades americanas...

Esta primeira foto é de uma conferência em Baltimore, onde apresentei este trabalho:

2479. “Brazilian Economic Historiography: an essay on bibliographical synthesis”, Hartford, 11 Abril 2013, 17 p. Apresentado na 38a. Conferência da Economic & Business History Society, em Baltimore (23-25 de maio de 2013).


Esta outra palestra foi dada em Yale, um mês atrás: 

2497. “Contemporary Brazil: politics and economy in an emerging country”, Hartford, 8 Julho 2013, 1 p. Esquema de apresentação para palestra na Universidade de Yale, sobre os eventos correntes no Brasil; feita em 11/09/2013, Preparado PowerPoint, 30 slides, para servir de suporte ao debate.

O velho Brasil de sempre: corrupcao; quando os brasileiros vao aprender com a experiencia?

A pergunta é exatamente esta: quando é que os brasileiros vão aprender que QUALQUER benefício público, qualquer prebenda, qualquer montante de dinheiro CIRCULANDO pelas mãos (várias vezes pelos pés) do ESTADO, sempre estará sujeito a DESVIOS, corrupção, etc?
A única forma de prevenir isso, é ter o menor volume possível de recursos da sociedade entregue ao Estado, para fazer caridade com o dinheiro alheio.
Parece que vai demorar para essa simples constatação entrar no domínio públicos.
Brasileiros ainda amam o Estado, querem mais Estado, suplicam por mais benesses públicas.
Então, tome corrupção...
Paulo Roberto de Almeida
11/10/2013 - 17h38

Mais de 2.000 políticos eleitos receberam o Bolsa Família ilegalmente

Gabriela Guerreiro
Folha de S.Paulo, 11/10/2013

Mais de 2.000 prefeitos e vereadores eleitos no ano passado receberam, até o início deste ano, recursos do programa Bolsa Família do governo federal.
O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome identificou 2.168 beneficiários que continuaram recebendo o dinheiro do programa apesar de terem sido eleitos para prefeituras e Câmaras Municipais.
A legislação brasileira veda políticos eleitos de receberem o benefício, mas determina que os próprios políticos acusem o fato de serem beneficiários do programa --o que na prática permite que muitos continuem a receber o dinheiro.
O governo encontrou as ilegalidades ao cruzar dados do ministério com do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A operação, realizada em fevereiro deste ano, encontrou inicialmente 2.272 eleitos que poderiam se enquadrar na situação ilegal. Após um pente-fino, com o envio de questionários às prefeituras, o ministério chegou ao número de 2.168 confirmados como políticos eleitos que são beneficiários do principal programa de transferência de renda do governo federal.
Todos tiveram os benefícios cancelados. Os outros 104, que chegaram a ter os pagamentos suspensos, tiveram os valores desbloqueados.
A lei 10.836/2004 obriga os beneficiários que tenham "dolosamente" prestado informações falsas para permanecerem no programa Bolsa Família devem ressarcir os cofres públicos o valor recebido irregularmente. O ressarcimento, segundo a lei, deve ser atualizado com base no IPCA. O ministério não informou se os políticos que receberam o dinheiro irregularmente fizeram o ressarcimento.
IRREGULARIDADES
Nas eleições de 2004 e 2006, o TCU (Tribunal de Contas da União) cruzou a lista de beneficiários do Bolsa Família com a relação de políticos eleitos e seus suplentes. Na época, o cruzamento revelou a existência de 20.601 políticos que recebiam o Bolsa Família, a maioria deles na categoria dos extremamente pobres. Na folha de pagamentos de um mês, fevereiro de 2008, os políticos receberam R$ 1,6 milhão.
No cruzamento, o tribunal identificou 1,1 milhão de famílias com indícios de renda acima do permitido. Elas receberam mais de R$ 65 milhões na folha de fevereiro de 2008. Consideradas só as entrevistadas em 2007, o TCU identificou mais de 195 mil com indícios de omissão de renda.
O cruzamento com o Sisobi (Sistema Informatizado de Controle de Óbitos) revelou a presença de quase 300 mil mortos. Na folha de fevereiro de 2008, foram identificados 3.791 benefícios pagos a famílias com pessoas mortas

Bolsa de Pesquisa Konrad Adenauer em Estudos Europeus - FGV-Rio

Processo Seletivo: Bolsista de Pesquisa Konrad Adenauer em Estudos Europeus

O Centro de Relações Internacionais do Centro de Pesquisa e Documentação em História Contemporânea do Brasil, Fundação Getulio Vargas (CPDOC/FGV), em parceria com a Fundação Konrad Adenauer no Brasil, comunica a abertura do processo para a atribuição de 1 (uma) Bolsa de Pesquisa Konrad Adenauer em Estudos Europeus.

Atribuições:
O candidato selecionado deverá desenvolver pesquisas de caráter acadêmico na área de relações internacionais, com ênfase em Estudos Europeus.
O candidato selecionado deve estar pronto para iniciar o cumprimento de suas funções a partir de 1 de abril de 2014.
A bolsa tem duração de 12 meses, prorrogável por mais 12 meses. Durante este período, o bolsista deverá apresentar relatórios periódicos à Fundação Konrad Adenauer e à coordenação do Centro de Relações Internacionais da FGV. A prorrogação depende da avaliação de desempenho aprovado por ambas instituições. O Centro de Relações Internacionais da FGV e a Fundação Konrad Adenauer reservam-se o direito de não prorrogar o período da bolsa.
O candidato selecionado deverá se dedicar exclusivamente às atividades de pesquisa no âmbito deste programa, não podendo ter qualquer tipo de vínculo com outras instituições.

Perfil pretendido:
A candidatura ao processo seletivo requer:
a)      Mestrado em Relações Internacionais ou área correlata
b)      Comprovada experiência prévia na área de Estudos Europeus
Excepcionalmente, admite-se a apresentação de candidatos que estejam em processo de conclusão do programa de Mestrado e já tenha cumprido todos os seus créditos, a critério da comissão de seleção.
É absolutamente indispensável o domínio da língua inglesa (fluência oral e escrita). Será dada preferência a candidatos que possuam fluência em outras línguas oficiais da União Européia.

Benefícios da Bolsa:
A bolsa oferecida é de R$ 2.200.00 por mês. Poderão ser avaliadas solicitações de recursos extras para a realização de viagens de pesquisa à Europa.
O bolsista ficará baseado no CPDOC/FGV, no Rio de Janeiro, mas trabalhará em intensa cooperação com o escritório do CPDOC/FGV em São Paulo.
Durante a vigência da bolsa o pesquisador terá acesso à infraestrutura oferecida pelo CPDOC/FGV, observadas as normas e parâmetros definidos pela Direção.
Não haverá vínculo empregatício de nenhuma forma entre o bolsista e a Fundação Konrad Adenauer ou a Fundação Getulio Vargas.

Apresentação de Candidaturas:
As inscrições deverão ser encaminhadas unicamente por meio eletrônico, até 10 de novembro de 2013, para ri@fgv.br, identificada pelo título “Processo de Seleção para Bolsista”. O mesmo endereço eletrônico deverá ser utilizado para a resolução de qualquer dúvida relacionada ao processo.
A solicitação de inscrição deverá vir acompanhada dos seguintes arquivos eletrônicos:
a.       Currículum Vitae em formato livre;
b.      Carta de intenções;
c.       Cópia de histórico escolar (graduação e mestrado);
d.      Esboço de projeto de pesquisa a ser desenvolvido durante a vigência da Bolsa;
A carta de intenções, com dimensão máxima de duas laudas, deverá:
i.                    Descrever sucintamente a trajetória acadêmica e profissional do candidato, demonstrando a adequação ao perfil pretendido pelas instituições;
ii.                  Motivações para o futuro.
O esboço de pesquisa deverá ter dimensão máxima de uma lauda.
As entrevistas serão realizadas em inglês.

Processo seletivo:
O processo seletivo será feito por uma comissão de seleção formada por um representante designado pela Fundação Konrad Adenauer e por um professor do Centro de Relações Internacionais da FGV.

A partir da seleção prévia do material apresentado quando da inscrição, o Centro de Relações Internacionais e a Fundação Konrad Adenauer reservam-se o direito de não convocar para as fases seguintes, necessariamente, todos os inscritos no processo seletivo.
Os candidatos pré-selecionados serão chamados para uma entrevista, a realizar-se no CPDOC/FGV, no Rio de Janeiro. O processo seletivo não cobrirá o deslocamento de candidatos para a cidade do Rio de Janeiro em qualquer hipótese.
Na entrevista serão avaliadas a coerência e a consistência da carta de intenções, assim como será debatido o esboço de pesquisa.
O Centro de Relações Internacionais e a Fundação Konrad Adenauer reservam-se o direito de não contratar nenhum dos inscritos.

Casos omissos:
Casos omissos neste edital serão resolvidos pela comissão de seleção, não cabendo qualquer recurso.

    Drª. Elena Lazarou                                                                        Sr. Felix Dane

Fundação Getulio Vargas                                                      Fundação Konrad Adenauer

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

O Itamaraty e o poder - Monica Gugliano (Valor)

Sob nova direção
Monica Gugliano
Para o Valor, de Brasília, 11/10/2013

Ao substituir Antonio Patriota por Luiz Alberto Figueiredo, Dilma decidiu que havia chegado a hora de mudar, mas não apenas o titular do Ministério
Na Esplanada dos Ministérios, a Casa do Barão do Rio Branco, tão conhecida pela eloquência, está em silêncio. Não é a primeira vez nem será a última em que divergências afetam as relações entre quem deve formular a política externa, no caso a presidente da República, e aqueles que devem executá-la, os diplomatas. "Ela não aprecia as tradições, os protocolos, os hábitos. Não demonstra paciência para as longas conversas. Detesta tanta pompa e tanta cautela. Há uma intransponível incompatibilidade de gênios entre a presidente e o Itamaraty", explica um auxiliar da presidente. Se o temperamento de Dilma não se casa com os costumes da diplomacia, servidores reclamam de sua impaciência e das cobranças ríspidas. "A sensação é de que os diplomatas são um estorvo e que a diplomacia não serve para nada", queixa-se um graduado diplomata, servindo no exterior.
Ao demitir, há pouco mais de dois meses, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, Dilma decidiu que havia chegado a hora de mudar. Mas não apenas o titular da pasta, substituído imediatamente pelo embaixador Luiz Alberto Figueiredo. A presidente, segundo interlocutores, quer arejar o estilo e as práticas de uma das mais antigas instituições brasileiras. Até mesmo o Instituto Rio Branco, a escola que forma os diplomatas, deverá ser atingida. Na última formatura, Dilma perguntou a um assessor: "Quantos são engenheiros?" Nenhum era. Engenheiros, acredita a presidente, teriam uma visão mais objetiva e direta para solucionar os problemas e desafios apresentados por um mundo tão complexo como o do século XXI. Mas a carreira desperta maior interesse entre formados em áreas humanas, como filosofia, história, direito, sociologia, relações internacionais e outras afins. Isso, porém, não significa que profissionais das ciências exatas sejam inexistentes no Itamaraty. O atual diretor- geral da Organização Mundial de Comércio (OMC), Roberto Azevedo, formou-se em engenharia elétrica pela Universidade de Brasília (UNB).
O Brasil tem 141 representações no exterior e o Instituto Rio Branco abre uma média de 30 vagas por ano para o curso de diplomata. Depois de dois anos, os aprovados estão aptos a começar a carreira como terceiro-secretário, recebendo um salário de pouco mais de R$ 13.000. Dali em diante, seguirão galgando postos e promoções de acordo com seus méritos e suas boas relações. Podem levar mais de 20 anos para chegar a embaixador. Muitos nem chegarão. Assim como poucos também chegam ao posto máximo (general, almirante ou brigadeiro de quatro estrelas) nas Forças Armadas. As carreiras têm semelhanças, a começar pela rígida hierarquia.

O concursos para o Instituto Rio Branco é um dos mais difíceis exames de ingresso para uma função pública no país. Há uma média de 260 candidatos por vaga. As provas são rigorosas, exigem conhecimentos sólidos de história, relações internacionais, inglês avançado, francês e espanhol razoável. Mas agora, se depender da vontade da presidente, exames e curso terão mais exigências. Ela acha que os futuros representantes do país no exterior devem aprender e saber expressar-se em árabe, mandarim e russo, além dos imprescindíveis inglês, francês e espanhol. A presidente defende também que os jovens estudantes intensifiquem o conhecimento de relações comerciais e negócios e que reforcem o domínio do uso das redes sociais. É provável que as novas qualificações requeridas, no entanto, não afastem os candidatos.
Mas a presidente quer outras mudanças, que vão atingir a carreira naquilo que ela tem de mais estereotipado: o glamour. Dilma mandou cortar os orçamentos das representações no exterior destinados a almoços, jantares, coquetéis, aluguéis de carros. Ela, dizem seus assessores, acha que esses eventos são desperdício de tempo. Os diplomatas discordam e afirmam que os eventos constroem relações que resultam em negócios e oportunidades. "O Itamaraty sempre fez isso. É uma das chancelarias mais profissionais do mundo. A diplomacia é uma carreira de Estado. A presidente, é claro, pode promover mudanças. Mas elas não vão alterar os alicerces do que fazemos há um século, quase", afirma um embaixador.
Os alicerces das relações internacionais estão consolidados na Constituição, que acaba de completar 25 anos. O artigo 4º diz que o Brasil segue os princípios da independência nacional, dos direitos humanos, da autodeterminação dos povos, da não intervenção e da igualdade entre os Estados. Assim como o Barão do Rio Branco traçou parte das fronteiras nacionais optando pelo caminho do diálogo, o Brasil prega e defende a solução pacífica dos conflitos, repudia o terrorismo e o racismo. Por último, num parágrafo único está dito que o país buscará formar uma comunidade latino-americana de nações, por meio da integração econômica, social e cultural dos povos da região.

Se os princípios estão na Constituição, a maneira de interpretá-los e até de implementar as ações é muito particular de cada chefe de Estado. Nos últimos tempos, dois temas disputam a atenção de diplomatas e acadêmicos. Um deles é o de que a presidente Dilma gosta da política externa, mas não da diplomacia. O diplomata inglês Harold Nicolson, autor de um clássico sobre o tema, diz que a diplomacia é o meio pelo qual se executa a política externa. Portanto, seriam indissociáveis. "A presidente Dilma tem uma visão estreita do dia a dia da diplomacia. É por isso que os diplomatas atualmente se sentem tão marginalizados. Ela não entende que é impossível separar diplomacia e política externa. Ela não entende que os tempos das ações são diferentes. Não há comparação entre erguer um prédio e construir uma boa relação entre Estados", afirma o embaixador e ex-ministro da Fazenda Rubens Ricupero.
Outro tema é que os partidos políticos têm usado a política externa para colher dividendos eleitorais internamente. É a chamada partidarização da política externa. "Isso é um assunto de Estado. A política externa é de Estado. O presidente da República conduz a política externa e dará ênfase aos assuntos que considerar mais importantes. Mas essa política não pode ser resumida aos objetivos de um partido", observa Celso Lafer, ministro das Relações Exteriores do governo de Fernando Henrique Cardoso.
O cientista político e superintendente executivo da Fundação Fernando Henrique Cardoso, Sergio Fausto, diz que a política externa dos governos do PT incorporou o que há de pior no conceito da partidarização. "O petismo percebeu que a política externa passou a pagar dividendos internos e soube trabalhar esse tema. Lula, principalmente, passou a usar slogans que cabem muito mais numa campanha eleitoral do que numa política que se supõe de Estado e de longo prazo", critica Fausto. O slogan ao qual se refere é "uma política altiva e ativa", cunhado durante a gestão do ministro das Relações Exteriores do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o embaixador Celso Amorim. A frase era uma crítica direta a Celso Lafer, que concordara em tirar os sapatos para submeter-se a uma revista em um aeroporto americano.
Lafer fala do assunto até hoje com naturalidade. "Tirei os sapatos, sim. Achei que não cabia criar caso e dar carteirada", conta. Fausto é mais duro. "Essa ideia é uma bobagem. É como se tudo que não fosse a tal política altiva e ativa fosse submissão aos interesses externos. E não é verdade. Ou vamos dizer que Fernando Henrique foi um presidente submisso?"

Há um fato, porém, que mesmo entre opositores políticos, é incontestável. A rara afinidade que existiu entre o ex-presidente Lula e o ministro Amorim fez o Itamaraty viver uma "era de ouro e prestígio" e, do chanceler, o estrategista dos grandes objetivos da política externa de Lula: a mobilização por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU; a inserção e a busca de voz ativa para o Brasil nos mais importantes organismos internacionais e, também, a ênfase no papel de liderança do Brasil na América Latina. Sem esquecer, é claro, de ações como a polêmica intermediação do diálogo entre Irã e Turquia, que acabou derrubada pelos Estados Unidos.
"Os partidos tendem a exagerar as diferenças", diz a professora do Instituto de Relações Internacionais da USP Maria Hermínia Tavares de Almeida. Ela coordenou uma equipe, composta também pelos professores Janina Onuki, Leandro Piquet Carneiro e Feliciano de Sá Guimarães, que realizou a pesquisa "O Brasil, as Américas e o Mundo - Opinião Pública e Política Externa". O estudo mostra que 85% dos pesquisados consideram que o país conseguiu firmar uma imagem de independência perante o mundo. Mais de 90% acreditam que o Brasil terá um papel mais importante nos próximos anos. A maior parte dos entrevistados é de um público considerado informado e interessado pelo tema. "Em regimes democráticos, existem pontos de vista diferentes sobre como chegar a determinados objetivos. Mas, sejam quais forem os dos políticos brasileiros, é inegável que nossos governantes buscam um papel de destaque para o Brasil na comunidade internacional, buscam o protagonismo", explica a professora.
Uma linha do tempo traçada a partir da redemocratização do Brasil permitirá perceber essa busca em maior ou menor dimensão. José Sarney, apesar de envolvido em consolidar a frágil democracia brasileira e consumido pela hiperinflação, ainda assim teria começado a plantar as primeiras sementes do Mercosul; Fernando Collor, apesar de ter vivido parte de seu mandato encurralado pelas denúncias que o levaram ao impeachment, iniciou a abertura do país ao mundo. Itamar Franco teve pouco tempo e menos gosto ainda para tratar da política externa. Assim, coube a Fernando Henrique Cardoso, chanceler dele próprio, como se costumava dizer em Brasília, retomar o gosto e a importância pela diplomacia e pelas relações internacionais. E Lula, aproveitando ventos favoráveis no mundo e na estabilidade herdada de seu antecessor, consolidou conquistas. A grande diferença entre Fernando Henrique e Lula, dizem os analistas, é que, enquanto o primeiro deu muita ênfase ao aspecto comercial das relações, o segundo teria priorizado a política. Esses mesmos analistas citam como exemplo o Mercosul. Fernando Henrique teria visto o grupo como uma forma de fortalecer o continente em negociações comerciais diante de outros blocos. Lula teria buscado a unificação por aspectos políticos.

De acordo com a professora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da UERJ e coordenadora do Observatório Político Sul Americano, Maria Regina Soares de Lima, a politização ou partidarização da política externa é, muitas vezes, interpretada como algo negativo. "A ideia é que essa característica afastaria a política externa das orientações, princípios e normas emanados de um suposto interesse nacional", diz, e acrescenta: "É uma das políticas de qualquer governo. A oposição também usa o tema partidariamente, ao criticar a atual condução que se dá ao tema".
Em julho deste ano, durante a Conferência Nacional "2002-2013", promovida pela Universidade Federal do ABC e pelo Grupo de Reflexão de Relações Internacionais, o assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, abriu sua palestra tocando exatamente nesse ponto. Ao observar que o debate acontecia 34

numa sala batizada com o nome do ex-ministro San Tiago Dantas, considerado um dos criadores da chamada política externa independente - ao lado de Afonso Arinos e João Augusto de Araújo Castro - Marco Aurélio reafirmou sua convicção de que a política externa tem, sim, muito a ver com política interna. "Diz-se que, nos últimos dez anos, o governo petista introduziu a cizânia na política externa brasileira. Falam, também, que ideias antes consensuais passaram a dividir o Brasil. Isso é uma mentira. A política externa sempre dividiu. E todos que conduziram o assunto com independência sofreram pesadas críticas dos antecessores dos governos de Lula e Dilma. Se a política externa não dividisse e todos concordassem, isso seria o totalitarismo."

Em artigo com o título "A politização da política externa - Fazer Política externa lá fora é fácil, o difícil é fazê-la aqui dentro", a professora Maria Regina recorda que o embaixador Ítalo Zappa, um dos principais construtores da política para a África do governo Geisel, costumava dizer que a politização da política externa era a demonstração de que as decisões, ainda que tomadas em relação a outros Estados, não eram o fruto de uma vontade única. Zappa referia-se à negociação política interna que Geisel conduzira para convencer e persuadir a chamada "linha dura" do regime militar de que era necessário reconhecer o governo socialista de Angola, em 1975.
Em longa entrevista ao CPDOC da Fundação Getúlio Vargas, organizada por Maria Celina D'Araújo e Celso de Castro, o ex-presidente Geisel expressou um pensamento sobre os diplomatas semelhante ao que se atribui à presidente Dilma: " A diplomacia é muito sutil. Nem sempre concordei com os diplomatas". Um dos temas em que ele mais discordava era também a relação entre Brasil e Estados Unidos. Geisel, assinala Octávio Amorim Neto, cientista político e professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (Ebape), da Fundação Getúlio Vargas (FGV-RJ), rompeu o paradigma que vigorara até o governo Médici, de convergência com os americanos.

No livro "De Dutra a Lula - A Condução e os Determinantes da Política Externa Brasileira", Amorim Neto pesquisa as relações entre Estados Unidos e Brasil. Utilizando as votações nas Nações Unidas para medir a convergência entre os dois países, o professor mostra que o Brasil mais divergiu do que concordou com a potência mundial. E isso não é recente. É uma postura que vem desde a metade do século passado, quando, após a vitória dos aliados na Segunda Guerra Mundial, os governantes perceberam que o fato de haver mandado tropas à Europa não garantiria aos brasileiros um tratamento diferenciado no continente. "Mas é bom assinalar que nossa trajetória com os americanos quase sempre teve um padrão marcado por decepções mútuas.

Agora, com a última crise, [as relações] não são hostis. Mas se tornaram completamente frias", assinala o professor.
Com o cancelamento da visita de Estado que a presidente Dilma faria este mês a Washington, as relações bilaterais praticamente congelaram. Para a presidente, não há explicação que justifique a espionagem americana aos seus documentos pessoais, aos de empresas e órgãos brasileiros. Uma visita de Estado, simploriamente, poderia ser comparada a um baile de gala entre países. É recheada de simbolismos, embora nem sempre traga resultados concretos como aqueles tão prezados pela presidente. Basicamente, o encontro sela um grau de amizade, de proximidade. O último presidente brasileiro a fazer uma visita com esse status aos Estados Unidos foi Fernando Henrique Cardoso, recebido por Bill Clinton. Talvez, Dilma, entre outros tantos argumentos que discutiu com seus assessores ao decidir cancelar a viagem, tenha lembrado de uma das fotos em que Fernando Henrique e dona Ruth, em trajes de gala, posavam ao lado do casal Clinton na Casa Branca, para dizer que, em meio às notícias da espionagem, não se prestaria a posar para retratos festivos com os Obama.

No Palácio do Itamaraty, o prédio de linhas espetaculares projetado por Oscar Niemeyer, repleto de obras de arte, tapetes e antiguidades, os diplomatas esperam que a gestão do embaixador Luiz Alberto Figueiredo traga dias menos tumultuados. Mas, enquanto ele vai tomando pé da situação e tenta implementar as primeiras mudanças ordenadas por Dilma, servidores da casa, em tom de brincadeira, gostam de contar a seguinte história, para explicar qual seria a diplomacia ideal: "A rainha Vitória soubera que o embaixador britânico fora humilhado publicamente pelo então ditador boliviano Mariano Melgarejo. O episódio, que teria acontecido por volta de 1870, enfureceu a soberana. Convencida de que deveria reagir sem piedade, ela mandou que lhe mostrassem o mapa-múndi. Viu que a Bolívia, cercada por Chile e Peru de um lado e pelo Brasil de outro, era inatingível pelo mar. A não ser que ordenasse um ataque por terra - uma guerra longa e caríssima - a reação pretendida seria impossível. Vitória resolveu o problema com um gesto simples: riscou a Bolívia do mapa das Américas. O país não mais existiria".

Socialistas sustentaveis? Novidade ou mais do mesmo? -Carlos AlbertoSardenberg

O pré-candidato socialista à presidência do Brasil (mas pode não ser ele e ficarmos com a Santa da Floresta) diz que é contra novos impostos. Bom, isso é fácil: qualquer idiota diria o mesmo. Em todo caso, a turma da bufunfa, como diria um keynesiano de botequim, os muito ricos ficaram contentes.
Eu quero ver ele dizer que vai reduzir o peso do Estado, pois essa é a origem dos altos impostos.
Acompanhemos.
PRA

POLÍTICA

Entre o mercado e o social

Carlos Alberto Sardenberg
O Globo, 10/10/2013
Ouvi Eduardo Campos falar para empresários e investidores de São Paulo — e o pessoal gostou muito do que o governador contou sobre sua administração em Pernambuco e sobre sua visão de Brasil.
Não estavam no grupo aqueles nomes tradicionais, tipo chapa-branca, que, no fundo da alma, não gostam do PT, mas, do fundo do bolso, desgostam mais ainda de brigar com o governo. E acham que sempre se pode arrumar negócio bom mesmo numa administração ruim e/ou hostil ao capital privado.
Estavam no grupo pessoas de dinheiro, é claro, preocupadas, por exemplo, com o imposto sobre grandes fortunas. Aliás, perguntaram ao governador e adoraram a resposta.
Campos disse: há impostos demais no Brasil; é preciso reduzi-los e torná-los mais progressivos; ricos devem pagar mais, mas não se pode esfolar o investidor e a empresa; e, finalmente, que o imposto sobre grandes fortunas é tecnicamente ruim, arrecada pouco e cria muita desconfiança. Ou seja, muito barulho ideológico para pouco dinheiro.
Perguntaram também sobre o chavismo e os bolivarianos. Campos aproveitou bem a deixa para mostrar seu lado “gauche”. Atacou ferozmente as velhas oligarquias venezuelanas (e, por tabela, as latino-americanas) que enriqueceram à custa de privilégios e verdadeiros assaltos ao Estado.
Esse contraste entre uma elite muito rica e um povo muito pobre deu origem a Chávez e seus seguidores. Trata-se de um caminho equivocado, um atraso contra outro atraso, disse Campos, mas a forma de escapar disso é um regime moderno, democrático, capitalista e social.
Me lembrei de Tony Blair. Ou Bill Clinton. No Velho Continente, existia (ainda existe) uma esquerda socialista, estatizante, que se opunha à direita liberal tipo Thatcher. Blair inventou aí a Terceira Via: economia de mercado, ambiente de negócios amigável ao empreendedor, liberdade financeira, com forte investimento estatal nas áreas sociais, sobretudo saúde e educação. Mas, atenção: o setor público deve seguir as regras de eficiência do privado, com metas e meritocracia.
Campos encantou aquela plateia quando falou de sua gestão nas escolas de Pernambuco — diretores, professores e alunos premiados por bom desempenho, medido e avaliado regularmente — e nos hospitais, vários entregues à gestão privada.
Nos EUA, Clinton claramente colocou-se entre Ronald Reagan, seu antecessor, e a esquerda do seu Partido Democrata, esta representada por seu vice, Al Gore, e agressivamente contra o que chamava (e chama) de big money e suas variações (big oil, big pharma etc.).
FHC e Lula, o do primeiro mandato, ajudaram a formar essa Terceira Via por aqui, ainda que em condições bem diferentes. Nunca tivemos nossa Thatcher (ou nosso Reagan), de modo que FHC, um social democrata europeu, teve que tocar boa parte da agenda liberal para conquistar a estabilidade macroeconômica (metas de inflação, abertura comercial, câmbio flutuante, privatizações, responsabilidade fiscal).
Começou também os programas sociais — Bolsa Escola, por exemplo, e o aumento real do salário mínimo —, seu lado esquerdo. Mas perdeu o ímpeto reformista no segundo mandato.
Lula, de origem, digamos, mais socialista, foi obrigado a manter a base da estabilidade e, ainda, sob influência de Palocci, avançou nas reformas microeconômicas, especialmente nas leis e regras que garantiram a concessão e ampliação do crédito. E mais o Bolsa Família e os aumentos do salário mínimo.
No segundo mandato e depois da crise de 2008/09, Lula começou a estragar tudo, tarefa seguida por Dilma Rousseff. Inventaram os truques para aumentar o gasto público e a dívida total, sem o confessar, e expandiram a intervenção estatal — da regulação e controle cada vez maior do setor privado ao avanço forçado das estatais, incluindo bancos, e à tentativa de aceleração de grandes obras.
Sem contar o ambiente de incerteza criado por decisões do governo e dos tribunais que a todo momento criam novas obrigações e custos aos negócios. Cabe aqui a mão pesada do Fisco na interpretação e criação de regras que geram impostos e multas bilionários, numa ação ao mesmo tempo hostil ao grande capital e com o objetivo de gerar receita perdida com os subsídios aos setores privilegiados.
O resultado aparece na inflação mais alta, no baixo crescimento, na falta de investimentos (pela desconfiança do setor privado e ineficiência do setor público), no Custo Brasil recorde, na situação delicada de estatais como a Petrobras e as elétricas.
É curioso: quando se apresenta como terceira via entre PT e PSDB, Campos, na verdade, parece querer recuperar os lados positivos de FHC e Lula e mais a agenda de reformas que ficou pelo caminho. Como? Com Marina?
Voltaremos.

Carlos Alberto Sardenberg é jornalista.