O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

domingo, 10 de março de 2019

Ricupero, FHC e Ernesto Araujo em debate sobre a política externa: a luta continua companheiros

Desculpando-me pelo título provocador, mas esta postagem tem unicamente o objetivo de dizer que o debate sobre a atual política externa continua.
Ele não precisa ser travado, interrompido – e certamente não o será – apenas porque poucas horas depois de eu ter postado o texto referido abaixo o chanceler ter decidido exonerar-me com "efeito imediato", como foi anunciado duramente pelo seu chefe de gabinete, agindo a mando.
O sogro, convidado por mim para uma palestra no Instituto Rio Branco, na sexta-feira 8/03, ainda tentou dissuadi-lo na mesma manhã de Carnaval, tão chuvosa manhã, mas frustrado em seu intento desistiu de viajar a Brasília, temendo repercussões maiores desse gesto autoritário.
As explicações foram as piores possíveis: "já estava prevista a substituição". Mas tinha de ser na manhã da segunda-feira de Carnaval? Não dava ao menos para esperar a quarta-feira de Cinzas?

A postagem abaixo foi feita na madrugada da mesma segunda-feira de Carnaval, e desde então acumularam-se comentários, pois eu justamente convidei a um debate sobre a política externa.
Como esses comentários podem passar despercebidos, permito-me transcrevê-los aqui abaixo, lembrando porém que a leitura do texto permanece à disposição dos interessados.
Apenas lamento que minha exoneração (ainda não consumada no momento em que escrevo: domingo 10 de março), tenha desviado o foco do debate sobre a política externa para esse infausto evento.

Nesta ficha, a indicação do arquivo e da postagem em questão, fazendo a assemblagem dos três textos, com uma introdução minha:

A política externa brasileira em debate: Ricupero, FHC e Araújo”, Brasília, 4 março 2019, 18 p. Introdução, em 2 p., à transcrição de três textos relativos à política externa do governo Bolsonaro, de Rubens Ricupero (25/02/2019), de Fernando Henrique Cardoso (03/03/2019), e do chanceler Ernesto Araújo (3/03/2019). Postado no blog Diplomatizzando (4/03/2019; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/a-politica-externa-brasileira-em-debate.html); disponibilizado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/s/70710c9869/a-politica-externa-brasileira-em-debate-ricupero-fhc-e-araujo).


Meu "chute" inicial no debate foi dado nestes termos: 

Começou, finalmente, o debate, sem aquelas acusações debiloides dos lulopetistas, sem os argumentos ridículos do ex-chanceler da "ativa e da altiva". Comparecem um ex-ministro, Rubens Ricupero, um ex-chanceler e ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso, e o atual chanceler do governo Bolsonaro, que debatem sobre a política externa atual. Os três textos são oferecidos para comentários e observações pertinentes.

Os demais comentários devem ser lidos na ordem inversa: 

Sinto por ter sido tão mal escrito, mas com estatísticas tendenciosas pode-se defender Lula por diminuir a dívida externa a níveis irrisórios, pode-se condenar Lula por uma perda imensa ao erário. Foi uma crítica a não ter números e fontes do Ricupero. Em segundo plano, lamento profundamente a exoneração do PRA de forma incorreta e infeliz. Por pensar um Brasil melhor, o Itamaraty desqualifica e tenta silenciar um dos seus melhores embaixadores.
Reescrevi rapidamente e simplifiquei
Agradeço a resposta. Estamos de acordo. Raffaelli
 

Apenas um breve comentário, à guisa de mais aprofundadas reflexões sobre os artigos de FHC ou o Professor Doutor, Rubens Ricupero, talvez o maior diplomata vivo do Brasil na atualidade: a exoneração do IPRI de Paulo Roberto de Almeida, homem multiletrado e reconhecido por sua afeição extremada ao debate de ideias, só demonstra a inefável tendência histórica (verdadeiramente traço cultural não luso-ibérico, mas de nosso Brasil) à truculência gratuita, que despreza e espanca o debate ideológico ao seguinte dilema: ou você está do nosso lado, ou está contra nós! Ernesto Araújo, em sua vertente primal (apenas se iniciando, tomara que seja aprumada com o tempo) de política externa virtualmente alinhada automaticamente a Washington, demonstra o desprezo a um dos pilares mestres da diplomacia: numa discussão, apresenta-se um argumento intelectual sólido, criterioso, ao qual se dá a chance de réplica, no sentido inverso: qual é o seu contra-argumento? Desnecessário dizer que a resposta virulenta do atual chanceler foi aquela já esperada na nossa cultura e magnificamente descrita no já tornado clássico ensaio de Roberto da Matta, intitulado Carnaval, Malandros e Heróis: o relato que consolidou uma das frases-mestras do conceito distorcido de nacionalidade brasileira: Sabe com quem está falando? A guisa de conclusão, lamentável verificar que a injusta, inaudita, violenta e inexplicável exoneração se deu quando? No intermezzo momesco...
 

Reescrevendo: Engolimos FHC, nos enganamos com Lula, desabamos com Dilma, passamos por Temer, e esperamos ainda por JB. Enquanto alguns estadistas em 4 ou 5 anos, puseram suas marcas para gerações e com isto o Brasil cresceu baseado em suas instituições criadas e estabelecidas, outros nem conseguem durante seu próprio governo manter a herança de Estado e a dilapidam como herança de família. Nossas instituições levaram décadas para atingirem a maturidade com trabalho determinado e com dedicação de seus membros. Isto, consequentemente representa muitos recursos empenhados na formação deste corpo. Destruir uma instituição é muito mais fácil e, obviamente representa risco inclusive para a nação quando se trata do Itamaraty e da política externa brasileira. Quando observo ações como a ocorrida recentemente na exoneração do PRA, venho a interpretar como uma atração num circo de horrores, e que de nada, absolutamente nada irá legar para o Estado e para nós. Quanto aos números e fontes requeridos para defender as tendências e que faltam no artigo do Professor Ricupero, acho dispensáveis, visto a firme e coerente explanação, pois estatísticas e números podem ser usados com encanto para justificar os erros, por parte de todos sem exceção, afinal todos aprenderam com Darrel Huff* e de forma nefasta se distanciam da realidade e dos objetivos reais. Somente lamento. * How to lie with statistics, 1954
 

Ricupero só indica suas fontes quando cita reportagens de revistas, mas nenhum dos números apresentados sobre as exportações brasileiras vieram acompanhados de... fontes. Procurei bastante esses números e não encontrei. "Basta lembrar que nada menos que quarenta e nove porcento do total das vendas brasileiras de proteína animal se destina a mercados árabes e do Irã". O senhor tem esse números? Sinto muito pela sua exoneração da diretoria do IPRI. Que isso estimule o senhor a produzir ainda mai... Read More
 

Parece que mesmo um leitor aparentemente perspicaz como o Paulo Roberto de Almeida não está livre de figurar entre os leitores incautos, haja vista sua destituição do IPRI. Receber críticas requer de qualquer sujeito ou entidade uma maturidade cada vez mais rara no ectoplasma do Espírito de nosso tempo. Almeida é vítima de mais uma leitura turva da realidade do atual governo e, quiçá, do mundo, ilustrando o argumento do Ricupero.
 

Os argumentos populistas do Chanceler Ernesto Araújo ao criticar FHC e Ricupero pela manutenção das políticas de longo e medio prazo, razão de ser do Itamaraty são infundados, carecem de diretivas sólidas e claramente refletem o despreparo da diplomacia brasileira lotada no atual governo.
 

Texto de Rubens Ricupero é muito rico de dados, informações e argumentos. Faz críticas contundentes ao atual chanceler Ernesto Araujo, que não consegue se contrapor aos argumentos de Rubens Ricupero e de Fernando Henrique, ao responder com acusações genéricas e vagas, sem indicar o caminho a seguir. Talvez ele mesmo não saiba e nem tenha autonomia para tanto, uma vez que, particularmente no relacionamento com a Venezuela, o general Mourão parece ter assumido o protagonismo. Felizmente.
 

Convido os interessados a ler os três textos e a continuar o debate. Eu teria várias observações a fazer, não só aos três textos, bem como aos comentários acima, mas vou deixar isso para uma próxima ocasião.

Ler os três textos no seguinte link: 

https://www.academia.edu/s/70710c9869/a-politica-externa-brasileira-em-debate-ricupero-fhc-e-araujo

sábado, 9 de março de 2019

Concurso para Professor Titular do IRel-UnB - Edital

Concurso Público para Professor Titular Livre

Edital 025/2019 - Abertura do Concurso Público para Professor Titular Livre para 01 (uma) vaga - Instituto de Relações Internacionais - IREL/UnBl.

IREL-UnB
(61) 3107.3637

https://www.academia.edu/s/60eb031d1b/concurso-para-professor-do-instituto-de-relacoes-internacionais-irelunb

Fim da era Geisel na política externa - Tales Faria

Agora temos uma política externa sem ideologia, com ideologia.

Contra militares, Bolsonaro tenta pôr fim à Era Geisel na política externa

Tales Faria
Blog, 8/03/2019

O presidente Jair Bolsonaro recebeu nesta sexta-feira (8) o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, para discutir acordos e parcerias a serem assinados durante suas próximas viagens internacionais.
Neste mês de março ele irá aos EUA, ao Chile e a Israel.
No início da noite de quinta-feira, em sua primeira live no Facebook depois de assumir o cargo no Palácio do Planalto, Bolsonaro anunciou as viagens. A escolha dos países não foi feita ao acaso. Marca o interesse do presidente em uma mudança drástica na política externa brasileira.
A live foi postada para explicar a polêmica declaração, poucas horas antes, segundo a qual democracia e liberdade só existem quando as Forças Armadas assim o querem.
No mesmo trecho em que tratou da, digamos, questão democrática, Bolsonaro falou de sua visão para a política externa:
"A (…) missão será cumprida ao lado das pessoas de bem do nosso Brasil, daqueles que amam a pátria, daqueles que respeitam a família, daqueles que querem aproximação com países que têm ideologia semelhante à nossa, daqueles que amam a democracia e a liberdade".
Curiosamente, essa ideologização da política externa pretendida pelo capitão da reserva Jair Bolsonaro, se ocorrer, será uma pá de cal na grande virada no Itamaraty promovida pelo regime militar. Mais especificamente, entre 1974 e 1979, pelo ex-presidente Ernesto Geisel e seu chanceler, Azeredo da Silveira, nome até hoje cultuado entre os diplomatas.
Geisel e Azeredo estabeleceram uma política externa pragmática com atos de grande alcance, como o acordo nuclear com a Alemanha, rompendo uma parceria comercial com a norte-americana Westhinghouse.
Em contraposição à menor interação com os Estados Unidos, o Brasil estreitou laços com a Europa, especialmente Inglaterra e França, com a Ásia e com os países árabes. Votou pela concessão à OLP (Organização para Libertação da Palestina) do status de observador na ONU (Organização da Nações Unidas). Rompeu com Taiwan para estabelecer relações diplomáticas com a socialista República Popular da China. Reconheceu ainda o então governo marxista de Angola, que tinha fortes ligações militares com cubanos e russos.
Tudo voltado por interesses comerciais. O acordo nuclear com a Alemanha veio após os EUA imporem restrições de transferência tecnológica ao Brasil. A questão das transferências de tecnologia impulsionou a aproximação com todos os países europeus. E também porque para lá é que estava indo boa parte do capital do mundo árabe. Os investimentos europeus no Brasil quadruplicaram no período.
A aproximação com os árabes foi quase obrigatória diante da crise mundial do petróleo. Resultou também num grande incremento, até hoje, das exportações de manufaturados do Brasil para a região e para a África. A China se tornou nosso segundo maior parceiro comercial.
Enfim, o Brasil de Geisel e Azeredo da Silveira se abriu para o mundo com uma política externa marcada por forte pragmatismo econômico e desideologização.
Praticamente veio até os dias de hoje, com apoio da alta cúpula militar do país.
Bolsonaro propõe uma mudança radical de rumo que terá impacto não só na sua relação com os militares (vide desentendimentos em relação à Venezuela) como na área econômica. Não se sabe ainda como reagirão, por exemplo, os países árabes sobre a escolha preferencial por Israel. Nem o que fará a China, com investimentos gigantescos planejados para o Brasil.
Os generais e o ministro da Economia, Paulo Guedes, estão apreensivos.