O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

quinta-feira, 25 de julho de 2019

O Itamaraty saqueado - Mathias Alencastro

Compartilho novamente este artigo de Mathias Alencastro, pois ele traduz exatamente a realidade vivida atualmente pela comunidade dos diplomatas profissionais: o Itamaraty foi sequestrado pelos aloprados da tribo olavo-bolsonarista e o chanceler atual não apenas é incapaz de defender os padrões tradicionais de uma diplomacia de alta qualidade, como colabora ativamente com a obra nefasta de desmantelamento da instituição. 
Tempos realmente sombrios, embora o Itamaraty deva sobreviver à insanidade, ainda que com sua autoestima bastante abalada. 

Meu recado aos mais jovens: resistam às ilegalidades, preservem a sanidade mental, mantenham perfil baixo em face das posturas bizarras que vão continuar se abatendo sobre a Casa, enquanto os aloprados continuarem no poder.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasilia, 25/07/2019


Indicação de Eduardo Bolsonaro leva Itamaraty a risco de implosão

A indicação de embaixadores de fora da carreira diplomática não é apenas moralmente aceitável como também é perfeitamente banal nas democracias ocidentais.

As coisas se complicam quando motivações espúrias estão por trás das escolhas e os indicados demonstram absoluta falta de experiência para o cargo.

Um terço dos embaixadores indicados por Donald Trump contribuíram financeiramente para a sua vitoriosa campanha presidencial de 2016. Somente 5% possuíam algum tipo de conhecimento prévio da região onde servem atualmente. Os restantes tinham apenas fritado hambúrgueres.

Na era Obama, o finado senador republicano John McCain se indignou com a escolha de Colleen Bell para chefiar a embaixada na Hungria. A produtora do melodrama "Paixão e Ódio" tinha zero experiência internacional, mas era um importante cabo eleitoral do presidente democrata na Califórnia.

Imune a esse tipo de intervenção presidencial, o Brasil está prestes a entrar numa nova era com a indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada em Washington.

Manifestamente antirrepublicana, ela abre um precedente irreversível, que expõe a política externa a todo tipo de absurdo.

Depois de o Senado aprovar a nomeação de Eduardo, o que impedirá Jair de indicar Marco Feliciano para Tel Aviv, algum ideólogo das redes sociais para Roma, e, por que não, Luciano Hang para Tóquio?

A mais grave consequência desse processo seria a implosão do Itamaraty. A liga dos embaixadores amadores trataria diretamente com quem os designou —o presidente— , esvaziando a instituição dos seus poderes discricionários.

Outro efeito perverso seria a exposição do Brasil aos erros crassos dos seus deslumbrados, facilmente manipuláveis por diplomatas mais experientes de outros países.

Por fim, nada garante que essas manobras surtam o efeito esperado. Theresa May e Emmanuel Macron fizeram de tudo para estabelecer uma relação de confiança com Trump. Os seus respectivos embaixadores acabaram regressando com o rabo entre as pernas.

Mas o mal já está feito. Se Bolsonaro recuar, ele pode seguir os passos de Trump, que também enfrentou resistência no Senado, e vetar a indicação de novos embaixadores. Por esse motivo, postos relevantes para a diplomacia americana, como México e Austrália, permanecem desocupados.

O impasse se deve, em parte, à corajosa reação do corpo diplomático americano às intervenções de Trump. Embaixadores entregaram os seus cargos, funcionários se demitiram.

No Brasil, tem sido o contrário.

Servil, Ernesto Araújo, um diplomata de carreira, vem ratificando alegremente a devassa, consolidando a ruptura com a ideia centenária de que o Itamaraty era uma instituição imune à politicagem do Alvorada.

Frequentemente apresentado pela imprensa como um desequilibrado, ele tem se revelado ser um zeloso ajudante de obras do presidente.

Resta saber se os restantes diplomatas vão continuar tolerando por muito tempo o saque do Palácio.

Mathias Alencastro
Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento e doutor em ciência política pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

Alberto da Costa e Silva, 88 anos - Documentario da ABL

Estou aguardando o lançamento, em 5 de agosto de 2019
Paulo Roberto de Almeida

Documentário “Alberto da Costa e Silva - Filho da África”, que exorta a trajetória do historiador, embaixador e acadêmico, estreia na ABL

Aos 88 anos, o historiador, embaixador e Acadêmico Alberto da Costa e Silva recebe os produtores Stéphanie Malherbe e Ricardo Vilas para “abrir o livro de sua vida e trajetória”. Com a discrição do diplomata e o humor fino do poeta, Alberto da Costa e Silva fornece neste filme um depoimento único sobre sua carreira, suas viagens e a importância da África no Brasil.

Percurso

Acadêmico Alberto da Costa e Silva conta sobre sua infância em Fortaleza, quando ia para a escola montado num carneiro, as brincadeiras com as crianças do bairro e pelo mundo imaginário encarnado por seu pai, o poeta Antônio da Costa e Silva. Relata a força de sua mãe, que trazia a marca das mulheres da sua família.

Trailer: “Alberto da Costa e Silva - Filho da África”



O documentário também aborda a adolescência no Rio de Janeiro, na Tijuca, onde a família se instala, pois sua mãe acredita que essa mudança propiciaria um futuro melhor para o filho. E trata, ainda, da escolha de Alberto pela carreira diplomática para “vingar seu pai”, que, antes dele, teve seu ingresso recusado na diplomacia. Mas essa escolha também foi justificada por seu gosto pela aventura, pelo desconhecido e pelo distante.
"
É uma alegria falar sobre Alberto da Costa e Silva, um homem incomum, singular... Eu diria que é um mestre. Um mestre da cultura, do pensamento... Um mestre da vida."
Fala da Acadêmica Nélida Piñon para o filme "Alberto da Costa e Silva - Filho da África".

Alberto da Costa e Silva e a África

Acadêmico Alberto da Costa e Silva é, reconhecidamente, no Brasil, o maior especialista em África, em razão de sua sede insaciável de procurar e entender as raízes do Brasil. Aos 14 anos, sendo um jovem branco e de classe média, tomou um choque ao ler Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, descobrindo que nós, brasileiros, éramos negros. Mas, então, de onde viemos?” - perguntava-se, pois todos os escritos que encontrava traziam relatos mencionando negros já chegados ao Brasil, como se nascessem no próprio navio negreiro e não tivessem um passado, uma história ou uma cultura por trás de cada um. Era como se a África, de onde vinham, não existisse.
Alberto vai pesquisar, sem descanso, a História das Áfricas, porque sem a África não existiria o Brasil, tornando-se, assim, um pioneiro no Brasil dos estudos africanos.

O documentário

Além dos depoimentos de Alberto da Costa e Silva, o filme conta com testemunhos de intelectuais e pesquisadores, como Nélida Piñon, Franklin Martins, Muniz Sodré e Lilia Schwarcz, e de artistas, como Haroldo Costa, Nei Lopes e Martinho da Vila.
Alberto da Costa e Silva - Filho da África” terá sua primeira exibição pública no dia 6 de agosto, às 15h30, no Teatro R. Magalhães Jr., na Academia Brasileira de Letras. O evento contará com a participação do cineasta e Acadêmico Carlos Diegues, que coordena as ações de cinema na ABL. A Entrada é franca, limitada à capacidade do teatro. Faça sua reserva abaixo!
Inscrições para a sessão no RJ: http://www.academia.org.br/node/28333

Academia Brasileira de Letras

Teatro R. Magalhães Jr.
Av. Presidente Wilson, 203 - 1º andar
Castelo
Rio de Janeiro - RJ
Brasil
(21) 3974-2500

6th Brazilian Economic History Workshop - INSPER, SP, 8-9/08/2019

6º Workshop de História Econômica Brasileira

6th Brazilian Economic History Workshop

6º Workshop de História Econômica /6th Brazilian Economic History Workshop

Insper, São Paulo

Dias 8 e 9 de agosto de 2018 

Programação
Insper – Sala 407 – Prédio 1

Dia 8 de agosto
8:45  –  Abertura – Marcos Lisboa (Presidente do Insper) e Delfim Netto (USP)
9:00 – Coşkun Tunçer (University College London) e Leonardo Weller (EESP-Fundação Getúlio Vargas), Democracy, autocracy and sovereign debt: how polity influenced country risk in the first financial globalisation
10:00 – Intervalo
10:15 – Ellen Fonseca de Assis e Michel Marson (Universidade Federal de Alfenas), As origens do financiamento industrial no Brasil, 1891-1940: um estudo da Companhia Antarctica Paulista
11:15 – Intervalo
11:30 – Rafael R. Guthmann (University of Minnesota), Growth over the long run: historical national accounts in international comparison
12:30 – Almoço
14:00 – Thales Zamberlan Pereira (Universidade Franciscana), Taxation and the stagnation of cotton exports in Brazil, 1800 – 1860 
15:00 – Intervalo
15:15 – Elissa Pereira (Universidade de São Paulo), Estratégias de assimilação, ascensão e mitigação de risco: atores cristãos novos no Rio de Janeiro – 1685-1770
16:15 – Intervalo
16:30 – Thomas Kang e Isabela Menetrier (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Export incentives, state level expenditures and primary education in Brazil, 1967-1985

Dia 9 de agosto
8:30 – Edmilson Varejão (EPGE-Fundação Getúlio Vargas), Samuel Pessoa (IBRE-Fundação Getúlio Vargas) e William Summerhill (University of California, Los Angeles), Economic consequences of educational backwardness in twentieth-century Brazil
9:30 – Intervalo
9:45 –  Ariel Kessel Akerman (EESP-Fundação Getúlio Vargas), US geopolitical goals and IMF conditionality: was Cold War relevant?
10:45 – Intervalo
11:00 –  Eustáquio Reis (IPEA), Fretes e custos de transportes no Brasil, 1830-1930
12:00 – Almoço
13:30 – Renato L. Marcondes e Lélio Luiz de Oliveira (Universidade de São Paulo-Ribeirão Preto), Credit as an economic growth determinant: mortgages in Brazil, 1893-1939
14:30 – Intervalo
14:45 – Bruno Gabriel Witzel de Souza (University of Göttingen), The rationale of sharecropping: immigrant bonded laborers and the transition from slavery in Brazil, 1830-1890
Obs: participação aberta a alunos de pós-graduação e pós-graduados, com vagas limitadas.
Informações e inscrições via e-mail: workshophist@gmail.com

quarta-feira, 24 de julho de 2019

Banco Central: historia contada por seus ex-presidentes

Com perdão aos webmasters do Banco Central, mas o site não contém link geral para a coleção de depoimentos, assim é impossível escolher quem ler, a menos que se faça uma busca específica pelo nome, esperando que venha tal gravação.
Não está em publicações, não está em nenhum lugar.
Qualquer garoto poderia oferecer um serviço melhor...
O depoimento de Pérsio Arida está aqui:
https://www.bcb.gov.br/historiacontada/publicacoes/hc_bc_volume_20_persio_arida.pdf
Paulo Roberto de Almeida


Banco Central lança sua História Contada com a presença de 14 ex-Presidentes e seu Presidente


03Janeiro2019
Publicadoàs 15:00
Atualizado03/01 às 15:17


O Banco Central divulgou nesta quinta-feira (03/01) a programação completa do evento de lançamento da coleção digital “História Contada do Banco Central do Brasil”. O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, e 14 ex-presidentes da instituição participarão do lançamento no próximo dia 11 de janeiro, às 14h30, no auditório do BC, no Rio de Janeiro.
O evento, que será aberto pelo presidente Ilan Goldfajn e pelo ex-presidente do BC, Alexandre Tombini, constará de três painéis de debate, nos quais os ex-presidentes irão discorrer sobre os principais momentos da economia brasileira nas últimas décadas. Já confirmaram presença os ex-presidentes Ernane Galvêas, Carlos Geraldo Langoni, Fernão Bracher, Fernando Milliet, Elmo Camões, Wadico Bucchi, Pedro Malan, Persio Arida, Gustavo Loyola,  Gustavo Franco, Francisco Lopes, Arminio Fraga, Henrique Meirelles e Alexandre Tombini.
COLEÇÃO 

A Coleção “História Contada do Banco Central do Brasil” é composta por 25 entrevistas com os ex-presidentes e outros atores que participaram da história da instituição. Os depoimentos contam a história do BC, da economia brasileira e internacional ao longo dos 54 anos de existência da autoridade monetária. 
Compõem a Coleção as seguintes personalidades:
Octávio Gouvêa de Bulhões (duas vezes superintendente da Sumoc e ministro da Fazenda quando da fundação do Banco Central), Alexandre Kafka (representante do Brasil junto ao FMI por 32 anos), Denio Nogueira, Casemiro Ribeiro (integrante da primeira Diretoria do BCB), Ruy Leme, Ernane Galvêas, Paulo Lira, Carlos Brandão, Carlos Geraldo Langoni, Affonso Celso Pastore, Antônio Carlos Lemgruber, Fernão Bracher, Fernando Milliet, Elmo Camões, Wadico Bucchi, Ibrahim Eris, Pedro Bodin (convidado em homenagem a Francisco Gros, já falecido), Paulo César Ximenes, Pedro Malan, Persio Arida, Gustavo Loyola, Gustavo Franco, Francisco Lopes, Armínio Fraga e Henrique Meirelles.
Evento: Lançamento da Coleção “História Contada do Banco Central do Brasil”
Local: Av. Presidente Vargas, 730, Centro, Rio de Janeiro – RJ
Data: 11/01/2019, às 14:30



Estrutura, rotina, foco: o que mudou no Itamaraty bolsonarista - Tiago Cordeiro (Gazeta do Povo)

Estrutura, rotina, foco: o que mudou no Itamaraty de Ernesto Araújo

Ernesto Araújo (dir.) e o presidente do Paraguai, Mario Abdo Benítez, na frente do Palácio do Itamaraty.
Ao anunciar a escolha do diplomata Ernesto Araújo para o posto de ministro das Relações Exteriores, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, em sua conta de Twitter: “A política externa brasileira deve ser parte do momento de regeneração que o Brasil vive hoje”. O primeiro semestre do governo foi marcado, de fato, por uma série de mudanças na política internacional do país. Mas algumas alterações sofreram recuos.
“Bolsonaro entregou mudança profunda em áreas que agradam sua base mais conservadora — sobretudo direitos humanos, meio ambiente, comportamento na ONU. Onde a mudança prometida assustou os interesses de sua base parlamentar, ele recuou. É o caso de Mercosul, da China e da mudança da embaixada para Jerusalém”, afirma Matias Spektor, professor associado e vice-diretor da Escola de Relações Internacionais da FGV. “Bolsonaro também recuou quando o tema tinha chance de alienar sua base militar: a Venezuela.”
Mas, no dia a dia do Itamaraty, essas transformações estão acontecendo em ritmo bastante acelerado. A estrutura e a rotina dos diplomatas brasileiros mudaram muito, na comparação com o cenário das últimas décadas.

Itamaraty ganha estrutura diferente

A decisão de retirar poder dos diplomatas e aumentar consideravelmente a participação de políticos ligados ao Poder Executivo nas negociações internacionais foi formalizada logo nos primeiros dias do novo governo, quando, no dia 9 de janeiro, um decreto autorizou a concessão de cargos de chefia para não diplomatas. A mudança rompe um paradigma antigo na diplomacia brasileira, o de que o ministro era um posto político, indicado pelo presidente, mas os demais cargos eram organizados considerando a hierarquia interna.
Essa valorização da antiguidade e do currículo foi alterada pelo decreto, que não só permite que os integrantes do gabinete do ministro não sejam diplomatas de carreira, como também possibilita que diplomatas de nível hierárquico mais baixo possam ocupar postos antes ocupados por profissionais mais antigos.
O mesmo decreto extinguiu a Divisão de Mudança do Clima e a Subsecretaria Geral de Meio Ambiente Energia e Ciência e Tecnologia. No lugar, criou um Departamento do Meio Ambiente, subordinado à nova Secretaria de Assuntos de Soberania Nacional e Cidadania.
Com isso, mudou o posicionamento de duas áreas que, até a gestão passada, eram cruciais para fornecer dados e subsídios para as negociações brasileiras a respeito de questões ambientais e de clima. A mudança foi acompanhada da decisão do presidente Bolsonaro de que o Brasil desistiria de sediar a próxima Conferência do Clima, em 2020.
Além disso, o currículo do Instituto Rio Branco, o centro de formação de diplomatas no Brasil, vem sendo alterado. A disciplina História da América Latina foi extinta e surgiram cadeiras voltadas para o estudo de obras clássicas. Além disso, a ementa do curso de Política Internacional mudou, com o objetivo de, nas palavras do ministério, afastar os futuros diplomatas de “amarras ideológicas eventualmente adquiridas em sua formação anterior”.
Outra mudança expressiva foi a demissão do diplomata Paulo Roberto de Almeida, crítico do filósofo Olavo de Carvalho, da direção do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais.

Itamaraty 'encolhe' na gestão de Ernesto

O Itamaraty também está menor: em maio, o governo reduziu 138 postos, sendo 84 de diplomatas e 54 para oficiais e assistentes de chancelaria. Com isso, o total de vagas para trabalho no exterior vai cair de 1.842 para 1.704.
O presidente também mandou fechar seis embaixadas que ficam na América Central: São Cristóvão e Nevis, Antígua e Barbuda, São Vicente e Granadinas, Granada, e Dominica. Internamente, o governo avalia que outras três representações poderão ser fechadas, todas na África: Serra Leoa, Libéria e Líbia.
“Os cortes orçamentários para a manutenção de embaixadas, consulados e outros postos dizem respeito, acima de tudo, à situação fiscal de penúria em que se encontra o Estado brasileiro”, afirma o professor Matias Spektor. “O Itamaraty, como o resto da máquina do governo, vem sofrendo sucessivas ondas de ajuste desde o governo Dilma e nada indica que esse quadro dramático vá mudar no curto prazo.”
Já Marco Aurélio Nogueira, coordenador do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp), considera que os cortes serão acompanhados de um rearranjo interno. “O objetivo alegado é de caráter fiscal: reduzir gastos. Mas, por trás dele, há também uma inflexão política, destinada a afastar diplomatas mais refratários à orientação prevalecente, que inclui um retrocesso no modo como o Itamaraty tratava de questões de direitos e reconhecimento no âmbito internacional”, critica.
Alguns cortes começaram antes mesmo da posse. Apesar disso, em paralelo aos cortes, o governo anunciou em junho a realização de um novo concurso para novos diplomatas, com 26 vagas de diplomatas.

Foco da diplomacia mudou

Outra mudança se manifesta na orientação geral para o foco da diplomacia nacional. Tradicionalmente, o Brasil se mantém neutro em relação a situações de conflitos, como as disputas entre Israel e Palestina. E busca alinhamento com países em desenvolvimento, como as nações africanas e os integrantes dos Brics, o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
Com a nova orientação, a diplomacia brasileira busca alinhamento com Israel, Estados Unidos e Europa Ocidental – como indica a tentativa de entrar para o chamado clube dos ricos, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
“O Brasil sempre procurou atuar no sistema internacional como um agente negociador e plural. Na gestão atual, essa linha foi substituída por um alinhamento incondicional aos Estados Unidos de Trump e pela adoção de um unilateralismo inadequado para os tempos atuais”, afirma Marco Aurélio Nogueira.
Para Maurício Santoro, professor-ajunto do Departamento de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, é a aproximação com os americanos a maior marca do governo atual. “O ponto mais importante do primeiro semestre do governo Bolsonaro são os esforços do governo em se aproximar dos Estados Unidos, com a obtenção do status de aliado extra-OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte, a aliança militar do Ocidente) e do apoio de Trump para o ingresso do Brasil na OCDE”.

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Matéria sobre minha demissão referida acima: 

"Diplomata é demitido após republicar textos que debatem crise na Venezuela
Paulo Roberto de Almeida foi demitido do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI)
Brasília, DF e São Paulo, SPFolhapress[04/03/2019] [18:32]"

Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/politica/republica/diplomata-e-demitido-apos-republicar-textos-que-debatem-crise-na-venezuela-6xe3y9t95gd3y4ytbf9gd9r1h/

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"O embaixador Paulo Roberto de Almeida foi demitido nesta segunda-feira (4) do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), órgão vinculado ao Ministério das Relações Exteriores. Ele assumiu a direção do instituto em meados de 2016, durante a gestão de Michel Temer (MDB). 


A demissão ocorreu após Almeida republicar, em seu blog pessoal, também nesta segunda-feira (4), três textos recentes sobre a crise na Venezuela, um assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, outro pelo embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero e o terceiro pelo atual ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. 


Araújo, em seu texto, critica as posições de FHC e Ricupero sobre a situação venezuelana, afirmando que os dois "escreviam seus artigos espezinhando aquilo que não conhecem, defendendo suas tradições inúteis de retórica vazia e desídia cúmplice". 


No texto em seu blog, Almeida diz querer estimular o debate sobre a política externa brasileira com a republicação dos artigos. 


No dia 24 de fevereiro, o embaixador agora demitido havia publicado um texto crítico ao escritor Olavo de Carvalho, que indicou ao presidente Bolsonaro nomes para compor o ministério do atual governo, entre eles, o de Araújo. 


Almeida foi comunicado da dispensa por telefone pelo chefe de gabinete de Araújo, Pedro Wollny. Procurado, não quis comentar os motivos da demissão. 


"Meu blog é um espaço de liberdade, de debate aberto e de interesse público", disse. "Aparentemente vou ter de voltar à biblioteca do Itamaraty para poder trabalhar", afirmou, em referência aos quase 14 anos de governos petistas em que afirma ter sido excluído de qualquer atividade no ministério. 


"Durante todo esse tempo de exílio involuntário, fiz da biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho, uma vez que não dispunha de nenhum outro local na Secretaria de Estado das Relações Exteriores", disse Almeida. 


Rubens Ricupero vê na dispensa de Almeida um "ato confessadamente de repressão político-ideológica, de patrulhamento ideológico que lembra os momentos mais sombrios da ditadura militar, da qual o atual presidente é confessadamente admirador". 


Segundo Ricupero, "aparentemente, não é debate que deseja a direção do Itamaraty, pois a simples republicação de artigos lhe inspira medidas repressivas". "À luz desse fato concreto, qual é a autoridade moral que tem esse governo para denunciar a repressão do regime de Maduro?" 


Leia mais: Discreto e rigoroso, substituto de Moro assume Lava Jato após carnaval


O Itamaraty afirmou que a mudança da diretoria do IPRI, "no contexto da troca da grande maioria das chefias do ministério das Relações Exteriores, já estava decidida e foi comunicada ao atual titular". 


Paulo Roberto Almeida é diplomata desde 1977 e já serviu nas embaixadas de Paris e de Washington, entre outros postos de destaque. Em 1984, obteve o doutorado em Ciência Política pela Universidade Livre de Bruxelas, na Bélgica. 


Fundado em 1987, o IPRI é um instituto voltado ao desenvolvimento e à divulgação de estudos e pesquisas sobre temas relativos às relações internacionais, à realização de cursos, seminários e conferências na área de relações internacionais, entre outras atividades."


Leia mais em: https://www.gazetadopovo.com.br/politica/republica/diplomata-e-demitido-apos-republicar-textos-que-debatem-crise-na-venezuela/

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terça-feira, 23 de julho de 2019

Governo Bolsonaro: existe algum risco de melhorar? Parece que não...

"Poder, influência… o que está por trás da “fritura” do porta-voz de Bolsonaro

Monica Gugliano, especial para a Gazeta do Povo São Paulo [22/07/2019] [21:12] 


Porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros foi duramente criticado no fim de semana pela ala ideológica do governo.

O porta-voz da Presidência, general Otávio do Rêgo Barros, virou o novo alvo da "frigideira" de Carlos Bolsonaro, o filho "02" de Jair Bolsonaro. O vereador já conseguiu "fritar" dois ministros palacianos em sete meses de governo: Gustavo Bebianno e Santos Cruz, este último general do Exército. O desgaste de Rêgo Barros se acentuou após o desastroso café da manhã com jornalistas estrangeiros, na última sexta-feira (19).

Carlos culpa o general pelos problemas na comunicação de Bolsonaro que, segundo ele, expõe o pai desnecessariamente. Desta vez, as críticas contaram com a ajuda do deputado pastor Marcos Feliciano (Pode–SP), vice-líder do governo no Congresso, que chegou a chamar Rêgo Barros de "mal intencionado e incompetente".

Militares próximos ao presidente se mobilizaram durante o fim de semana para defender o porta-voz. Alguns viram nos ataques nas redes sociais uma tentativa de atingir também o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, que também sofreu críticas recentes do filho de Bolsonaro.

A mais recente disputa territorial no Planalto envolve muito mais do que o cargo do porta-voz e os cafés da manhã com a imprensa que ele vem organizando. Aparentando sempre a paciência e a calma de um monge budista, Rêgo Barros tem mantido um bom relacionamento com os jornalistas desde que chegou ao cargo pelas mãos de Augusto Heleno, e do ex-comandante do Exército, Villas Bôas, de quem foi chefe da Comunicação Social.

Atualmente assessor especial do GSI, Villas Bôas se tornou um dos principais defensores do ex-subordinado nessa crise. E isso não apenas pelo enorme apreço e amizade que existe entre ambos, mas também porque o ex-comandante, hoje uma das vozes mais importantes no Exército, discorda e combate a forma de agir de Carlos. O general vê nos ataques muito mais do que um desrespeito aos colegas de farda, mas uma afronta à instituição que comandou. “Consideramos um absurdo que esses ataques se perpetuem e atinjam agora o porta-voz”, observou um influente militar do Planalto.

Em jogo, o controle da Secretaria de Comunicação

Ao atacar Rêgo Barros, Carlos Bolsonaro retoma os motivos que, de certa forma, o levaram a "fritar" o então ministro da Secretaria de Governo, Santos Cruz: o poder sobre a estrutura de comunicação social do Palácio do Planalto. Desde a posse do presidente, nunca se conseguiu chegar a um consenso sobre como deveria funcionar a Secretaria de Comunicação (Secom), um dos mais importantes instrumentos do governo no relacionamento com a população.

O presidente Jair Bolsonaro nunca quis manter o comando da Secretaria com terceiros – exceto foi quando pensou em nomear Carlos ministro da área – e muito menos seguir os moldes implementados no governos petistas, em que havia um ministro que chefiava a Secom e detinha o poder de decisão sobre a fabulosa verba da publicidade oficial.

Nesse sistema, o titular do ministério era o responsável pela secretaria que, abaixo dele, se dividia em uma área de imprensa propriamente dita (atendendo a mídia regional, nacional e estrangeira), a publicidade e um porta-voz que, diariamente, fazia os briefings (comunicados) com a posição oficial do presidente da República.

Bolsonaro optou por um esquema que subordinou toda a Secom à Secretaria de Governo. Não funcionou com Santos Cruz e o novo titular da pasta, o general Luiz Eduardo Ramos Pereira, cauteloso, ainda estuda como administrará a área. Em princípio, ele vem tentando manter a estrutura e é o responsável pelas verbas de publicidade que, para este ano, passam do R$ 200 milhões.

Entretanto, uma Secom em que o porta-voz tem autonomia e não se subordina ao secretário, neste caso Fábio Wajngarten, nunca existiu. “O porta-voz, do jeito que está, é uma entidade que só tem ligação com o presidente Bolsonaro”, explica um assessor do Planalto.

Por que cafés da manhã viraram motivo de polêmica

A situação ficou dessa forma porque Rêgo Barros chegou ao cargo muito antes do que Wajngarten. Nesse vácuo, coube a ele, portanto, formular estratégias de comunicação – uma função que seria do secretário – e tentar aproximar o presidente da imprensa.

Foram criados os cafés da manhã, encontros semanais com jornalistas escolhidos por ele e por Augusto Heleno que, dessa forma, tinham oportunidade de se aproximar de Bolsonaro e estabelecer algum relacionamento. Além disso, a relação entre Rêgo Barros e Wajngarten está longe de ser harmoniosa porque um integra a ala militar e o outro representa a família e a ala ideológica do governo.

O estilo informal de Bolsonaro e o fato de ele, na maior parte das vezes, conceder outras entrevistas (o chamado 'quebra-queixo') aos setoristas do Planalto, mesmo nos dias do café, tiraram um pouco do sentido dos encontros porque os jornalistas convidados não tinham informação exclusiva. Por fim, nesse último dedicado aos correspondentes estrangeiros e estopim da crise com Rêgo Barros, o encontro foi transmitido em uma live.

Enquanto era visto por milhares de seguidores, o presidente foi aumentando o tom e sendo mais enfático nas respostas. Disse que não existia fome no Brasil (corrigiu depois), investiu contra a jornalista Miriam Leitão, afirmou que os dados sobre desmatamento na Amazônia divulgados pelo Inpe eram falsos e, o pior dos estragos, fez um comentário pejorativo sobre os governadores do Nordeste sem saber que seu microfone estava aberto, portanto, tudo que dizia era ouvido e transmitido.

No sábado (20), Carlos Bolsonaro tuitou que esses cafés da manhã deviam acabar, pois só servem para prejudicar o presidente. "Sei exatamente o que acontece e por quem, mas não posso falar nada porque senão é fogo amigo", disse, referindo-se aos organizadores dos encontros.

Por enquanto, o café com os jornalistas continua. Nesta segunda-feira (22), Rêgo Barros evitou comentar os ataques de Carlos Bolsonaro contra ele, mas avisou que conversou com o presidente Jair Bolsonaro sobre os cafés da manhã e que eles não irão parar de acontecer. Como se vê, somente o passar dos dias poderá revelar quem, desta vez, venceu a última e mais recente briga no Planalto."


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Ser embaixador em Washington - Rubens Barbosa

O Estado de S. Paulo, 23/07/2019


Ser embaixador em Washington

       O Dissenso de Washington, livro onde descrevo como exerci a função de embaixador nos EUA por quase 5 anos e as atividades da embaixada, foi  publicado em 2011. Por sua atualidade, transcrevo trechos do capítulo “Ser Embaixador Junto ao Governo Americano”, lembrando que, por mais que as relações entre os governos sejam excelentes, o embaixador tem de ficar atento para defender os interesses do pais, pois os Estados Unidos hão de defender, com vigor, os seus próprios. A defesa é feita acima de partidos e ideologias, com prudência e comedimento, sobretudo nos pronunciamentos públicos.
        Ser embaixador em Washington, o posto mais importante no exterior para profissionais de qualquer país do mundo, é o sonho de todo diplomata, mas poucos alcançam esse objetivo. Até ser indicado, por mais de 30 anos, ocupei cargos de chefia no governo e na área econômica do Ministério das Relações Exteriores e no ministério da Fazenda.
                  O embaixador em Washington tem de estar amplamente atualizado não só sobre o que ocorre em seu próprio país e naquele  em que está acreditado, como também sobre os acontecimentos que se desenvolvem nos outros países do mundo. 
      Talvez mais do que em outros postos, em Washington, o que conta para um embaixador é ter acesso e influência. O processo de construção do que se traduz em prestígio perante o governo e a sociedade local é, em grande parte, executado nos contatos desenvolvidos e aprofundados em ocasiões onde os interesses do Brasil são manifestados e defendidos.
         No mundo globalizado, onde a comunicação é instantânea é enorme a competição por espaço na mídia, no mundo cultural e no acesso à comunidade acadêmica. Participei de programas de televisão, rádio, debates acadêmicos, think-tanks e junto a instituições relacionadas com comércio exterior. Assumi o cargo com plena  consciência de que a disputa por espaço para tentar influir em favor do Brasil seria uma das principais linhas de atuação da embaixada. 
         O poder de atração de Washington sobre autoridades de todos os quadrantes é uma das facetas da vida da capital dos EUA.  Presidentes, primeiros-ministros, altas autoridades visitam quase diariamente seus contrapartes norte-americanos. Em torno dessas autoridades, são organizados seminários, reuniões e palestras preciosas fontes de informação para o trabalho diplomático. A presença da embaixada brasileira nas reuniões para debater a situação no hemisfério, a política externa dos EUA e os principais temas globais facilitou muito o nosso trabalho de coleta de informações e análisessobre o que se passava no continente e no mundo.
                     Quando cheguei a Washington, havia ali 194 embaixadas. Fiz um trabalho de ampliação de contatos de modo a que o Brasil se distinguisse como um interlocutor privilegiado para os Estados Unidos no conjunto dos países ali representados. Minha primeira preocupação foi definir a vocação que imprimiria à embaixada brasileira, pois isso determinaria a escolha das prioridades e dos instrumentos de trabalho durante minha gestão.
                        Nas primeiras reuniões com a equipe, tracei a estratégia da atuação futura que visava a dinamizar alguns setores e a criar novos setores na chancelaria. Dentre as prioridades iniciais, estavam a ampliação da interlocução com as autoridades americanas, a ênfase econômica e comercial e o desenvolvimento de um programa de diplomacia pública com a realização de seminários e encontros sobre o Brasil. Empenhei-me também em ampliar a presença no Congresso e em estabelecer sólida aproximação com o meio acadêmico e toda comunidade brasileira. 
Nesse contexto, meu objetivo imediato foi ampliar os contatos e o relacionamento da embaixada brasileira com o governo e o Congresso norte-americanos assim como com as universidades, escolas, mídia, think tanks, ONGs (direitos humanos e meio ambiente), instituições financeiras internacionais e privadas. A meta era fazer da embaixada uma interlocutora proativa nesses setores que definimos como prioritários.
        Faz parte do trabalho de qualquer embaixada hoje, em especial em países estratégicos, adicionar valor às informações que o Itamaraty pode obter por seus próprios meios. Cuidei que desenvolvêssemos análises que superassem as meras notícias e informações oriundas de qualquer parte do mundo e praticamente simultânea aos próprios acontecimentos. Dentro dessa perspectiva e sem descurar do fato de que os Estados Unidos não se resumem a Washington, desenvolvi o trabalho diplomático por meio de viagens e contatos pessoais também fora da capital. Visitei oficialmente 30 Estados (Mídia, Câmaras de Comercio, Universidades).
          A embaixada de Washington goza de situação bastante peculiar: o embaixador atua não só no âmbito bilateral, mas também na mediação do contato de governadores e ministros de estado visitantes com o Banco Mundial, o BID e o Fundo Monetário Internacional. Nunca deixamos de acompanhar as reuniões dessas autoridades brasileiras com o governo norte-americano e com os organismos multilaterais na capital norte-americana.
                               A residência funcionava como uma espécie de braço para a ação diplomática. Muitas vezes, o dia começava com um café da manhã de trabalho. E era rotina recebermos convidados norte-americanos, o corpo diplomático, os correspondentes de jornais e autoridades brasileiras em almoços e jantares de trabalho.
                          Em qualquer representação, mas, sobretudo, na embaixada junto à Casa Branca, o papel da mulher é especialmente valioso. Sendo Washington uma cidade administrativa, os contatos se desenvolvem no âmbito da sociedade local composta de congressistas, membros do governo, dos tribunais, da mídia e dos milhares de lobistas de carteirinha.

            Pela transcrição.
                
            Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington (1999-2004)