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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sábado, 27 de julho de 2019

Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty - Paulo R Almeida, lançamento em SP


Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty
Brasília: Edição do autor, 2019, 184 p., ISBN: 978-65-901103-0-5.
Incorporado às plataformas Academia.edu 
(link para o miolo do livro: https://www.academia.edu/40000881/A_Destruicao_da_Inteligencia_no_Itamaraty_Edição_do_Autor_2019_; link para a capa completa: https://www.academia.edu/39821938/Miseria_da_diplomacia_a_destruicao_da_inteligencia_no_Itamaraty_2019)
e Research Gate (link: https://www.researchgate.net/publication/334450922_Miseria_da_diplomacia_a_destruicao_da_Inteligencia_no_Itamaraty_2019). 


Sumário

Prefácio: onde está a política externa do Brasil? 

1. Miséria da diplomacia, ou sistema de contradições filosóficas 
     1. No reino das contradições filosóficas  
     2. Quanto à forma de designação do chanceler  
     3. Quanto à natureza do personagem designado   
     4. Quanto à substância de alguns temas da agenda diplomática  

2. O Ocidente e seus salvadores: um debate de ideias  
     1. A decadência e o Ocidente: algum perigo iminente? 
     2. Quais são as “teses” principais de “Trump e o Ocidente”?
     3. O grande medo do Ocidente cristão: realidade ou paranoia? 
     4. Contradições insanáveis no projeto de salvamento do Ocidente cristão 

3. O marxismo cultural: um útil espantalho?  
     1. O renascimento de uma tendência: a parábola do marxismo cultural 
     2. A trajetória do socialismo: o elefante que voou, via opressão dos trabalhadores 
     3. O genérico substituto do gramscismo: em socorro do socialismo  
     4. O marxismo cultural salvo do declínio pela paranoia da direita? 

4. A destruição da inteligência no Itamaraty: dialética da obscuridade  
     1. No começo era o verbo, depois fizeram-se as trevas...
     2. Nas origens da metapolítica: o romantismo alemão que derivou para o nazismo 
     3. Tribulações de um antiglobalista improvisado: supostas “ameaças” ao Brasil  
     4. Dialética da obscuridade: a diplomacia do antiglobalismo 

5. O globalismo e seus descontentes: notas de um contrarianista  
     1. Fixando os termos do debate: a contracorrente do pensamento único 
     2. Nota pessoal do ponto de vista de quem pratica ativamente o ceticismo sadio
     3. Globalização real e globalismo surreal: da física à metafísica 
     4. Do lado da direita: todo globalismo será castigado, mesmo sem doutrina  
     5. Teorias conspiratórias sobre o globalismo: déjà vu, all over again 
     6. A contrafação dos neo-Illuminati no Brasil: globalismo, climatismo, marxismo  

6. A revolução cultural na diplomacia brasileira: um exercício demolidor
     1. Euforia e tragédia das revoluções culturais  
     2. O pequeno salto para trás do chanceler 
     3. A revolução cultural na prática  

Apêndices:
Por que sou um contrarianista?  
Breve nota biográfica: Paulo Roberto de Almeida 
Livros e trabalhos de Paulo Roberto de Almeida     


Para ser uma "república de bananas" o Brasil precisa ser uma República antes, não um assunto de família

Diplomata brasileiro compara Brasil a “República das bananas”

EPA/Joedson Alves
O diplomata do Ministério das Relações Exteriores brasileiro (Itamaraty) Paulo Roberto de Almeida afirmou este sábado, à agência Lusa, que o Brasil assemelha-se a uma “República das bananas” devido ao “nepotismo” da nomeação de Eduardo Bolsonaro para embaixador.
O Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, anunciou no dia 11 de julho a sua intenção de indicar o seu terceiro filho, o deputado Eduardo Bolsonaro, para embaixador do Brasil em Washington, capital dos Estados Unidos da América, uma possibilidade que, segundo Paulo Roberto de Almeida, tem prejudicado a imagem internacional do país.
Só Repúblicas de bananas têm esse ‘familismo’, esse nepotismo, filhotismo, essa personalização de relações políticas importantes, como são as diplomáticas, num sistema que antigamente pertencia à aristocracia, às oligarquias, e que hoje é inaceitável para os padrões de uma diplomacia consolidada no sistema burocrático”, afirmou o ex-embaixador em entrevista à Lusa.
O diplomata não tem dúvidas ao declarar que Eduardo Bolsonaro não “tem capacidades” para atender as necessidades do cargo, apesar do chefe de Estado brasileiro confiar nas competências do filho, realçando o facto de falar várias línguas e de conhecer a família do Presidente norte-americano, Donald Trump,
Ele não é capacitado, vamos ser muito claros. Acaba de fazer 35 anos, não tem formação adequada, conhece muito pouco, ou nada, de relações internacionais. Essa adesão às teses de Trump é algo estranho e até bizarro, porque certamente o Presidente norte-americano já colocou o Brasil naquela lista dos ‘shithole countries’, ou seja, um desprezo total por Estados que fornecem imigrantes ilegais aos EUA”, frisou o diplomata de carreira.
Paulo Roberto de Almeida exerceu diversos cargos na Secretaria de Estado das Relações Exteriores e em embaixadas e delegações do Brasil no exterior, tendo sido ministro-conselheiro na Embaixada do Brasil em Washington, entre 1999 e 2003.
Na sua passagem pelos Estados Unidos, Paulo Almeida seguiu de perto a situação de muitos brasileiros em situação irregular naquele país, reforçando, porém, a natureza “honesta” e “trabalhadora” da grande maioria desses cidadãos.
Em março deste ano, numa passagem pelos EUA, Eduardo Bolsonaro, que além de deputado é presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, classificou os imigrantes brasileiros em situação ilegal como uma “vergonha para o país”, uma atitude que não agradou a Paulo Almeida.
Dizer que é uma vergonha para o Brasil ter imigrantes ilegais nos EUA não é verdade. Eles são pessoas que não tendo oportunidades no Brasil, como muitos outros latinos, africanos ou asiáticos, devido a crises económicas ou a guerras civis, buscaram com os pés uma vida melhor com as suas famílias”, garantiu o também professor universitário.
Questionado se a nomeação de Eduardo Bolsonaro para o cargo de embaixador não será uma estratégia de política externa delineada pelo Presidente, Paulo Roberto de Almeida disse que se foi essa a intenção, tratou-se de um “erro fundamental”.
“Pode ser que na conceção primária de política externa de Jair Bolsonaro fosse uma estratégia, mas é um erro fundamental.(…) Nos últimos 70 anos, na grande organização burocrática de relações internacionais do sistema da ONU, a diplomacia é conduzida pelos canais oficiais dos Ministérios das Relações Exteriores. Temos carreiras diplomáticas que compreendem todo um treino ao longo de décadas, para postos de certa importância. O filho do Presidente, certamente, não tem nenhuma capacidade para ser embaixador em quaisquer condições normais”, reforçou.
No entanto, para o diplomata, não é apenas a nomeação de Eduardo Bolsonaro como embaixador que afeta a imagem do país sul-americano. Também as adesões do Brasil a teses minoritárias o preocupam.
Nas últimas semanas, o Brasil ficou ao lado de países como o Iraque, Paquistão e Arábia Saudita, em causas vinculadas a Direitos Humanos na ONU, em relação a ideologia de género, sexualidade, ou proteção das mulheres, o que, na voz de Paulo Almeida, causa “perda de prestígio” do país, no plano internacional.
Em março deste ano, Paulo Roberto de Almeida foi demitido da presidência do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), cargo que ocupava desde 2016, naquele órgão vinculado ao ‘Itamaraty’, nome como é conhecido o Ministério das Relações Exteriores do Brasil, passando a ocupar um cargo na divisão de arquivo da mesma pasta.
Apesar de crítico dos Governos do Partido dos Trabalhadores (PT), foram as opiniões negativas tecidas ao Governo de Bolsonaro no seu blogue pessoal, nomeadamente ao ministro das Relações Exteriores brasileiro, Ernesto Araújo, que terão levado à sua exoneração.
Pelo menos é nisso que o diplomata acredita, apesar de essa tese ter sido contrariada pelo executivo, que afirmou que a demissão “já estava decidida” antes mesmo da polémica.
À lusa, o ex-embaixador reforçou críticas a Ernesto Araújo, dizendo que o atual chefe da diplomacia brasileira foi uma “péssima escolha para o cargo”, e que acredita que o ‘chanceler’ conseguiu liderar um Ministério devido a “oportunismo”.
Acho que foi uma péssima escolha. Não se sabia nenhuma adesão dele a teses de direita, e acho que construiu isso de forma artificial nas relações com Eduardo Bolsonaro ou Olavo de Carvalho (considerado ‘Guru’ de Bolsonaro. (…) Do ponto de vista internacional, alguém que resolver empreender uma campanha contra o globalismo, multilateralismo e comercialismo é alguém que em deficiências de raciocínio lógico em relação ao sistema internacional”, depreendeu.
“Eu não consigo compreender como é que um diplomata formado na escola do Itamaraty, nas leituras e na experiência internacional consiga aderir a teses tão bizarras quanto essas, a não ser por puro oportunismo”, concluiu Paulo Roberto de Almeida em entrevista à agência Lusa.

O bolsonarismo precisa alimentar a tribo esquerdista: ele vive disso - Rodrigo Levino

O ‘bolsonarismo’ entre a conciliação e a revolta

A decisão do min. Dias Toffoli do STF por suspender investigações baseadas em dados fornecidos pelo COAF a partir de um pedido do senador Flavio Bolsonaro (PSL-RJ), encalacrado com as movimentações financeiras pouco ortodoxas do seu entorno político, selou um pacto menos institucional do que estratégico e de autoproteção entre os Bolsonaro e o establishment, que põe o primeiro numa encruzilhada.
Em janeiro passado, quando o ministro Luiz Fux acatou o pedido liminar suspendendo qualquer procedimento investigatório contra Flavio até que o relator do processo no Supremo se pronunciasse, a militância bolsonarista descarregou críticas sobre o filho mais velho do presidente, surrando a retórica para dar conta de isolar o mandatário da família das suspeitas que se avolumavam de mau uso do dinheiro público.
Desde a semana passada, no entanto, essas posições vem mudando de face. O ‘sim’ de Toffoli ao novo pedido do senador, filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, serviu de fleet paralisante, pacificou a timeline bolsonarista, que sentiu o cheiro de queimado, embora a maioria ainda esteja na fase de negação. A tergiversação deu o tom e mesmo as críticas públicas dos ponta-de-lança militantes nas redes sociais não foram além de acanhados ‘lamentável’.
O coro de ‘Dudu Chapeiro para embaixador nos EUA’ foi parte da estratégia. Calculou-se que era uma forma menos desgastante de desviar a atenção das franjas mais radicalizadas da militância do flerte descarado da família Bolsonaro com o estamento burocrático que ela diz pretender drenar. As declarações vulgares do presidente sobre fome e cinema no Brasil serviram ao mesmo fim.
A forma final dessa encruzilhada talvez se dê nas próximas semanas, quando o mesmo STF que agiu para proteger Flavio Bolsonaro, talvez aja para beneficiar o ex-presidente Lula, nêmesis do bolsonarismo. A ideia de ‘um cabo e um soldado para fechar o STF’ ainda é a melhor síntese do respeito legado pela militância do presidente a corte maior.
Intutelável, de pendor revolucionário, ainda mais radicalizado desde as manifestações de maio passado, tendo degradado as posições tanto dos militares quanto, em menor grau, é verdade, dos liberais dentro do governo, o arranjo olavobolsonarista que guia o pensamento do presidente e seus apoiadores mais fiéis é milenarista e tem afinado um clamor à violência crescente e cada vez mais desavergonhado nas redes sociais, onde ela melhor se organiza.
Mas a entropia aos poucos vaza para o mundo real. Episódios como o enfrentamento do grupo Direita SP contra membros do Movimento Brasil Livre nas manifestações recentes de apoio a Lava Jato, por exemplo, tem guarida e são, se não comemorados, tolerados em grupos de Whatsapp e fóruns de discussão reacionários como uma espécie de processo de depuração da ‘verdadeira direita’.
Protestos como o contra a participação da jornalista Miriam Leitão numa feira de literatura em Santa Catarina são estimulados com fervor de brigadas lutando contra o comunismo em pleno 1930. A fala do presidente atacando a jornalista e chancelando indiretamente os manifestantes parece loucura, mas tem método. Como numa lição que se repete mais claramente desde Revolução Francesa, as primeiras vítimas dos extremistas, para quem apoio é subserviência, são os moderados, ‘entulhos’, ‘isentões’ e ‘traidores’.
Em vídeos, memes e podcasts a gradação da linguagem bélica vai desde o uso de termos como ‘ucranizar’ (agressão pública em série a políticos de oposição) a elogios mal disfarçados de ‘zueira’ e ‘humor politicamente incorreto’ ao motorista suspeito de atropelar um idoso na semana passada num ato do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, de esquerda, em Valinhos (SP), ou frases como ‘nós vamos fazer o que os militares deixaram de fazer em 1964’, ‘vai faltar necrotério’ em alusão clara à repressão política.
Uma frase do escritor Olavo de Carvalho ilustra o ímpeto dos mais exaltados, quando diz que ‘moderação na defesa da verdade é prestar serviço à mentira’. Os que comungam desse entendimento respondem com presteza o que seria a verdade (o credo olavista e o apoio irrestrito ao presidente), a mentira (tudo que por eles seja identificado como comunismo), mas o limite da não moderação resta sempre em aberto. ‘Temer por suas existências físicas’ e ‘quebrar as pernas’ já foram expressões usadas pelo mesmo Olavo referindo-se aos opositores do presidente.
A pauta moral vai servindo de pasto ao gado militante e mantém, em potencial, a violência que pode ser conclamada mais abertamente à medida que se configurem embates político-institucionais como os que podem sequenciar ao abrandamento do cumprimento da pena do ex-presidente Lula.
É quando chegará a hora de por à prova a resistência do pacto Dias Toffoli-Bolsonaros. Um caminho leva à conciliação, com Supremo com tudo. Outro, ao arrostamento contra um dos três poderes da República, ‘cúmplice de tudo que está aí’. O eleitor raiz de Bolsonaro, cuja percepção é de podridão institucional generalizada, saliva pelo segundo. Os vazamentos da comunicação entre integrantes da força tarefa Lava-Jato só aguçaram esse faro para a carniça.
Pode não ser, no agudo da crise política que se avizinha, a hora em que a violência coesa e organizada vai entrar em cena no debate público, mas as aproximações a essa realidade tem sido paulatinas.
Como descreve René Girard, autor caro ao olavismo, ‘na onda crescente dos escândalos, cada represália evoca uma nova, mais violenta que a precedente. Se nada vier estancá-la, a espiral irá necessariamente desembocar nas vinganças em série, fusão perfeita de violência e de mimetismo’.
A prisão de Lula foi, dentro dessa visão sectária, o auge das represálias, de modo que sustá-la deixará uma lacuna. É fundamental ao bolsonarismo manter o espantalho do lulismo vivo, questão ontológica. A manutenção desse espectro/capital político talvez peça ao presidente, quem sabe, o sacrifício do seu próprio filho.