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quinta-feira, 19 de março de 2020

Consequências geopolíticas da pandemia Covid-19 - Paulo Roberto de Almeida

Consequências geopolíticas da pandemia Covid-19

Paulo Roberto de Almeida
 [Objetivo: debate público; finalidade: esclarecimento pessoal]


Grandes mudanças nos equilíbrios econômicos e políticos em escala global costumam ocorrer em consequência de eventos ou processos de grande impacto nacional e mundial: desastres naturais – catástrofes da natureza, epidemias, justamente – e, mais frequentemente, guerras civis e revoluções (domésticas) e guerras entre Estados. Estas são mudanças que podem ocorrer em curto ou médio prazo, e podem ajudar, ou postergar, mudanças “naturais” que já vinham ocorrendo mais gradualmente, sob o peso da demografia, dos grandes deslocamentos de populações – invasões “bárbaras” no Ocidente entre a Antiguidade e a Idade Média, por exemplo – e, mais frequentemente, como resultado de avanços materiais e progressos tecnológicos, que alteram, gradual ou repentinamente, os modos de produção e de intercâmbio entre sociedades e regiões inteiras: disseminação de novas culturas e criações (intercâmbio de espécies nos grandes espaços abertos, como descrito por Jared Diamond em seu clássico Armas, Germes e Aço), invenções práticas (arado, contabilidade de partida dobrada, caravelas, revolução científica, máquinas a vapor, motor a explosão, válvulas, transistores, etc.) e novidades nos meios de intercâmbio (moeda, lettera di cambio na Idade Média, bill of exchange telegráfico no século XIX, transações financeiras instantâneas na era contemporânea). Dentre as grandes calamidades epidêmicas, permanecem paradigmáticas, na história da humanidade, a Peste Negra na Europa do século XIV – que, contraditoriamente, representou um crescimento da produtividade econômica, ao diminuir a população total – e a “Gripe espanhola”, em 1918-19, que pode ter vitimado entre 50 e 100 milhões de pessoas.
Existem outras mudanças, de natureza contingente ou conjuntural, que também podem alterar profundamente as relações entre Estados, impérios, nações, tanto quanto a evolução interna das sociedades, ações que são o resultado de decisões de dirigentes, atuando sob o impacto de paixões momentâneas, cálculos estratégicos ou pressão das circunstâncias: guerra de Troia, queda de Roma imperial, expansão árabe do islamismo e cruzadas vindas da Europa cristã, invasão mongol do império Song, guerras entre impérios bizantino e persa, invasão otomana do Império Romano do Oriente e nas franjas balcânicas da Europa e na África do norte, e, finalmente, expansão europeia a partir dos Descobrimentos e consequente dominação ocidental sobre o resto do mundo pelos cinco séculos seguintes (até a Segunda Guerra Mundial pelo menos). Acredito que se possa colocar entre essas mudanças de tipo contingente a decisão de um novo Secretário-Geral do PCUS da União Soviética de não continuar preservando as estruturas atrasadas do planejamento centralizado e o duro regime de censura autocrática do Partido. A implosão subsequente do socialismo na Europa foi a “grande transformação” na política e na economia global desde a Grande Guerra, da qual tinha justamente emergido a contestação bolchevique à economia capitalista e às democracias de mercado. Estas são as grandes mudanças de impacto monumental nos últimos três mil anos (desde a guerra de Troia, tão mítica quanto possa ser), ou desde os impérios romanos (república e império) e chineses (várias dinastias sucessivas), até o século XX.
Ao lado dessas mudanças “objetivas”, existem as grandes mudanças “imperiais” que resultam de choques entre pretensões hegemônicas concorrentes, em diversas regiões: no caso da Europa, o chamado “equilíbrio de potências” do final do século XIX foi precedido de guerras devastadoras entre os impérios britânico, francês, dos Habsburgos, dos czares e muitos outros. A Revolução francesa de 1789 – independentemente do fato objetivo que ela atrasou relativamente o capitalismo na França, segundo Hobsbawm, quando a Grã-Bretanha surfava praticamente sozinha na onda da primeira revolução industrial – representou, em seus muitos episódios e desdobramentos – sob o Diretório, Consulado e Império napoleônico –, a maior alteração conhecida até então naquela ponta da Eurásia: guerras napoleônicas, com o fim do Império Romano Germânico, da Liga Hanseática, impacto nas dinastias da península ibérica e, a partir daí, nas suas colônias do Novo Mundo, que caminharam uma a uma para a independência política, depois das treze colônias da América do Norte pouco antes.
A segunda revolução industrial sinalizou o processo que os economistas historiadores chamam de “Grande Divergência”, ou seja, o aprofundamento da distância entre as nações industrialmente avançadas e as dependências coloniais e nações periféricas que preservaram essa status praticamente até a contemporaneidade; apenas recentemente, a partir da terceira onda da globalização (desde os anos 1980), o processo se encaminha para uma Convergência que atinge mais decisivamente os novos países industriais que se inseriram nas grandes cadeias de valor da nova interdependência global. Mas, o evento ainda mais decisivo para uma alteração radical nas relações interimperiais e entre grandes economias foi representado pela Grande Guerra (1914-1918), que modificou profundamente não apenas a geopolítica do mundo contemporânea, mas também as bases de funcionamento da economia global. Ao lado das demais mudanças políticas – fim de impérios: alemão, austríaco, russo, otomano; criação de novos Estados, no quadro dos princípios wilsonianos das negociações de 1919 –, o que repercutiu gravemente pelo resto do século foi a intervenção estatal na vida econômica, com toda a panóplia do regulacionismo intrusivo e da assunção pelo Estado de inúmeros setores de interesse público: não apenas energia, transportes e comunicações, mas também indústrias ditas “estratégicas”.
O multilateralismo nascente, na Liga das Nações, não foi capaz de evitar o crescente apelo ao nacionalismo econômico, ao protecionismo, às políticas de “beggar-thy-neighbour” (empurre a crise para o seu vizinho). Foi o que justamente ocorreu a partir da crise da bolsa de Nova York, em outubro de 1929 (aprovação de novas tarifas americanas, em 1930), mas sobretudo a partir da quebra de bancos em 1931, que precipitou o mundo numa nova e gigantesca crise: fim da conversibilidade, restrições quantitativas, desvalorizações agressivas e, enfim, a Grande Depressão que se arrastou praticamente até a Segunda Guerra Mundial. Esta precipita movimentos que já tinham começado na Grande Guerra: erosão paulatina dos grandes impérios europeus e emergência de duas grandes potências antagônicas, que vão marcar os quarenta anos seguintes de Guerra Fria, sob o signo do terror nuclear e da oposição irredutível entre o mundo socialista e o capitalista, com um Terceiro Mundo espremido entre os dois. A grande divisão geopolítica do mundo, resumida nas obras clássicas de John Lewis Gaddis, nunca representou, na verdade, um congelamento do poder mundial, pois que outras potências, grandes e médias, continuaram emergindo e alterando gradualmente o verdadeiro nervo central dos equilíbrios mundiais, o poder econômico, os novos “Estados comerciais”, na caracterização de Richard Rosencrance (Trading State; mais aplicável a Japão, Alemanha e outros).
A ordem econômica multilateral de Bretton Woods seguiu uma trajetória de sucesso a partir do segundo pós-guerra, com percalços eventuais, sobretudo representado pela quebra do padrão ouro-dólar (1971-73) e suas crises habituais absolutamente “normais”: do petróleo (1973-79), da dívida externa dos países emergentes (1982-90), das crises financeiras dos países asiáticos e da Rússia (1997-98), com seus efeitos no resto do mundo. A crise de 2008-09, precedida da bolha imobiliária e das instituições financeiras (2007-08), esteve mais centrada nos próprios países avançados, num momento em que a China já despontava como a segunda grande potência econômica mundial, ao lado dos velhos parceiros-inimigos do CSNU, que são também as potências nucleares “autorizadas”.
Cabe agora contemplar o cenário atual, absolutamente inovador por causa da irrupção da pandemia do Covid-19, cuja “globalidade” deve provocar imensos efeitos econômicos em todo o mundo e também mudanças geopolíticas no momento imprevisíveis, mas que podem confirmar certas tendências já presentes na fase pós-Guerra Fria. Nos 30 anos seguintes, o mundo parecia se encaminhar para um cenário de “convivência pacífica” entre grandes contendores econômicos, comerciais e tecnológicos, ou seja, a substituição da antiga Guerra Fria geopolítica da era nuclear para uma nova Guerra Fria Econômica, que teria tudo para se desenvolver de modo relativamente harmônico, não fossem as novas tendências surgidas a partir do relativo declínio das antigas potências industriais do século XX. Observadores otimistas – como Niall Ferguson, por exemplo – chegaram a cunhar o termo de “Chimerica”, que seria uma espécie de osmose entre as duas grandes economias planetárias, absolutamente complementares entre si, e que poderiam, se animadas pelos princípios cooperativos do multilateralismo econômico – Gatt-OMC, instituições de Bretton Woods, Ocde, etc. – contribuir para uma nova fase de prosperidade universalmente partilhada por países ricos, emergentes e em desenvolvimento, assim como ocorreu nas “trinta gloriosas”, as três décadas de crescimento contínuo no pós-Segunda Guerra, mas que beneficiaram mais os países avançados do que os socialistas (et pour cause) ou os países “subdesenvolvidos”.
Infelizmente essa perspectiva de um reforço na interdependência global não se materializou, em virtude da introversão dos países ricos, em especial os EUA, no novo protecionismo comercial (mais padrões do que tarifas), no nacionalismo xenofóbico, nas políticas tendentes a preservar suas estruturas industriais já condenadas desde o declínio da segunda revolução industrial. Depois da fase otimista da “globalização”, o mundo caminhou para uma “desglobalização” moderada, até a irrupção catastrófica do Covid-19 a partir do final de 2019, mas que só revelou toda a sua extensão nos primeiros meses de 2020. O que pode ocorrer a partir de agora, em termos de impacto na economia global, no emprego e na renda de centenas de milhões de pessoas, na política de diferentes regimes ao redor do mundo, é propriamente imprevisível, mas algumas tendências poderiam ser sinalizadas.
Não há por que subestimar o impacto amplamente catastrófico da pandemia atual, em termos humanos, sociais e econômicos, mas existem, igualmente, consequências geopolíticas do Covid-19, com incidência progressiva ou continuada em termos de mudanças no cenário global, principalmente quanto aos papeis globais dos EUA e da China. Esta vem sendo acusada de responsável pela disseminação do elemento vetor, que se converteu na maior pandemia conhecida na história da humanidade, com capacidade de superar, talvez, em incidência, a chamada “gripe espanhola”, ainda que não dotada, provavelmente, da mesma letalidade que o influenza de cem anos atrás. No plano estritamente técnico, cabe registrar que o regime autoritário chinês pode, sim, ser acusado de ter postergado as primeiras reações ao novo vírus em sua província central, mas, uma vez aferida a seriedade e gravidade desse desafio, atuou prontamente, em bases científicas e em total cooperação com a OMS, para lutar contra seus efeitos mais nefastos em seu próprio território e em direção dos demais países. A hostilização ideológica da ditadura chinesa não contribui em praticamente nada para o esforço conjunto de combate à pandemia, tanto porque os ensinamentos e lições derivadas do dramático episódio chinês podem servir, e em alguns casos estão sendo, de aprendizado a novos países afetados pelo mesmo mal. A centralização dos esforços e a rápida introdução de medidas coercitivas de isolamento, de controle, prevenção e remissão dos vetores contribuíram, possivelmente, para o virtual corte nas novas fontes de contaminação, sendo que novos casos detectados são todos importados. Ou seja, depois de estar na origem da pandemia, a China passa a oferecer know-how, cooperação técnica, equipamentos e pessoal aos países afetados, com destaque para a Itália e o próprio Brasil.
O que parece relativamente certo é que, sendo a epidemia global, sua reversão não se fará facilmente em bases puramente nacionais ou exclusivamente autocentradas, o que pode dificultar a necessária coordenação e cooperação entre países e organismos internacionais. Aqui se situam as possíveis consequências geopolíticas do Covid-19, e tal perspectiva se situa inteiramente na capacidade de projeção externa das grandes economias do mundo atual, a partir de uma sólida base nacional. Desde os tempos nos quais a Grã-Bretanha se constituiu como o berço e o motor da primeira revolução industrial, não se assistia a uma mudança tão rápida na geopolítica do poder mundial. A Royal Navy exerceu uma preeminência notável sobre quase todos os oceanos no decorrer do século XIX, assim como a libra britânica e a City de Londres se constituíram na base incontornável dos grandes fluxos e circuitos de comércio, de investimentos, de finanças internacionais durante mais de um século, enquanto a Europa ocidental se alçava na liderança do mundo na passagem para a segunda revolução industrial (que também foi a era dos impérios e colonialismo contemporâneo). A Alemanha caminhou rapidamente para estabelecer sua supremacia no continente, e ao fazê-lo, devido à natureza de seu regime político, foi responsável por três guerras – começando pela de 1870, mas se prolongando mais enfaticamente em 1914 e 1939, a “segunda guerra de Trinta Anos” – que justamente destruíram o poderia europeu sobre resto do mundo, abrindo o caminho para a emergência dos dois grandes da era nuclear.
Os Estados Unidos emergiram como a grande potência econômica e tecnológica no bojo da segunda revolução industrial e recuperaram, parcialmente, o papel econômico da Grã-Bretanha no comando da economia mundial no decorrer do século XX. Sua emergência como potência militar se dá apenas no decorrer e após a Segunda Guerra Mundial, mas sua base econômica continuou declinando relativamente, pari passu à emergência de novos competidores: Alemanha, Japão, e desde o início do novo milênio, a China. O fato de a atual liderança política nos EUA estar retrocedendo o país para um tipo semelhante – não similar – de isolacionismo como o conhecido no entre guerras pode acelerar o declínio relativo da potência hegemônica do pós-Guerra Fria, que o historiador Niall Ferguson gostaria que assumisse, como novo Colossus, o papel anteriormente exercido pelo Empire britânico. Este é um fato objetivo, confirmado pelas tendências detectadas no período recente, assim como pelas políticas implementadas no país, ambas coincidentes no retrocesso à introversão.
Mais importante ainda, em termos geopolíticos, são duas outras tendências que podem ser detectadas em dois ambientes paralelos na governança dos grandes impérios, dois típicos símbolos do poder estatal, exemplificados nas figuras que Raymond Aron identificava como os personagens centrais desse poder: o soldado e o diplomata. O primeiro, sabe-se desde as lições de Clausewitz, representa a ultima ratio da defesa e da projeção do poder do Estado; o segundo também emerge na mesma época, ou seja, o Congresso de Viena, como o enviado formal e regular para administrar as relações cooperativas, ou seja, amistosas, e não bélicas, entre os países. O diplomata é uma espécie de acadêmico que está a serviço dos governos, ao passo que o soldado é o braço armado do Estado, para ser usado apenas em última instância.
Paradoxalmente, a arrogância imperial faz com que a paranoia normal dos militares – que é necessária por pura coerência com os seus propósitos, de dissuadir e de ameaçar – seja projetada igualmente entre acadêmicos e diplomatas, com o que se constrói um ambiente pouco propenso à construção da interdependência global que deveria abrir uma nova era de prosperidade para o mundo. Ao eleger a China, não como mera concorrente tecnológica ou militar, mas como “adversária estratégica”, os paranoicos do Pentágono podem estar dando início a uma nova corrida armamentista, como já houve tantas no passado – entre Roma e Cartago, entre os impérios centrais que precipitaram a Grande Guerra, entre a URSS e os EUA, na Guerra Fria – e que pode desviar importantes recursos econômicos numa conjuntura de esgotamento dos Tesouros nacionais para cuidar do declínio demográfico e da pressão competitiva dos mercados emergentes. Por outro lado, a adesão de diplomatas e acadêmicos a essa visão confrontacionista do ambiente internacional impede, paralelamente, ou pelo menos retrasa, a integração econômica e cultural do mundo, tal como construída pela globalização microeconômica, aquela conduzida por empresas e indivíduos (em contraposição ao segundo tipo de globalização, a macroeconômica, isto é, aquela administrada por governos e entidades internacionais, e que pode ser, na verdade, uma antiglobalização).
Tal como eu vejo o atual cenário mundial no plano geopolítico, creio que as atuais tendências e políticas nacionalistas em ação em importantes países do Ocidente – uma manifestação que vem sendo identificada com o paranoico fenômeno do antiglobalismo – farão retroceder a interdependência global, mas elas serão tanto mais prejudiciais às economias nacionais quanto mais seus dirigentes adotarem o recurso ao nacionalismo protecionista. Na outra vertente do mundo, defendendo resolutamente a globalização, o livre comércio, a abertura aos investimentos – ainda que fazendo um uso malicioso das regras multilaterais que eventualmente regulem essas áreas, e recorrendo também a práticas desleais nos mercados globais –, situa-se a China atual, lançada com ardor na nova interdependência, embora agora temporariamente afetada pelo seu terrível surto epidêmico (em remissão). Como interpreto o curso da atual Guerra Fria Econômica em curso no mundo – com suas evidências tópicas simbolizadas pelo Belt and Road, 5G, conflitos em termos de propriedade intelectual de inovações tecnológicas, práticas desleais de comércio, etc. – aplicando, como se deve, justamente os critérios de tendências e políticas, acredito que a China já emergiu dessa “guerra” como a vencedora indiscutível nesse processo, uma vez que ela apresenta tendências e políticas coincidentes e conducentes com os requerimentos da globalização no seu presente estágio de desenvolvimento. A pandemia pode frear moderadamente o ritmo desse processo, mas assim como a Europa emergiu mais forte e mais produtiva da sua terrível experiência com a Peste Negra, acredito que a China emergirá mais capacitada, mais bem dotada de know-how, experiência e conhecimento, ou seja, melhor preparada para enfrentar eventuais choques entre impérios, fricções normais no longo caminhar do processo histórico.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19 março 2020.


Rodrigo Constantino também aproveita o Coronavirus para continuar a batalha ideológica

A ditadura chinesa do Partido Comunista é apenas a forma moderna do velho "despotismo oriental", a tirania longeva que se estendeu ao longo de séculos, com poucos períodos de abertura política ou tolerância com a dissidência (que no entanto existia e existe, mesmo nos momentos mais despóticos).
O despotismo não impediu o desempenho brilhante da China nos séculos passados, graças tanto à energia de seu povo, quanto à organização "weberiana" dos mandarins do Estado, e também fases tenebrosas de sua história – guerras civis, rebeliões, invasões estrangeiras com humilhações e genocídios, como no caso do militarismo do Japão –, o que se agravou ainda sob o maoísmo demencial dos anos 1950 aos 70, com milhões de mortos em cada um desses episódios e provações. 
Epidemias existem em diferentes países e situações, que são ou não controláveis pelas autoridades sanitárias.
A ditadura chinesa errou, sim ao início do novo coronavirus, mas depois se recompôs e organizou um sistema eficaz de controle e combate, o que fez com a epidemia revertesse em dois ou três meses. A RPC oferece agora know-how, equipamentos e pessoal como colaboração a países afetados, entre eles Itália e Brasil.
Acredito que se deve separar as querelas ideológicas das questões técnicas vinculadas ao combate à pandemia, que sendo uma enfermidade global, deve ser combatida globalmente, na cooperação entre os estados nacionais, sob a coordenação da OMS e organismos regionais dessa esfera.
O exclusivismo nacionalista, assim como o dedo acusatório de natureza política não vão resolver os problemas dos países afetados.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 19/03/2020

Onde os valores fazem parte da notícia

 

    A ditadura comunista deveria indenizar o mundo pelo vírus chinês


Por Rodrigo Constantino
Gazeta do Povo, 19/03/2020

O presidente Donald Trump passou a só se referir ao Covid-19 como "vírus chinês", e tem sido atacado por jornalistas por isso. Mas como ele nunca abaixa a cabeça para essa turma, chega a ser constrangedor ver a humilhação que sofrem quando tentam emparedar o presidente como "racista", e ele simplesmente explica que o vírus veio da China mesmo, e que o regime, ao esconder informações, ajudou a criar a pandemia."

Como explica Ben Shapiro, não há nada de controverso em chamar de vírus chinês, como chamamos, aliás, a gripe que dizimou milhares no passado de gripe espanhola. Diz Shapiro:

 
"O fato de a imprensa de alguma forma ter encontrado tempo para tratar de um assunto menor — a descrição de um vírus chinês como tal — em meio a um pânico mundial sem precedentes demonstra o profundo descompromisso daqueles que reclamam.

É inacreditável que o termo seja controverso. O vírus realmente teve origem na China. Mais do que isso, a ideia de que o governo chinês deveria ser protegido das consequências de suas medidas tirânicas e seu governo patológico é de uma perversidade sem igual."

 
O debate foi aquecido no Brasil pelo episódio envolvendo Eduardo Bolsonaro, que publicou mensagem na linha do que disse Trump. Eduardo pode falar dez vezes antes de pensar, pode ser pouco diplomata, irresponsável até, tudo isso de que tem sido acusado, mas ele é o deputado federal mais votado da nossa democracia e não mentiu; já a China é uma ditadura que prende jornalistas e calou médicos que alertavam para o risco da gripe.

Eduardo, em que pese ser filho do presidente e por isso gerar tensão diplomática maior, não foi o único deputado federal a se manifestar nesse sentido. Marcel van Hattem, do Partido Novo, também comentou, ao compartilhar a ótima sequência feita por Rodrigo da Silva sobre o caso.
 

Kim Kataguiri, do DEM de Rodrigo Maia e ligado ao MBL, também publicou responsabilizando o regime chinês.

Já Rodrigo Maia, supostamente tentando apagar incêndio diplomático, pediu desculpas à ditadura.

Nosso “primeiro-ministro”, nos desejos de boa parte da mídia, prefere tomar o partido do regime que prende jornalistas, que cala médicos que alertam sobre o coronavírus, que permitiu com que o troço virasse uma pandemia. Eles amam a democracia... ou nem tanto!

É lamentável - e revelador -, portanto, ver nossos "jornalistas" e "democratas humanistas" tomando o partido da ditadura, vibrando com a "enquadrada" do PCC, o maior responsável pela pandemia. É pragmatismo, simpatia ideológica ou se venderam para os comunistas mesmo?



Artigo completo aqui.
 

The Dead Zone (Spanish Flu) - By Malcolm Gladwell (The New Yorker)

Se você acha que o Covid-19 é terrível, que tal um outro Covid-19, mas de CEM anos atrás, a tal "Gripe Espanhola", mas que não era na verdade espanhola e pode ter nascido no Kansas?
Vamos ver...



Uberaba na Segunda Guerra e na Política Externa - Jornal de Uberaba

Transcrevo a parte que me interessou nesta coletânea de notícias sobre Uberaba:


ARTIGO

Ensaios técnicos uberabenses (III)

Guido Bilharinho


https://www.jornaldeuberaba.com.br/noticia/8759/ensaios-tecnicos-uberabenses-iii-

POLÍTICA EXTERNA
Quando deputado federal na legislatura de 1946/1950, JOÃO HENRIQUE SAMPAIO VIEIRA DA SILVA, então presidente da Comissão de Diplomacia da Câmara, elaborou parecer favorável sobre “A Internacionalização de Jerusalém”, posteriormente editado em livro pelo Ministério das Relações Exteriores, sem, contudo, explicitar a data da edição e a data do próprio parecer, supondo-se 1948.
*
Em 1972, João Henrique lançou segunda edição do livro “Novos Rumos Para a Diplomacia Brasileira”, elaborado, como informado na Introdução, “em função do cargo de presidente da Comissão de Diplomacia da Câmara dos Deputados” exercida de 1946 a 1950, discorrendo, além do tema-título, sobre aspectos da Política Interamericana e das Campanhas em Prol da Paz.
*
Em 2007, o embaixador CARLOS ALBERTO LEITE BARBOSA publicou a obra “Desafio Inacabado – A Política Externa de Jânio Quadros”, no qual, em nada menos de vinte e nove capítulos, expõe os principais fatos relacionados a essa política, diversos deles de larga repercussão à época.

SEGUNDA GUERRA MUNDIAL
 Uberaba e região enviaram centenas de jovens para participar da Segunda Guerra Mundial, seja para segurança e vigilância da extensa costa atlântica do país, seja para lutar diretamente no teatro da guerra na Europa. Um dos pracinhas que foram e lutaram nos campos de batalha da Itália, OTÁVIO BATISTA CARVALHO, publicou, em 1947, o livro “Dramas da Guerra”, no qual relata fatos e episódios do conflito.
*
A participação de Uberaba e região na Segunda Guerra Mundial foi tão expressiva, que, em 1995, o Arquivo Público de Uberaba publicou a obra “Uberaba na 2ª Guerra Mundial”, com coordenação de pesquisa promovida por SÔNIA MARIA FONTOURA e redação e organização temática efetuadas por ela e pelos pesquisadores do Arquivo, FLÁVIO ARDUINI CANASSA e LUÍS HENRIQUE CELULARE, abordando a obra a reunião das centenas de jovens de Uberaba e cidades próximas para atuarem na Guerra, bem como sua participação no seu decorrer.
*
Conquanto em outra perspectiva e diversa finalidade, sobre o tema Uberaba apresentou ainda o livro “A Segunda Guerra no Cinema” (2005), de nossa autoria, distribuídos os artigos de conformidade com o espaço de beligerância que os filmes contemplam (dramas e batalhas marítimas, Europa Central e Bálcãs, Frente Italiana, Europa Ocidental, Alemanha antes, durante e depois da guerra, Frente Russa, Norte da África, Ilhas do Pacífico, Japão, além de cinebiografias dos generais Rommel, Patton e MacArthur).

quarta-feira, 18 de março de 2020

Pandemias são interrompidas pela ciência. E só por ela - Geraldo Wilson Fernandes, Sérvio P. Ribeiro (UFMG)

Pandemias são interrompidas pela ciência. E só por ela

Professores Geraldo Fernandes e Sérvio Ribeiro alertam que não ouvir os cientistas em situações como a da atual epidemia de coronavírus pode trazer consequências devastadoras

Imagem de viriões de Sars-CoV-2 obtida por microscópio eletrônico de varrimento
Imagem do Sars-CoV-2, o novo coronavírus, obtida por microscópio eletrônico de varrimentoNIAID Rocky Mountain Laboratories (RML), U.S. NIH / Domínio Público
Cientistas investigam a natureza e tudo o que está relacionado a ela – desde a descrição de fenômenos, formas, quantidades e comportamentos até a formulação de predições sobre acontecimentos futuros, baseados no entendimento (passado e presente) dos fenômenos naturais.
Faz 20 anos que os cientistas alertam que haveria mudanças de regimes de chuvas, com cenários mais imprevisíveis e com eventos extremos mais frequentes, caso o aquecimento global provocado pelo homem não fosse revertido. E não foi! 
Em 29 de janeiro, de forma imprevisível, as áreas mais nobres de Belo Horizonte foram devastadas por uma chuva que superou os desastres das tempestades de 2017. Em regiões como as atingidas, essas chuvas extremas deveriam se repetir naturalmente em intervalos de mais ou menos 20 anos, mas agora estão mais frequentes. Na sexta-feira anterior ao dia 29, a chuva devastou ainda mais gravemente regiões carentes da cidade.
Entre tantos campos em que a ciência se aplica, está o da previsibilidade. Quando fazem previsões, os cientistas não querem que elas se concretizem. O que querem é alertar as sociedades de perigos iminentes e provocar mudanças em políticas públicas e em comportamentos sociais, de forma a evitar danos às pessoas, ao meio ambiente e às economias. Fenômenos climáticos extremos e imprevisíveis que atingem os ricos os fazem perceber que não há onde se refugiar, e a necessidade de mudanças políticas contra o aquecimento global começa a ficar mais evidente.
No que se refere às doenças, ocorre algo semelhante: a reação é mais rápida quando o risco de transmissão não pode ser controlado ou mesmo impedido apenas com a aplicação de recursos financeiros. Assim, vírus que se espalham rapidamente com grande risco de contaminação e causam doenças letais, são minimamente responsáveis por rupturas no sistema econômico global, o que faz o mundo se mobilizar por soluções rápidas. Enquanto alguns governos e instituições fundamentam suas decisões no entendimento preditivo da ciência, sempre há outros, assim como alguns setores da sociedade, que responsabilizam arbitrariamente fenômenos que não são a causa da pandemia ou atribuem a culpa às próprias vítimas, em especial aquelas que vivem em estado de pobreza crônica. 
No início dos anos 2000, o mundo enfrentou duas outras pandemias de coronavírus de forma bem-sucedida. Isso ocorreu porque foram seguidos protocolos científicos aceitos globalmente para conter a expansão desses vírus. Resumidamente, cientistas epidemiologistas usam uma constante chamada H0, que é o número de pessoas que podem ser infectadas por um sujeito contaminado. Essa é uma medida classicamente ecológica, que avalia a velocidade de multiplicação em se tratando de vírus. O assustador é que se trata de uma medida exponencial, o que significa que, após certo ponto, é impossível de ser freada.
Quando fazem previsões, os cientistas não querem que elas se concretizem. O que querem é alertar as sociedades de perigos iminentes e provocar mudanças em políticas públicas e em comportamentos sociais, de forma a evitar danos às pessoas, ao meio ambiente e às economias.
O problema de certas viroses é que o H0 é muito alto, e as infecções se propagam tão rapidamente que chegam a atingir um número máximo de indivíduos que um ambiente pode sustentar. Dessa forma, a relação entre o hospedeiro e a doença entra em colapso. Como nós somos o “recurso” para o vírus, estamos falando de índices aterrorizantes de mortalidade e ruptura social. Usando a ciência, é fácil entender que, se as pessoas sadias (= recurso) estiverem fora do alcance do vírus, interromperemos esse ciclo mortal antes que ele se espalhe exponencial e descontroladamente. No entanto, em todos esses casos anteriores, as formas emergentes dos vírus não se transmitiam pelo ar, somente por partículas de saliva ou fluídos corporais.
Neste ano, a nova pandemia de coronavírus avança, e os padrões sugerem que a infecção possa se dar de pessoa a pessoa, assim como pelo ar. Outro detalhe preocupa: a maior parte da população está nas mãos de governantes autoritários ou, quando democráticos, negacionistas da ciência.
A tradição de escutar os cientistas tem variado de tempos em tempos.  Nos casos cotidianos de endemias, as consequências de não escutar a ciência (e de não agir coordenadamente via órgãos internacionais regulatórios) são, na verdade, um enorme crime social, com consequências quase sempre devastadoras.
Qualquer governo no mundo que atuar desamparado de critérios científicos no combate ao coronavírus reeditará o chamado “racismo ambiental”, que define situações nas quais os custos de um impacto ambiental atingem mais os pobres que os ricos. Em outras palavras, um cenário epidemiológico desamparado de suporte científico e não pautado por condutas internacionais validadas cientificamente poderia vir a ser definido como “racismo sanitário” – no fundo, algo tão óbvio e antigo em países em desenvolvimento que dispensa explicações ou tipificações.
O medo, portanto, não é só do vírus, mas de que, em regiões importantes do mundo, com largas rotas migratórias e comerciais, a ciência seja ignorada em detrimento de critérios político-financeiros. Olhando de maneira mais ampla, não valorizar as universidades e o ensino equivale a não planejar políticas com base no investimento na ciência e monitoramento de ameaças potenciais ao cidadão.
Um governo responsável trata seu ministério da saúde como um segundo ministério de ciência e tecnologia, capaz de dialogar e criar força de trabalho com as universidades e centros de pesquisa. Essa base institucional de colaboração no controle epidemiológico está presente no Brasil há várias décadas.
Geraldo Wilson Fernandes, professor titular de Ecologia da UFMG
Sérvio P. Ribeiro, professor titular e chefe do Laboratório de Ecohealth da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e docente visitante no Departamento de Parasitologia do ICB/UFMG

Portugal: presidente declara estado de emergência - um discurso de estadista

Gostei do presidente português, Marcelo Rebelo de Souza, mencionar a história de quase nove séculos do seu país. Os portugueses foram bravos, ao longo de todo esse tempo, foram os primeiros a partir à descoberta do mundo, quaisquer que tenham sido os motivos.
Foram bravos, foram corajosos, continuam corajosos.
Viva Portugal, vivam os portugueses.
Um discurso de estadista como estaríamos a merecer por aqui, mas que não teremos.
Paulo Roberto de Almeida


Estado de emergência por cinco razões
O discurso de Marcelo na íntegra

Mensagem do Presidente da República, a propósito da declaração do estado de emergência na sequência da pandemia de covid-19.
Marcelo Rebelo de Sousa 
18 de Março de 2020, 20:34

Palácio de Belém, 18 de Março de 2020

Portugueses,
Acabei de decretar o estado de emergência.
Uma decisão excepcional num tempo excepcional.
A pandemia do Covid-19 não é uma qualquer epidemia como aquelas que já conhecemos na nossa democracia.
Está a ser e vai ser mais intensa.
Vai durar mais tempo até desaparecerem os seus últimos efeitos.
Está a ser e vai ser um teste nunca vivido ao nosso Serviço Nacional de Saúde e à sociedade portuguesa, chamada a uma contenção e a um tratamento em família sem precedente.
Está a ser e vai ser um desafio enorme para a nossa maneira de viver e para a nossa economia. Basta pensar na saúde, na educação, no comportamento nas famílias, no trabalho, nos efeitos no turismo, nas exportações, no investimento, na fragilização de famílias e empresas, nomeadamente de pequena e média dimensão.
Esta guerra – porque de uma verdadeira guerra se trata – dura há um mês, começou depois dos vizinhos europeus, e, também por isso, pôde demorar mais tempo a atingir os picos da sua expressão.
E o que fizemos nestes últimos 15 dias?
Entendemos – e bem – que, no nosso Estado Social, era e é uma tarefa de todos e não de cada um abandonado à sua sorte.
Apostámos na contenção, para tentar limitar o contágio, ganhar tempo para preparar a resposta e evitar uma concentração muito rápida da procura de cuidados de saúde.
Na contenção, o Serviço Nacional de Saúde, fez e continua a fazer heroísmo diário, pela mão dos seus notáveis profissionais.
E, com eles, todos os que estão a garantir a segurança e a produção e distribuição de bens essenciais para que o país funcione.
E os portugueses, com a experiência de quem já viveu tudo numa história de quase nove séculos, disciplinaram-se, entenderam que o combate era muito duro e muito longo e foram e têm sido exemplares. Numa quase quarentena, que revela o bom senso de respeitar as orientações das autoridades de saúde, e digo-vos, por testemunho próprio, é nosso dever acatar as orientações genéricas e, por maioria de razão, as recomendações específicas das autoridades sanitárias.
O Governo – que tem entre mãos uma tarefa hercúlea – adoptou medidas, tentando equilibrar contenção no espaço público e nas fronteiras e não paragem da vida económica e social, medidas que todos, Presidente, Parlamento, partidos e parceiros sociais, apoiámos, conscientes de que só a unidade permite travar e depois vencer guerras.
Aqui chegados, entendi dever convocar o Conselho de Estado, e, nos termos da Constituição, ouvi o Governo e solicitei autorização à Assembleia da República para decretar o estado de emergência.
Sabia e sei que os portugueses estão divididos. Há quem o reclame para anteontem. Há quem considere dispensável, prematuro ou perigoso.
Sabia e sei que, em plena crise, as pessoas se sentem tão ansiosas, tão angustiadas, que aquilo que pedem um dia ou uma semana, uma vez dado, é logo seguido de mais exigências ou reclamações, à medida que as preocupações ou os temores se avolumam.
Sabia e sei que muitos esperam do estado de emergência o milagre que tudo resolva num minuto, num dia, numa semana, num mês.
Ainda assim, entendi ser do interesse nacional dar este passo. Agradeço aos conselheiros de Estado o terem expresso as suas opiniões, ao primeiro-ministro e ao Governo o terem aderido, solidariamente, e colaborado, de modo decisivo, no conteúdo do presente decreto, e à Assembleia da República o tê-lo autorizado com generosa prontidão e amplo consenso.
Cinco razões essenciais explicam o passo dado.
Primeira – Antecipação e reforço da solidariedade entre poderes públicos e deles com o povo. Outros países, que começaram, mais cedo do que nós, a sofrer a pandemia, ensaiaram os passos graduais e só agora chegaram a decisões mais drásticas, que exigem maior adesão dos povos e maior solidariedade dos órgãos do poder. Nós, que começamos mais tarde, devemos aprender com os outros e poupar etapas, mesmo se parecendo que pecamos por excesso e não por defeito.
O povo português tem sido exemplar. Mas este sinal político, dado agora, e dado não apenas pelo Governo, mas por Presidente da República, Assembleia da República e Governo é uma afirmação de solidariedade institucional, de confiança e determinação, para o que tiver de ser feito nos dias, nas semanas, nos meses que estão pela frente.
Segunda – Prevenção. Diz o povo: mais vale prevenir do que remediar. O que foi aprovado não impõe ao Governo decisões concretas, dá-lhe uma mais vasta base de Direito para as tomar. Assim, permite que possam ser tomadas, com rapidez e em patamares ajustados, medidas que venham a ser necessárias no futuro. Nomeadamente, na circulação interna e internacional, no domínio do trabalho, nas concentrações humanas com maior risco, no acesso a bens e serviços impostos pela crise, na garantia da normalidade na satisfação de necessidades básicas, nas tarefas da protecção civil, em que, nos termos da lei, todos já são convocados, civis, forças de segurança e militares. O que seria, mais tarde, se fosse necessário agir, num ou noutro caso, neste quadro preventivo e ele não existisse?
Terceira – Certeza. Esta base de Direito dá o quadro geral de intervenção e garante que, mais tarde, acabada a crise, não venha a ser questionado o fundamento jurídico das medidas já tomadas e a tomar.
Quarta – Contenção. Este é um estado de emergência confinado, que não atinge o essencial dos direitos fundamentais, porque obedece ao fim preciso do combate à crise da saúde pública e da criação de condições de normalidade na produção e distribuição de bens essenciais a esse combate.
Quinta – Flexibilidade. O estado de emergência dura 15 dias, no fim dos quais pode ser renovado, com avaliação, no terreno, do estado da pandemia e sua previsível evolução.
É um sinal político forte de unidade do poder político, que previne situações antes de poderem ocorrer, estabelece um quadro que confere certeza, dá poderes ao Governo mas não regidifica o seu exercício, e permite reavaliação na sua aplicação num combate que muda de contornos no tempo.
É também um sinal democrático.
Democrático, pela convergência dos vários poderes do Estado.
Democrático, porque é a democracia a usar os meios excepcionais que ela própria prevê para tempos de gravidade excepcional.
Não é uma interrupção da Democracia. É a democracia a tentar impedir uma interrupção irreparável na vida das pessoas.
Não é, porém, uma vacina, nem uma solução milagrosa, que dispense o nosso combate diário, o apoio reforçado ao Serviço Nacional de Saúde, a capacidade de pessoas e as famílias continuarem a tentar limitar o contágio, para que os números a crescer cresçam menos do que os piores cenários e para que o tratamento possa ser, cada vez mais, em casa. Tudo mais cedo do que mais tarde.
Até porque, num ponto, os especialistas são claros – depende da contenção nestas próximas semanas o conseguirmos encurtar prazos, poupar pacientes e, sobretudo, salvar vidas.
Temos, pois, todos de fazer por contribuir para ir o mais longe e o mais depressa possível nesta luta desigual.
E quanto mais depressa formos, mais depressa poderemos salvar vidas, salvar a saúde, mas também concentrar-nos nos efeitos, a prazo, no emprego, nos rendimentos, nas famílias, nas empresas.
E, mesmo agora, só se salvam vidas e saúde se, entretanto, a economia não morrer.
Por isso, o Estado está a ajudar a economia a aguentar estes longos meses mais agudos. Fazendo o que possa para proteger o emprego, as famílias e as empresas.
Mas nós temos de fazer a nossa parte. Não parar a produção, não entrar em pânicos de fornecimentos como se o país fechasse, perceber que limitar contágio e tratar de contagiados em casa é e tem de ser compatível com manter viva a nossa economia.
Assim é em tempo de guerra, as economias não podem morrer.
Termino com um pedido.
Nesta guerra, como em todas as guerras, só há um efectivo inimigo, invisível, insidioso e, por isso, perigoso.
Que tem vários nomes.
Desânimo. Cansaço. Fadiga do tempo que nunca mais chega ao fim.
Temos de lutar, todos os dias, contra ele.
Contra o desânimo pelo que corre mal ou menos bem.
Contra o cansaço de as batalhas serem ainda muitas e parecerem difíceis de ganhar.
Contra a fadiga que tolhe a vontade, aumenta as dúvidas, alimenta indignações e revoltas.
Tudo o que nos enfraquecer nesta guerra alongará a luta e torná-la-á mais custosa e dolorosa.
Resistência, solidariedade e coragem são as palavras de ordem. E verdade, porque nesta guerra, ninguém mente nem vai mentir a ninguém.
Isto vos diz e vos garante o Presidente da República. Por vós directamente eleito para ser, em todos os instantes, os bons e os maus, o primeiro e não o último dos responsáveis perante os portugueses.
O caminho ainda é longo, é difícil e é ingrato.
Mas, não duvido um segundo sequer, que vamos vencê-lo o melhor que pudermos e soubermos.
Na nossa História, vencemos sempre os desafios cruciais.
Por isso temos quase novecentos anos de vida.
Nascemos antes de muitos outros. Existiremos ainda, quando eles já tiverem deixado de ser o que eram e como eram.
Deixem-me terminar com um exemplo de como somos.
O exemplo da neta, enfermeira, que, no dia em que perdeu o seu avô, a primeira vítima mortal, me dizia: “Presidente, já só faltam nove dias para eu regressar à luta”.
Somos assim. Porque somos Portugal.

Governo Federal estabelece medidas de proteção para o serviço público: + de 60 anos poderão trabalhar em casa

CORONAVÍRUS

Governo Federal estabelece medidas de proteção para o serviço público

Ministério da Economia publicou Instrução Normativa com medidas para diminuir o risco de contágio do coronavírus  
Publicado em 17/03/2020 14h48
Esplanada dos Ministérios | Foto: Agência Brasil ´EBC
Esplanada dos Ministérios | Foto: Agência Brasil ´EBC
O Ministério da Economia publicou Instrução Normativa que orienta órgãos e entidades da Administração Pública Federal sobre as medidas de proteção para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus (Covid-19).
De acordo com a Instrução Normativa, os órgãos e entidades integrantes da Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública Federal (Sipec) deverão suspender a realização de viagens internacionais a serviço, enquanto perdurar o estado de emergência de saúde pública. As viagens domésticas a serviço também deverão ser reavaliadas. 

O documento também prevê que servidores com 60 anos ou mais, com doenças crônicas ou imunodeficientes, gestantes e lactantes trabalhem remotamente no período estabelecido como quarentena.

Os servidores ou empregados com filhos em idade escolar, e que necessitem da assistência de um dos pais, também poderão executar as suas atribuições de maneira remota.

O dispositivo prevê, ainda, que o ministro ou autoridade máxima da entidade poderá adotar medidas de prevenção e redução de transmissibilidade, tais como: jornada de trabalho em turnos alternados de revezamento, trabalho remoto, melhor distribuição física da força de trabalho presencial. O objetivo é evitar a concentração e a proximidade de pessoas no ambiente de trabalho, além da flexibilização dos horários de início e término da jornada.
Segundo a instrução normativa, as determinações não se aplicam aos servidores e empregados públicos em atividades nas áreas de segurança, saúde ou de outras atividades consideradas essenciais pelo órgão ou entidade.
Com informações do Diário Oficial da União