O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

A fantasia delirante do globalismo entra no currículo do Itamaraty - O Globo

 O outrora prestigiado e respeitado Instituto Rio Branco, sob a gestão alucinada e alucinante do patético chanceler acidental, tornou-se uma escolinha das fantasias delirantes do PIOR chanceler da história do Itamaraty, guiado pelas mãos (e pés) de um ideólogo fraudulento, o Rasputin de Subúrbio, que está destruindo toda a credibilidade da diplomacia brasileira.

Paulo Roberto de Almeida

Ignorado por teóricos, 'globalismo' vira tema em cursos para diplomatas no Itamaraty

O Globo, 18/01/2021

Conceito usado pelo chanceler Ernesto Araújo e por ideólogos nacional-populistas para designar suposta conspiração internacional está na ementa de três disciplinas do Instituto Rio Branco

O “globalismo”, controverso conceito usado pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, passou, oficialmente, a fazer parte do curso de formação de diplomatas do Instituto Rio Branco, vinculado ao Itamaraty. O GLOBO analisou as ementas dos cursos ministrados entre 2009 e 2020 e constatou que os termos “globalismo” e “globalista”, denotando uma suposta conspiração global para acabar com a soberania dos países, entraram na grade curricular dos futuros diplomatas a partir de 2019, primeiro ano da gestão de Araújo no comando do Itamaraty.

A formação acadêmica dos diplomatas brasileiros voltou a chamar atenção na semana passada depois que o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto que colocou o Instituto Rio Branco diretamente subordinado ao chanceler. Antes, o comando do órgão, responsável pelos concursos e formação dos diplomatas, ficava sob a estrutura da Secretaria de Comunicação e Cultura do Itamaraty.

Usado até meados do século passado, sobretudo em países de língua inglesa, para designar uma visão de mundo que vai além das fronteiras nacionais, o termo “globalismo” ganhou um viés negativo na boca de ideólogos do nacional-populismo, incluindo Olavo de Carvalho, uma das principais influências intelectuais de Araújo.

Nesse sentido, o globalismo seria uma espécie de ideologia por trás de um suposto plano para reduzir o poder de governos locais e instituir um tipo de “ditadura global”. Esse “plano” seria apoiado por bilionários de todo o mundo, como o megainvestidor e filantropo George Soros, e por políticos de esquerda ou classificados como “progressistas”.

Entidades internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e suas agências, além de outras instituições multilaterais e organizações não governamentais, seriam braços dessa suposta conspiração. O termo é atualmente usado por radicais de direita para fazer sua própria crítica ao processo de globalização. O blog que Araújo mantém na internet traz o termo no título: “Metapolítica 17 – Contra o globalismo”.

Novidade em currículos

No mundo acadêmico e no Itamaraty, o termo globalismo e a tal “conspiração globalista” nunca foram considerados relevantes, mas o assunto ganhou força com a chegada de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos e, depois, com a eleição de Jair Bolsonaro e a chegada do grupo de Ernesto Araújo ao comando da política internacional do país. Isso se refletiu no conteúdo pedagógico usados na formação dos futuros diplomatas formados pelo Instituto Rio Branco, vinculado ao Ministério das Relações Exteriores (MRE).

O GLOBO analisou as ementas de cursos oferecidos pelo instituto desde 2009. A primeira vez que o termo “globalista” aparece no conteúdo pedagógico do órgão foi em 2019. Na ementa do curso de formação de diplomatas de 2020, há cinco menções ao termo “globalista”. Elas aparecem na ementa das disciplinas “Defesa, segurança e política externa” e “Política internacional I e II”. Na primeira, a ementa cita o termo para estudar a atuação dos Estados Unidos na política internacional durante o governo Trump.

Na ementa da disciplina Política internacional I para 2020, o termo globalista aparece no planejamento de uma aula sobre o atual momento da diplomacia brasileira. O plano de aula previa que os alunos debatessem as causas da eleição de Trump. A aula é no formato de debate em que os estudantes precisam analisar algumas premissas e discuti-las.

As duas premissas em questão eram, primeiro, se a eleição de Trump foi um “acidente de percurso, causado por ingerências externas, pelas ‘fake news’ e pelo machismo” ou, contrariamente, se representou um “avanço democrático importante, uma vez que parcela considerável da população, até então excluída do debate político pela hegemonia globalista, finalmente se fez ouvir”.

Fora da academia

O pesquisador e professor de Relações Internacionais Dawinsson Belém Lopes, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que o globalismo na concepção utilizada por Olavo de Carvalho e discípulos como Ernesto Araújo não é um conceito tido como relevante pelo mundo acadêmico.

— Essa ideia de uma megaconspiração marxista para tomar o mundo de assalto não encontra guarida nas principais academias. É uma coisa muito de gueto, de nicho. É uma ideia muito peculiar que acabou sendo transplantada para o Brasil — afirmou.

Belém Lopes classifica o conceito como “marginal” e “delirante”.

— Não é algo que conste no mainstream da teoria das Relações Internacionais nessa forma como é apresentada pelo grupo do Ernesto — explica.

A reportagem enviou questionamentos sobre o assunto para a assessoria de imprensa do Itamaraty, mas até o fechamento desta reportagem, nenhuma resposta foi recebida.



Bolsonaro escolheu ser o coveiro dele mesmo - Ricardo Noblat, Paulo Roberto de Almeida

 O Brasil começa tardiamente a vacinação sem que o desgoverno do capitão degenerado tenha feito qualquer coisa para que esse dia começasse; ao contrário, fez tudo para atrapalhar a “vacina chinesa do Doria”, a única disponível no momento. 

O que Bolsonaro fez foi uma CAMPANHA DA MORTE, com seu desrespeito sistemático às medidas de prevenção, com a irresponsabilidade de recomendar “tratamento preventivo com cloroquina” (que não só não é recomendada, como pode levar à morte), e se opôs a que a União bancasse o investimento na Coronavac, ao mesmo tempo em que financiava largamente o experimento da FioCruz, até aqui inexistente. 

A prescrição para o degenerado é IMPEACHMENT!

Paulo Roberto de Almeida 

Bolsonaro escolheu ser o coveiro dele mesmo

 Ricardo Noblat, 18/01/2021

Doria fez barba, cabelo e bigode no presidente

Na medida em que se enfraquece, o presidente Jair Bolsonaro perde mais e mais o controle sobre os fatos produzidos ou não por seu governo. Dois episódios de ontem provam isso.

Os cinco diretores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), nomeados por ele, anunciaram ao país que não existe tratamento preventivo contra a Covid-19.

Desmentiram Bolsonaro em transmissão nacional de rádio e de televisão. Até o ministro da Saúde, o general de peito estufado Eduardo Pazuello, também o fez com todo o cuidado do mundo.

Em São Paulo, o governador João Doria (PSDB) deu início à vacinação em massa, o que o Ministério da Saúde disse que só poderia acontecer depois de sua autorização.

Doria também reteve a cota paulista de doses da vacina fabricada pelo Butantan que o Ministério da Saúde esperava receber para em seguida devolver a São Paulo. Uma estupidez, por certo.

Foi um ato de rebeldia do governador que, ao ser acusado por Pazuello de promover um “golpe de marketing”, respondeu que há 11 meses Bolsonaro promove um “golpe de morte”.

O presidente da República vai fazer o quê? Processar Doria? Pressionar a Justiça para que mande prendê-lo por crime de desobediência civil? Se o fizer, perderá.

Vamos ao mantra adotado por 9 entre 10 estrelas da política: presidente pode muito, mas não tudo. Bolsonaro, por mais que diga o contrário aos berros, cada dia que passa manda menos.

A derrota que colheu com a aprovação emergencial das vacinas foi a maior derrota desde que acidentalmente se elegeu há dois anos e tomou posse da presidência sem estar preparado para isso.

Mais de 70% dos brasileiros queriam se vacinar. O percentual crescerá com o início da vacinação em massa. Bolsonaro sempre desacreditou a vacina e diz que não se vacinará.

Em todos os países onde começou, a vacinação foi festejada pelos chefes de Estado. Aqui, Bolsonaro não deu um pio. Desapareceu. Apareça, Bolsonaro! Livre-se do colete à prova de vacina. Não dói.

No passado, quando um time goleava o outro, dizia-se que fez dele barba, cabelo e bigode, lembrou o jornalista Ricardo Kotscho. Perfeito! Doria fez barba, cabelo e bigode em Bolsonaro.

O 7 x 1 da Alemanha sobre o Brasil na Copa do Mundo de 2014 é pouco para dar a verdadeira dimensão da surra que Bolsonaro levou de Doria. Outras surras virão em breve.

Os bolsonaristas e seus cúmplices construíram a falsa narrativa da invencibilidade de Bolsonaro, fizesse ele o que fizesse. E que ele se tornara de alguns meses para cá um presidente normal.

Jamais Bolsonaro será um presidente normal porque como ser humano jamais foi normal. Não pode ser normal quem defende a tortura, tem fixação em armas, detesta gays e sabota a vida.

Aturá-lo por mais dois anos será insuportável, mas talvez sirva para ensinar os brasileiros a votar melhor.




As grandes companhias estatais de petróleo-infográfico (Visual Capitalist)

 infographic

Map of the largest state-owned oil companies

Mapped: The World’s Largest State-Owned Oil Companies

View the high-resolution of the infographic by clicking here.

Oil is one of the world’s most important natural resources, playing a critical role in everything from transportation fuels to cosmetics. 

For this reason, many governments choose to nationalize their supply of oil. This gives them a greater degree of control over their oil reservesas well as access to additional revenue streams. In practice, nationalization often involves the creation of a national oil company to oversee the country’s energy operations.

What are the world’s largest and most influential state-owned oil companies?

Editor’s Note: This post and infographic are intended to provide a broad summary of the state-owned oil industry. Due to variations in reporting and available information, the companies named do not represent a comprehensive index.

State-Owned Oil Companies by Revenue

National oil companies are a major force in the global energy sector, controlling approximately three-quarters of the Earth’s oil reserves. 

As a result, many have found their place on the Fortune Global 500 list, a ranking of the world’s 500 largest companies by revenue. 

CountryNameFortune Global 500 Rank2019 Revenues 
🇨🇳 ChinaSinopec Group2$443B
🇨🇳 ChinaChina National Petroleum Corporation (CNPC) 4$379B
🇸🇦 Saudi ArabiaSaudi Aramco6$330B
🇷🇺 RussiaRosneft76$96B
🇧🇷 BrazilPetrobras120$77B
🇮🇳 IndiaIndian Oil Corporation (IOCL) 151$69B
🇲🇾MalaysiaPetronas186$58B
🇮🇷 IranNational Iranian Oil Company (NIOC) Not listed$19B* 
🇻🇪Venezuela Petróleos de Venezuela (PDVSA)Not listed$23B (2018)

*Value of Iranian petroleum exports in 2019. Source: Fortune, Statista, OPEC

China is home to the two largest companies from this list, Sinopec Group and China National Petroleum Corporation (CNPC). Both are involved in upstream and downstream oil operations, where upstream refers to exploration and extraction, and downstream refers to refining and distribution. 

It’s worth noting that many of these companies are listed on public stock markets—Sinopec, for example, trades on exchanges located in Shanghai, Hong Kong, New York, and London. Going public can be an effective strategy for these companies as it allows them to raise capital for new projects, while also ensuring their governments maintain control. In the case of Sinopec, 68% of shares are held by the Chinese government.

Saudi Aramco was the latest national oil company to follow this strategy, putting up 1.5%of its business in a 2019 initial public offering (IPO). At roughly $8.53 per share, Aramco’s IPO raised $25.6 billion, making it one of the world’s largest IPOs in history. 

Geopolitical Tensions

Because state-owned oil companies are directly tied to their governments, they can sometimes get caught in the crosshairs of geopolitical conflicts. 

The disputed presidency of Nicolás Maduro, for example, has resulted in the U.S. imposing sanctions against Venezuela’s government, central bank, and national oil company, Petróleos de Venezuela (PDVSA). The pressure of these sanctions is proving to be particularly damaging, with PDVSA’s daily production in decline since 2016. 

State-Owned Oil Companies - Venezuela example

In a country for which oil comprises 95% of exports, Venezuela’s economic outlook is becoming increasingly dire. The final straw was drawn in August 2020 when the country’s last remaining oil rig suspended its operations. 

Other national oil companies at the receiving end of American sanctions include Russia’s Rosneftand Iran’s National Iranian Oil Company (NIOC). Rosneft was sanctioned by the U.S. in 2020 for facilitating Venezuelan oil exports, while NIOC was targeted for providing financial support to Iran’s Islamic Revolutionary Guard Corps, an entity designated as a foreign terrorist organization. 

Climate Pressures

Like the rest of the fossil fuel industry, state-owned oil companies are highly exposed to the effects of climate change. This suggests that as time passes, many governments will need to find a balance between economic growth and environmental protection.

Brazil has already found itself in this dilemma as the country’s president, Jair Bolsonaro, has drawn criticism for his dismissive stance on climate change. In June 2020, a group of European investment firms representing $2 trillion in assets threatened to divest from Brazilif it did not do more to protect the Amazon rainforest.

These types of ultimatums may be an effective solution for driving climate action forward. In December 2020, Brazil’s national oil company, Petrobras, pledged a 25% reduction in carbon emissions by 2030. When asked about commitments further into the future, however, the company’s CEO appeared to be less enthusiastic. 

That’s like a fad, to make promises for 2050. It’s like a magical year. On this side of the Atlantic we have a different view of climate change.

— Roberto Castello Branco, CEO, Petrobras

With its 2030 pledge, Petrobras joins a growing collection of state-owned oil companies that have made public climate commitments. Another example is Malaysia’s Petronas, which in November 2020, announced its intention to achieve net-zero carbon emissions by 2050. Petronas is wholly owned by the Malaysian government and is the country’s only entry on the Fortune Global 500. 

Challenges Lie Ahead

Between geopolitical conflicts, environmental concerns, and price fluctuations, state-owned oil companies are likely to face a much tougher environment in the decades to come. 

For Petronas, achieving its 2050 climate commitments will require significant investment in cleaner forms of energy. The company has been involved in numerous solar energy projects across Asia and has stated its interests in hydrogen fuels. 

Elsewhere, China’s national oil companies are dealing with a more near-term threat. In compliance with an executive order issued by the Trump Administration in November 2020, the New York Stock Exchange (NYSE) announced it would delist three of China’s state-run telecom companies. Analysts believe oil companies such as Sinopec could be delisted next, due to their ties with the Chinese military.

domingo, 17 de janeiro de 2021

Intervenção no BB é mais um ataque ao liberalismo - Editorial de O Globo

Bozo não é, nunca foi, nunca será liberal. Usou dessa carapuça hipocritamente, de má-fé, para enganar os "liberais de mercado" e os grandes empresários, que são tão estúpidos quanto ele, achando que poderiam realizar alguns de seus objetivos secretos. Ele conseguiu ser eleito, e os donos do capital ainda aguardam a maravilha do crescimento. Que não virá sem reformas, e reformas é tudo o que Bolsovirus não quer. Seu único objetivo é proteger seus negócios escusos, e sua família miliciana, aliás muito parecido com Trump, nisso também.

Paulo Roberto de Almeida 

Intervenção no BB é mais um ataque ao liberalismo
Editorial de O Globo, 17/01/2021
Barrar reforma no banco confirma que Bolsonaro só se preocupa com seus projetos político-eleitorais
A ameaça de demissão de André Beltrão da presidência do Banco do Brasil revela a essência antiliberal de Jair Bolsonaro, que trata empresas estatais, mesmo as com ações em bolsa dentro e fora do país, como se estivessem subordinadas ao Planalto, à sua disposição para interferências políticas. Ex-presidente do HSBC, Beltrão foi levado para o banco pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para fazer uma gestão profissional. Esbarrou no projeto político e na visão ideológica de Bolsonaro sobre as estatais.
Assumiu o cargo em julho para substituir Rubem Novaes, que saiu se dizendo frustrado por não conseguir fazer privatizações no BB. Não é difícil deduzir de onde partiam as resistências. Desta vez, Brandão anunciou um necessário plano de enxugamento do banco, cada vez menos competitivo num setor em rápida evolução. O plano envolvia um programa de demissão voluntária para afastar 5 mil funcionários, fechar agências, escritórios e postos de atendimento, 361 unidades ao todo, gerando economia de R$ 353 milhões ainda este ano. Não faz sentido mesmo manter guichês e balcões quando, também no BB, cresce o número de operações feitas pelos clientes de forma digital.
Mas o programa de reestruturação não é considerado conveniente em meio ao toma lá dá cá que transcorre em Brasília para Bolsonaro eleger Arthur Lira (PP-AL) presidente da Câmara dos Deputados. “Quem manda sou eu” é um dos bordões mais usados por Bolsonaro quando não gosta de alguma decisão tomada em seu governo. Ele reclama que não foi informado sobre detalhes do plano, aprovado pelo ministro Paulo Guedes.
Na quarta-feira, Bolsonaro recebeu a visita de nove deputados e um senador, preocupados com os efeitos do plano de enxugamento em suas bases. Consta que Paulo Guedes, além de procurar demover Bolsonaro, tenta substituir Brandão por alguém do mesmo perfil. O plano de Brandão, diga-se, é até modesto perto da real necessidade para o país: privatizar a área comercial do BB — não faz sentido o Estado operar um banco de varejo — e, se necessário, criar uma nova instituição financeira para as operações de fomento e crédito agrícola operadas pelo banco, área com que o BB tem ligação tradicional.
Fundado na chegada da família real portuguesa ao país, em 1808, o BB tem uma longa história de uso pelos donos do poder. A começar pela primeira falência, em 1821, quando Dom João VI voltou a Lisboa levando nas arcas o dinheiro do banco. Bolsonaro repete uma tradição secular da manipulação de estatais, sem qualquer preocupação com os acionistas privados da instituição financeira.
Todos os bancos têm planos de enxugamento para se adaptar à digitalização do setor, acelerada pela chegada das fintechs. Mas Bolsonaro se preocupa apenas com seu projeto político-eleitoral e, no momento, em eleger Lira para controlar a pauta da Câmara. A queda de braço em torno do BB resulta em mais uma derrota a seu ministro da Economia, a cada vez menos visível face liberal do governo.


Literatura brasileira de Relações Internacionais: uma entrevista ao Correio Braziliense (2002) - Paulo Roberto de Almeida

Arrumando estes dias meus livros e papeis, para ver se consigo, finalmente, colocar em ordem minha caótica biblioteca, descobri, dentro de uma pasta não identificada, o Caderno Pensar do Correio Braziliense de 13/01/2020, contendo uma entrevista minha ao então jovem jornalista Marcos Savini, hoje Conselheiro na carreira diplomática, servindo na nossa delegação junto à OMC, em Genebra.



Creio que nunca tinha feito um scan da entrevista publicada, mas sim, registrei em meus arquivos implacáveis tanto a versão original de minhas respostas ao Marcos Savini, um texto de 6 p., quanto a versão publicada, obviamente reduzida. A entrevista se deu porque eu estava publicando dois livros, mas me encontrava em Washington (aliás viajando na Flórida, pois o texto é datado de Orlando): 

Os primeiros Anos do Século 21: o Brasil nas relações internacionais (Paz e Terra, 2002)

Formação da Diplomacia Econômica no Brasil: as relações econômicas internacionais no Império (Senac-Funag, 2001)

Eis a ficha do trabalho: 

846. “Bibliografia brasileira sobre relações internacionais: Respostas a questões colocadas pelo Correio Braziliense”, Orlando, 9 janeiro 2002, 6 p. Entrevista sobre a produção brasileira em relações internacionais concedida por meio de correspondência eletrônica ao jornalista Marcos Savini. Publicada parcialmente no Correio Braziliense, caderno “Pensar”, domingo, 13 de janeiro de 2002, p. 5. Relação de Publicados n. 307. 


Eis a versão original, completa, do trabalho: 

Bibliografia brasileira sobre relações internacionais

Respostas a questões colocadas pelo Correio Braziliense

 

Paulo Roberto de Almeida

pramre@earthlink.net

www.pralmeida.org

 

Jornalista: Marcos Savini, Caderno Pensar, Correio Braziliense

Data: Wed, 09 Jan 2002 13:09:22 

Assunto: formação diplomática

 

Questões MS e respostas PRA:

 

1 - Acredita que já exista hoje uma bibliografia brasileira sólida sobre diplomacia e relações internacionais? O que há de notável e o que falta fazer?

 

PRA: O campo ainda apresenta lacunas importantes, mas nos últimos dez anos foram publicadas obras que já podem ser consideradas como relevantes, com destaque para pesquisadores acadêmicos (historiadores e cientistas políticos) e os próprios diplomatas. Em ambos os grupos existe uma saudável orientação em fugir aos cânones da história diplomática tradicional, aquela preocupada apenas em relatar os eventos e fatos políticos, com base unicamente em documentos de chancelaria, e buscar uma abordagem analítica e interpretativa sobre os fatores econômicos e políticos explicativos do tipo de inserção internacional e regional praticada pelo Brasil.

 

2 - Existe uma visão brasileira das relações internacionais ou continuamos a depender de versões européias e americanas?

 

PRA: Não se pode propriamente falar de um escola ou de teorias brasileiras de relações internacionais, mas tampouco ocorre uma cópia indiscriminada da produção estrangeira. Se bem seja certo que muitos cientistas políticos sigam padrões norte-americanos de metodologia e abordagem, e que historiadores (é o caso da própria UnB, por exemplo) tendam a seguir uma visao francesa das relações internacionais (como patente nos livros de Renouvin ou Duroselle), também é verdade que os pesquisadores brasileiros têm procurado seguir um enfoque original das relações internacionais do Brasil.

  

3 - Caso a resposta seja positiva, em que nos diferenciamos?

 

PRA: Vários pesquisadores acadêmicos, mas também os próprios diplomatas têm colocado o país no centro de um sistema próprio de relações exteriores, nos planos regional ou internacional, com grande ênfase nos seus problemas de desenvolvimento econômico. Esta é marca, por exemplo, de alguns economistas-historiadores, como Marcelo de Paiva Abreu, Winston Fritsch, ou o próprio ministro da Fazenda, Pedro Malan, que já produziu alguns textos importantes sobre o contexto internacional do desenvolvimento econômico brasileiro. Este é também o meu caso, pois tenho diversos trabalhos nessa vertente, como dois livros sobre o Mercosul, um sobre o Brasil e o multilateralismo econômico e agora este denso trabalho sobre a Formação da Diplomacia Econômica no Brasil na época imperial (que deve ter continuidade em mais dois volumes tratando da fase republicana).  


 

4 - Seu livro supre uma lacuna importante sobre a história da diplomacia econômica no Brasil. Que outras lacunas existem?

 

PRA: Meu livro Formação da Diplomacia Econômica no Brasil é original no sentido em que não existia, até aqui, nenhuma história abrangente da diplomacia econômica no Brasil, o que agora passa a existir, pelo menos para o período imperial. Faltaria agora cobrir a fase republicana (o que estou empenhado em fazer, com dois novos volumes que deverão seguir a este), mas também faltam estudos pormenorizados sobre a história financeira internacional do Brasil, por exemplo, ou a de suas relações com os organismos finaneiros internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, algo que tentei suprir num dos capítulos de meu livro O Brasil e o multilateralismo econômico (Editora Livraria do Advogado, 1999). Marcelo de Paiva Abreu já escreveu algo sobre o Brasil e o GATT (hoje OMC), mas ainda falta uma história de nossa participação nesse importante foro do sistema multilateral de comércio.

 

5 - Que conseqüências a ausência destes estudos traz para a formação de diplomatas e especialistas em relações internacionais no país?

 

PRA: Os diplomatas estão certamente mais afeitos à leitura tradicional de história diplomática, do que aos problemas de nossa inserção econômica internacional, sobretudo nos planos comercial e financeiro. Essas lacunas começam recém a serem supridas, mas ainda falta muito para considerarmos a literatura satisfatória ou abundante. Os efeitos podem ser considerados como preocupantes pois as novas gerações de diplomatas entram na carreira sem uma visão dos grandes debates internacionais sobre desenvolvimento, comércio, finanças, propriedade intelectual, entre outros temas, que moldaram a ação de uma geração anterior de diplomatas. Uma boa contribuição nesse sentido foram as memórias do Roberto Campos, mas esses temas estão dispersos no livro e não recebem o tratamento sistemático que deveriam receber numa análise de cunho classicamente acadêmico.

  

6 - Em seu livro o sr. relata como a diplomacia econômica foi  tradicionalmente conduzida por funcionários consulares, enquanto os diplomatas preocupavam-se com questões políticas. Hoje o cenário parece inverter-se e a diplomacia brasileira está cada vez mais voltada para temas  econômicos. Essa tendência é irreversível, apesar dos atentados de 11de setembro terem demonstrado que a ordem político-estratégica não é tão secundária como poderíamos imaginar?

 

PRA: Meu livro relata que os funcionários consulares se ocupavam de questões comerciais, mas não esconde o fato de que eram diplomatas (em muitos casos não necessariamente da carreira) os que de verdade negociavam os tratados econômicos mais importantes. Mas, é também verdade que a visão tradicional da diplomacia, até pelo menos a belle époque (antes da Primeira Guerra Mundial), recusava em grande medida os temas econômicos, considerados como de low politics, preferindo se ocupar das chamadas questões de high politics, que seriam as de política bilateral e de questões de equilíbrio militar. A tendência para a multilateralização e a ênfase nas questões econômicas, que caracterizam nossa época, devem continuar a pautar as relações internacionais contemporâneas, mesmo a despeito de questões importantes como as do desarmamento ou do terrorismo internacional, como ilustrado tragicamente em setembro de 2001. Não se pode, porém, descurar a importância de problemas políticos relevantes, como os que estão vinculados à ausência de democracia, de desenvolvimento e de respeito aos direitos humanos, que explicam em parte o surgimento de movimentos terroristas, de conflitos étnicos e do nacionalismo exacerbado de cunho por vezes tribal. Nesses campos, ao lado da ação tradicional dos Estados, os atores ainda insubstituíveis das relações internacionais, começa a despontar o trabalho das organizações não-governamentais, interlocutores relevantes em diversos foros de grande impacto social e humanitário, como nas questões de meio ambiente por exemplo.


  

7 - Muito se tem falado na falta de quadros no Brasil para enfrentar as negociações multilaterais que se desenham para o futuro próximo - OMC, Alca, União Européia, etc. O que pode ser feito, em sua opinião, para suprir essa lacuna?

 

PRA: Sem falar da própria expansão dos servidores diplomáticos e de outros órgãos públicos (como os analistas de comércio exterior, do MDIC, por exemplo), as insuficiências existem igualmente no seio das empresas brasileiras, que não estão ainda suficientemente “globalizadas” para contratar especialistas em relações internacionais, que possam colocá-las no novo ambiente competitivo do comércio internacional, tanto no plano regional (do Mercosul por exemplo), como no âmbito multilateral (regido pelas normas da OMC). Trata-se de lacunas que tendem a ser supridas gradualmente, à medida em que o próprio Brasil se insere mais ativamente no cenário internacional e globaliza sua economia.

  

8 - No complicado tabuleiro das relações econômicas atuais, basta especializar diplomatas para defender os interesses brasileiros? Ou é preciso se preocupar com o preparo de outros setores do governo e da sociedade?

 

PRA: Os diplomatas são importantes mas não podem substituir-se à própria sociedade, que através da academia ou dos centros de formação de outras agências públicas ou privadas devem continuar a atividade de constante formação de quadros especializados nas complexas questões da agenda econômica internacional contemporânea. Penso por exemplo nos conflitos comerciais, que exigem advogados comerciais com conhecimento das regras da OMC ou do Mercosul, para atuar nos órgãos de solução de controvérsias, terreno no qual o Brasil é notoriamente carente de um número razoável de quadros. Em outros campos do direito internacional igualmente, muitas vezes nossos interesses são defendidos por escritórios estrangeiros de advogados, à falta de especialistas em número suficiente, ou de escritórios brasileiros possuindo representações no exterior.

 

9 - Há carência de especialistas em outras áreas do conhecimento para conduzir tais negociações?

 

PRA: Os diplomatas são plenamente capazes de conduzir essas negociações, mas muitas  vezes falta o trabalho preparatório, ou de acompanhamento, no campo do apoio técnico especializado, como suporte conceitual e mesmo instrumental nos debates que ocorrem nos foros internacionais. Uma certa responsabilidade incumbe aqui à academia, isto é, aos muitos cursos de relações internacionais já existentes no Brasil. Muitas vezes os professores se preocupam em demasia, ou de modo excessivamente acadêmico, com questões conceituais ou teóricas de relações internacionais, quando o que precisamos, na maior parte dos casos, não é necessariamente de grandes conhecedores da “teoria neorealista” em relações internacionais, mas sim de peritos em comércio internacional, ou de especialistas práticos em integração regional e nas questões do Mercosul.

 

10 - A política externa do Brasil já deixou de ser assunto apenas de diplomatas e o país está deixando de ser uma sociedade voltada para dentro e com pouco interesse em questões internacionais? Que sinais relevantes apontaria em tal mudança?

 

PRA: Os processos de globalização e de regionalização em curso na última década certamente contribuiram para abrir o Brasil ao cenário internacional, mas muito mais importantes foram questões concretas como o conflito Embraer-Bombardier, as restrições à carne brasileira em virtude de acusações indevidas e infundadas por causa da doença da “vaca louca”, as crises financeiras dos anos 90 (e ainda agora o problema da Argentina) ou o debate em torno da Alca em nosso hemisfério, que seguramente trouxeram importantes questões internacionais para o cotidiano de milhões de brasileiros.  Mais e mais nosso país vai ter de conviver com (e compreender) esse tipo de problema de comércio internacional, o que é normal, se se admite que o país deve cada vez mais participar da globalização. Os diplomatas continuarão a ser os negociadores por excelência em quase todos esses temas (nas questões financeiras, os funcionários da Fazenda e do Banco Central têm o comando, por exemplo), mas cada vez mais, as empresas, os ONGs brasileiras e os próprios cidadãos serão chamados a opinar em torno desses problemas que finalmente afetam a todos nós. Estou certo, por exemplo, que nas próximas eleições presidencias os temas de comércio internacional, com as negociações da Alca e da OMC, assim como os problemas financeiros internacionais (câmbio, ajuda do FMI, capitais estrangeiros) estarão no centro dos debates entre os principais candidatos.

 

Paulo Roberto de Almeida, 846: Orlando, 9 de janeiro de 2002

Publicada parcialmente na edição dominical do Correio Braziliense,

caderno “Pensar”, 13 de janeiro de 2002, p. 5. Relação de publicados nº 298.



Eis a versão publicada no Correio Braziliense, em, versão abreviada: 


Correio Braziliense, Brasília

Brasília, domingo,

13 de janeiro de 2002 

Pensar

Entrevista / Paulo Roberto de Almeida

 

OS PRIMEIROS ANOS DO SÉCULO 21 — O BRASIL NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS CONTEMPORÂNEAS - De Paulo Roberto de Almeida. Editora Paz e Terra. Preço a ser definido. Mais informações no site www.pralmeida.org. 

 

FORMAÇÃO DA DIPLOMACIA ECONÔMICA NO BRASIL — AS RELAÇÕES ECONÔMICAS INTERNACIONAIS NO IMPÉRIO - De Paulo Roberto de Almeida. Editora Senac São Paulo/ Fundação Alexandre Gusmão (Funag), 676 páginas. R$ 68,00.

 

Há pelo menos uma década os temas comerciais e econômicos tomaram boa parte do espaço reservado às questões políticas e aos (não) alinhamentos ideológicos nas mentes de diplomatas e especialistas em relações internacionais no Brasil. Mas a produção intelectual não tem acompanhado tal mudança de prioridades na velocidade necessária. Até hoje não existia, por exemplo, nenhuma história abrangente da diplomacia econômica no Brasil. 

  O sociólogo e diplomata Paulo Roberto de Almeida resolveu encarar a empreitada. Acaba de lançar Formação da Diplomacia Econômica no Brasil, cobrindo os anos do Império. Em outros dois volumes, pretende tratar o período republicano, do final do século 19 até os dias de hoje. Autor de vários livros nessa vertente, inclusive dois sobre o Mercosul, ele também lançará em fevereiro Os Primeiros Anos do Século 21 — O Brasil nas Relações Internacionais Contemporâneas.

 

CORREIO BRAZILIENSE — Existe hoje uma sólida bibliografia brasileira sobre diplomacia e relações internacionais? 

PAULO ROBERTO DE ALMEIDA — O campo ainda apresenta lacunas importantes, mas nos últimos dez anos foram publicadas obras relevantes escritas por pesquisadores acadêmicos (historiadores e cientistas políticos) e pelos próprios diplomatas. Em ambos os grupos existe uma saudável orientação em fugir aos cânones da história diplomática tradicional, aquela preocupada apenas em relatar os eventos e fatos políticos, com base unicamente em documentos de chancelaria, e buscar uma abordagem analítica e interpretativa sobre os fatores econômicos e políticos explicativos do tipo de inserção internacional e regional praticada pelo Brasil. 

   

CORREIO — Existe uma visão brasileira das relações internacionais ou continuamos a depender de versões européias e americanas? 

ALMEIDA — Não se pode propriamente falar de uma escola ou de teorias brasileiras de relações internacionais, mas tampouco ocorre uma cópia indiscriminada da produção estrangeira. É certo que muitos cientistas políticos seguem padrões norte-americanos de metodologia e abordagem, e que historiadores tendem a seguir uma visão francesa das relações internacionais. Mas também é verdade que os pesquisadores brasileiros têm procurado seguir um enfoque original das relações internacionais do Brasil. 

   

CORREIO — Quando fomos originais? 

ALMEIDA — Vários pesquisadores acadêmicos, mas também os próprios diplomatas têm colocado o país no centro de um sistema próprio de relações exteriores, nos planos regional ou internacional, com grande ênfase nos problemas do desenvolvimento econômico. Esta é marca, por exemplo, de alguns economistas-historiadores, como Marcelo de Paiva Abreu, Winston Fritsch, ou o próprio ministro da Fazenda, Pedro Malan, que já produziu alguns textos importantes sobre o contexto internacional do desenvolvimento econômico brasileiro.

   

CORREIO — Seu livro supre uma lacuna importante sobre a história da diplomacia econômica no Brasil Império. Que outras lacunas existem? 

ALMEIDA — Faltaria agora cobrir a fase republicana, o que estou empenhado em fazer, com dois novos volumes. Mas também faltam estudos minuciosos sobre a história financeira internacional do Brasil, por exemplo, ou a de suas relações com os organismos financeiros internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, algo que tentei suprir num dos capítulos de meu livro O Brasil e o Multilateralismo Econômico (Editora Livraria do Advogado, 1999). Marcelo de Paiva Abreu já escreveu algo sobre o Brasil e o GATT (hoje OMC), mas ainda falta uma história de nossa participação nesse importante foro do sistema multilateral de comércio. 

   

CORREIO — Que conseqüências a ausência destes estudos traz para a formação de diplomatas e especialistas em relações internacionais? 

ALMEIDA — Os diplomatas são certamente mais afeitos à leitura tradicional de história diplomática do que aos problemas de nossa inserção econômica internacional, sobretudo comercial e financeira. Os efeitos são preocupantes pois as novas gerações entram na carreira sem uma visão dos grandes debates internacionais sobre desenvolvimento, comércio, finanças, propriedade intelectual, entre outros temas, que moldaram a ação de uma geração anterior de diplomatas. Uma boa contribuição nesse sentido foram as memórias do Roberto Campos, mas esses temas estão dispersos no livro e não recebem o tratamento sistemático que deveriam receber numa análise de cunho classicamente acadêmico. 

   

CORREIO — Muito se tem falado na falta de quadros no Brasil para enfrentar as negociações multilaterais que se desenham para o futuro próximo — OMC, Alca, União Européia etc. O que pode ser feito, em sua opinião, para suprir essa lacuna? 

ALMEIDA — Sem falar da própria expansão dos servidores diplomáticos e de outros órgãos públicos, como os analistas de comércio exterior, do MDIC, por exemplo. As insuficiências existem também no seio das empresas brasileiras, que não estão ainda suficientemente ‘‘globalizadas’’ para contratar especialistas em relações internacionais, que possam colocá-las no novo ambiente competitivo do comércio internacional. Penso por exemplo nos conflitos comerciais, que exigem advogados comerciais com conhecimento das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) ou do Mercosul, para atuar nos órgãos de solução de controvérsias, terreno no qual o Brasil é notoriamente carente de um número razoável de quadros. Em outros campos do direito internacional igualmente, muitas vezes nossos interesses são defendidos por escritórios estrangeiros de advogados, à falta de especialistas em número suficiente, ou de escritórios brasileiros possuindo representações no exterior.

   

CORREIO — Por que existem tais carências? 

ALMEIDA — Uma certa responsabilidade incumbe aqui à academia, isto é, aos muitos cursos de relações internacionais já existentes no Brasil. Muitas vezes os professores se preocupam em demasia, ou de modo excessivamente acadêmico, com questões conceituais ou teóricas de relações internacionais, quando o que precisamos, na maior parte dos casos, são de peritos em comércio internacional, ou de especialistas práticos em integração regional e nas questões do Mercosul.

   

CORREIO — A política externa do Brasil já deixou de ser assunto apenas de diplomatas e o país está deixando de ser uma sociedade voltada para dentro e com pouco interesse em questões internacionais. Que sinais relevantes apontariam tal mudança? 

ALMEIDA — Os processos de globalização e de regionalização em curso na última década certamente contribuíram para abrir o Brasil ao cenário internacional, mas muito mais importantes foram questões concretas como o conflito Embraer-Bombardier, as restrições à carne brasileira em virtude de acusações indevidas e infundadas por causa da doença da ‘‘vaca louca’’, as crises financeiras dos anos 90, incluindo o da Argentina, ou o debate em torno da Alca em nosso hemisfério, que seguramente trouxeram importantes questões internacionais para o cotidiano de milhões de brasileiros. Mais e mais nosso país vai ter de conviver com (e compreender) esse tipo de problema de comércio internacional. Estou certo, por exemplo, que nas próximas eleições presidenciais os temas de comércio internacional, com as negociações da Alca e da OMC, assim como os problemas financeiros internacionais — como câmbio, ajuda do FMI, capitais estrangeiros — estarão no centro dos debates entre os principais candidatos.( Marcos Savini) 


Mensagem original do jornalista:

Caro Paulo,

 

   Se conseguires, de algum modo, enviar-me até amanhã cedo a capa do novo livro pela Paz e Terra, posso incluir a imagem. Se for impossível, posso citá-lo sem problemas ao lado do "Formação da Diplomacia Econômica do Brasil". Bom, frente à esse texto que acabas de enviar, e que vem muito a calhar, e frente à nossa mútua escassez de tempo, envio abaixo as perguntas que gostaria de te colocar e podemos publicar como uma entrevista. 

Desculpe não ter enviado ontem, mas saí muito tarde da redação.

 

1 - Acredita que já exista hoje uma bibliografia brasileira sólida sobre diplomacia e relações internacionais? O que há de notável e o que falta fazer?

 

2 - Existe uma visão brasileira das relações internacionais ou continuamos a depender de versões européias e americanas?

 

3 - Caso a resposta seja positiva, em que nos diferenciamos?

 

4 - Seu livro supre uma lacuna importante sobre a história da diplomacia econômica no Brasil. Que outras lacunas existem?

 

5 - Que conseqüências a ausência destes estudos traz para a formação de diplomatas e especialistas em relações internacionais no país?

 

6 - Em seu livro o sr. relata como a diplomacia econômica foi tradicionalmente conduzida por funcionários consulares, enquanto os diplomatas preocupavam-se com questões políticas. Hoje o cenário parece inverter-se e a diplomacia brasileira está cada vez mais voltada para temas econômicos. Essa tendência é irreversível, apesar dos atentados de 11 de setembro terem demonstrado que a ordem político-estratégica não é tão secundária como poderíamos imaginar?

 

7 - Muito se tem falado na falta de quadros no Brasil para enfrentar as negociações multilaterais que se desenham para o futuro próximo - OMC, Alca, União Européia, etc. O que pode ser feito, em sua opinião, para suprir essa lacuna?

 

8 - No complicado tabuleiro das relações econômicas atuais, basta especializar diplomatas para defender os interesses brasileiros? Ou é preciso se preocupar com o preparo de outros setores do governo e da sociedade?

 

9 - Há carência de especialistas em outras áreas do conhecimento para conduzir tais negociações?

 

10 - A política externa do Brasil já deixou de ser assunto apenas de diplomatas e o país está deixando de ser uma sociedade voltada para dentro e com pouco interesse em questões internacionais? Que sinais relevantes apontaria em tal mudança?

 

Bom, espero que ainda esteja em tempo. Não precisa ser exaustivo, até porque o espaço em jornal não é enorme. Se preferir enviar as respostas quando voltar dos passeios, para mim está bem. Posso ligar também mais tarde, se achar que escrevendo tomará muito seu tempo.

 

Abraço,

Marcos Savini