"Economia global pode entrar na Terceira Grande Depressão"
Historiador da Universidade Harvard prevê estagnação não tão profunda quanto a da década de 1930, mas longa, com um período de baixo crescimento dos EUA e deflação em vários países
PEDRO DIAS LEITE
Folha de São Paulo, Segunda-feira, 13 de julho de 2009
Para o historiador, a decisão de permitir a continuidade de instituições "grandes demais para quebrar" vai contra um dos benefícios das crises financeiras: o fim de modelos que não funcionam e a criação e transformação de novos caminhos, bem-sucedidos. O professor de Harvard afirma que a crise pode levar a uma aceleração de um processo, que já vem acontecendo, de declínio dos Estados Unidos e ascensão da China como nova potência. "Seria perfeitamente familiar, do ponto de vista histórico", diz. Em uma ou duas décadas, os PIBs dos dois serão
equivalentes, aposta. O livro, que figurou na lista de mais vendidos do "New York Times", será lançado no Brasil nesta semana. Leia abaixo a entrevista concedida por Ferguson à Folha, por telefone.
FOLHA - Em uma palestra sobre seu livro, o senhor disse que acabou a "era da alavancagem". Em que era estamos entrando agora?
NIALL FERGUSON - Temo cada vez mais que estejamos entrando na Terceira Depressão, não tão severa quanto a de 1929-33, mas provavelmente tão longa quanto a de 1873-1878. Temos pela frente um período de crescimento baixo na maior economia do mundo, os EUA, e também um ou dois anos de deflação em muitas economias.
FOLHA - Olhando historicamente, existe alguma diferença entre essa Terceira Grande Depressão e as anteriores, para a população?
NIALL FERGUSON - Uma das grandes diferenças é que os atuais sistemas de bem-estar social e de apoio aos desempregados são muito melhores que os anteriores. Os governos tiveram um papel muito mais ativo na condução da economia, então vimos ações extraordinárias dos bancos centrais para injetar liquidez no sistema -e também enormes déficits dos governos enquanto tentam impulsionar a economia. Isso vai ser diferente e é por isso que não estamos vendo um colapso severo como o dos anos 30. Mas não dá para conseguir tudo. Estamos começando a ver os limites das respostas monetárias e keynesianas a esta crise.
FOLHA - O senhor fala em "destruição criativa". Da quebra dessas empresas, vamos ter um novo tipo de economia. Que nova economia vai emergir dessa depressão?
FERGUSON - Há duas coisas diferentes. Primeiro, vai ser uma economia mundial em que países como China, Índia e, claro, o Brasil terão um papel muito maior, com os EUA, a Europa e o Japão menos dominantes. O segundo ponto importante é que as economias desenvolvidas, particularmente os EUA, não serão capazes de reavivar o antigo modelo de securitização [em que dívidas são aglutinadas, transformadas em títulos e vendidas como investimento], de bancos de investimento e de crédito ao consumidor. O que vamos ver nos EUA e também na Europa é um retorno a um modelo financeiro mais antiquado. Digo isso com alguma hesitação, porque neste momento os governos desses países estão falando em novas regulações que parecem mirar em reviver esses dinossauros e mantê-los vivos. Em outras palavras, medidas estão sendo tomadas para impulsionar instituições que eram vistas como "grandes demais para quebrar". E eu concordo com os que dizem que, se algo é grande demais para quebrar, é grande demais mesmo, e provavelmente não deveria existir. Mas a tendência da nova regulação é a de manter esses dinossauros vivos, o que vai criar mais problemas. O que mais precisamos neste momento é um retorno a instituições financeiras menores e menos vulneráveis, mas o que vamos pegar é um tipo de megassuperbanco nacionalizado.
FOLHA - Então, nesse caso, o curso natural da história não está sendo respeitado e pode ser a semente de uma nova crise mais para a frente?
FERGUSON - O perigo de intervir desse modo é acabar com um tipo de "década perdida", no estilo japonês, em escala global. Minha esperança é que serão tomadas medidas para quebrar esses gigantes perigosos, como o Citigroup e o Bank of America. Se essas instituições forem divididas e houver novas instituições, aí pode haver razões para otimismo. Senão, as perspectivas são bastante ruins.
FOLHA - Seu livro vai até a origem do dinheiro. Sempre é feita a comparação da economia de agora com a da década de 30, mas, sob um ponto de vista mais amplo, com que outros pontos da história a atual era pode ser comparada?
FERGUSON - Há muitos paralelos. Parte do objetivo do livro é mostrar como a história financeira explica a geopolítica. Pense no declínio dos impérios português e espanhol, que nos 1600 pareciam os protagonistas da economia global. O declínio da Espanha foi claramente financeiro, porque a disponibilidade de prata do Novo Mundo teve o efeito de minar a saúde institucional do império espanhol e abrir o caminho para novas potências financeiras. Primeiro a Holanda, e depois, claro, a Inglaterra. A França era um império poderoso no século 18, mas, financeiramente, um império fraco, que em última análise caiu exatamente por isso -a Marinha britânica era muito maior, porque os franceses não tinham um mercado de "bonds", não tinham a capacidade de se financiar naquela escala. No século 20, é o Reino Unido que está em problemas, como consequência de dívida e baixo crescimento, especialmente depois de 1945. Então seria perfeitamente familiar, de um ponto de vista histórico, se essa crise financeira levasse a uma aceleração da mudança dos Estados Unidos para a China. Nós já vimos nos últimos dez anos que a liderança parece estar mudando em direção à China. Embora isso leve tempo e seja imprevisível -já que a China pode sempre entrar em dificuldades-, é razoável dizer que em 10 ou 20 anos os PIBs da China e dos EUA não serão diferentes.
FOLHA - O senhor cria a "Chimérica" no seu livro, o que é isso?
FERGUSON - Meu argumento é que, para entender a economia mundial, é necessário entender a relação entre a China e a América [EUA]. A China exportadora, a América importadora. A China poupadora, a América gastadora. Essa relação esteve no centro da economia global nos últimos dez anos, e o interessante é perguntar se a crise levará ao fim da "Chimérica". A China tem reclamado cada vez mais do modo como os EUA lidam com a crise.
FOLHA - A China tem falado constantemente numa alternativa ao dólar.
FERGUSON - Isso tem se tornado tão frequente de Pequim que parece que eles realmente querem dizer isso. Eles têm US$ 1,5 trilhão em títulos em dólar e ficam muito nervosos com os EUA tomando medidas que podem enfraquecer o dólar e, assim, suas reservas. Isso pode parecer o fim desse casamento. Quando cunhei essa expressão, pensei na palavra quimera, uma criatura mítica. Não acho que seja uma relação estável.
FOLHA - É possível ver uma trajetória linear na evolução econômica do mundo ou é algo errático? Estamos indo em alguma direção ou não?
FERGUSON - O paralelo que eu traçaria é um que me bateu quando eu estava na Bolívia, observando os Andes. Olhando as linhas das montanhas, dei-me conta de que estava olhando algo parecido com os índices do mercado financeiro, os picos, as quedas bruscas, os pontos agudos. E acho que essa analogia é válida. Na economia, as coisas quebram, no sentido de seleção natural, existe a sobrevivência, inovações ou mutações acontecem, novas instituições são criadas. São as bem-sucedidas que sobrevivem e se multiplicam. A diferença é que, ao contrário do mundo natural, temos intervenção de reguladores e legisladores, o que previne o processo natural de acontecer. Uma das maiores diferenças entre evolução natural e evolução financeira é que essa pode ser interrompida, os dinossauros podem ser salvos da extinção, e os mamíferos, impedidos de herdar a Terra. É um pouco isso o que está acontecendo, com instituições que deveriam ter quebrado, mas interviemos para mantê-las vivas.
FOLHA - Mas um dos argumentos é que, se quebrassem, o sofrimento para a população seria enorme, como nos anos 30. Não faz sentido?
FERGUSON - Isso é correto, e o Fed [banco central dos EUA] fez um bom trabalho em evitar a catástrofe. Se os bancos tivessem quebrado em setembro passado, estaríamos numa situação muito pior. Mas existem diferenças entre medidas temporárias e reformas de longo prazo. As medidas iniciais foram tomadas para prevenir o pânico. Mas, uma vez que isso foi feito, temos de dizer: depois do que você fez, não há a menor possibilidade de continuar como antes. Quando vimos o Goldman Sachs, que recebeu todo tipo de benefício, voltando aos negócios como sempre, os bancos sobreviventes simplesmente voltando ao que eram antes, tudo isso é muito frustrante. O Goldman vai ter em 2009 o mesmo lucro de 2007, ou maior. É difícil acreditar que os contribuintes colocaram seus recursos para prevenir uma depressão, não para que os bancos tivessem um ótimo ano de 2009.
FOLHA - Isso pode levar a reações mais agressivas da população?
FERGUSON - Isso é parte da dificuldade do público de distinguir entre milhares e milhões. Quando você tenta explicar para as pessoas o que está acontecendo, é complicado, porque, para elas, é difícil distinguir 1 milhão de 1 bilhão. Um dos objetivos do meu livro é encorajar o "alfabetismo financeiro", para que o leitor comum não se sinta intimidado quando ler palavras como derivativos, trilhão. A ideia de que os mestres do universo de Wall Street precisam nos explicar o que está acontecendo é absurda. Está muito claro que a crise financeira foi causada por um grosseiro erro de cálculo e de administração pelas pessoas que geriam os bancos. E o fato de que muitos deles continuam a comandar os bancos é profundamente irritante.
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
segunda-feira, 13 de julho de 2009
1219) Politicas de Estado e de Governo: materia do Correio Braziliense
Parece combinado, mas não foi isso; por um desses acasos, eu escrevi um artigo no sábado, dia 11 de julho de 2009, sobre as distinções a serem aplicadas a políticas de Estado e a políticas de governo, objeto de meu post imediatamente anterior a este (ver este link), e eis que não mais que de repente, o jornal Correio Braziliense, deste domingo, 12 de julho de 2009, publicou uma matéria sobre a mesma questão, mas aplicada à política econômica.
POLÍTICA
Choque de ideias no Ministério da Fazenda
Ricardo Allan, Editoria Econômica
Correio Braziliense, Domingo, 12 de Julho de 2009, p. 3
A crise internacional agravou as divergências ideológicas que já separavam a cúpula do Ministério da Fazenda e seus comandados. Herdados das duas administrações anteriores, de Pedro Malan e Antonio Palocci, técnicos de orientação mais liberal discordam das medidas anunciadas pelo ministro Guido Mantega para tirar o país da recessão. Especialistas das secretarias do Tesouro Nacional, de Política Econômica e da Receita Federal reclamam que não participam mais da formulação de políticas e que o "debate está interditado". Os chefes asseguram que existe conversa e que os liberais só são derrotados pela "fraqueza de ideias". Temendo represálias, os subordinados reprimem sua insatisfação.
A equipe econômica tem se inclinado claramente por uma política anticíclica, aumentando os gastos públicos e concedendo diversos incentivos fiscais para elevar as vendas de bens duráveis, os investimentos e a produção. Preocupados com a estabilidade fiscal, técnicos do Tesouro temem os efeitos negativos dessa orientação no médio e longo prazos. Se o resultado fiscal se deteriorar, com elevação da dívida como proporção do PIB, o preço a pagar pode ser a volta da inflação. Em todas as frentes do Tesouro (política fiscal, controle da dívida e relacionamento com os estados, por exemplo), muitos operadores chegaram à Fazenda nos anos 1990. Eles se dizem frustrados.
"Até a chegada do Mantega, o debate era mais fluido e aberto. Os atuais secretários imprimem uma nítida orientação ideológica, embora tenham sido mais pragmáticos quando isso foi preciso. Eles são muito fechados num grupo monolítico. Determinam a política e nós só a executamos", afirma um experiente técnico da Fazenda. Ele cita decisões que trouxeram preocupação: a emissão de até R$ 100 bilhões em títulos para capitalizar o BNDES, a determinação que o Banco do Brasil (BB) baixe os juros e empreste mais, mesmo com o aumento do risco de calote, e a escolha de setores específicos para gozar de cortes de impostos.
Dominantes - O "grupo monolítico" que domina o ministério é formado, além do próprio Mantega, pelo secretário-executivo, Nelson Machado; o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa; e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. Todos eles são filiados ao PT ou têm profundas ligações com o partido do governo. Os quatro, pintados pelos técnicos como "razoavelmente inflexíveis", defendem uma intervenção mais forte do Estado na economia. A orientação também está sendo ditada, em grande medida, pela ministra-chefe da Casa Civil e pré-candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff. Só assessores muito próximos da cúpula da Fazenda participam de algumas discussões.
"Falar em interdição de debate hoje é brincadeira. O que eles chamam de debate interditado eu chamo de resultado democrático das eleições. O Brasil escolheu uma orientação e isso se traduz nas ações do ministério. Os funcionários da casa devem seguir as diretrizes do governo. Podem obviamente opinar, contribuir e divergir, mas no fim do dia vale a opinião do governo eleito", rebate o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa. Na visão dele, alguns funcionários estão desacostumados com a alternância de poder que deu fim ao "pensamento único" dominante na Fazenda por mais de uma década. "Se é para os técnicos ditarem os rumos da política econômica, para que haver eleição?"
Para o secretário, o debate não era possível no governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), em que não haveria espaço para discutir um ponto de vista "alternativo à visão de Washington" nem para a ascensão profissional de quem pensava diferente. "Hoje, o debate é amplo e irrestrito. Se o argumento liberal não vence, é pela qualidade das ideias e pelos exemplos claros de fracasso recente", garante. Barbosa contra-ataca: alguns técnicos alegam que são perseguidos para não admitir sua baixa capacidade. "É muito mais confortável dizer para a esposa que perdeu o DAS (cargo em comissão) por ser perseguido do que por ser incompetente."
Resistência - O Correio Braziliense ouviu vários técnicos sobre o assunto e a tônica geral foi de reclamação. Um deles elogia a formação econômica de Nelson Barbosa, mas se queixa do nível geral da cúpula da Fazenda. "Essa equipe é a mais fraca que já vi aqui. O debate está muito pobre. Não adianta nem tentar argumentar. O pacote já vem pronto e a gente só fica sabendo no dia do anúncio. Antes, tínhamos um papel na formulação das medidas. Ninguém reclama abertamente para não ser perseguido", revela.
Primeiro secretário de Política Econômica de Mantega, Julio Sérgio Gomes de Almeida sempre lutou contra a resistência dos técnicos à nova orientação no ministério. "Tudo o que eu queria fazer batia numa muralha, o que gerou um desgaste muito grande. Eles acreditam que a estabilidade deve vir antes do crescimento e que o governo não deve ter política social. Se o entendimento está difícil, pode ser por causa dos secretários, mas nunca pelo Mantega, que é um homem de debate. Ele é tolerante até demais. Está substituindo esse povo de forma gradual, quando deveria fazer isso de forma mais rápida", diz.
POLÍTICA
Choque de ideias no Ministério da Fazenda
Ricardo Allan, Editoria Econômica
Correio Braziliense, Domingo, 12 de Julho de 2009, p. 3
A crise internacional agravou as divergências ideológicas que já separavam a cúpula do Ministério da Fazenda e seus comandados. Herdados das duas administrações anteriores, de Pedro Malan e Antonio Palocci, técnicos de orientação mais liberal discordam das medidas anunciadas pelo ministro Guido Mantega para tirar o país da recessão. Especialistas das secretarias do Tesouro Nacional, de Política Econômica e da Receita Federal reclamam que não participam mais da formulação de políticas e que o "debate está interditado". Os chefes asseguram que existe conversa e que os liberais só são derrotados pela "fraqueza de ideias". Temendo represálias, os subordinados reprimem sua insatisfação.
A equipe econômica tem se inclinado claramente por uma política anticíclica, aumentando os gastos públicos e concedendo diversos incentivos fiscais para elevar as vendas de bens duráveis, os investimentos e a produção. Preocupados com a estabilidade fiscal, técnicos do Tesouro temem os efeitos negativos dessa orientação no médio e longo prazos. Se o resultado fiscal se deteriorar, com elevação da dívida como proporção do PIB, o preço a pagar pode ser a volta da inflação. Em todas as frentes do Tesouro (política fiscal, controle da dívida e relacionamento com os estados, por exemplo), muitos operadores chegaram à Fazenda nos anos 1990. Eles se dizem frustrados.
"Até a chegada do Mantega, o debate era mais fluido e aberto. Os atuais secretários imprimem uma nítida orientação ideológica, embora tenham sido mais pragmáticos quando isso foi preciso. Eles são muito fechados num grupo monolítico. Determinam a política e nós só a executamos", afirma um experiente técnico da Fazenda. Ele cita decisões que trouxeram preocupação: a emissão de até R$ 100 bilhões em títulos para capitalizar o BNDES, a determinação que o Banco do Brasil (BB) baixe os juros e empreste mais, mesmo com o aumento do risco de calote, e a escolha de setores específicos para gozar de cortes de impostos.
Dominantes - O "grupo monolítico" que domina o ministério é formado, além do próprio Mantega, pelo secretário-executivo, Nelson Machado; o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa; e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. Todos eles são filiados ao PT ou têm profundas ligações com o partido do governo. Os quatro, pintados pelos técnicos como "razoavelmente inflexíveis", defendem uma intervenção mais forte do Estado na economia. A orientação também está sendo ditada, em grande medida, pela ministra-chefe da Casa Civil e pré-candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff. Só assessores muito próximos da cúpula da Fazenda participam de algumas discussões.
"Falar em interdição de debate hoje é brincadeira. O que eles chamam de debate interditado eu chamo de resultado democrático das eleições. O Brasil escolheu uma orientação e isso se traduz nas ações do ministério. Os funcionários da casa devem seguir as diretrizes do governo. Podem obviamente opinar, contribuir e divergir, mas no fim do dia vale a opinião do governo eleito", rebate o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa. Na visão dele, alguns funcionários estão desacostumados com a alternância de poder que deu fim ao "pensamento único" dominante na Fazenda por mais de uma década. "Se é para os técnicos ditarem os rumos da política econômica, para que haver eleição?"
Para o secretário, o debate não era possível no governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), em que não haveria espaço para discutir um ponto de vista "alternativo à visão de Washington" nem para a ascensão profissional de quem pensava diferente. "Hoje, o debate é amplo e irrestrito. Se o argumento liberal não vence, é pela qualidade das ideias e pelos exemplos claros de fracasso recente", garante. Barbosa contra-ataca: alguns técnicos alegam que são perseguidos para não admitir sua baixa capacidade. "É muito mais confortável dizer para a esposa que perdeu o DAS (cargo em comissão) por ser perseguido do que por ser incompetente."
Resistência - O Correio Braziliense ouviu vários técnicos sobre o assunto e a tônica geral foi de reclamação. Um deles elogia a formação econômica de Nelson Barbosa, mas se queixa do nível geral da cúpula da Fazenda. "Essa equipe é a mais fraca que já vi aqui. O debate está muito pobre. Não adianta nem tentar argumentar. O pacote já vem pronto e a gente só fica sabendo no dia do anúncio. Antes, tínhamos um papel na formulação das medidas. Ninguém reclama abertamente para não ser perseguido", revela.
Primeiro secretário de Política Econômica de Mantega, Julio Sérgio Gomes de Almeida sempre lutou contra a resistência dos técnicos à nova orientação no ministério. "Tudo o que eu queria fazer batia numa muralha, o que gerou um desgaste muito grande. Eles acreditam que a estabilidade deve vir antes do crescimento e que o governo não deve ter política social. Se o entendimento está difícil, pode ser por causa dos secretários, mas nunca pelo Mantega, que é um homem de debate. Ele é tolerante até demais. Está substituindo esse povo de forma gradual, quando deveria fazer isso de forma mais rápida", diz.
domingo, 12 de julho de 2009
1218) Sobre políticas de Estado e políticas de governo
Este post pode ser lido em conexão com um mais antigo, relativo ao debate sobre políticas públicas na esfera do Estado ou no âmbito do governo, especificamente este aqui:
Quarta-feira, 17 de Junho de 2009
1163) Um debate sobre diplomatas e políticas de Estado
Em todo caso, se trata do meu trabalho mais recente.
Sobre políticas de governo e políticas de Estado: distinções necessárias
Paulo Roberto de Almeida
Saber se uma determinada política seguida por um governo específico, num dado momento da trajetória política de um país, corresponde a uma expressão da chamada “vontade nacional” – ou seja, se ela corresponde ao que normalmente se designa como política de Estado – ou se ela, alternativamente, expressa tão somente a vontade passageira de um governo ocasional, numa conjuntura precisa, geralmente breve ou temporária, da vida política desse mesmo país não é, certamente, uma questão trivial, pois esse conhecimento envolve usualmente a consideração de certo número de elementos objetivos que podem entrar na categoria dos sistêmicos, ou estruturais, ou também na classe dos passageiros, ou circunstanciais.
Muitos pretendem que toda e qualquer política de governo é uma política de Estado, posto que um governo, que ocupa o poder num Estado democrático – isto é, emergindo de eleições competitivas num ambiente aberto aos talentos políticos – é sempre a expressão da vontade nacional, expressa na escolha regular daqueles que serão os encarregados de formular essas políticas setoriais. Os que assim pensam consideram bizantina a distinção, mas estes são geralmente pessoalmente do próprio governo, eventualmente até funcionários do Estado que pretendem se identificar com o governo de passagem. O que se argumenta é que, na medida em que suas propostas políticas já foram “aprovadas” previamente no escrutínio eleitoral, elas correspondem, portanto, aos desejos da maioria da população, sendo em conseqüência “nacionais”, ou “de Estado”.
Não é bem assim, pois raramente, numa competição eleitoral, o debate pré-votação desce aos detalhes e minudências das políticas setoriais e a todos os contornos e implicações dos problemas que podem surgir na administração corrente do Estado após a posse do grupo vencedor. Campanhas eleitorais são sempre superficiais, por mais debates que se possam fazer, e os candidatos procuram simplificar ainda mais os problemas em confronto, adotando slogans redutores, e fazendo outras tantas simplificações em relação às posições dos seus adversários. Por outro lado, as promessas são sempre genéricas, sem muita quantificação – diretamente quanto às metas ou sua expressão orçamentária – e sobretudo sem precisão quanto aos meios e seus efeitos no cenário econômico ou social. Todos prometem empregos, distribuição de renda, crescimento e desenvolvimento, defesa dos interesses nacionais, resgate da dignidade e da cidadania e outras maravilhas do gênero. Em outros termos, raramente a eleição de um movimento ou partido político ao poder executivo lhe dá plena legitimidade para implementar políticas de governo como se fossem políticas de Estado, que por sua própria definição possuem um caráter mais permanente, ou sistêmico, do que escolhas de ocasião ou medidas conjunturais para responder a desafios do momento.
Políticas de governo são aquelas que o Executivo decide num processo bem mais elementar de formulação e implementação de determinadas medidas para responder às demandas colocadas na própria agenda política interna – pela dinâmica econômica ou política-parlamentar, por exemplo – ou vindos de fora, como resultado de eventos internacionais com impacto doméstico. Elas podem até envolver escolhas complexas, mas pode-se dizer que o caminho entre a apresentação do problema e a definição de uma política determinada (de governo) é bem mais curto e simples, ficando geralmente no plano administrativo, ou na competência dos próprios ministérios setoriais.
Políticas de Estado, por sua vez, são aquelas que envolvem as burocracias de mais de uma agência do Estado, justamente, e acabam passando pelo Parlamento ou por instâncias diversas de discussão, depois que sua tramitação dentro de uma esfera (ou mais de uma) da máquina do Estado envolveu estudos técnicos, simulações, análises de impacto horizontal e vertical, efeitos econômicos ou orçamentários, quando não um cálculo de custo-benefício levando em conta a trajetória completa da política que se pretende implementar. O trabalho da burocracia pode levar meses, bem como o eventual exame e discussão no Parlamento, pois políticas de Estado, que respondem efetivamente a essa designação, geralmente envolvem mudanças de outras normas ou disposições pré-existentes, com incidência em setores mais amplos da sociedade.
Se quisermos ficar apenas com um exemplo, no âmbito da diplomacia, pode-se utilizar esta distinção. Política de Estado é a decisão de engajar um processo de integração regional, a assinatura de um tratado de livre comércio, a conclusão de um acordo de cooperação científica e tecnológica numa determinada área e coisas do gênero. Política de governo seria a definição de alíquotas tarifárias para um setor determinado, a exclusão de produtos ou ramos econômicos do alcance do tratado de livre comércio, ou a assinatura de um protocolo complementar definindo modalidades para a cooperação científica e tecnológica na área já contemplada no acordo. Creio que tanto o escopo das políticas, como os procedimentos observados em cada caso podem ser facilmente distinguidos quando se considera cada um dos conjuntos de medidas em função das características definidas nos dois parágrafos precedentes.
Por isso, não se pode pretender que as políticas de Estado possam ser adotadas apenas pelo ministro da área, ou mesmo pelo presidente, ao sabor de uma sugestão de um assessor, pois raramente o trabalho técnico terá sido exaustivo ou aprofundado o suficiente para justificar legitimamente essa designação. Isso se reflete, aliás, na própria estrutura do Estado, quando se pensa em como são formuladas e implementadas essas políticas de Estado.
Pense-se, por exemplo, em políticas de defesa, de relações exteriores, de economia e finanças – em seus aspectos mais conceituais do que operacionais – de meio ambiente ou de educação e tecnologia: elas geralmente envolvem um corpo de funcionários especializados, dedicados profissionalmente ao estudo, acompanhamento e formulação das grandes orientações das políticas vinculadas às suas respectivas áreas. Ou considere-se, então, medidas de natureza conjuntural, ou voltadas para uma clientela mais restrita, quando não ações de caráter mais reativo ou operacional do que propriamente sistêmicas ou estruturais: estas podem ser ditas de governo, aquelas não.
Portanto, quando alguém disser que está seguindo políticas de Estado, pare um pouco e examine os procedimentos, a cadeia decisória, as implicações para o país e constate se isso é verdade, ou se a tal política corresponde apenas e tão somente a uma iniciativa individual do chefe de Estado ou do ministro que assim se expressou. Nem todo presidente se dedica apenas a políticas de Estado, e nem toda política de Estado é necessariamente formulada pelo presidente ou decidida apenas no âmbito do Executivo. Como dizem os americanos: think again, ou seja, espere um pouco e reconsidere o problema...
Brasília, 11 de julho de 2009
Quarta-feira, 17 de Junho de 2009
1163) Um debate sobre diplomatas e políticas de Estado
Em todo caso, se trata do meu trabalho mais recente.
Sobre políticas de governo e políticas de Estado: distinções necessárias
Paulo Roberto de Almeida
Saber se uma determinada política seguida por um governo específico, num dado momento da trajetória política de um país, corresponde a uma expressão da chamada “vontade nacional” – ou seja, se ela corresponde ao que normalmente se designa como política de Estado – ou se ela, alternativamente, expressa tão somente a vontade passageira de um governo ocasional, numa conjuntura precisa, geralmente breve ou temporária, da vida política desse mesmo país não é, certamente, uma questão trivial, pois esse conhecimento envolve usualmente a consideração de certo número de elementos objetivos que podem entrar na categoria dos sistêmicos, ou estruturais, ou também na classe dos passageiros, ou circunstanciais.
Muitos pretendem que toda e qualquer política de governo é uma política de Estado, posto que um governo, que ocupa o poder num Estado democrático – isto é, emergindo de eleições competitivas num ambiente aberto aos talentos políticos – é sempre a expressão da vontade nacional, expressa na escolha regular daqueles que serão os encarregados de formular essas políticas setoriais. Os que assim pensam consideram bizantina a distinção, mas estes são geralmente pessoalmente do próprio governo, eventualmente até funcionários do Estado que pretendem se identificar com o governo de passagem. O que se argumenta é que, na medida em que suas propostas políticas já foram “aprovadas” previamente no escrutínio eleitoral, elas correspondem, portanto, aos desejos da maioria da população, sendo em conseqüência “nacionais”, ou “de Estado”.
Não é bem assim, pois raramente, numa competição eleitoral, o debate pré-votação desce aos detalhes e minudências das políticas setoriais e a todos os contornos e implicações dos problemas que podem surgir na administração corrente do Estado após a posse do grupo vencedor. Campanhas eleitorais são sempre superficiais, por mais debates que se possam fazer, e os candidatos procuram simplificar ainda mais os problemas em confronto, adotando slogans redutores, e fazendo outras tantas simplificações em relação às posições dos seus adversários. Por outro lado, as promessas são sempre genéricas, sem muita quantificação – diretamente quanto às metas ou sua expressão orçamentária – e sobretudo sem precisão quanto aos meios e seus efeitos no cenário econômico ou social. Todos prometem empregos, distribuição de renda, crescimento e desenvolvimento, defesa dos interesses nacionais, resgate da dignidade e da cidadania e outras maravilhas do gênero. Em outros termos, raramente a eleição de um movimento ou partido político ao poder executivo lhe dá plena legitimidade para implementar políticas de governo como se fossem políticas de Estado, que por sua própria definição possuem um caráter mais permanente, ou sistêmico, do que escolhas de ocasião ou medidas conjunturais para responder a desafios do momento.
Políticas de governo são aquelas que o Executivo decide num processo bem mais elementar de formulação e implementação de determinadas medidas para responder às demandas colocadas na própria agenda política interna – pela dinâmica econômica ou política-parlamentar, por exemplo – ou vindos de fora, como resultado de eventos internacionais com impacto doméstico. Elas podem até envolver escolhas complexas, mas pode-se dizer que o caminho entre a apresentação do problema e a definição de uma política determinada (de governo) é bem mais curto e simples, ficando geralmente no plano administrativo, ou na competência dos próprios ministérios setoriais.
Políticas de Estado, por sua vez, são aquelas que envolvem as burocracias de mais de uma agência do Estado, justamente, e acabam passando pelo Parlamento ou por instâncias diversas de discussão, depois que sua tramitação dentro de uma esfera (ou mais de uma) da máquina do Estado envolveu estudos técnicos, simulações, análises de impacto horizontal e vertical, efeitos econômicos ou orçamentários, quando não um cálculo de custo-benefício levando em conta a trajetória completa da política que se pretende implementar. O trabalho da burocracia pode levar meses, bem como o eventual exame e discussão no Parlamento, pois políticas de Estado, que respondem efetivamente a essa designação, geralmente envolvem mudanças de outras normas ou disposições pré-existentes, com incidência em setores mais amplos da sociedade.
Se quisermos ficar apenas com um exemplo, no âmbito da diplomacia, pode-se utilizar esta distinção. Política de Estado é a decisão de engajar um processo de integração regional, a assinatura de um tratado de livre comércio, a conclusão de um acordo de cooperação científica e tecnológica numa determinada área e coisas do gênero. Política de governo seria a definição de alíquotas tarifárias para um setor determinado, a exclusão de produtos ou ramos econômicos do alcance do tratado de livre comércio, ou a assinatura de um protocolo complementar definindo modalidades para a cooperação científica e tecnológica na área já contemplada no acordo. Creio que tanto o escopo das políticas, como os procedimentos observados em cada caso podem ser facilmente distinguidos quando se considera cada um dos conjuntos de medidas em função das características definidas nos dois parágrafos precedentes.
Por isso, não se pode pretender que as políticas de Estado possam ser adotadas apenas pelo ministro da área, ou mesmo pelo presidente, ao sabor de uma sugestão de um assessor, pois raramente o trabalho técnico terá sido exaustivo ou aprofundado o suficiente para justificar legitimamente essa designação. Isso se reflete, aliás, na própria estrutura do Estado, quando se pensa em como são formuladas e implementadas essas políticas de Estado.
Pense-se, por exemplo, em políticas de defesa, de relações exteriores, de economia e finanças – em seus aspectos mais conceituais do que operacionais – de meio ambiente ou de educação e tecnologia: elas geralmente envolvem um corpo de funcionários especializados, dedicados profissionalmente ao estudo, acompanhamento e formulação das grandes orientações das políticas vinculadas às suas respectivas áreas. Ou considere-se, então, medidas de natureza conjuntural, ou voltadas para uma clientela mais restrita, quando não ações de caráter mais reativo ou operacional do que propriamente sistêmicas ou estruturais: estas podem ser ditas de governo, aquelas não.
Portanto, quando alguém disser que está seguindo políticas de Estado, pare um pouco e examine os procedimentos, a cadeia decisória, as implicações para o país e constate se isso é verdade, ou se a tal política corresponde apenas e tão somente a uma iniciativa individual do chefe de Estado ou do ministro que assim se expressou. Nem todo presidente se dedica apenas a políticas de Estado, e nem toda política de Estado é necessariamente formulada pelo presidente ou decidida apenas no âmbito do Executivo. Como dizem os americanos: think again, ou seja, espere um pouco e reconsidere o problema...
Brasília, 11 de julho de 2009
1217) Comparando Europa e Estados Unidos
O autor, um típico representante daqueles "conservadores econômicos" que publicam artigos de opinião no jornal mais capitalista do mundo, o Wall Street Journal, foca em políticas macroeconômicas no plano geral e nas políticas de defesa em particular, para explicar como a politica social-democrática da Europa é insustentável, ou apenas sustentável com base na abertura e no poderio militar americano. Ele lamenta, aliás, que os EUA de Obama estejam pretendendo aderir a esse modelo social-democrático insustentável no longo prazo.
O autor nao diz, mas isso está implícito em seu artigo de opinião, que as políticas generosas da Europa no plano social e laboral, combinadas à rigidez de suas políticas setoriais, estão atuando para diminuir o crescimento da produtividade na Europa, comparativamente à flexibilidade demonstrada pela economia capitalista americana.
A consequencia é que a Europa vai continuar atrasada em relacao aos EUA, e portanto vai continuar sendo mais protecionista do que os EUA.
Do ponto de vista do Brasil, e de sua inserção na economia internacional, o que interessaria mais ao Brasil, sobretudo no plano dos mercados para suas exportações? A Europa ou os EUA?
Acho que as respostas se impoem por si mesmas...
-------------
Paulo Roberto de Almeida
Europe Should Hope Obama Fails
The continent has been free riding on the strength of U.S. capitalism.
By JEFF DURSTEWITZ
The Wall Street Journal, July 11, 2009
It's clear by now that President Barack Obama wants to turn the United States into something more like Germany or Belgium -- a "social democracy" in which redistribution ("spread the wealth around," as Mr. Obama explained to Joe the Plumber during the campaign) is an expanding government's main concern.
Europe, for its part, has reciprocated our president's apparent love of their system by treating him like a messiah. He is the man, they sense, who will finally make good on George H.W. Bush's famous promise in 1988 to make America a "kinder and gentler nation."
Alas, this mutual love is self-defeating. That's because Mr. Obama will doom the low-growth, weak-defense European model to the extent he gets the U.S. to emulate it.
Consider some basic facts: Europe has been riding on our economic coattails and sheltering under our defense umbrella since the end of World War II nearly 65 years ago. Our markets have been open to European goods, and our strong currency and relative affluence -- the product of our much-maligned free-market economic model -- have provided Europe with a ready buyer. (Question: How worried were French wine-makers about Americans boycotting French wines in 2003? Answer: très worried.)
While providing a huge market for Europe's goods, we've also substantially relieved the European powers of the burden of defending themselves. Yes, France has an aircraft carrier and a nuclear force de frappe, but it's not really capable of projecting significant force around the world anymore. Germany, the world's third-largest economy, has a vestigial high-seas fleet and a modest air force. Even the Royal Navy is a shadow of its former self. "The U.S. last year spent about 44% more on defense than all other NATO members combined," Robert Wall recently noted in Aviation Week.
By assuming Europe's defense the U.S. has, in effect, allowed it the luxury of extremely expensive and ultimately unsustainable social-welfarism.
The great irony here is that the European model American leftists envy couldn't survive without its despised cowboy counterparty. If the U.S. economy weakens because of increased regulation, heavy-handed unionization, and higher taxes and debt to support an expensive social agenda -- all policies Mr. Obama and the Democrats in Congress are pushing hard -- it will hurt Europe.
The market for Europe's exports will shrink, and the U.S. will be less able to defend Europe. Europe is also facing a demographic cataclysm in the near future because of low birth rates (under 1.3 children per woman in the EU, well below the 2.1 necessary to maintain the population). Thus Europe will be increasingly unable to sustain its current welfare state, the very model that the left in the United States adores.
Mr. Durstewitz is co-author of "Younger Than That Now -- A Shared Passage From the Sixties" (Bantam, 2001).
O autor nao diz, mas isso está implícito em seu artigo de opinião, que as políticas generosas da Europa no plano social e laboral, combinadas à rigidez de suas políticas setoriais, estão atuando para diminuir o crescimento da produtividade na Europa, comparativamente à flexibilidade demonstrada pela economia capitalista americana.
A consequencia é que a Europa vai continuar atrasada em relacao aos EUA, e portanto vai continuar sendo mais protecionista do que os EUA.
Do ponto de vista do Brasil, e de sua inserção na economia internacional, o que interessaria mais ao Brasil, sobretudo no plano dos mercados para suas exportações? A Europa ou os EUA?
Acho que as respostas se impoem por si mesmas...
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Paulo Roberto de Almeida
Europe Should Hope Obama Fails
The continent has been free riding on the strength of U.S. capitalism.
By JEFF DURSTEWITZ
The Wall Street Journal, July 11, 2009
It's clear by now that President Barack Obama wants to turn the United States into something more like Germany or Belgium -- a "social democracy" in which redistribution ("spread the wealth around," as Mr. Obama explained to Joe the Plumber during the campaign) is an expanding government's main concern.
Europe, for its part, has reciprocated our president's apparent love of their system by treating him like a messiah. He is the man, they sense, who will finally make good on George H.W. Bush's famous promise in 1988 to make America a "kinder and gentler nation."
Alas, this mutual love is self-defeating. That's because Mr. Obama will doom the low-growth, weak-defense European model to the extent he gets the U.S. to emulate it.
Consider some basic facts: Europe has been riding on our economic coattails and sheltering under our defense umbrella since the end of World War II nearly 65 years ago. Our markets have been open to European goods, and our strong currency and relative affluence -- the product of our much-maligned free-market economic model -- have provided Europe with a ready buyer. (Question: How worried were French wine-makers about Americans boycotting French wines in 2003? Answer: très worried.)
While providing a huge market for Europe's goods, we've also substantially relieved the European powers of the burden of defending themselves. Yes, France has an aircraft carrier and a nuclear force de frappe, but it's not really capable of projecting significant force around the world anymore. Germany, the world's third-largest economy, has a vestigial high-seas fleet and a modest air force. Even the Royal Navy is a shadow of its former self. "The U.S. last year spent about 44% more on defense than all other NATO members combined," Robert Wall recently noted in Aviation Week.
By assuming Europe's defense the U.S. has, in effect, allowed it the luxury of extremely expensive and ultimately unsustainable social-welfarism.
The great irony here is that the European model American leftists envy couldn't survive without its despised cowboy counterparty. If the U.S. economy weakens because of increased regulation, heavy-handed unionization, and higher taxes and debt to support an expensive social agenda -- all policies Mr. Obama and the Democrats in Congress are pushing hard -- it will hurt Europe.
The market for Europe's exports will shrink, and the U.S. will be less able to defend Europe. Europe is also facing a demographic cataclysm in the near future because of low birth rates (under 1.3 children per woman in the EU, well below the 2.1 necessary to maintain the population). Thus Europe will be increasingly unable to sustain its current welfare state, the very model that the left in the United States adores.
Mr. Durstewitz is co-author of "Younger Than That Now -- A Shared Passage From the Sixties" (Bantam, 2001).
1216) Pedro Malan: melhorar a qualidade do debate publico sobre politicas economicas
Um apelo do ex-ministro Malan à melhoria da qualidade do debate público.
A despeito de que alguns, provavelmente os mesmos que dividem o mundo das políticas públicas entre desenvolvimentistas e neoliberais, gostariam de imputar ao ex-ministro o epíteto de liberal, desafio, esses mesmos a contestar seus argumentos e sua solicitação para um melhor enquadramento da discussão sobre as políticas públicas, em especial na área macroeconômica.
-------------
Paulo Roberto de Almeida
Respostas à crise: melhorar o debate?
Pedro S. Malan
O Estado de São Paulo, 12.07.2009
Qual a diferença entre um anglo-saxão, um alemão prussiano e um latino?" O grande matemático John von Neumann brincava: "Para o anglo-saxão, tudo é permitido, exceto o que for proibido; para o prussiano, tudo é proibido, exceto o que é permitido; e para o latino, tudo o que for proibido é permitido" - desde que feito com jeito e sem alarde.
Eduardo Gianetti, que conta a anedota acima (sem o meu adendo final), nota que, "estereótipos à parte, ela toca num ponto nevrálgico do ordenamento ético em qualquer sociedade - a identificação e a observação das normas demarcando a fronteira entre o proibido e o permitido. E afirma, corretamente: "Não há convivência humana possível, mesmo nos marcos da nem sempre alegre energia latina, na ausência de interdições."
Afinal, lembra ele, há 250 anos Smith notara que na ausência de "leis de justiça" amplamente acatadas, canalizando o egoísmo privado para a criação de valores publicamente reconhecidos, o mercado pode degenerar numa selva predatória. Com efeito, Smith jamais subestimou a importância de um arcabouço ético-jurídico bem constituído para que o sistema de mercado pudesse funcionar a contento - assim como para que governos pudessem funcionar sem degenerar em selvas predatórias, em que cada um procura "defender" e ampliar o seu "espaço" e os de sua grei.
Talvez por isso, José Guilherme Merquior insistia em afirmar que o bom combate não era contra o Estado, mas contra o aparelhamento e o uso do Estado para propósitos ideológico-partidários e contra formas espúrias, indevidas e não-transparentes de apropriação privada de recursos públicos.
Por que essas lembranças me vêm à mente? Primeiro, por acompanhar de perto a melhor mídia brasileira, extraordinário instrumento de que o País dispõe para um ativo diálogo consigo mesmo - tanto sobre suas mazelas como sobre suas enormes possibilidades. Segundo, por ter sempre presente aquilo que R. DaMatta, desenvolvendo tema explorado por S. B. de Hollanda no indispensável Raízes do Brasil, descreveu como nossa relativa "aversão ao cotidiano": nossa preferência por grandes sonhos e projetos abrangentes em detrimento da busca de eficácia na gestão do dia a dia - necessária para alcançar qualquer objetivo, ainda que definido com base em ousados projetos para o longo prazo.
Apenas um exemplo para ilustrar. Em artigo recente, publicado na página 3 de um dos maiores jornais do País, o presidente da principal instituição de pesquisa e planejamento econômico e social do governo escreve: "O Estado necessário para o século 21 precisa incorporar novas premissas fundamentais. A primeira passa pela reinvenção do mercado. A segunda compreende a mudança na relação do Estado com a sociedade. A terceira premissa deve convergir para a mudança na relação do Estado para com o fundo público" (sic). O fascinante é que, no mesmo artigo, o autor escreve: "Hoje, pelo menos dois quintos dos brasileiros são analfabetos funcionais." Vá alguém entender a relação disso com as três "premissas".
A terceira razão das lembranças iniciais deste artigo diz respeito às consequências da combinação da grave crise global - que evidentemente nos afeta - com a campanha eleitoral há muito abertamente antecipada pelo governo. Em momentos como este, é fundamental um esforço, dentre as pessoas de boa-fé e honestidade intelectual, por melhorar a qualidade do debate público. O espaço permite-me apenas mencionar três razões ou exemplos.
A uma, não existe, a meu ver, uma política macroeconômica de esquerda, progressista e desenvolvimentista à qual se contraporia uma política macroeconômica de direita, monetarista, conservadora e neoliberal. Não há, ou não deveria haver, maniqueísmos nesse campo. Na verdade, há um espectro de políticas macro mais ou menos adequadas do ponto de vista de sua consistência intertemporal. E um legítimo debate profissional sobre o grau de responsabilidade, de coerência e de credibilidade de uma dada política. A qualidade desse tipo de debate tem melhorado no Brasil, apesar das tentativas em contrário.
A duas, não existe ou não deveria existir, a meu juízo, quando se está discutindo, de boa-fé, na prática, a eficácia de uma política pública específica numa área definida, seja educação, saúde ou segurança, uma posição de esquerda, ou progressista, ou desenvolvimentista em oposição maniqueísta a uma outra posição de direita, ou fiscalista, ou neoliberal. (Milton Friedman, por exemplo, sempre foi um ardoroso defensor da ideia de transferências diretas de renda aos mais pobres, sem quaisquer condições.)
A três, há claros limites para a expansão acelerada dos gastos governamentais, mesmo quando justificáveis como importantes para reduzir injustiças sociais ou mitigar efeitos de crises econômicas como a atual. Como disse Luiz Felipe de Alencastro, "a ideia de que se pode alcançar a justiça social à custa das ações do Estado chegou ao limite. É preciso buscar novos caminhos e mobilizar a sociedade num ambiente onde atuem mecanismos de mercado".
Concluindo: é desonestidade intelectual, além de falta de ética no debate público, imputar a indivíduos e a supostas escolas de pensamento a que pertenceriam o descaso com o desenvolvimento econômico e a inclusão social, porque essa "preocupação" teria sido já apropriada e transformada em monopólio de autointitulados "social-desenvolvimentistas". Vimos recentemente a tentativa de um partido de se apropriar do monopólio da ética na política. Deu no que deu. O enfrentamento das difíceis escolhas à frente seria mais efetivo se pudéssemos perder menos tempo, talento e energia com falsos dilemas, dicotomias simplórias, diálogos de surdos, pregações dirigidas aos já convertidos e rotulagens destituídas de sentido, exceto para militantes sempre ansiosos por simplórias palavras de ordem. O Brasil merece algo melhor em termos de qualidade de debate público.
A despeito de que alguns, provavelmente os mesmos que dividem o mundo das políticas públicas entre desenvolvimentistas e neoliberais, gostariam de imputar ao ex-ministro o epíteto de liberal, desafio, esses mesmos a contestar seus argumentos e sua solicitação para um melhor enquadramento da discussão sobre as políticas públicas, em especial na área macroeconômica.
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Paulo Roberto de Almeida
Respostas à crise: melhorar o debate?
Pedro S. Malan
O Estado de São Paulo, 12.07.2009
Qual a diferença entre um anglo-saxão, um alemão prussiano e um latino?" O grande matemático John von Neumann brincava: "Para o anglo-saxão, tudo é permitido, exceto o que for proibido; para o prussiano, tudo é proibido, exceto o que é permitido; e para o latino, tudo o que for proibido é permitido" - desde que feito com jeito e sem alarde.
Eduardo Gianetti, que conta a anedota acima (sem o meu adendo final), nota que, "estereótipos à parte, ela toca num ponto nevrálgico do ordenamento ético em qualquer sociedade - a identificação e a observação das normas demarcando a fronteira entre o proibido e o permitido. E afirma, corretamente: "Não há convivência humana possível, mesmo nos marcos da nem sempre alegre energia latina, na ausência de interdições."
Afinal, lembra ele, há 250 anos Smith notara que na ausência de "leis de justiça" amplamente acatadas, canalizando o egoísmo privado para a criação de valores publicamente reconhecidos, o mercado pode degenerar numa selva predatória. Com efeito, Smith jamais subestimou a importância de um arcabouço ético-jurídico bem constituído para que o sistema de mercado pudesse funcionar a contento - assim como para que governos pudessem funcionar sem degenerar em selvas predatórias, em que cada um procura "defender" e ampliar o seu "espaço" e os de sua grei.
Talvez por isso, José Guilherme Merquior insistia em afirmar que o bom combate não era contra o Estado, mas contra o aparelhamento e o uso do Estado para propósitos ideológico-partidários e contra formas espúrias, indevidas e não-transparentes de apropriação privada de recursos públicos.
Por que essas lembranças me vêm à mente? Primeiro, por acompanhar de perto a melhor mídia brasileira, extraordinário instrumento de que o País dispõe para um ativo diálogo consigo mesmo - tanto sobre suas mazelas como sobre suas enormes possibilidades. Segundo, por ter sempre presente aquilo que R. DaMatta, desenvolvendo tema explorado por S. B. de Hollanda no indispensável Raízes do Brasil, descreveu como nossa relativa "aversão ao cotidiano": nossa preferência por grandes sonhos e projetos abrangentes em detrimento da busca de eficácia na gestão do dia a dia - necessária para alcançar qualquer objetivo, ainda que definido com base em ousados projetos para o longo prazo.
Apenas um exemplo para ilustrar. Em artigo recente, publicado na página 3 de um dos maiores jornais do País, o presidente da principal instituição de pesquisa e planejamento econômico e social do governo escreve: "O Estado necessário para o século 21 precisa incorporar novas premissas fundamentais. A primeira passa pela reinvenção do mercado. A segunda compreende a mudança na relação do Estado com a sociedade. A terceira premissa deve convergir para a mudança na relação do Estado para com o fundo público" (sic). O fascinante é que, no mesmo artigo, o autor escreve: "Hoje, pelo menos dois quintos dos brasileiros são analfabetos funcionais." Vá alguém entender a relação disso com as três "premissas".
A terceira razão das lembranças iniciais deste artigo diz respeito às consequências da combinação da grave crise global - que evidentemente nos afeta - com a campanha eleitoral há muito abertamente antecipada pelo governo. Em momentos como este, é fundamental um esforço, dentre as pessoas de boa-fé e honestidade intelectual, por melhorar a qualidade do debate público. O espaço permite-me apenas mencionar três razões ou exemplos.
A uma, não existe, a meu ver, uma política macroeconômica de esquerda, progressista e desenvolvimentista à qual se contraporia uma política macroeconômica de direita, monetarista, conservadora e neoliberal. Não há, ou não deveria haver, maniqueísmos nesse campo. Na verdade, há um espectro de políticas macro mais ou menos adequadas do ponto de vista de sua consistência intertemporal. E um legítimo debate profissional sobre o grau de responsabilidade, de coerência e de credibilidade de uma dada política. A qualidade desse tipo de debate tem melhorado no Brasil, apesar das tentativas em contrário.
A duas, não existe ou não deveria existir, a meu juízo, quando se está discutindo, de boa-fé, na prática, a eficácia de uma política pública específica numa área definida, seja educação, saúde ou segurança, uma posição de esquerda, ou progressista, ou desenvolvimentista em oposição maniqueísta a uma outra posição de direita, ou fiscalista, ou neoliberal. (Milton Friedman, por exemplo, sempre foi um ardoroso defensor da ideia de transferências diretas de renda aos mais pobres, sem quaisquer condições.)
A três, há claros limites para a expansão acelerada dos gastos governamentais, mesmo quando justificáveis como importantes para reduzir injustiças sociais ou mitigar efeitos de crises econômicas como a atual. Como disse Luiz Felipe de Alencastro, "a ideia de que se pode alcançar a justiça social à custa das ações do Estado chegou ao limite. É preciso buscar novos caminhos e mobilizar a sociedade num ambiente onde atuem mecanismos de mercado".
Concluindo: é desonestidade intelectual, além de falta de ética no debate público, imputar a indivíduos e a supostas escolas de pensamento a que pertenceriam o descaso com o desenvolvimento econômico e a inclusão social, porque essa "preocupação" teria sido já apropriada e transformada em monopólio de autointitulados "social-desenvolvimentistas". Vimos recentemente a tentativa de um partido de se apropriar do monopólio da ética na política. Deu no que deu. O enfrentamento das difíceis escolhas à frente seria mais efetivo se pudéssemos perder menos tempo, talento e energia com falsos dilemas, dicotomias simplórias, diálogos de surdos, pregações dirigidas aos já convertidos e rotulagens destituídas de sentido, exceto para militantes sempre ansiosos por simplórias palavras de ordem. O Brasil merece algo melhor em termos de qualidade de debate público.
sábado, 11 de julho de 2009
1215) Esqueça a desnuclearização: um realista estratégico
Why We Don't Want a Nuclear-Free World
The former defense secretary on the U.S. deterrent and the terrorist threat.
By MELANIE KIRKPATRICK
The Wall Street Journal, 11.07.2009
'Nuclear weapons are used every day." So says former Defense Secretary James Schlesinger, speaking last month at his office in a wooded enclave of Maclean, Va. It's a serene setting for Doomsday talk, and Mr. Schlesinger's matter-of-fact tone belies the enormity of the concepts he's explaining -- concepts that were seemingly ignored in this week's Moscow summit between Presidents Barack Obama and Dmitry Medvedev.
We use nuclear weapons every day, Mr. Schlesinger goes on to explain, "to deter our potential foes and provide reassurance to the allies to whom we offer protection."
(...)
"The notion that we can abolish nuclear weapons reflects on a combination of American utopianism and American parochialism. . . . It's like the [1929] Kellogg-Briand Pact renouncing war as an instrument of national policy . . . . It's not based upon an understanding of reality."
A world without nukes would be even more dangerous than a world with them, Mr. Schlesinger argues.
Lei a íntegra desta entrevista neste link.
The former defense secretary on the U.S. deterrent and the terrorist threat.
By MELANIE KIRKPATRICK
The Wall Street Journal, 11.07.2009
'Nuclear weapons are used every day." So says former Defense Secretary James Schlesinger, speaking last month at his office in a wooded enclave of Maclean, Va. It's a serene setting for Doomsday talk, and Mr. Schlesinger's matter-of-fact tone belies the enormity of the concepts he's explaining -- concepts that were seemingly ignored in this week's Moscow summit between Presidents Barack Obama and Dmitry Medvedev.
We use nuclear weapons every day, Mr. Schlesinger goes on to explain, "to deter our potential foes and provide reassurance to the allies to whom we offer protection."
(...)
"The notion that we can abolish nuclear weapons reflects on a combination of American utopianism and American parochialism. . . . It's like the [1929] Kellogg-Briand Pact renouncing war as an instrument of national policy . . . . It's not based upon an understanding of reality."
A world without nukes would be even more dangerous than a world with them, Mr. Schlesinger argues.
Lei a íntegra desta entrevista neste link.
1214) Flip: Empulhações literárias - Diogo Mainardi
Eu sempre desconfiei que fosse assim mesmo, e por isso passo por cima, batido, dessas matérias de imprensa que são de uma admiração beata e basbaque por algumas figuras literárias que pousam, literalmente (mas não literariamente), em Paraty, revelando apenas a ignorância jornalística e o conformismo com vedetes, vacas sagradas e outras figuras patéticas.
A badalação em torno de Flip, o Festival Literário Internacional de Paraty, deve fazer parte do empreemdimento comercial que está por trás do evento anual. Deve ser muito aborrecido, inclusive porque a cidade é mais pretensiosa do que confortável...
Enfim, apenas para introduzir a crônica de Diogo Mainardi, na Veja que começa a circular neste sábado 11 de julho de 2009.
Paulo Roberto de Almeida
Edna entendeu tudo
Diogo Mainardi
Veja, edição 2121, 15 de julho de 2009
"Edna O’Brien foi arrastada a um encontro entre Chico Buarque e Milton Hatoum. O que ela afirmou, assim que conseguiu escapar do encontro? Que Chico Buarque era uma fraude. O que ela afirmou em seguida, durante o jantar? Que se espantou com a empáfia e com o desconhecimento literário dos dois autores"
Edna O’Brien está fazendo um conto sobre "Chico". Ela pronuncia "Chico" com um "T" na frente, como em Chico Marx. Por isso mesmo, "Chico", em seu conto, ganhou o nome de Harpo, como em Harpo Marx. Mas o inspirador da festejada escritora irlandesa – pode bater no peito – é o nosso "Chico": Chico Buarque.
Edna O’Brien conheceu "Chico" uma semana atrás, na Flip, em Paraty. Depois de participar de um debate, ela foi arrastada a um encontro entre Chico Buarque e Milton Hatoum. O que ela afirmou, assim que conseguiu escapar do encontro? Que Chico Buarque era uma fraude. O que ela afirmou em seguida, durante o jantar? Que se espantou com a empáfia e com o desconhecimento literário dos dois autores. E o que ela repetiu para mim, alguns dias mais tarde, em outro jantar, no Rio de Janeiro? Que Chico Buarque era uma fraude, que ela se espantou com sua empáfia e com seu desconhecimento literário, e que se espantou mais ainda com sua facilidade para enganar a plateia da Flip.
No conto de Edna O’Brien, Chico Buarque – ou Harpo – é tratado como "Astro do rock". O personagem é inspirado em Chico Buarque, mas tem também umas pitadas de Bono, do U2, admirador de Edna O’Brien. A narradora – uma autora irlandesa – está numa feira literária no Brasil. De alguma maneira, ela é inserida no séquito de um cantor que, como Chico Buarque, se meteu a fazer romances. Há uma atmosfera onírica no conto. Essa atmosfera onírica foi estimulada pelo fato de Edna O’Brien, nas quatro noites que passou em Paraty, atormentada pela batucada permanente do lado de fora da janela de seu hotel, nunca ter dormido. Quando saiu de Paraty, ela se refugiou no Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, mas continuou insone, atormentada pela festa de casamento de Pato, o jogador do Milan, com Sthefany Brito, a atriz de Chiquititas. Sthefany é com "Y", como Paraty, e "Chiquitita" tem um "T" na frente, como Chico Marx.
Eu já resenhei um romance de Chico Buarque: Benjamim. Nele, um homem à beira da morte relembra o passado, misturando realidade e sonho. Em Leite Derramado, seu último romance, um homem à beira da morte relembra o passado, misturando realidade e sonho. Chico Buarque, como Harpo, é o buzinador das letras: fon-fon. Ele está para a literatura assim como Dilma Rousseff está para as teses de mestrado. Ou assim como José Sarney está para Agaciel Maia. Edna O’Brien passou apenas uma semana no Brasil. Mas ela entendeu tudo: neste país fraudulento, o que mais espanta é a facilidade para enganar a plateia, enquanto a batucada continua do lado de fora.
A badalação em torno de Flip, o Festival Literário Internacional de Paraty, deve fazer parte do empreemdimento comercial que está por trás do evento anual. Deve ser muito aborrecido, inclusive porque a cidade é mais pretensiosa do que confortável...
Enfim, apenas para introduzir a crônica de Diogo Mainardi, na Veja que começa a circular neste sábado 11 de julho de 2009.
Paulo Roberto de Almeida
Edna entendeu tudo
Diogo Mainardi
Veja, edição 2121, 15 de julho de 2009
"Edna O’Brien foi arrastada a um encontro entre Chico Buarque e Milton Hatoum. O que ela afirmou, assim que conseguiu escapar do encontro? Que Chico Buarque era uma fraude. O que ela afirmou em seguida, durante o jantar? Que se espantou com a empáfia e com o desconhecimento literário dos dois autores"
Edna O’Brien está fazendo um conto sobre "Chico". Ela pronuncia "Chico" com um "T" na frente, como em Chico Marx. Por isso mesmo, "Chico", em seu conto, ganhou o nome de Harpo, como em Harpo Marx. Mas o inspirador da festejada escritora irlandesa – pode bater no peito – é o nosso "Chico": Chico Buarque.
Edna O’Brien conheceu "Chico" uma semana atrás, na Flip, em Paraty. Depois de participar de um debate, ela foi arrastada a um encontro entre Chico Buarque e Milton Hatoum. O que ela afirmou, assim que conseguiu escapar do encontro? Que Chico Buarque era uma fraude. O que ela afirmou em seguida, durante o jantar? Que se espantou com a empáfia e com o desconhecimento literário dos dois autores. E o que ela repetiu para mim, alguns dias mais tarde, em outro jantar, no Rio de Janeiro? Que Chico Buarque era uma fraude, que ela se espantou com sua empáfia e com seu desconhecimento literário, e que se espantou mais ainda com sua facilidade para enganar a plateia da Flip.
No conto de Edna O’Brien, Chico Buarque – ou Harpo – é tratado como "Astro do rock". O personagem é inspirado em Chico Buarque, mas tem também umas pitadas de Bono, do U2, admirador de Edna O’Brien. A narradora – uma autora irlandesa – está numa feira literária no Brasil. De alguma maneira, ela é inserida no séquito de um cantor que, como Chico Buarque, se meteu a fazer romances. Há uma atmosfera onírica no conto. Essa atmosfera onírica foi estimulada pelo fato de Edna O’Brien, nas quatro noites que passou em Paraty, atormentada pela batucada permanente do lado de fora da janela de seu hotel, nunca ter dormido. Quando saiu de Paraty, ela se refugiou no Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, mas continuou insone, atormentada pela festa de casamento de Pato, o jogador do Milan, com Sthefany Brito, a atriz de Chiquititas. Sthefany é com "Y", como Paraty, e "Chiquitita" tem um "T" na frente, como Chico Marx.
Eu já resenhei um romance de Chico Buarque: Benjamim. Nele, um homem à beira da morte relembra o passado, misturando realidade e sonho. Em Leite Derramado, seu último romance, um homem à beira da morte relembra o passado, misturando realidade e sonho. Chico Buarque, como Harpo, é o buzinador das letras: fon-fon. Ele está para a literatura assim como Dilma Rousseff está para as teses de mestrado. Ou assim como José Sarney está para Agaciel Maia. Edna O’Brien passou apenas uma semana no Brasil. Mas ela entendeu tudo: neste país fraudulento, o que mais espanta é a facilidade para enganar a plateia, enquanto a batucada continua do lado de fora.
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