sábado, 30 de janeiro de 2010

1884) Uma frase, um gesto, um vínculo em torno do Maquiavel...

Ter amigos atentos e inteligentes é um privilégio como poucos na vida, mesmo se a distância não nos permite um contato tão frequente quanto desejável. Amigos assim sempre nos fazem, e trazem, surpresas agradáveis, ainda que inesperadas, mas sempre generosas, pela espontaneidade do gesto e a imensa cortesia que eles encerram.
Pois fui confortado com duas surpresas assim, a propósito do recente lançamento eletrônico (ou digital, como queiram), de meu livro:

O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado

O Embaixador de Portugal em Paris, Francisco Seixas da Costa, que mantém um blog, Duas ou Três Coisas (notas pouco diárias do embaixador português em Fança), que eu classificaria de propriamente indispensável -- por prazeiroso, intelectual, leve e ao mesmo tempo denso -- , fez-me o favor de anunciar esse lançamento virtual em um post especial, do sábado, 23 de janeiro de 2010, simplesmente intitulado e-book.
Nele, escreveu o seguinte:

Um amigo brasileiro, diplomata e prolífico escritor da área das relações internacionais, mandou-me um convite para o "lançamento virtual", hoje, de um seu e-book, isto é, um livro em edição eletrónica, que pode ser adquirido aqui. A sessão tem como ponto alto um "chat" com o autor, a ter lugar aqui [PRA: link para o chat eletrônico, já inexistente]. Para o convite ser completo, só não fica clara a forma como poderemos ter acessos aos salgadinhos que estas ocasiões sempre proporcionam.

O mundo muda muito...


Bem, só posso ficar lisonjeado com o anúncio gratuito, ou propaganda voluntária, e dizer que representou mais uma oportunidade para percorrer esse blog altamente simpático e cativante, no qual também pesquei uma frase que se aplica, mutatis mutandis, ao meu caso.
Com efeito, meus amigos e leitores -- assim como vários editores preocupados -- sempre reclamam que eu escrevo demais, me alongo em determinados assuntos, vou buscar seus precedentes no pleistoceno superior -- às vezes no pré-cambriano da história --, faço todas as conexões com o cenário mundial, bref, que sou prolixo e demasiado "completo" (como se isso fosse um defeito, o que em vários casos o é, efetivamente).
Pois recupero, no blog do Embaixador Seixas da Costa, uma frase, num post sobre uma nova passagem de Portugal pelo CSNU, que diz o seguinte:

"Este é um post longo. Como diria alguém, não tenho tempo para ser sintético."

Com permissão do Embaixador, e sua magnanimidade pelo não recolhimento de direitos autorais, mas atribuindo-lhe o devido copyright, ou pelo menos os direitos morais pela frase (que ele talvez já emprestou de alguém), cada vez que um editor ou responsável de publicação reclamar do tamanho de meus textos, vou passar a dizer:

"Mil perdões pela extensão do texto, mas não tive tempo de ser breve..."

Finalizando, desejo também agradecer a Glauciane Carvalho a gentileza de ter colocado, em seu excelente blog, uma chamada para o lançamento desse meu livro sobre Maquiavel e em torno do Príncipe.
Essa seção especial sobre o "meu" Maquiavel foi feita com tanta graça, competência e refinamento técnico -- habilidades que eu nunca conseguiria ter -- que eu só posso ficar agradecido a ela pela imensa gentileza do gesto.
Veja este anúncio de indicação de leitura aqui.
(e ainda temos direito a uma excelente sessão musical)

1883) Ainda os avioes da FAB; estendendo o debate

Meu leitor e comentarista habitual Vinicius Portella acrescentou mais um comentário a este post anterior:

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010
1871) Ainda os aviões da FAB: uma opinião bem informada

Recomendo aos que ainda não o leram, que o façam, pois traz uma "opinião" extremamente bem informada, e sensata, sobre o assunto.
Pois, em função disso, meu amigo Vinicius Portella perguntou-me o que segue:

"Paulo,
Creio que, neste texto, o brigadeiro Teomar Fonseca Quírico nos fornece elementos importantes para o debate sobre esse tema; ressalvando-se, todavia, seu tom de devoção em determinadas passagens. Um dos pontos de maior importância nessa discussão diz respeito à transferência de tecnologia. Que considerações fazes sobre isso? Penso que tenhas coisas importantes a dizer sobre isso.
Um grande abraço, espero tua resposta."

Acabo de responder-lhe o que segue"

Vinicius Portella,
Agradeço a generosidade do comentário e sua benevolência com os meus posts, assim como com meus parcos argumentos em torno dessa questão, mas eu não tenho capacidade, ou simplesmente competência, para estender-me num debate técnico em torno da escolha correta dos aviões da FAB.
Minha única competência relativa consiste em, sendo um cidadão consciente e bem informado, perceber alguns aspectos do processo decisório que deve presidir a toda e qualquer escolha governamental de certa importância. E esta, envolvendo bilhões de reais, e aviões que vão servir por pelo menos duas décadas, certamente é muito importante para ser deixadaa apenas ao argumento canhestro do "eu decido", a "relação é estratégica", ou ainda "a decisão é política".
Essa variante do "l'Etat c'est moi" eu simplesmente não aceito.
Sobretudo porque ela implicaria desprezar o trabalho de meses e meses de dezenas, talvez centenas de servidores abnegados da FAB, que fizeram um trabalho técnico dos mais sérios, para chegar a uma conclusão, qualquer que seja ela, importante no plano operacional da Força Aérea.
Ora, desprezar isso, com o gesto absolutista do "eu decido", representa não apenas descartar o trabalho sério da FAB, mas desprezar a opinião pública do Brasil de modo tão arrogante a ponto de ser inaceitável.
Paulo Roberto de Almeida
(30.01.2010)

1882) Partilha compulsoria de lucros: os autores intelectuais

Surgiu uma controvérsia a respeito da idéia -- autoritária, dirigista e sempre 'expropriatória' do capital, a respeito de um projeto de lei que o governo pretenderia fazer aprovar ainda em 2010 (para dela extrair resultados eleitorais, provavelmente), tendente a obrigar as empresas a destinar 5% de seus lucros para os trabalhadores, numa nova ofensiva contra o direito de propriedade que já não deve surpreender neste governo. Obviamente, não se cogita de dividir a responsabilidade por perdas e prejuizos, cujos custos e riscos ficam inteiramente com o patrão, ou dono do capital, apenas os lucros, que, por definição, são a remuneração do capital.
A matéria abaixo deixa claro a responsabilidade moral e política pelo projeto e sua autoria intelectual.

Lula estimulou partilha de lucros, diz Mangabeira
VANNILDO MENDES - Agencia Estado
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010, 12:29

BRASÍLIA - Autor do projeto que determina a distribuição compulsória de 5% dos lucros das empresas para os empregados, o ex-ministro de Assuntos Estratégicos Roberto Mangabeira Unger afirmou ontem que a cúpula do governo não só sabia como estimulou a proposta. Em entrevista por e-mail, ele disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva era um defensor "entusiasmado" da proposta e os ministros da Justiça, Tarso Genro, e do Trabalho, Carlos Lupi, colaboraram diretamente na sua elaboração. "Conduzi esse trabalho com o apoio entusiasmado do presidente Lula e em estreita colaboração com meus amigos colegas ministros, sobretudo os do Trabalho e da Justiça", garantiu Mangabeira, que hoje é professor na Universidade Harvard.

A afirmação contradiz declaração do ministro da Justiça, segundo a qual a obrigatoriedade da partilha de lucros, hoje entregue à negociação direta entre empregados e empregadores, não passa de "estudo" e não foi objeto de análise e decisão de sua pasta nem do governo. O projeto tem nove artigos e integra um documento de 67 páginas, chamado Reconstrução das Relações Capital-Trabalho, que Mangabeira diz ter produzido após um ano e meio de análises e discussões com entidades representativas de trabalhadores e do setor empresarial.

Lei
Prevista na Constituição, a participação de empregados no lucro das empresas é disciplinada pela Lei nº 10.101, editada em 2000 pelo governo Fernando Henrique Cardoso. O texto remete os critérios da distribuição à livre negociação entre as partes e não fixa um porcentual de partilha. O novo texto, na prática, anularia a lei vigente e tornaria a distribuição compulsória, fixando a cota de 5%.

Desse montante, se aprovada a proposta, 2% serão transferidos de forma linear a todos os empregados. Os 3% restantes devem ser distribuídos conforme critério interno de gestão da empresa, em razão do mérito individual, produtividade e resultados.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

1881) Enquanto isso, no outro Forum Social...

Certos comportamentos são atávicos: uma vez estatizante, sempre estatizante. Basta surgir uma oportunidade, como a recente crise financeira, por exemplo, cuja culpa deve ser debitada inteiramente a banqueiros gananciosos, brancos, loiros, de olhos azuis, como diria um não economista. Os governos, que criaram as oportunidades de especulação e para a formação de bolhas, não tem obviamente nada a ver com a confusão.
Pois este economista alternativo propõe a nacionalização do sistema bancário.
Fazia tempo que alguém desse campo, que prefere viver de dinheiro privado, em lugar de estatizar o setor, não tinha uma idéia tão brilhante...

Em Salvador, Singer defende a nacionalização de bancos
ANA CONCEIÇÃO
Agencia Estado, sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

SALVADOR - Após a atuação dos bancos públicos brasileiros, que elevaram a oferta de crédito durante o período mais agudo da crise financeira internacional, o tema da nacionalização das instituições financeiras voltou ao debate durante o Fórum Social Temático de Salvador. A medida foi defendida hoje por Paul Singer, titular da Secretaria Nacional de Economia Solidária, do Ministério do Trabalho. "O que salvou o Brasil na crise é que quase metade do sistema bancário é público", disse. Depois, citou exemplos de países que saíram bem da crise, como Índia e China, "onde os bancos também são públicos".

Para o economista e professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP), se o sistema bancário continuar sem regulação uma nova crise financeira deverá surgir em prazo de dois a quatro anos. "(O presidente dos Estados Unidos Barack) Obama está na ofensiva contra os bancos, mas a solução é nacionalizar. Lá os bancos foram salvos pelo dinheiro público", defendeu.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

1880) Livro: retirando o mofo do Itamaraty

Estou lendo, para fins de resenha e análise este livro:

Ovídio de Andrade Melo:
Recordações de um Removedor de Mofo no Itamaraty
(Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009, 192 p; ISBN: 978-85-7631-175-5)

São memórias seletivas de diplomata que, de 1950 a 1986, serviu em diversos consulados, em Washington junto à OEA, chefiou a DNU numa época (1965-68) em que as três potências nucleares impunham o TNP -- que o Brasil recusou, inclusive com base em sua argumentação -- , foi Cônsul-Geral em Londres de 1968 a 1976 e, no intervalo, Embaixador especial durante a independência de Angola (ali permanecendo durante a fase decisiva da implantação do governo do MPLA), tendo depois servido de Embaixador comissionado em Bangkok e em Kingston, e foi o primeiro Embaixador pleno na "Nova República" (em 1985). Aposentou-se em 1990.

A remoção de 'mofo', do título, se refere ao arejamento do Itamaraty, ainda marcado, em seu tempo, por certa subserviência à política internacional das grandes potências, tarefa para a qual ele diz ter contribuído em vários aspectos. Essas memórias, ou recordações, trazem passagens importantes, que merecem uma referência pontual e uma análise mais detida.

O aspecto mais paradoxal deste livro, para quem pretende arejar o Itamaraty e remover o seu "mofo", está, talvez, em certo "saudosismo" da chamada política externa independente, não necessariamente pelo seu conceito formal -- o de ser independente -- mas pelo seu propósito substantivo de fazer o Brasil aderir a certos conceitos ou posturas de épocas passadas que, tanto quanto a suposta adesão indevida aos padrões alegadamente submissos da Guerra Fria, refletem uma visão do mundo de certo modo embolorada, muito próxima de certas teorias conspiratórias que pretendem que as grandes potências sempre pretenderam nos colonizar de fato.

Para quem adere a esse tipo de visão, trata-se de um prato cheio. Para os mais circunspectos, como eu, cabe uma leitura atenta e refletida. Em todo caso, pode-se aprender muito com o Itamaraty dos "velhos tempos", tanto o alinhado com os EUA, quanto o insubmisso e rebelde à recolonização...

Paulo Roberto de Almeida (29.01.2010)

1879) FSM, dia 4: uma hegemonia esqualida, quase diafana

Para todos aqueles que seguem os debates diários que "ocorrem" -- o termo correto, na verdade, seria "são perpetrados" -- no Fórum Social Mundial de Porto Alegre, a impressão que se tem - a partir dos resumos diários, claro, pois assistir ao vivo deve representar um sacrifício muito grande a qualquer pessoa sã de espírito ou dotada de certa alergia à estupidez e à burrice, como é o meu caso -- é a de uma imensa cacofonia, a de uma improvisão sem limites e, sobretudo, a de uma ausência completa de idéias, ou de propostas inteligíveis, consistentes, aplicáveis, factíveis, exequíveis, sensatas, economicamente viáveis, etc., etc., etc... (desculpem a redundância dos sinônimos, mas eles são diretamente proporcionais aos pleonasmos cometidos no FSM).
Pois bem, com base no resumo de hoje, eu me permito destacar algumas pérolas. Depois, com tempo, vou selecionar todas as pérolas de todos os debates ocorridos, pois algumas delas são realmente impagáveis, concorrendo, com folga, com aquelas pérolas de vestibular e dos provões (tipo ENEM e ENADE) que regularmente professores mal intencionados fazem circular pela internet, apenas para espezinhar e humilhar aluninhos eventualmente desprovidos de maior intimidade com a língua pátria ou com simples regras de lógica elementar.

RESUMO – 28.01: mesa “Elementos da nova agenda II: Como Construir uma Hegemonia Política”

Já de início, a conclusão dessa mesa, sobre a construção da nova hegemonia, demonstra um caso extremo de gramscismo surrealista, ou, digamos, "leninismo do crioulo doido", uma assemblagem heteróclita de elementos dispersos, que faria os dois personagens em questão revirarem-se em seus túmulos (no caso de Lênin, sua múmia ficaria verde de raiva, pois que ela já é pintada regularmente de vermelho róseo). Vejamos:

"Os participantes da mesa “Como Construir uma Hegemonia” foram unânimes em avaliar que um novo socialismo está sendo desenhado pelos movimentos sociais. A construção da nova hegemonia política depende da diversidade. E esse foi o grande salto dessa discussão nos últimos anos. Se as primeiras a luta [sic] pela implementação de uma sociedade socialista vinha a reboque do proletariado organizado, o socialismo do século 21 se dará pelo esforço daqueles que lutam pelos direitos dos povos indígenas, pelo fim do sexismo, contra o preconceito racial, pelo direitos humanos, pela apropriação dos meios de comunicação e de todos os demais movimentos sociais."
PRA: OK, OK, os novo socialismo sairá dessa nova e santa aliança dos movimentos sociais, sem esquecer o GLTBs...

Aquele português maluco da Universidade de Coimbra (que já produziu coisas melhores), doido de pedra e criminoso intelectual -- que pretende que o MST vem sendo perseguido injustamente pelo Ministério Público e que anunciou que pediria pessoalmente a cessação de todos os processos contra esses inocentes agraristas do século 18 -- anunciou coisas verdadeiramente surpreendentes, que transcrevo, em parte:

"Para combater as democracias representativas – que como disse Virginia Vargas, em sua apresentação, vai muito além do sistema eleitoral – Boaventura sugere uma aproximação dos partidos políticos e dos movimentos sociais por meio da organização de seminários. Aceitar que a democracia tem seus limites e partidarizar os movimentos, foram só alguns caminhos apontados por Boaventura. Ele também defende que um outro mundo só será possível tirando da mão do capital os bens naturais; promovendo a justiça histórica com negros e índios e a justiça ambiental; combatendo o sexismo e integrando a América Latina. Para isso, a posição do Brasil é fundamental. “O Brasil tem que deixar de ficar entre o sim e o não em relação a todos os movimentos sociais”, disse."

Não contente com sua genial trouvaille, ele ainda anunciou outra:

"...chegou a causar espanto quando disse que o socialismo do século 21 pode até conviver com capitalistas. 'O que não pode é eles definirem a lógica do sistema. A economia solidária é que tem que fazer isso', explicou."

Ainda bem: cheguei até a pensar que eles pretendiam enforcar todos os capitalistas com as cordas que estes mesmos venderiam a esses neobolcheviques, como pretendia Lênin. Que alívio!: não vamos ter mais aquelas cenas horrríveis de revolucionários fuzilando a burguesia, sngue correndo nas ruas; todos poderão conviver em paz, desde que se submetam à "economia solidária", que poderia ser chamada de "etapa superior do besteirol altermundialista".

Mas, o português maluco tem pressa, e pretende mudar até o slogan favorito dos antiglobalizadores, o de que "um outro mundo é possível":

"Boaventura também chamou a atenção para a urgência da transformação. “Devíamos mudar o nome do Fórum para 'um outro mundo é urgente e necessário'”, disse explicando que esse modelo de produção e consumo não é mais apenas injusto, é também insustentável. A crise ambiental, lembrou, atingirá tanto Bangladesh como a Holanda."

Confesso que eu gostaria de ter estado presente para ver a cena descrita a seguir no resumo, para ver as caras de embevecimento do público, apenas para constatar se havia algum sinal de lucidez aparente:

"A platéia aplaudiu em pé quando ao término de sua apresentação disse: 'Não queremos críticos bem formados, queremos criar rebeldes competentes.'"

Mas eu de verdade me pergunto se esse pessoal junta dois neurônios para refletir, ou se tudo é fruto da teoria do caos cerebral. Vejamos esta altermundialista:

"Virginia Vargas [da Articulación Feminista Marcosur, do Peru] também trouxe a discussão para o cotidiano. Para ela, o socialismo do século 21 traz um novo horizonte de poder, onde não há divisão entre governantes e governados. 'A proposta não é substituir uma hegemonia por outra. É inventar relações não hierarquizadas, que também estão nas relações pessoais e nas relações entre as organizações', disse. Essa dinâmica, defende ela, leva à formação de um sujeito emancipado e revolucionário."

Eu sinceramente desejo sucesso nessa empreitada de "inventar relações não hierarquizadas", que leve "à formação de um sujeito emancipado e revolucionário", mas também acho que esse pessoalzinho vai ter certa dificuldade em realizar o prometido, ou desejado...

Finalmente, mesmo com toda a cobertura da grande mídia em torno do total vazio de ideias que representou o FSM - e ainda assim divulgando suas dansas e pantomimas com aqueles pézinhos sujos -- os altermundialistas ainda reclamam da imprensa:

"Rosane Bertotti [CUT, Brasil] levou para o debate o desafio da comunicação de disseminar essas questões para os diferentes públicos. 'O Fórum, por exemplo, é invisível para a grande imprensa, que não consegue entender esse espaço', disse. Além disso, as pautas de discussão não estão nos meios de comunicação. 'Precisamos intervir [para democratizar os meios de comunicação], mas também precisamos ousar e construir meios de comunicação que olhem para outra realidade econômica'."

Bem, quem já leu o Programa Nacional de Direitos Humanos-3, aquele que pretende também "democratizar a grande mídia", sabe o que esperar desse tipo de iniciativa. Eu apenas gostaria de saber qual é essa "outra realidade econômica" que eles pretendem divulgar, pois ainda não vi nas prateleiras dos supermercados da História.

Concluo, dizendo simplesmente o seguinte: estou perdendo um tempo enorme lendo os materiais do FSM, apenas para constatar o que eu já sabia: de onde menos se espera, é que não sai nada mesmo. Espreme, espreme, e o FSM continua vazio de idéias. Vai ser difícil construir o outro mundo possível pretendido.
Êta mundo impossível...

Pelo resumo:
Paulo Roberto de Almeida (29.01.2010)

1878) O debate sobre a "primarizacao" da economia brasileira

1) Primeiro a matéria do jornal que sustenta um debate que vem sendo travado desde certo tempo, sem conclusões definitivas no estado atual:

Básica e concentrada
Exportação de bens primários ganha força. Indústria perde espaço

Henrique Gomes Batista e Eliane Oliveira RIO e BRASÍLIA
O Globo, 29.01.2010

A concentração das vendas externas do país em produtos primários e o enfraquecimento da indústria ganharam força em 2009. Apenas seis produtos básicos foram responsáveis por praticamente um terço (32,17%) das exportações brasileiras: soja, minério de ferro, petróleo, açúcar, frango e farelo de soja.

No ano anterior, este grupo respondia por 27,72% das vendas brasileiras a outras nações e, em 2004, somente 20,69%. Isso ocorre porque a crise mundial afetou mais fortemente os compradores de produtos acabados brasileiros — como Estados Unidos, Europa e América Latina — e favoreceu a exportação para a China, grande compradora de bens primários e hoje o maior parceiro comercial do Brasil.

O ano de 2009 foi o primeiro em que não havia nenhum item industrializado entre os seis mais vendidos.

Entre os dez produtos mais exportados, apenas dois — aviões, na sétima posição, e automóveis, em décimo lugar no ranking — são manufaturados.

Em 2004, o top ten continha outras duas manufaturas, além das atuais: peças de automóveis e aparelhos de transmissão e recepção.

Com isso, os produtos primários responderam por 40,50% das exportações brasileiras em 2009. Esta é a primeira vez, em 20 anos, que a categoria ultrapassa os 40% do total — em 2008, estava em 36,89%. Por outro lado, os produtos manufaturados, que representaram 46,82% das vendas de 2008, passaram a significar apenas 44,02% no ano passado.

Para o economista da RC Consultores, Fábio Silveira, hoje o país está dependente das commodities, sem autonomia para planejar seu futuro, sob o ponto de vista comercial. O quadro é positivo, quando os preços sobem.

Mas uma queda nas cotações dos produtos, a curto prazo, acaba afetando negativamente a balança.

— Esta forte concentração de produtos na pauta de exportações é preocupante, pois são produtos sobre os quais o Brasil não tem qualquer controle, nem de preços, nem quantidade — confirmou o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro

Dependência deve aumentar em 2010
O Brasil vive hoje esse problema da “primarização” de sua pauta exportadora.
Alguns dizem que isso não é um problema, pois Chile, Canadá e Austrália se desenvolveram com exportações de bens primários. Há quem alegue, inclusive, que existe mais tecnologia em alguns primários, como carnes, com pesquisa genética, que em alguns manufaturados. Mas é polêmico, e o Brasil precisa saber se quer ser um grande exportador de básicos ou se quer diversificar a sua pauta — afirmou Luís Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet).

Para Lima, essa concentração tende a continuar em 2010, pois ele acredita que os grandes compradores de manufaturados do Brasil ainda estarão com economias relativamente fracas, enquanto a China deve aumentar seu apetite por produtos básicos. Em sua opinião, o país perdeu a oportunidade de, na bonança mundial, de fazer as reformas tributária e trabalhista, o que daria mais competitividade para o setor industrial brasileiro.

O governo reconhece que as commodities têm tido um papel imprescindível nas exportações. Mas argumenta que a queda da participação de manufaturados se deve ao desaquecimento da demanda mundial. Outros dois fatores são o dólar desvalorizado, que tira a rentabilidade, em reais, dos exportadores, e a concorrência chinesa em terceiros mercados.

Os setores que melhores resultados apresentaram em 2009 mostram suas estratégias. Produtores de açúcar, por exemplo, se beneficiaram da quebra de produção da Índia, o que abriu mercado ao produto nacional, com preços melhores no mercado mundial. O presidente da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Frango (Abef), Francisco Turra, disse que o segredo foi focar em mercados menos atingidos pela crise: Ásia e Oriente Médio. Outro fator considerado fundamental pelo setor foi a abertura do mercado chinês para o frango: — As vendas para Rússia, União Europeia, Japão e Venezuela caíram muito. Por isso, incrementamos negócios em outras regiões.

Segundo o vice-presidente do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, a siderurgia brasileira manteve o esforço de exportação, mesmo com queda de preços para manter os níveis de produção, tendo em vista que o mercado interno desaqueceu: — Além disso, houve a entrada em operação de novas indústrias. A queda das exportações em volume foi de 2,9% e em receita 38,8%.
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2) Agora a carta de um economista indignado com o que ele imagina ser uma traição de neoliberais, prontos para entregar o país aos donos do "Consenso de Washington" e autores intelectuais de uma volta de nossa economia a padrões coloniais:

Carta ao jornal O Globo por João Carlos Bezerra de Melo
A reprimarização da economia

Ora, até que enfim esse jornal abre as suas páginas e estampa manchete de primeira página, para noticiar, como se fosse a última novidade, o resultado do processo (que se vai agravar ainda, muito mais) de reprimarização da economia brasileira, com os seus inelutáveis efeitos sobre o balanço de transações externas correntes, sobre o nível do emprego e sobre o crescimento econômico, enfim.

O que não faz a parcialidade sistemática com que esse obstinado porta-voz da classe dominante (vale dizer dos grandes oligopólios financeiros e sua camarilha, poderosa o suficiente para abranger, envolver e, digamos, e$timularcerto tipo hegemônico de colunistas econômicos da grande mídia - ataca, por todos os meios o atual governo?

Afinal, (quem diria?), denuncia O GLOBO o óbvio fenômeno, não natural nem casual, mas resultante de uma persistente, proposital e criminosa política cambial, contra a qual nós, os economistas não alinhados sob a bandeira inimiga dos lesa-pátria neoliberais, vimos nos batendo, anos a fio.

Aplausos, pois, para o tardio despertar d'O GLOBO. Porém, a um só tempo, veemente (a mais veemente) condenação, por não haver contado toda a história: O câmbio sobrevalorizado, em que reside a causa do objeto da "denúncia" tardia, se mantém como herança dos tempos não saudosos do tucanato servil aos postulados do Consenso de Washington (cujos prepostos, no atual governo, suportam o insider Meirelles no comando do independente Banco Central); e tem como corolário a total desregulamentação (por que não dizer orgia?) dos fluxos financeiros e dos juros estratosféricos, que ganham o topo do pódio mundial, se é que cabe a imagem no contexto de tão sinistro certame. Esse outro lado da verdade, O GLOBO não conta e, omitindo-o, exerceu o seu sempre presente papel de desinformar o seu público leitor, no que diz respeito à realidade brasileira.

Mais uma vez, na contra-mão da História e do interesse da nacionalidade, O GLOBO perdeu um belo momento para contar a história toda, completa, sem omitir nem escamotear a verdade. E de perguntar aos virtuais candidatos à Presidência da República: Quem dos senhores subscreve o compromisso de disciplinar os fluxos financeiros internacionais e promover uma política cambial realista e patriótica que evite o retorno do País à condição de uma grande plantation?

João Carlos Bezerra de Melo, economista, assinante de O GLOBO

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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...