sábado, 14 de maio de 2011

Um peso, duas medidas: Chavez e as FARC (y otras cositas mas...)

Nem tudo está dito: quando do anúncio de um acordo militar entre a Colômbia e os EUA, para o uso de bases militares colombianas por pessoal militar americana engajado em cooperação técnica, certo chanceler brasileiro ficou quase tão histérico quanto os venezuelanos (porque supostamente as bases seriam uma preparação de uma proxy war dos EUA contra o coronel Chávez); o Brasil exigiu que o assunto fosse examinado e que tudo estivesse transparente em reuniões sul-americanas, preferencialmente para sabotar e impedir tal acordo.
Quando da invasão do território equatoriano por forças colombianas que mataram esse líder guerrilheiro das FARC e capturaram o material de que se fala abaixo, o mesmo chanceler ficou ainda mais histérico, e lutou para obter uma condenação da Colômbia na OEA e em outras instâncias latino-americanas. Foi de uma parcialidade exemplar, pois logo depois se anunciou a captura de mísseis manuais venezuelanos em poder das FARC e o mesmo chanceler histérico duvidou que a notícia fosse verdadeira. Jamais uma nota sequer se referiu, por exemplo, ao envio de tanques e aglomeração de tropas venezuelanas nas fronteiras da Colômbia (quando os problemas com o Equador se processavam a centenas de quilômetros dali, na fronteira com o Equador).
Agora, depois de todo este ativismo, talvez se devesse esperar por alguma nota com pedido de esclarecimentos de quem deve explicações.
Seria apenas uma demonstração de equilíbrio, já que histerias parece que passaram de moda...
Paulo Roberto de Almeida

Autoridades da Venezuela pediram às Farc para matarem opositores de Chávez, diz instituto
Fernando Duarte, correspondente
Agências internacionais, 10/05/2011

LONDRES e CARACAS - Um dossiê de 240 páginas publicado nesta terça-feira pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), de Londres, contradiz as afirmações do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, de que as ligações de seu governo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) teriam sido obra de ações individuais isoladas. Com base em arquivos eletrônicos de Raul Reyes, então o número 2 na hierarquia das Farc, não só Chávez ofereceu financiamento às operações do grupo paramilitar como autoridades venezuelanas ainda pediram apoio para o treinamento de milícias pró-governo e para matar adversários políticos do presidente. Chávez, porém, não estaria ciente dos pedidos de assassinatos. Nesta terça-feira Chávez era esperado no Brasil, mas o presidente cancelou a viagem .

De acordo com o documento do IISS, Chávez via nas Farc um aliado nas divergências com a Colômbia, sobretudo por manter ocupada a cooperação militar entre Bogotá e Washington. Em 2007, teria prometido US$ 300 milhões ao grupo. Ainda que o dossiê seja bastante claro na afirmação de que a chegada das Farc à Venezuela não tenha ocorrido na presidência de Chávez, sua ascensão ao poder, em 1999, fortaleceu os laços e abriu novas portas para a guerrilha, como a possibilidade de obter armas de parceiros comerciais da Venezuela, incluindo a China, por meio de acordos triangulares usando as exportações venezuelanas de petróleo.

As alegações não param em Caracas: ainda de acordo com o material analisado pelo IISS, as Farc teriam contribuído financeiramente para a eleição de Rafael Correa à presidência do Equador em 2006, no que representou para a guerrilha o auge dos esforços de infiltração na política e território equatorianos. Embora algumas das informações ligando Chávez e Correa às Farc já tivessem sido divulgadas anteriormente, boa parte da documentação está caindo pela primeira vez em domínio público - ainda que oficialmente, o governo colombiano tenha se recusado a confirmar a entrega de informações ao instituto britânico.

Os documentos foram encontrados em arquivos de computador de Reyes, morto em uma operação em 2008 que resultou num rompimento de relações diplomáticas entre Quito e Bogotá por dois anos. O dossiê também mostrou a relação entre o governo Chávez e os guerrilheiros, embora muitas vezes cooperativa, também teve momentos difíceis e de jogo duplo.

Segundo o ISS, Chávez se colocou ao lado do governo colombiano na luta contra as Farc em algumas ocasiões, especialmente quando havia ganhos políticos envolvidos. Em novembro de 2002, o livro reporta que antes de uma reunião entre o então presidente Álvaro Uribe e Chávez, as Farc pediram ao Exército venezuelano permissão para transportar uniformes pelo território da Venezuela. Os militares permitiram, mas depois cercaram o comboio e prenderam oito membros do grupo e os entregaram à Colômbia, permitindo que Chávez informasse Uribe da operação pessoalmente.

Traições como estas, assim como promessas de grandes quantias de dinheiro, geraram uma considerável tensão entre os guerrilheiros e o líder venezuelano.

Farc estudavam treinar membros do partido comunista para ações terroristas
Em uma das descrições mais reveladores da ação das Farc na Venezuela, o instituto explica como a principal agência de inteligência do país, o Serviço de Inteligência Bolivariano, conseguiu alistar as Farc no treinamento de forças de segurança e na realização de ataques terroristas, incluindo bombardeios, em Caracas entre 2002 e 2003.

O grupo também treinou várias organizações pró-Chávez, como as Forças de Liberação Bolivarianas - um grupo paramilitar que atua na fronteira com a Colômbia -, estudou fornecer técnicas de terrorismo urbano para membros do Partido Comunista Venezuelano.

O relatório ainda cita pedidos do governo Chávez para que a guerrilha matasse ao menos dois de seus opositores. As Farc discutiram um desses pedidos em 2006, quando o assessor de segurança Alí Rodríguez Araque pediu para que matar Henry López Sisco, que dirigia a agência de inteligência venezuelana na época. Sisco deixou o país em novembro do mesmo ano.

No mês passado, o presidente venezuelano admitiu pela primeira vez que alguns de seus aliados políticos colaboraram com os guerrilheiros colombianos, mas insistiu que eles o fizeram "pelas nossas costas".

O estudo do ISS, porém, contradiz a afirmação ao apontar um longo histórico de colaboração do próprio Chávez e de seus principais confidentes.

"(A Venezuela viu as Farc) como um aliado que manteria o poder militar americano e colombiano na região controlados pela contra insurgência, ajudando a reduzir as ameaças contra a Venezuela", diz o relatório.

Em outro trecho, o documento relata um encontro secreto em setembro de 2007 entre Chávez e Reyes, quando o presidente prometeu emprestar uma grande quantia às Farc para a compra de armas.

O porta-voz do presidente não respondeu aos pedidos de entrevista. O governo venezuelano afirma que os arquivos de Reyes são fabricações. Em 2008, a Interpol rejeitou a possibilidade de que os documentos tenham sido alterados.

"Pequenos Principes" do Haiti (nao querendo zombar de uma desgraca...)

Não sei por que, mas esta matéria me fez lembrar de um autor, um livro: se estivéssemos em época de concurso de misses, poderíamos dizer:

"Você sempre será responsável por aquilo que cativas..."

Pois é, fomos ser bonzinhos no Haiti (na verdade fazendo o trabalho que americanos e franceses não queriam fazer) e de olho numa cadeira no CSNU (por megalomania obsessiva dos dois maiores caciques da nossa diplomacia) e deu nisso.
Agora aguente-se o prejuízo que virá (não só com gente, mas com drogas, crimes, etc...).
Paulo Roberto de Almeida

Entrada ilegal de haitianos no Brasil preocupa autoridades
Nádia Pontes
Deutsche Welle Brasil, 13/05/2011

No meio da Floresta Amazônica, longe da vigilância oficial, a rota ilegal do tráfico de drogas passou a ser a porta de entrada de haitianos no Brasil. Os imigrantes pagam de 2 a 5 mil dólares para cruzar as fronteiras com a ajuda dos chamados “coiotes”.

“Esses são relatos dos próprios haitianos que entram no país. Eles contratam pessoas que conhecem a rota do tráfico, muitas vezes traficantes. E quando chegam ao território brasileiro, eles pedem o refúgio”, revelou à Deutsche Welle o procurador da República do estado do Acre.

Desde o devastador terremoto no Haiti, em janeiro de 2010, a Justiça brasileira recebeu 1.377 pedidos de refúgio de cidadãos haitianos. Mas nenhum foi concedido. “A política brasileira de refúgio é direcionada àqueles que efetivamente são obrigados a sair de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política”, esclareceu a nota enviada pelo Ministério da Justiça à Deutsche Welle. Segundo a lei nacional, portanto, os haitianos não se enquadram na condição de refugiado.

Rota da esperança
Depois da catástrofe que abalou o território haitiano, seguida pela epidemia de cólera e a degradação da já precária condição de subsistência naquele país, vários imigrantes passaram a ver no Brasil uma chance de melhoria de vida. A maneira de entrada no território, no entanto, despertou a preocupação das autoridades.

Segundo o procurador Ricardo Gralha Massia, a via ilegal virou uma alternativa porque os haitianos passaram a ser barrados pela Polícia Federal. “Todos os dias chegam haitianos na fronteira do Brasil. Na semana passada, eram mais de 30 tentando entrar no país em Apari, que é o município no Peru que faz fronteira com Assis Brasil, no estado do Acre.”

A rota da fuga passa pela República Dominicana, Panamá, Equador, Colômbia, Peru e Bolívia. A entrada ilegal em território brasileiro acontece por Tabatinga, no estado do Amazonas, e em Assis Brasil, no Acre. O próximo passo, então, é entrar com o pedido de refúgio. Com o protocolo em mãos, o solicitante obtém o visto provisório por 90 dias, prorrogável até que o caso seja analisado pelo Conare, o Comitê Nacional para Refugiados.

A Justiça brasileira, no entanto, ainda continua analisando os mais de mil casos em andamento, ou seja: esses haitianos prosseguem com uma situação jurídica indefinida. “A resposta do Conare precisa ser mais rápida. O adequado para uma política clara de imigração seria estimular os haitianos a formularem o pedido de ingresso na Embaixada do Brasil. Seria a porta de entrada para o visto de permanência para fins de trabalho, de forma regular”, critica Massia.

Condição legal
O governo brasileiro concedeu residência permanente a 197 haitianos que chegaram ao país desde o ano passado. Depois de duas audiências públicas convocadas na última semana pela Procuradoria da República no Acre para destravar a questão, o Ministério da Justiça informou que os pedidos de refúgio deverão ser convertidos em visto de permanência, e que foram encaminhados ao Conselho Nacional de Imigração, do Ministério do Trabalho.

Professores universitários, dentistas, profissionais especializados formam a lista de haitianos que aguardam a decisão da Justiça para viverem legalmente em solo brasileiro. “As questões humanitárias e a motivação que trazem esses haitianos ao Brasil devem ser levadas em consideração. Há uma postura do Brasil de não deportá-los”, comenta o procurador.

Com o benefício do visto de residência permanente, o imigrante pode solicitar o registro na Polícia Federal e a carteira de identidade para estrangeiros, que garante todos os direitos civis no Brasil. “É possível que nem todos os pedidos que estão sendo analisados sejam liberados. Pessoas com pendências na Justiça não vão obter a residência no Brasil. Enquanto isso, eles estão sendo mantidos no país apoiados pelos governos estaduais e municipais, e as pastorais dos imigrantes, entre outras entidades civis”, esclarece a Ministério brasileiro da Justiça.

A bobagem da semana: jogador portugues de futebol

Não por ser português, e eu não cultivo piadas de português, porque simplesmente acho que nossa população 10 vezes maior dá direito a dez vezes mais o número de idiotas, imbecis, alienados e outros estúpidos involuntários do que jamais existiu em Portugal.
Mas eu tenho horror, mais do que isso, de comentários de jogadores e técnicos de futebol em geral (de alguns comentaristas da mídia também): cada vez que alguns deles começa a falar no rádio que "desta vez não deu, mas da próxima vão fazer um futebol mais ofensivo", ou que "o time não conseguiu engrenar, porque não estava no seu dia", eu juro que desligo logo o rádio, ou mudo de estação, pois acho que não existe coisa pior no mundo -- depois de demagogia de político, claro -- do que comentaristas de futebol, jogadores, técnicos ou radialistas. Horror!
Mas este jogador português, Futre de nome de família, até que não é burro: ele quer salvar o seu time, o futebol português e, de quebra, o país que está quebrado, importando jogadores de futebol da China.
Até que ele teve uma ideia genial: os jogadores brasileiros estão muito bem cotados no mercado, são caros, e até um tanto arrogantes: basta serem contratados por algum timinho europeu que logo começam ir torrar o dinheiro em boates, com meninas de programa (espertas...), carrões vistosos, e outras loucuras mais.
Pensando beM: jogadores chineses de futebol podem não ser nenhuma maravilha, mas devem ser baratos, e se eles atraírem algumas centenas de milhares de turistas chineses para a copa europeia, isso vai ser a salvacão de muito país quebrado.
Quanto a sua sugestão de que sua biografia converta-se numa nova Bíblia, tenho minhas dúvidas, mas até pode ser: todo mundo já conhece a Bíblia, e ele pode ter boas histórias para contar...
Paulo Roberto de Almeida

Portugueses fazem piada da crise após fala de jogador
Josélia Aguiar
Folha de S.Paulo, 12.05.2011

Um festival de piadas assola Portugal em crise, e seu autor involuntário não é um comediante, mas um ex-jogador de futebol.
Paulo Futre, 45, sugeriu numa entrevista há um mês que a solução não só para o time português do Sporting, mas para o país de maneira geral, seria contratar "o melhor jogador chinês".
"Vai (sic) vir charters de chineses", explicou, a uma plateia atônita diante desta e de outras declarações absurdas. "Temos de atrair o mercado asiático. É onde está o dinheiro".
Os chineses, fãs do tal jogador -que ainda seria escolhido-, chegariam aos bandos, ocupariam hotéis, restaurantes e museus, segundo o raciocínio de Futre.
Portugal vive uma séria crise econômica. Enfrenta forte deficit público e acaba de pedir empréstimo à Comissão Europeia e ao FMI.
As declarações tresloucadas de Futre originaram paródias na mídia tradicional e nas redes sociais. Camisetas com suas frases são vestidas nas ruas.
Atento ao fenômeno midiático, o Licor Beirão contratou Futre como garoto-propaganda. Na campanha publicitária, Futre promete "um wok [panela tradicional chinesa] para cada português".
A biografia de Futre, que sairia apenas no final do ano, foi concluída a tempo de ser lançada no próximo final de semana, na Feira do Livro de Lisboa. "Espero que o livro se torne uma Bíblia", disse Futre à Folha.
Ele, que encerrou a carreira em 1998, jogou pela seleção portuguesa e times como Sporting, Porto e Benfica. Também atuou na Espanha, França, Itália e Japão.

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PS.: Agradeço a meu amigo Rolemberg Estevão de Souza o envio desta matéria, que me tinha passado despercebida, a despeito de sua importância fundamental para os rumos do futebol português e mundial... (PRA)

A frase da semana - G. K. Chesterton

A dead thing can go with the stream...
Only a living thing can go against it.

G. K. Chesterton

(Acho que combina com o meu natural contrarianista... PRA)

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Violencia escolar: de quem a culpa?: da "mercantilizacao", ora essa...

Eu tenha certa alergia à burrice, como todo mundo sabe.
Mas tenho mais horror ainda à estupidez voluntária e à desonestidade intelectual.
Somados à pedagogia ambiente, isso pode dar uma mistura explosiva (e imbecilizante).

Acabo de ver uma reportagem num canal de notícias (reputado sério, mas nada impede que ele tenha jornalistas idiotas, também) sobre a "violência na escola".

Um dos professores, provavelmente indelevelmente marcado pela pedagogia freireana -- do supremo idiota educacional Paulo Freire; não confundir com o mestre Gilberto Freyre -- disse que a culpa era da "mercantilização do ensino"...
Uma pedagoga, entrevistada expressamente sobre isso na mesma matéria, confirmou que havia uma tendência à "privatização do ensino", o que poderia explicar esse aumento da violência. Ou seja, os alunos são mal-educados e violentos, não porque os pais não os educam em casa, mas porque a escola pública é ruim, e cada vez a classe média recorre ao ensino pago.
Conclusão lógica: o pequeno delinquente é resultado da nossa sociedade capitalista.

Confesso que não tenho mais paciência para aguentar esse desfilar de imbecilidades, de professores, pedagogas e jornalistas.

Depois entrevistaram a cavalgadura da "professora" que escreveu um livro que considera normal falar e escrever errado, já que o povo fala assim.
Deve ser o efeito de outra cavalgadura que se orgulhava (deve se orgulhar ainda) de não ler livro nenhum. (E para quê?: ele está ganhando dinheiro a rodo dos capitalistas -- todos com cursos universitários, se entende -- para falar meia dúzia de bobagens e três piadas.)

Estou estarrecido, e quase desistindo de escrever e de publicar.
As cavalgaduras ocuparam todos os espaços públicos...

Preciso de um exílio temporário em algumaa ilha do conhecimento.
Vou para algum quilombo de resistência intelectual, para começar o trabalho de reconquista do terreno contra os idiotas que estão soltos por aí...

Paulo Roberto de Almeida

Maquiavel redivivo (e visitando Brasilia): dia 18 de maio, as 19hs (livro Paulo R. Almeida)

Já anunciei aqui o lançamento deste livro que foi publicado enquanto eu passeava pela China:
O Moderno Príncipe: Maquiavel revisitado
(veja sumário e alguns textos neste link)

Em todo caso, gostaria de convidar os interessados num debate sobre "Maquiavel e a Política Contemporânea", com os cientistas políticos Paulo Kramer e Murillo Aragão, seguido de um coquetel de lançamento do livro,

na Casa Thomas Jefferson da Asa Sul de Brasília
(SEP Sul EQ 706/906, Conjunto B; tel.: 3442-5501; www.thomas.org.br)
na quarta-feira, dia 18 de maio, as 19hs.

O convite da Casa Thomas Jefferson figura aqui,

e o mesmo convite, em formato-texto, está aqui.

Paulo Roberto de Almeida

Bibliomaniacos: onde acomodar tudo isso?

Eu conheço esse problema: sem ser um colecionador de livros (apenas um leitor, comprador, emprestador de bibliotecas), já não sei onde colocar todos os meus livros.
Ao longo da vida, já doei muitos livros (fora aqueles emprestados e nunca devolvidos), mas também tive de comprar um escritório só para acomodar os acréscimos. Ele já está cheio. Será que vou precisar de outro escritório? Ou um maior? Ou uma casa inteira?
Enfim, dilemas de todo leitor compulsivo...
Paulo Roberto de Almeida

Acervos pessoais ''encalham'' em livrarias da cidade
13 de maio de 2011 | 0h 00
Edison Veiga e Flávia Tavares - O Estado de S.Paulo – pág. C10

Há esgotamento inclusive de espaço para guardar bibliotecas particulares de famílias paulistanas, que abrigam preciosidades

Quando se entra naquela livraria de obras antigas, com cheiro de páginas lidas e relidas e títulos que parecem fundamentais só pela imponência da capa de couro, pode-se ter a impressão de que se trata apenas de mais um sebo do centro de São Paulo. O que não se imagina é que naquelas estantes estão décadas de dedicação, investimentos e empenho de colecionadores e bibliófilos em encontrar as obras mais especiais. São as bibliotecas pessoais - que a Livraria Calil, descrita acima, comercializa -, que movimentam um mercado vultoso e internacional.

Raridades. Maristela, em sua livraria no centro de SP: 'Recebi ofertas da Turquia e dos Estados Unidos por algumas coleções, mas preferi não vender. Essas obras devem ficar no Brasil' (foto)

A diferença básica desta livraria para as outras é a preferência por vender bibliotecas pessoais inteiras, sem desmembrá-las - embora haja também obras avulsas nas prateleiras. Ali, estão acervos que valem de US$ 120 mil a US$ 2 milhões. Na verdade, falar em dólar está desatualizado. A compra e a venda de acervos valiosos são agora em euros.

"O mercado está globalizado. Recebi ofertas da Turquia e dos Estados Unidos por algumas coleções, mas preferi não vender. Acho que essas obras devem ficar no Brasil", explica Maristela Calil, herdeira da livraria e hoje sua administradora. Ela explica ainda o que distingue uma biblioteca pessoal de um lote: a biblioteca tem mais de mil volumes.

Entre as coleções mais significativas sob sua tutela está a do próprio pai, Líbano Calil. "Já avaliaram o acervo como o terceiro mais importante do Brasil, atrás do de José Mindlin e da família Safra", diz Maristela. São 15 mil volumes sobre assuntos brasileiros, encaixotados à espera de um comprador. Maristela já tentou vender para os governos federal, estadual e municipal. Sem sucesso. "O diretor da Biblioteca Nacional me disse que compraria se eu encontrasse um patrocinador", espanta-se Maristela. Com a coleção do pai, seriam vendidas as bibliotecas do jurista e agitador cultural Luiz Arrobas Martins, com 14 mil volumes, e do professor José Pedro Galvão de Sousa, com 7 mil. A do ex-prefeito de São Paulo, José Carlos de Figueiredo Ferraz, também está lá, mas seus familiares autorizaram que as obras fossem vendidas separadamente.

Famílias que optam por vender bibliotecas, e não doá-las, acreditam que o trabalho de uma vida inteira do bibliófilo tem valor e merece um preço. Muitas vezes, são famílias tradicionalíssimas, que, por estarem em dificuldades financeiras, preferem não falar. "Como são, em geral, pessoas conhecidas no meio social ou universitário, elas não gostam de ser identificadas para não serem mal interpretadas", afirma Eurico Brandão Júnior, do sebo Brandão. Ele afirma que chega a comprar cinco bibliotecas assim por mês - geralmente com mais de 2 mil exemplares cada. "Paguei R$ 15 mil pela última, que tinha acervo de 3 mil volumes, de História, Sociologia e Filosofia."

Também há quem prefira vender a coleção para instituições de renome, justamente para ter a garantia de que o acervo não se perderá - e ficará bem cuidado. "Minha família decidiu que venderia a biblioteca de 15 mil volumes de meu pai (o crítico literário João Alexandre Barbosa, morto em 2006) ao Instituto Moreira Salles, porque eles demonstram ter um cuidado técnico muito grande", afirma filho, o poeta Frederico Barbosa.

Novos ricos. Já os compradores variam de perfil: podem ser professores universitários, intelectuais, escritores, colecionadores de raridades - os mais fanáticos até checam sistematicamente os obituários dos jornais para ver se algum notório bibliófilo morreu e sua biblioteca entrará no circuito. E, cada vez mais, novos ricos que precisam de uma biblioteca respeitável para as recém-compradas mansões. "Já vendi uma biblioteca a um banqueiro que comprou sem nem ver os livros", lembra Maristela.

Há um esgotamento, inclusive de espaço, nas livrarias. "Para estocar um livro em São Paulo, excluindo a manutenção e a mão de obra, gastam-se mensalmente R$ 0,05 por unidade", explica Gunter Zibell, da livraria Bibliomania.

Líbano Calil passou 50 anos procurando títulos muito específicos, que compusessem um acervo especializado em assuntos brasileiros. A biblioteca está à venda há 17 anos. "Alguém pode considerar esse dinheiro empatado. Um livreiro, como eu, considera que está investido", argumenta Maristela.

Bibliotecas públicas aceitam doações de livros usados
13 de maio de 2011 | 0h 00
Edison Veiga e Flávia Tavares - O Estado de S.Paulo

Maior e mais tradicional biblioteca pública de São Paulo, a Mário de Andrade investiu R$ 123 mil em 2010 na aquisição de novos títulos - no total dos acervos das bibliotecas, a Prefeitura investiu quase R$ 2 milhões. Mas nem tudo o que entra em seus catálogos precisa ser comprado.

Quem quer se desfazer de livros pode procurar as bibliotecas públicas para doar. As obras precisam estar em bom estado - e livres de fungos ou infestação de insetos, que poderiam contaminar toda a biblioteca. Em geral, as instituições recebem o material pessoalmente e fazem uma triagem.

Com a Mário de Andrade, entretanto, o processo é um pouco diferente. Isso "em razão de ser uma das mais procuradas", como informa a administração.

Ali, antes é preciso elaborar a listagem das obras (com título, autor, ano de publicação, edição e editora) e encaminhá-la para bmadesenvcolecoes@prefeitura.sp.gov.br. A mensagem deve ser identificada: nome, sobrenome, cidade e telefone para contato. Em dez dias, a relação é analisada e respondida pela biblioteca. Só então o material aprovado deve ser encaminhado.

Coleção. Assim que o editor e artista gráfico Massao Ohno morreu, no ano passado, sua viúva e amigos passaram a se mexer para que sua biblioteca - cerca de 600 títulos de poesia contemporânea - fosse incorporada pela Mário de Andrade. "Não queria que se transformasse em dinheiro, achava que precisava se tornar público na biblioteca que ele tanto gostava", conta a viúva, Marjorie Sonnenschein.

Outro caso de doação ilustre, um pouco mais antiga, é o da vasta biblioteca de 20 mil volumes do poeta e tradutor Haroldo de Campos, morto em 2003. "A família dele recebeu ofertas para vender para instituições estrangeiras. Mas optou para que permanecesse no Brasil", conta o poeta Frederico Barbosa. Ele se tornou "guardião" do acervo desde 2004, quando a coleção foi doada ao Estado e passou a ficar na Casa das Rosas, na Avenida Paulista.

Livreira dá dicas de como montar uma boa coleção
13 de maio de 2011 | 0h 00
Flávia Tavares - O Estado de S.Paulo

A livreira Maristela Calil dá dicas a quem quer montar uma biblioteca pessoal valiosa, como a de seu pai, Líbano: "Um bom acervo deve ter, obrigatoriamente, obras de referência. Aquelas que estão sempre citadas nas bibliografias de outros livros, porque são ricas conceitualmente".

Um segundo quesito importante é a raridade, a peculiaridade das obras. "Tem livreiro que, sem avaliar o acervo, oferece um preço fechado de R$ 0,50 por livro. Eu faço questão de olhar volume por volume e, se houver uma preciosidade ali, pagar o preço justo por ela."

Por fim, Maristela ressalta que a preservação dos livros custa caríssimo e, por isso, é muito importante que eles estejam bem conservados na hora da venda. "Meu pai passou cinco décadas indo a sebos, formando uma biblioteca. E ela realmente é especial. Quanto vale um trabalho desse?", pergunta a livreira

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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...