domingo, 17 de agosto de 2025

Sou um bibliófilo? Não exatamente - Paulo Roberto de Almeida

Sou um bibliófilo?

Não exatamente. 

Vejamos:

robertsonfrizero escreveu isto no Threads:

“Você é um bibliófilo se na sua biblioteca particular houver:

▪️um livro totalmente inútil para você;

▪️um livro publicado em uma língua estrangeira que você não domina;

▪️livros que você comprou repetidos, por não lembrar que já tinha adquirido;

▪️várias edições de um mesmo livro;

▪️um livro que você comprou só pelo projeto editorial;

▪️mais livros do que tempo hábil para ler todos nesta encarnação;

▪️pelo menos uma obra rara;

▪️várias traduções de um mesmo livro.”

PRA

Incorro em todos esses “pecados”, mas nem por isso me considero um “bibliófilo”, ou seja, um amigo dos livros. Simplesmente considero os livros objetos úteis ao conhecimento e ao meu trabalho de pesquisador, de professor e de produtor de artigos e de outros livros. 

Tanto é assim que agora estou me desfazendo de boa parte de meus livros e entregando-os à Biblioteca do Itamaraty, onde passaram a integrar a “Coleção Paulo Roberto de Almeida”.

Fiz uma relação dos livros doados até aqui (outros seguirão) nesta postagem em Academia.edu:

4976. “Lista cumulativa dos livros integrando a Coleção PRA na Biblioteca do Itamaraty”, Brasília, 4 julho 2025, 148 p. Junção de todas as listas e respectivos conteúdos dos arquivos numerados seguintes: 4807, 4808, 4811, 4812, 4860, 4969 e 4973, tal como listado no trabalho 4975. Salvo em pdf sob o título de “Listagens parciais dos livros PRA na Biblioteca do Itamaraty”, postado em Academia.edu: https://www.academia.edu/130327707/4976_Listagens_parciais_dos_livros_PRA_na_Biblioteca_do_Itamaraty_2025_ 

===========

Outras relações de livros depositados Biblioteca do Itamaraty: 

4975. “Coleção PRA na Biblioteca do Itamaraty: relações dos livros doados”, Brasília, 4 julho 2025, 2 p. Listas parciais e informações tópicas sobre as doações de livros (pessoais, capítulos, organizados e livros de terceiros, da biblioteca pessoal, efetuadas gradualmente à Biblioteca do Itamaraty, incorporados e catalogados na coleção PRA. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2025/07/colecao-pra-na-biblioteca-do-itamaraty.html).

4860. “Coleção Paulo Roberto de Almeida na Biblioteca do Itamaraty: continuidade das doações em 2025”, Brasília, 27 fevereiro, 2 março 2025, 8 p. Relação dos livros doados no início de 2025, para integrar a coleção PRA na Biblioteca Antônio Francisco Azeredo da Silveira, do Itamaraty: Sociologia; América Latina, Brasil; Economia internacional, tecnologia, finanças; História. Arquivo parcial na plataforma Academia.edu (1/03/2025, link: https://www.academia.edu/127953067/4860_Colecao_Paulo_Roberto_de_Almeida_na_Biblioteca_do_Itamaraty_continuidade_das_doacoes_em_2025); apresentação parcial no blog Diplomatizzando (1/03/2025; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2025/03/colecao-pra-na-biblioteca-do-itamaraty.html). 8 caixas de livros; encaminhado em 6/03/2025.

4921. “Coleção PRA na Biblioteca do Itamaraty”, Brasília, 9 maio 2025, 9 p. Apresentação da coleção PRA. Postado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2025/05/colecao-pra-na-biblioteca-do-itamaraty.html).

Aos poucos vou me "libertando" de meus amigos livros...


O Brasil na transição energética: oportunidades a serem aproveitadas - IEDI

 IEDI publica um paper sobre o Brasil na transição energética:


O Brasil na transição energética: oportunidades a serem aproveitadas
https://www.iedi.org.br/cartas/carta_iedi_n_1324.html

Sumário

O desafio climático e ambiental pelo qual o mundo passa tem produzido no Brasil um relativo consenso de que muitas oportunidades podem ser abrir para o desenvolvimento do país. Seja pelas nossas riquezas naturais, seja porque já temos expertise em áreas importantes para a transição energética, como em biocombustíveis.


O IEDI vem apontando estas oportunidades há algum tempo, como na Carta n. 1075 “Transição Verde: oportunidades e desafios para o Brasil”, de 2021; Carta n. 1209 “A necessidade de uma estratégia “net zero” para o Brasil, segundo o Banco Mundial”, de 2023; e nas Cartas n. 1247 “Oportunidades da Sustentabilidade Ambiental” e n. 1291 “Descarbonização e oportunidades para o Brasil”, de 2024, para citarmos alguns exemplos.

O impacto destas oportunidades, se bem aproveitadas, foi recentemente estimado por estudo realizado pela UFRJ e PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) que estima que o PIB brasileiro poderia ser acrescido em 0,28 ponto percentual ao ano entre 2025 e 2040 (de 2,1% para 2,38% a.a.) se o Plano de Transformação Ecológica (PTE), coordenado pelo Ministério da Fazenda e que faz parte das NDCs do país, fosse integralmente implementado.

Os desafios para a realização deste potencial sabemos que não são poucos. Internamente, por exemplo, exige um ambiente de negócios com menos distorções e custos sistêmicos e um arranjo macroeconômico que viabilize taxas de juros mais baixas, destravando os investimentos necessários para impulsionar a inovação e a produtividade do nosso sistema produtivo.

A Carta IEDI de hoje aborda um outro estudo sobre o tema, realizado por pesquisadores do Laboratório de Política Industrial NET Zero da Johns Hopkins University, intitulado “New industrial policy for a new world: Seizing Brazil’s opportunities in the energy transition”, que identifica mais especificamente as principais oportunidades para o Brasil, mas também avalia as iniciativas recentes do programa Nova Indústria Brasil (NIB).

Para os autores, além de contar com uma base industrial produtora de bens complexos e com uma agricultura mecanizada, o país possui vantagens competitivas em minerais essenciais, recursos energéticos renováveis e biocapacidade que, se bem exploradas, podem tornar o Brasil um grande produtor e exportador de energia, materiais e tecnologias verdes.

Ao combinar significativa dotação de recursos naturais com forte potencial em manufatura avançada, o Brasil está bem posicionado para se tornar uma potência de primeira ordem no novo sistema energético mundial, segundo o estudo.

Sete cadeias são identificadas como as mais promissoras para ensejar o fortalecimento industrial e tecnológico do Brasil neste contexto de um novo “sistema energético mundial”: minareis críticos para a transição energética; baterias e seus componentes; veículos elétricos e híbridos; biocombustíveis para aviação; aço de baixo carbono; produção de geradores de energia eólica; e fertilizantes verdes.

Para chegar em cada uma dessas cadeias, os autores levaram em consideração: a posição brasileira no cenário competitivo do mercado global; a base produtiva doméstica existente e as iniciativas de políticas e as respostas empresariais já identificadas. Ou seja, são cadeias ancoradas em competências e vantagens que já possuímos e com sinais positivos de aderência das estratégias empresariais.

O estudo também alerta para importantes gargalos existentes no país, em geral já bastante conhecidos. É o caso da deficiência de nossa educação e do desafio de capacitar mão de obra para atender a demanda dos clusters tecnológicos que serão criados com o objetivo de explorar o potencial do país na transição energética. É igualmente o caso da integração da ciência com a inovação e das empresas com as universidades nas cadeias produtivas promissoras.

Na avaliação dos autores, o programa Nova Indústria Brasil (NIB), lançado em janeiro de 2024, demostra uma compreensão do potencial que o Brasil pode explorar na transição energética, mas apontam algumas fragilidades importantes:

• A orientação por missão da NIB é ampla demais para fornecer o foco necessário.

• Os recursos alocados à NIB provavelmente serão distribuídos de forma pulverizada entre muitas prioridades, o que não garante ao Brasil alcançar uma posição de destaque mundial em setores altamente competitivos.

• Não está claro quais serão os mecanismos de colaboração entre governo, empresas, sindicatos, sociedade civil e especialistas independentes ao longo da sua implementação.

• Não há na NIB um plano para criar clusters baseados em conhecimento e elaborar combinações de políticas específicas para cada uma das cadeias prioritárias.

Para que o país aproveite as oportunidades que estão se abrindo, os autores recomendam que a política industrial brasileira tenha três características principais:

• Foco: estabelecimento de metas claras em poucos setores, priorizando oportunidades específicas e quantitativas.

• Coordenação forte: melhoria dos fluxos de informação entre governo, indústria, especialistas e diferentes níveis de governo.

• Investimentos estruturais em educação e inovação: construção de uma base de conhecimento focada em áreas estratégicas para competir globalmente.

Na avaliação dos autores, além de apoiar projetos e fornecer capital, também deve estar na agenda da política pública a criação de condições para mudanças estruturais por meio de investimentos em infraestrutura, capital humano e energia acessível.

Os autores reconhecem, ainda, as restrições fiscais enfrentadas pelo Brasil, por isso, inclusive, a ênfase na necessidade de evitar políticas fragmentadas. Além disso, argumentam que investimentos estratégicos podem ser viabilizados pela ação do BNDES, desde que a política industrial esteja integrada, reduzindo a necessidade de recursos orçamentários.


Ler a íntegra do estudo neste link:

sábado, 16 de agosto de 2025

A degradação moral dos bolsonaristas, ao defender o negacionista que queria uma nova ditadura militar no Brasil - Paulo Roberto de Almeida, editorial do Estadão

A degradação moral dos bolsonaristas, ao defender o negacionista que queria uma nova ditadura militar no Brasil


Paulo Roberto de Almeida, editorial do Estadão

Tarcíso está errado. Que Lula e os petistas sejam nefastos no terreno econômico, da corrupção e de uma diplomacia equivocada e míope, não quer dizer que Bolsonaro seja melhor, o que este editorial do Estadão também afirma.

Mas é preciso deixar algo MUITO CLARO: o Brasil já viveu 21 anos de ditadura militar, que fez repressão ampla contra políticos, artistas, acadêmicos, jornalistas e quaisquer pessoas que não concordavam com um regime autoritário, com polícia política à espreita e censura à cultura e às artes, à mídia e aos simples professores de esquerda, uma fauna que existe em qualquer país do mundo.

Mas quem ELOGIOU TORTURADORES, quem disse claramente que "A DITADURA MATOU DE MENOS", que o regime militar deveria ter eliminado pelo menos TRINTA MIL OPOSITORES foi Bolsonaro, o MONSTRO NEGACIONISTA, que matou, indiretamente, ALGUNS MILHARES DE INFECTADOS PELA COVID-19 durante a pandemia, em grande medida os próprios bolsonaristas, que acreditaram na FRAUDE ANTIPROFILÁTICA do presidente boçal, OPOSTO A VACINAS, e só se rendendo quando o governador de SP começou a importar vacinas.

Tarcísio se opõe acertadamente a Lula no lado econômico e moral, mas deveria com maior razão se opor ao psicopata perverso que infelicitou milhares de famílias, e que pretendia se manter no poder por meio de um GOLPE MILITAR.

Paulo Roberto de Almeida

Tarcísio está certo

Editorial O Estado de S. Paulo, 15/08/2025

Ele resumiu bem: ‘O Brasil não aguenta mais o Lula’ – e desbancá-lo é condição para superar o atraso. Mas os candidatos à direita devem saber que o Brasil também não aguenta mais Bolsonaro

 

“O Brasil não aguenta mais o PT, o Brasil não aguenta mais o Lula.” O desabafo do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, num encontro promovido pelo BTG Pactual com outros presidenciáveis de centro-direita, como Ratinho Jr., Eduardo Leite e Ronaldo Caiado, vocaliza mais que um diagnóstico político. É a expressão condensada de um esgotamento histórico, comprovado por dados e pelo cotidiano. Não se trata de mera retórica eleitoral. O sentimento popular, traduzido em índices de rejeição, ecoa uma realidade objetiva: o modelo lulopetista é fiscalmente insustentável, economicamente estagnante, institucionalmente corrosivo e diplomaticamente anacrônico.

Na oposição, recorde-se, o PT sempre foi irresponsável, rejeitando marcos civilizacionais, a começar pela Constituição e o Plano Real. No governo, o resultado foi inequívoco: retrocesso na produtividade, deterioração fiscal, aparelhamento do Estado, corrosão da moralidade pública e uma política externa que confunde alinhamento com ditaduras e hostilidade ao Ocidente com “soberania”. Na economia, o lulopetismo substituiu reformas estruturais por expansão desenfreada do gasto corrente, subsídios distorcivos e intervencionismo improvisado. O preço está na dívida crescente, no déficit crônico, nos juros exorbitantes, na paralisia do investimento privado. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), em 45 anos o Brasil despencou do 48.º para o 87.º lugar no ranking de PIB per capita, aproximando-se da metade mais pobre do planeta – e isso tem relação direta com o fato de que o Brasil foi governado pelo PT em 16 dos últimos 22 anos.

A cultura institucional moldada pelo PT é adversa ao mérito e complacente com o clientelismo. A máquina pública foi loteada a aliados; as estatais, transformadas em cabides de emprego; o Congresso é tratado ora como inimigo, ora como balcão de negócios. Na política externa, Lula insiste em bajular autocratas e dar declarações contra o “imperialismo estadunidense”, mesmo enquanto China, Europa ou até o Vietnã negociam pragmaticamente com Washington. No campo moral, a marca é um relativismo corrosivo: o partido que reivindica o monopólio da ética capitaneou o maior escândalo de corrupção da história nacional.

Ao dizer que o Brasil “não aguenta mais”, Tarcísio verbaliza um limite estrutural. A população sente – e as projeções confirmam – que o País não suporta mais regimes fiscais que empilham déficits e empurram a conta para o futuro. A exaustão também é geopolítica e tecnológica: enquanto o mundo corre atrás da transição energética e da economia do conhecimento, o lulopetismo insiste em reviver debates marxistas antediluvianos, preso a um saudosismo sindical e a rancores de grêmio estudantil.

Não é preciso endossar candidaturas para reconhecer que os princípios defendidos pelos governadores durante o encontro apontam na direção certa: responsabilidade social sustentada por responsabilidade fiscal, reforma orçamentária, modernização administrativa, combate à corrupção e privilégios e uma visão de futuro conectada às oportunidades globais. É essa virada de página que importa.

Mas, para ser completa, ela não pode omitir um dado incômodo: o Brasil não aguenta mais o bolsonarismo também. Entre os muitos males que Lula e o PT causaram ao País, um dos mais degradantes foi a ascensão de Jair Bolsonaro. O populismo bolsonarista foi um subproduto dialético do populismo lulopetista. O antipetismo viabilizou a ascensão de Bolsonaro, e o antibolsonarismo viabilizou o retorno de Lula, mantendo o País cativo de um ciclo infernal de ressentimento, radicalização e estagnação. Rompê-lo é condição para avançar. Como resumiu singelamente Ratinho Jr., basta eleger “uma pessoa normal”.

Virar a página não é trocar um demagogo por outro. É abandonar a mentalidade retrógrada que nos prende a crises recorrentes, colocar a responsabilidade fiscal no centro da agenda, reafirmar o compromisso com instituições sólidas e abraçar o mundo como ele é, e não como o imaginário ideológico o descreve. O Brasil não aguenta mais Lula e Bolsonaro – e, se não superá-los de uma vez, estará condenado à mais profunda mediocridade.


Bem-estar individual com respeito aos direitos democráticos da maioria dos cidadãos? Um objetivo ainda distante na maior parte da humanidade - Paulo Roberto de Almeida

Bem-estar individual com respeito aos direitos democráticos da maioria dos cidadãos? Um objetivo ainda distante na maior parte da humanidade.

    Paulo Roberto de Almeida
Nota sobre os poucos progressos da humanidade.

   
         Vamos partir de coisas simples. O que conta mesmo, na vida de bilhões de habitantes do planeta, espalhados por 200 jurisdições nacionais, ou estatais, reconhecidas por suas bandeiras e símbolos distintos, não é exatamente a riqueza e o poderio total de cada uma dessas jurisdições separadas, e sim o bem-estar e a felicidade individual de cada um desses habitantes. Um país pode ser rico e poderoso, e ainda assim deixar ao relento uma parte dos seus nacionais.
        O império romano era rico e poderoso, mas ao preço da conquista, opressão, dominação e exploração de outros povos. Ou seja, apenas parte da sua população, no centro desse império, desfrutava de bem-estar e liberdade, no que era um sistema de patricios (ou nobres) explorando menos nobres e pobres na sua jurisdição, e uma maioria de oprimidos, dominados em povos conquistados pela força.
        As economias de mercado e o sistema baseado na propriedade individual legalmente protegida, com base em Estados (governos) regidos pela Lei, não pelo poderio individual de alguns poucos, permitiram, pela primeira vez na história da humanidade, criar mais riqueza e distribuí-la (ainda que muito desigualmente) entre uma maioria de cidadãos (sim, seres dotados de direitos legais, e não simples súditos, o que já foi um enorme progresso).
        A educação ampliada para uma maioria de cidadãos completou esse processo de melhoria das condições de vida para estratos cada vez mais largos da população dessas jurisdições nacionais que lograram combinar liberdades individuais e livre empreendedorismo em economias de mercado. 
        O capitalismo é apenas uma das formas das economias de mercado, algumas mais livres e legais do que outras, portanto mais prósperas, com maior grau de felicidade INDIVIDUAL.
        Os EUA se tornaram mais livres e prósperos, com base nos esforços individuais de milhões de imigrantes que buscaram maior liberdade, BEM ANTES, de se tornarem imperialistas, ao estilo romano, mas sem escravatura de outros povos, apenas com base no comércio e nos investimentos. Com isso ficaram poderosos e começaram a oprimir outros povos. 
        A China se desenvolveu tecnológica e economicamente com base em outro tipo de organização política e social, sem os requisitos legais da liberdade individual, mas com base num sistema meritocrático, selecionando os melhores gestores a partir do domínio individual do letramento e da cultura.
        Os EUA se deixaram embalar na sua riqueza e poderio conquistados com esforço, e derivaram para um sistema plutocrático, com a deterioração progressiva da educação, deixando-os na mesma situação do antigo império romano, desigual e opressor.
        A China, depois de larga decadência — situação atual dos EUA —, conseguiu restabelecer seu sistema tecnocrático que é relativamente eficiente para fins de riqueza e poderio, mas sem as liberdades individuais dos regimes ocidentais derivados do Iluminismo.
        China e EUA são os mais ricos e poderosos do momento, mas os seus habitantes não são, necessariamente, os mais prósperos e felizes no plano INDIVIDUAL. 
Prosperidade individual e felicidade relativa da maioria dos habitantes de uma determinada jurisdição nacional dependem de uma combinação única e original de fatores, que ainda não foram alcançados pela maior parte da humanidade.
        Esse “sucesso” relativo, temporário talvez, é observado num grupo muito pequeno de países, quase todos eles membros da OCDE. Mas não foi a OCDE que os converteu em prósperos e felizes, e sim uma evolução própria no caminho da prosperidade com garantia de liberdades, isto é, com uma democracia plena num regime de economia de mercado e de educação de boa qualidade. O pertencimento à OCDE ocorreu por uma circunstância específica da história das sociedades ocidentais, que puderam combinar sistemas legais de proteção à propriedade individual e educação progressiva da maioria dos cidadãos.
        Essa combinação depende de trabalho duro e de um pouco de “sorte”, o que não é alcançado espontaneamente, pois que a formação “natural” dos povos continua a ser baseada na exploração da maioria pelos ricos e poderosos.
        Os EUA plutocráticos e a China tecnocrática são ricos e poderosos cumulativamente, mas ainda não individualmente, pois continuam desiguais internamente.
        O Brasil ainda está longe de ser rico e poderoso cumulativamente, e muito menos individualmente, pois não possui nem um sistema legal que premie a riqueza adquirida numa economia de mercado baseada na proteção da propriedade individual, nem uma qualidade de educação que promova as liberdades democráticas da maioria da população. Poderemos chegar lá num futuro não definido, o que sou incapaz de prever neste momento. Não temos maturidade suficiente para desenvolver uma legítima economia de mercado e para prover a maioria da população com uma educação de qualidade.
        Alguns povos conseguem; nós ainda não o fizemos, o que não é uma condenação eterna.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 16/08/2025


Remembering old times… - Paulo Roberto de Almeida

Remembering old times…

        Em meus tempos de Washington, eu fiz muitos amigos brasilianistas, e até publiquei com Marshall Eakin dois livros sobre seus livros, cobrindo praticamente toda a produção acumulada entre 1945 e 2000.

        Gostaria de escrever a cada um deles para me solidarizar com todos eles a respeito do deplorável cenário atual de destruição das melhores tradições de estudos especializados de alto nivel, agora rebaixados por um presidente demencial. Não o faço, pois seria extremamente pungente.

        Lamento a terrível decadência da boa cultura americana e a promoção atual dos mais baixos e grotescos instintos de um sociopata colocado à frente do país mais relevante do planeta desde aproximadamente cem anos. Será substituído por uma nova potência econômica, tecnologicamente avançada, inovadora, mas desprovida daqueles valores que impulsionaram as liberdades democráticas que tanto prezamos em nosso universo intelectual. 

        Lamento, igualmente, que essa nova potência econômica esteja aliada a uma potência opressora, e que ela sustente um criminoso de guerra, um monstro que assassina diariamente civis inocentes, não só na Ucrânia, mas em seu próprio país.

        E lamento, mais profundamente ainda, que o atual governo brasileiro se apresente como um aliado objetivo de duas potências autocráticas, contra nossos princípios e valores.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 16/08/2025



Familia Mann: cultura e tragédia - Jurandy Valença (revista Humboldt, do Instituto Goethe)

Thomas Mann

TRAGÉDIAS FAMILIARES
A dinastia intelectual dos Mann
Jurandy Valença
Revista Humboldt (Instituto Goethe)

Traduzidas para mais de 40 idiomas e com milhões de exemplares vendidos, as obras do escritor alemão Thomas Mann são até hoje matéria-prima de diversos estudos e teses. É também incontornável a onipresença do patriarca na vida de seus filhos. Reconhecidos em suas respectivas trajetórias, eles escaparam, cada um a seu modo, da sombra do pai.

Nascido em Lübeck, Alemanha, em 1875, Thomas Mann se exilou nos Estados Unidos após a ascensão do nazismo em 1933 e só retornou à Europa em 1952, tendo vivido na Suíça até sua morte, em 1955. No exílio, converteu-se em cidadão estadunidense (em 1944) e foi um engajado ativista contra o regime fascista. Mann teve um papel importante enquanto esteve no desterro. Os Aliados providenciaram para que uma série de cartas suas fossem lidas no rádio. Eram 25 textos desancando Hitler e pedindo que a Alemanha voltasse à democracia – da qual Mann nem sempre havia sido um defensor. Esses discursos no rádio (Ouvintes alemães!) eram direcionados à população alemã e clamavam sem pudor à resistência contra o nazismo.

Em 1930, Thomas Mann publicou Mário e o mágico, uma das primeiras obras da literatura mundial a abordar (e preconizar) a ascensão, nos anos seguintes, dos regimes totalitários, sobretudo em sua terra natal. Como comenta o pesquisador brasileiro Marcus Mazzari [no posfácio A hipnose do nazismo, publicado na edição de Mário e o mágico, Companhia das Letras, 2023], “o fenômeno do fascismo, que parece não se limitar às catástrofes do século 20, encontrou na obra de Thomas Mann uma das representações literárias mais expressivas e multifacetadas”.
Descendentes influentes
Não há como escrever sobre o escritor sem falar sobre sua família, que se tornou uma espécie de dinastia intelectual ao longo das décadas – sua influência reverberou não só na Alemanha, mas no mundo todo. De origem privilegiada, o autor cresceu em uma abastada família de comerciantes. Em 1905, Thomas Mann se casou com Katia Pringsheim, física e matemática proveniente de uma rica família judaica, que se tornaria Katharina Hedwig Mann.

Tiveram seis filhos, vários dos quais seguiram carreiras de sucesso, principalmente Erika (1905-1969) e Klaus Mann (1906-1949). A primeira foi atriz, escritora, dramaturga, jornalista e produtora de teatro, tendo fundado em 1933 o cabaré político antifascista Die Pfeffermühle (O moinho de pimenta, em tradução literal).
Mephisto nas telas
Klaus, o segundo filho, também escritor, fugiu para o exílio na Holanda em 1933 a fim de escapar da perseguição política do regime nacional-socialista. Em Amsterdã, exerceu seu ativismo escrevendo para a revista Die Sammlung, na qual atacava o nazismo. Ele deixou várias obras, mas uma em especial teve grande repercussão: Mephisto (1936), publicada quando estava exilado e que teve adaptação para o cinema em 1981 pelo cineasta húngaro István Szabó (no ano seguinte, ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro).

O romance – baseado no mito de Fausto e Mefistófeles – tem como protagonista Hendrik Höfgen (inspirado na vida do famoso ator alemão Gustaf Gründgens, que foi casado com Erika, irmã de Klaus). Vale lembrar que Mefistófeles é a representação do diabo, enquanto Fausto simboliza um estudioso que busca conhecimento e faz um pacto com o demônio para alcançar seus objetivos.

Depois de uma longa luta contra a depressão e o vício em cocaína, heroína e morfina, Klaus cometeu suicídio em 1949 em Cannes, na França, ao tomar uma overdose de soníferos (Thomas não foi ao funeral). Aliás, a família Mann enfrentou diversos problemas de saúde mental, tendo o seu filho mais novo, o músico Michael Mann, se matado em 1977.
Ana em Veneza
Thomas Mann era filho de uma brasileira. Julia da Silva Bruhns (apelidada de Dodô) nasceu em 1851, em Paraty (RJ), filha do alemão naturalizado brasileiro Johann Ludwig Hermann Bruhns, um fazendeiro que tinha propriedades no Rio de Janeiro e em Santos (SP); e de Maria Luísa da Silva, brasileira de ascendência indígena e portuguesa (que morreu quando Julia tinha apenas cinco anos).

Seu pai, após a morte da esposa, retornou para a Alemanha com os filhos junto da babá negra Ana, personagem do livro Ana em Veneza (1994), do escritor brasileiro João Silvério Trevisan. Julia deixou a infância dourada e tropical ainda criança e foi para Lübeck, onde seu pai tinha parentes. Foi lá que, aos 17 anos, se casou com o futuro senador Johann Heinrich Mann, com quem teve cinco filhos, entre eles o célebre Thomas Mann.
Rede de conflitos
Segundo pesquisadores, Julia foi inspiração para diversas obras do filho. Ainda assim, o diplomata carioca André Chermont de Lima afirma no texto Thomas Mann e o Brasil: uma relação incompleta, publicado em 2021 pelo jornal O Estado de São Paulo, que os alemães tratavam com esnobismo o papel da cultura brasileira na formação da família Mann.

Além de Thomas, Julia teve Carla, Júlia, Viktor e Heinrich, este último também escritor e famoso por suas críticas à sociedade alemã. Em um dos livros de Heinrich Mann, Entre as raças (1907), a personagem brasileira tem nítida inspiração na mãe (precisamente nas memórias escritas por ela em 1903, Lembranças da infância de Dodô, que é uma das únicas fontes disponíveis sobre a vida da matriarca no Brasil).

Carla, aos 28 anos, cometeu suicídio tomando cianeto. Uma tragédia que reverberou muito tanto na vida de Julia quanto na de Thomas. A psicanalista e socióloga Marianne Krull, em Im Netz der Zauberer. Eine andere Geschichte der Familie Mann (Na teia dos magos. Uma outra história da família Mann, em tradução livre), apresenta o retrato de uma família nada exemplar, enredada em uma série de adultérios, assassinatos, brigas, ciúmes, drogas, homossexualidade, incesto, inveja e suicídios.
Questões sociais e políticas
Para os especialistas em sua obra, é inegável que Thomas Mann faz uso de vários dispositivos literários que conduzem o interesse do leitor para as circunstâncias de estrangeiro de seus personagens. Neles, o autor depositava suas angústias, dramas interiores e inquietações por intermédio de uma aguçada análise social, atrelando-os a temas filosóficos.

Enquanto leitores, não há, porém, como evitar o alumbramento de mergulhar com tempo em obras como a monumental tetralogia José e seus irmãos, que teve a Bíblia como inspiração para o escritor. Ela está no panteão e vem no lastro de grandes escritores do século 19, como Honoré de Balzac, Charles Dickens, Fiódor Dostoiévski, Michel Proust e Émile Zola, cujas obras abarcavam questões sociais e políticas. Para eles, como o próprio Mann afirma, “a moral é, sem dúvida, a maior questão da vida”. A nós, resta decifrar suas alusões e, tal como ele, nos reconhecer como estrangeiros nessa odisseia.

Este texto foi originalmente publicado pela Revista Cult e gentilmente cedido à Revista Humboldt para publicação em versão editada.

Jurandy Valença
Jurandy Valença é curador, jornalista e gestor cultural. Foi diretor da Biblioteca Mário de Andrade (2021-2025) e ocupou diversos cargos nas Secretaria de Cultura do estado e do município de São Paulo.
Copyright: Texto: Goethe-Institut, Revista Cult, Jurandy Valença.

Um “sucesso” que é um retrocesso - Paulo Roberto de Almeida

Um “sucesso” que é um retrocesso

O chamado “PIX Global” do BRICS é um retorno ao bilateralismo anterior ao sistema multilateral de pagamentos estabelecido em Bretton Woods. Como simples mecanismo automático de liquidação de transações entre cada um dos países participantes do esquema pode até funcionar, dispensando o dólar, mas cada país vendedor fica com ativos liberados na moeda digital do país comprador, sem que possa usar em qualquer outra transação, dentro ou fora do BRICS. 

Os participantes podem até estabelecer uma moeda digital comum, mas quem vai determinar o valor real desse ativo nas transações entre eles próprios e com terceiros países? 

Essa criptomoeda será conversível em quaisquer outras moedas?

Sem isso não haverá sistema multilateral de pagamentos, e sim um conjunto de transações amarradas bilateralmente.

Isso é um progresso?

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 16/08/2025


Comentário a propósito desta postagem: 

https://diplomatizzando.blogspot.com/2025/08/brics-acelera-criacao-de-pix-global.html



Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...