O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

A destruicao do sistema multilateral de comercio por Mister Trump (news)

Absolutamente inédito na história econômica mundial: o país que inagurou o moderno sistema mundial de comércio, baseado no multilateralismo aberto, está agora, por iniciativa de um presidente absolutamente idiota, desmantelando o sistema, destruindo suas bases, retirando as condições de funcionamento do sistema baseado na OMC.
Paulo Roberto de Almeida

COMÉRCIO INTERNACIONAL E PROMOÇÃO COMERCIAL

Trump rejeita texto da OMC e abre crise na entidade

Países-membros denunciam tentativa da Casa Branca de esvaziar entidade e de bloquear funcionamento dos tribunais da organização
Jamil Chade CORRESPONDENTE / GENEBRA

O Estado de S. Paulo, 23/11/2017 

 

O governo dos EUA se recusou ontem a apoiar texto da Organização Mundial do Comércio (OMC) que tratava da importância em manter o sistema multilateral de comércio e da abertura dos mercados. A ação foi interpretada como um ato deliberado para minar a entidade.
O governo dos Estados Unidos se recusou ontem a apoiar o texto de declaração ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), levando as negociações para um acordo na entidade, que se reúne em dezembro em Buenos Aires, a um impasse. A Casa Branca ainda anunciou no mesmo dia que vetaria a nomeação de novos juízes para os tribunais da
OMC, abalando o sistema de solução de controvérsias.
Num texto que falaria da importância em se manter o sistema multilateral do comércio, da abertura dos mercados e de se buscar formas de encontrar acordos para agricultura, pesca e outros setores, o comportamento dos EUA foi interpretado como um ato deliberado para minar a entidade.
A Casa Branca alegou que o texto não atendia a suas expectativas, acusando-o de dar atenção excessiva a questões de desenvolvimento e que não aceitaria a declaração sobre a “centralidade” do sistema multilateral do comércio.
Durante a reunião do G-20, Trump já havia se recusado a aceitar uma linguagem parecida. Um processo semelhante foi registrado na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e mesmo na Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec). Desta vez, não seria diferente no caso da OMC.
A partir de agora, o processo apenas pode ser resgatado por uma decisão política, num acordo entre ministros. O governo argentino, anfitrião do encontro, garantiu ontem que não vai desistir do processo. Para o porta-voz da OMC, Keith Rockwell, governos fizeram avanços importantes nos últimos dias. “Mas não atingiram a meta”, disse. “O bastão agora será passado aos ministros”, explicou.
Mas, entre as delegações, o gesto dos EUA foi interpretado como um sinal claro de que a administração de Donald Trump não está interessada em fortalecer a OMC. Durante sua campanha eleitoral, o americano chegou a ameaçar uma retirada da entidade e, por meses, o esforço do brasileiro Roberto Azêvedo, diretor-geral da OMC, foi a de garantir que os canais com a Casa Branca estivessem abertos.
A interpretação, agora, é de que Washington poderá privilegiar apenas acordos bilaterais ou mecanismos pelos quais ele possa manter o controle.
O golpe, se consumado, pode ter um sério impacto para os países emergentes, entre eles o Brasil, que dependem das regras internacionais para ter alguma chance de evitar medidas protecionistas e corrigir distorções. O fracasso desta semana, depois de dez dias de negociações, deixou vários governos em alerta.
Esvaziar. Mas o golpe contra a entidade não ocorreu apenas na declaração de Buenos Aires. Governos ainda denunciam a tentativa da administração de Donald Trump de esvaziar a OMC, impedindo que seu órgão máximo de solução de disputas possa nomear juízes para avaliar os casos. Ontem, a entidade realizou a última reunião do ano para debater a situação do funcionamento de seus tribunais. O governo americano, uma vez mais, rejeitou qualquer iniciativa para preencher as vagas abertas entre os juízes.
O resultado da posição americana é que, a partir de dezembro, a OMC contará com apenas quatro membros do órgão de solução de disputas, instância que serve como uma espécie de Supremo Tribunal do comércio e que tradicionalmente dispõe de sete juízes. Hoje, o órgão conta com cinco membros. Mas o mandato de um deles termina no dia 11 de dezembro e não há substituto designado.
Com praticamente metade de seus delegados, o tribunal máximo do comércio está ameaçado, justamente num momento em que as disputas tiveram um salto importante.
“A entidade foi criada para o benefício de todos, menos o nosso.” Donald Trump PRESIDENTE DOS EUA EM ENTREVISTA À FOX NEWS
Escolha de juízes
Em fevereiro, a OMC precisa dar início à seleção dos novos juízes, porque os mandatos vão vencer. Mas o governo Trump tem usado diferentes justificativas para frear o processo. No início do ano, Washington apontava que a transição entre as administrações exigia um certo tempo da Casa Branca para avaliar suas posições no comércio global.
Mas, em meados do ano, problemas técnicos foram alegados para impedir que a nomeação de novos juízes fosse realizada. Documentos revelados na semana passada pela imprensa americana, porém, revelam que o governo Trump já tratava da questão das nomeações desde fevereiro, na surdina.
Roberto Azêvedo, diretorgeral da OMC, chegou a tratar do assunto em uma viagem a Washington em setembro e a esperança era de que a crise pudesse ser superada antes do fim do ano.
Ontem, porém, a administração Trump voltou a bloquear a escolha de novos membros. Como resposta, 52 países se uniram para propor que a escolha dos novos árbitros ocorra no início de 2018, evitando assim a paralisia da entidade. Para a delegação brasileira, o que mais preocupa é que os americanos não estão dando esclarecimentos sobre o que deve ser feito para que seu veto seja alterado. Para o Itamaraty, o risco é de que o órgão passe a ser “disfuncional”.

Valor Econômico – EUA barram declaração ministerial da OMC

Assis Moreira | De Estocolmo
 Faltando menos de três semanas para a grande conferência ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) na Argentina, um impasse provocado na prática pela política de Donald Trump de "America First", caracterizada pelo nacionalismo econômico, explodiu de vez ontem na entidade.
O embaixador da África do Sul, Xavier Carim, presidente do Conselho Geral, orgão máximo da OMC, decidiu suspender as negociações entre os mais de 160 países sobre a declaração ministerial na conferência na Argentina, na qual teria destaque a defesa do sistema multilateral de comércio.
Isso porque a delegação dos EUA, que insiste que os países devem discutir o futuro da OMC, deixou claro que não havia condições para declaração, em meio à reação dos outros países que temem efeitos do isolacionismo americano.
Se nem a declaração ministerial pode ser negociada, todo o resto corre o risco de ficar paralisado. Temas que são discutidos, como a proibição de alguns subsídios para o setor pesqueiro, sofrem freio brutal, com Washington empurrando a conferência para o fiasco.
A presidente da conferência, Susana Malcorra, ex-ministra das Relações Exteriores da Argentina, insiste que, face à "incerteza política e econômica crescente", o que conta não são apenas os aspectos técnicos das questões em discussão, mas princípios do comércio internacional fundado em regras transparentes e comuns.
O que os negociadores do governo Trump deixaram claro na OMC foi a posição predominante na Casa Branca. Trump reclama do sistema multilateral e não hesita em acusar a OMC de fazer os EUA baixarem suas próprias barreiras comerciais, enquanto outros países não fariam o mesmo, e de tratar os EUA de maneira injusta.
Em recente viagem à Ásia, Trump fez forte defesa do nacionalismo econômico, deixando claro o pouco interesse pelo sistema multilateral. "Farei acordos comerciais bilaterais com qualquer nação do Indo-Pacífico que queira ser nosso parceiro e respeite os princípios de comércio leal e recíproco", afirmou ele no Vietnã.
Segundo Trump, os EUA sob sua liderança não mais entrarão em acordos comerciais grandes, "que amarram, que prendem nossas mãos, entregam nossa soberania e cuja execução significativa é praticamente impossível".
Na cúpula da Ásia-Pacífico, no Vietnã, com muito custo os países chegaram a uma declaração reconhecendo "o trabalho da OMC em assegurar comércio internacional baseado em regras, livre, aberto, justo e transparente". Eles se comprometeram a cooperar para melhorar o funcionamento do órgão xerife do comércio internacional.
O que pode acontecer em Buenos Aires é uma declaração pessoal da presidente da conferência ilustrando o que ela ouviu dos países. Algum entendimento global sobre qualquer tema, no entanto, por ora parece quase impossível.

Trade Policies: multilateral and regional scenarios - Yorizumi Watanabe, UnB, 1//12/2017

O melhor especialista japonês que conheço em políticas comerciais, estratégias nacionais e das multinacionais, cadeias de valor e integração regional na Ásia Pacífico.
Imperdível para todos os que trabalham com negociações comerciais em geral.
 
Yorizumi WATANABE
Following several appointments in Japan's foreign service, specializing in international
trade policy issues, Professor Watanabe has now brought those skills and experience to
the senior academic post he has filled at Keio University since 2005.
Prof. Watanabe’s distinguished career has featured significant engagement in all the
major bilateral and multilateral trade negotiations in which Japan has been involved in
the past two decades. This included the role of policy advisor to relevant Ministers, and
postings to Japan's diplomatic missions in Brussels and Geneva.
He was Deputy Director-General of the Economic Affairs Bureau, Ministry of Foreign
Affairs of Japan from 2002-2004 and served as Chief Negotiator for the Japan-Mexico
Economic Partnership Agreement (EPA) and the Working Party on Russia’s
Accession to the WTO. He was Special Assistant to the Minister for Foreign Affairs of
Japan in 2004. He has been a member of the Task Force on Japan-India Economic
Partnership, Japan Chamber of Commerce and Industry since 2006.
Prof. Watanabe completed his BA and MA and was PhD candidate in International
Relations at Sophia University, Tokyo. He also studied at the College of Europe in
Bruges under Belgian Government Scholarship. He is the author of a number of
publications on GATT/ WTO and trade and economic partnership agreements. His
most recent book on the TPP (Trans-Pacific Strategic Economic Partnership
Agreement) has been ranked one of the top-ten best-selling books on economics in
December, 2011 in Tokyo.

Professor Yorizumi WATANABE
Institution: Keio University Yorizumi@sfc.keio.ac.jp
Languages: Japanese, English, French
Areas of expertise:
International political economy, World Trade Organisation, FTAs (Free Trade
Agreements) and Trade Rules/Negotiations
Biography:
Professor Watanabe (Osaka, 1953) is currently Professor of International Political
Economy at Keio University, Japan
[Experience]
- Special Assistant on GATT/UNCTAD Issues, Permanent Mission of Japan to the
International Organizations in Geneva (1985.3. -1988.3)
- Economic Affairs Officer, Tariff Division, GATT Secretariat, Geneva (1988.4-1990.4)
- Associate Professor of International Political Economy, Faculty of Economics, Nanzan
University, Nagoya, Japan (1990.4-1997.8)
- Special Assistant on Trade Policy Issues, Mission of Japan to the European Union,
Brussels (1995.7-1998.7)
- Professor of International Political Economy, Faculty of Comparative Culture, Otsuma
Women's University, Tokyo (1997.8-2005.3)
- Deputy Director-General, Economic Affairs Bureau, Ministry of Foreign Affairs, Tokyo,
Japan (2002.5- 2004.3)
- Chief Negotiator for the Japan-Mexico Economic Partnership Agreement (2002.5-
2004.3)
- Chief Negotiator, Working Party on Russia’s Accession to the WTO (2002.5- 2004.3)
- Chief Negotiator, Working Party on Trade and Competition Policy (2002.5- 2004.3)
- Senior Official for Trade and Investment (SOMTI), ASEM (2002.5- 2004.3)
- Special Assistant to the Minister for Foreign Affairs, Tokyo, Japan (2004.4.-2004.11)
- Professor of International Political Economy, Faculty of Policy Management, Shonan
Fujisawa Campus (SFC), Keio University, Japan (2005.4 to date)
[Education]
- Department of Philosophy, Sophia University, Tokyo (Bachelor of Arts) (1972.4-1976.3)
- Department of Economics, College of Europe, Bruges, Belgium (Certificate of
Advanced European Studies) (1976.9-1978.6)
- Graduate School of International Relations, Sophia University, Tokyo (Master of Arts in
International Relations in 1981, Candidate for Ph.D. in 1982)
[Other Professional Activities]
- Member of a semi-governmental task force on Japan-Korea Free Trade Agreement
(1999.1-2000.3)
- JICA (Japan International Cooperation Agency) expert to conduct WTO seminars in
Kazakhstan and Latvia (1999. 8-10)
- JETRO (Japan External Trade Organization) expert to conduct a WTO seminar in
Tehran, Iran (2000.8)
- Member of a research team on WTO New Round issues at the Institute of International
Policies (IIPS), (Sekai-heiwa kenkyuusho), Tokyo (2001.8-2003.3)
- Chairman of a task force on Japan-China Trade Relations and the WTO Rules, Institute
of Japan-China Economic Cooperation, Tokyo (2001.11-2002.3)
- Member of a committee on Capacity-Building Cooperation within the WTO System for
developing economies of the APEC, Japan International Cooperation Agency (JICA),
Tokyo (2000.10- 2002.3)
- Member of the Joint Study Group on the Japan-Chile Economic Partnership Agreement
(EPA) (2005.1-2005.10)
- Member of the Task Force on Japan-India Economic Partnership, Japan Chamber of
Commerce and Industry, Tokyo, Japan (2006.7- present)
- JICA expert to conduct a WTO seminar in Alger, Algeria (2007.3-4)
[Publications]
1) The GATT and the Uruguay Round (co-author with Prof. Tamotsu Takase), Toyo
Keizai, Dec. 1993, revised version Jan. 1999
2) Law and Politics of Contemporary Japan, (co-author with Prof. Masanobu Kato),
Sanseido, July 1994
3) “The United States and the European Community in the Uruguay Round”,
International Affairs, Japan Institute of International relations, May 1994
4) “Perspectives of Free Trade Agreement (FTA) in East Asia and the WTO System”,
Journal of International Economic Laws, Japan Association of International Economic
Laws, October. 2001
5) WTO Handbook; Issues and Perspectives of the Doha Development Agenda, JETRO
PRESS, Tokyo, Japan, October 2003
6) FTA-EPA Negotiations, Nihon Keizai Hyoron Sha, May 2007
7) The GATT/WTO System and Japan, Hokujyu Publications, October 2007

"Percursos Diplomaticos": embaixadora Thereza Quintella; HOJE, 24/11, 15hs

Mais um da série "Percursos Diplomáticos": venham todos!

A Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG), com o apoio do seu Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI), e o Instituto Rio Branco (IRBr) convidam para a palestra-debate “Percursos Diplomáticos”, a ser proferida pela embaixadora Thereza Maria Machado Quintella.

A palestra será realizada no auditório Paulo Nogueira Batista, em 24 de novembro, às 15h.

Thereza Quintella ingressou na carreira diplomática em 1961. Além de embaixadora em Viena (1991- 1995) e em Moscou (1995-2001), foi diretora do IRBr e presidente da FUNAG. Sua trajetória diplomática contribuiu para promover a igualdade de gênero no Itamaraty.
Inscreva-se!
http://funag.gov.br/sisev/
Serviço
Tema: "Percursos Diplomáticos".
Palestrante: Embaixadora Thereza Maria Machado Quintella.
Local: Auditório Paulo Nogueira Batista, Brasília.
Data e hora: 24 de novembro, às 15h.

Venezuela: a confusa situacao de sua divida externa (Financial Times)


EUA, Rússia e China fazem suas apostas na crise da Venezuela

John Paul Rathbone e Robin Wigglesworth | 
Financial Times, de Miami e Nova York
Valor Econômico, 23/11/2017

Na semana passada, a convite do presidente Nicolás Maduro, um grupo de credores internacionais esteve em Caracas para iniciar o que vem sendo classificado de a mais complicada reestruturação de dívida do mundo, além de uma das maiores e certamente uma das mais estranhas.
Ressaltando o contraste de uma economia amparada pelas maiores reservas de petróleo do mundo, mas à beira do colapso, o governo Maduro estendeu um tapete vermelho para seus convidados e posicionou uma guarda cerimonial.
A Venezuela busca uma solução que seja boa para todos, disse o vice-presidente, Tareck El Aissami, aos investidores. O país continuará pagando a sua dívida externa, de US$ 150 bilhões, assegurou, embora agências de classificação de risco estivessem emitindo alertas de calotes enquanto ele falava. O pronunciamento terminou meio hora depois. Os participantes saíram com presentes, como pacotes de café e chocolates finos, mas sem nenhum esclarecimento. O governo declarou a reunião um sucesso.
"Estamos todos tentando descobrir se há um método nessa loucura da Venezuela", diz Peter West da consultoria EM Funding. "Se você estiver um pouco confuso... não se sinta mal", acrescentou Russ Dallen da Caracas Capital, um especialista na dívida da Venezuela.
A confusão deriva, em parte, da complexidade das obrigações da Venezuela, que foram emitidas por várias entidades, com várias cláusulas legais, para múltiplas partes. O país deve US$ 64 bilhões a detentores de bônus, mais de US$ 20 bilhões aos aliados China e Rússia, US$ 5 bilhões a credores multilaterais, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), e dezenas de bilhões a importadores e firmas de serviços que mantêm a crucial indústria do petróleo funcionando e o regime respirando.
As incertezas resultam da noção de que a Venezuela embarcou num "plano de reestruturação" clássico. Caracas não está iniciando um exercício de reescalonamento da dívida, sustentabilidade e outras medidas que geralmente marcam uma renegociação. Em vez disso, o país começou um jogo de pôquer sem limite de apostas.
Com exceção dos detentores de bônus, para outras cinco partes interessadas- governo, oposição, EUA, Rússia e China - o prêmio vai muito além do dinheiro. Está em jogo a sobrevivência política de um governo, o destino de 30 milhões de cidadãos venezuelanos e os interesses geopolíticos conflitantes de três superpotências.
"É um jogo complexo com muitos jogadores, e que poderá ter um resultado ruim", diz Robert Kahn, ex-funcionário do Fundo Monetário Internacional (FMI) e veterano de outras crises de dívidas soberanas. "Além disso, muitos dos jogadores não conhecem nem entendem as motivações dos demais."
O governo Maduro quer apenas sobreviver. Ele teme que os detentores de bônus, que querem apenas ser pagos, possam confiscar suas cargas de petróleo no caso de um default, tirando de Caracas a sua única fonte de receitas. Entre as superpotências, Washington quer abreviar um regime envolvido com o tráfico de drogas, que possui reservas de petróleo avaliadas em US$ 15 trilhões e distante só três horas de avião dos EUA.
Moscou tenta transformar Caracas numa base avançada nas Américas. Os interesses da China são mais comerciais: por ter emprestado a Caracas mais de US$ 60 bilhões na última década, Pequim quer manter acesso às enormes reservas de energia da Venezuela.
Contribuindo para a complexidade estão as regras - ou ausência delas. Todos os bônus da Venezuela no mercado externo estão submetidos às leis de Nova York. Mas a presença da Rússia e da China no jogo é um complicador a mais numa reestruturação que será, ao menos parcialmente, conduzida fora do FMI ou do Clube de Paris.
Depois, há o fato de os dois venezuelanos encarregados de conduzir o processo, El Aissami e Simon Zerpa, o ministro de Economia, serem alvos de sanções dos EUA acusados de tráfico de drogas e de casos de abusos dos direitos humanos. A nomeação dos dois indica que Caracas se imagina operando num universo legal paralelo - como demonstra o jogo de pôquer que se desenrola.
Uma das poucas coisas que estão claras nesse exercício de blefes é que a Venezuela não pode mais arcar com sua dívida. Há dez anos, em meio ao boom dos preços das commodities, a Venezuela recebeu de um fluxo extraordinário de petrodólares estimado em US$ 1 trilhão. Com ajuda de Wall Street, Caracas emitiu mais de US$ 50 bilhões em bônus. Junto com o dinheiro dos chineses e outros empréstimos, isso quadruplicou a dívida externa. Grande parte do dinheiro se perdeu ou foi roubado - até US$ 300 bilhões, segundo ex-ministros. Agora, Caracas está sem recursos.
As reservas internacionais estão abaixo de US$ 10 bilhões, perto do menor patamar em 20 anos. As importações caíram 85% em cinco anos, algo muito pior que o mais austero dos programas do FMI. No mercado paralelo, a taxa de câmbio está 7.000 vezes acima da taxa oficial, e a produção média diária de petróleo - a única fonte de divisas estrangeiras - encolheu 20% em relação ao ano passado.
Além disso, a Venezuela sofre com a hiperinflação, com os preços subindo mais de 50% só no mês passado. Nenhuma economia consegue sobreviver à hiperinflação por muito tempo. Com o calote da dívida à vista, mudanças podem estar chegando para a Venezuela.
Certamente é isso que a oposição espera. Embora abalada e dividida, ela é uma carta potencialmente forte nesse jogo. Sanções impedem instituições dos EUA de negociar emissões da dívida refinanciada da Venezuela, o que efetivamente torna impossível uma reestruturação. A única exceção é se a dívida for autorizada pela Assembleia Nacional, controlada pela oposição.
Em tese, isso abre a possibilidade de uma barganha política que poderia resultar numa mudança mais profunda. A oposição poderia aprovar um refinanciamento da dívida. Em troca, o governo permitiria eleições presidenciais livres, justas e monitoradas internacionalmente no ano que vem.
Se o governo está preocupado, até agora não deu muitos sinais disso. Além disso, Maduro tem bons motivos para achar que pode blefar com os EUA, com a oposição e com os detentores de bônus.
Aconselhado pela inteligência cubana, que por sua vez foi instruída pelos soviéticos, Maduro exerce um domínio "orwelliano" sobre o país. À parte a Assembleia Nacional, todas as demais instituições estão o sob seu controle - incluindo a Suprema Corte, a imprensa, a autoridade eleitoral e os militares.
Há escassez de alimentos - e grande parte do que está disponível é distribuído por meio de um programa estatal subsidiado, que Maduro pode usar para coagir o apoio público. A oposição está exausta depois que as manifestações em massa deste ano não produziram mudanças, apesar dos mais de 100 mortes. Começa até mesmo a surgir uma "oposição fiel", cooptada pelo governo.
"Tudo isso deixar o presidente Nicolás Maduro numa posição confortável" e também "reduz significativamente as chances de uma mudança de regime", escreveu Risa Grais-Targow, da consultoria de risco Eurasia.
Deve ser por isso que Maduro iniciou as discussões sobre a dívida em primeiro lugar. Mesmo um calote não seria necessariamente o fim. Ele poderia usar os US$ 9 bilhões previstos de serviço da dívida em 2018 para dobrar a importação, aumentando assim suas chances na eleição do ano que vem. Enquanto isso, seus advogados trabalhariam para rebater as queixas dos investidores nos tribunais.
"O governo jamais irá negociar se não achar que essa será a sua melhor operação", diz um analista a par da situação. "E esse momento ainda não chegou."
Apesar da escassez de divisas, Caracas continua pagando os credores privados, ainda que de maneira irregular, graças à generosidade de Moscou e Pequim.
Na semana passada, a Rússia reestruturou sua dívida bilateral de US$ 3,5 bilhões com a Venezuela, liberando recursos para Caracas pagar outros credores. A China, embora relute em aumentar sua exposição de cerca de US$ 20 bilhões à Venezuela, também parece preferir o status quo político.
"A Venezuela é um atoleiro para a China", diz Margaret Myers, uma especialista em China do instituto Inter-American Dialogue, de Washington. "Mas a sensação geral é que Pequim vai desembolsar outros US$ 4 bilhões ou coisa parecida para a Venezuela neste ano, por meio do fundo estabelecido em joint-venture pelos dois países. Mas a China não irá além disso."
Este promete ser um jogo de pôquer exaustivo. Mas haverá um ajuste de contas. A hiperinflação venezuelana e a contínua queda na produção de petróleo serão responsáveis por isso. Nem Moscou, nem Pequim continuarão reestruturando a dívida da Venezuela indefinidamente enquanto investidores em bônus continuam sendo pagos. Quando esse momento chegar, os outros jogadores terão de arriscar tudo, ou ceder.
Os EUA poderão ser os primeiros a subir a aposta. O país poderá ampliar a proibição de viagens e o congelamento de ativos de autoridades venezuelanas. Também poderá emitir sanções secundárias contra companhias de petróleo russas e bancos chineses que negociam com a Venezuela, assim como tem feito com empresas que têm negócios com a Coreia do Norte. A maior sanção de Washington seria a "opção nuclear" de proibir a importação de 600 mil barris de petróleo/dia da Venezuela.
Quanto aos detentores de bônus, em algum momento eles terão de decidir se vão esperar para receber propostas de reestruturação do governo da Venezuela ou elaborar suas próprias propostas.
Em caso extremo, isso significaria o confisco de cargas de petróleo. Se essa estratégia for bem-sucedida, Maduro enfrentaria uma escolha difícil. Ele poderia desistir e fugir para o exílio em Cuba - uma saída já sugerida a Havana por diplomatas latino-americanos. Ou, ele poderia resistir e reprimir uma instabilidade social crescente. O papel dos militares seria então crucial: eles continuam leais a Maduro, mas isso pode não durar para sempre - como mostrou o Zimbábue recentemente.
As apostas foram feitas. O jogo será difícil, mas os retornos são potencialmente altos. Isso se aplica especialmente àqueles investidores dispostos a suportar uma batalha como a que produziu lucros descomunais para vários "fundos abutre" que compraram títulos da dívida da Argentina na reestruturação de US$ 100 bilhões em bônus do país, e então entraram com processos buscando o reembolso integral ao preço nominal.
"No fim, eles vão ganhar mais dinheiro na Venezuela do que ganharam na Argentina", diz Hans Humes, presidente da Greylock Capital, que está formando uma comissão de investidores. As consequências geopolíticas e humanitárias deverão ser ainda maiores. 

(Tradução de Mario Zamarian)


quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Despesas publicas: estudo do Banco Mundial recomenda varias reformas - Editorial Estadao

Gastar menos e fazer mais

Estudo do Banco Mundial contém material de alta qualidade para discussão na campanha eleitoral. Falta saber se haverá candidatos bastante sérios para tratar desses assuntos

Editorial Estadão, 23/11/2017

O governo pode fazer mais com menos dinheiro, produzindo serviços com mais eficiência e tratando os cidadãos com mais equidade, segundo um estudo recém-divulgado em Brasília pelo Banco Mundial. O trabalho contém material farto e de alta qualidade para discussão na campanha eleitoral do próximo ano. Falta conferir se haverá candidatos bastante sérios para tratar de assuntos como a melhora da administração, a reforma do Orçamento, a distribuição mais equilibrada e mais justa de encargos e benefícios e a definição mais pragmática e realista de metas e programas. As propostas são dirigidas a quem estiver disposto a enfrentar com seriedade e honestidade algumas questões tão simples quanto importantes. Exemplos: por que os pobres devem financiar ensino universitário gratuito aos jovens das classes mais abonadas? Por que o Tesouro deve conceder benefícios custosos e ineficientes a grupos empresariais mais interessados no conforto do que na busca de competitividade?
O governo brasileiro gasta mais do que pode e, além disso, gasta mal: essa “é a principal conclusão do estudo”. Nenhum remédio será satisfatório, portanto, se o problema do gasto mal executado ficar sem tratamento. Nesse caso, mais dinheiro à disposição do poder público será mais dinheiro desperdiçado. Não é uma questão ideológica, mas aritmética e pragmática.
As mudanças propostas no estudo podem servir a governos de várias orientações – se forem razoavelmente sérios. Afinal, o uso mais eficiente do dinheiro pode servir à execução de diferentes tipos de política. Mas a eficiência dependerá de algumas condições.
Uma delas é a reforma da Previdência, apontada como a fonte mais importante de economia no longo prazo. Não há como contornar os desafios impostos pelas mudanças demográficas, argumentam os autores do estudo, repetindo um argumento realista e bem conhecido. Além disso, a reforma poderá tornar mais equitativo um sistema caracterizado por distribuição desigual de benefícios entre ricos e pobres e entre servidores públicos e trabalhadores do setor privado.
Sem essa e outras mudanças, o teto de gastos ficará na lembrança como mais uma iniciativa bem-intencionada e de curtíssima utilidade. O limite constitucional dos gastos só terá um sentido prático se for invertida a tendência dominante nos últimos anos. Será necessário executar nos próximos dez anos um corte acumulado de quase 25% nas despesas primárias (isto é, sem juros) da administração federal. A contenção do gasto exigirá várias medidas além do combate ao déficit previdenciário.
As propostas incluem, entre os primeiros itens, a redução da massa de salários do funcionalismo público, medida tanto de eficiência como de equidade. A redução pode ser obtida pela diminuição do quadro de pessoal e pelo corte gradativo das vantagens. A remuneração do funcionário federal, segundo o relatório, é em média 67% superior à dos trabalhadores do setor privado (mesmo levando-se em conta diferenças de nível educacional).
O governo também poderá economizar melhorando seu sistema de compras e assim reduzindo desperdícios. Poderá abandonar políticas muito caras e ineficientes de estímulo às empresas, com custos equivalentes a 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015. A ineficiência dessas políticas, com escasso ou nenhum resultado em termos de crescimento, foi apontada várias vezes por analistas brasileiros. O governo apenas mexeu em alguns de seus componentes.
Algumas inovações são politicamente complicadas, caso da unificação dos programas de proteção social. A eliminação da gratuidade como padrão geral da universidade pública seria certamente recebida com muitas críticas, embora dois terços dos beneficiários pertençam aos 40% mais aquinhoados. A mudança seria compatível com programas de financiamento e de bolsas.
Racionalidade e eficiência são raramente populares. É muito mais fácil defender políticas populistas, mesmo quando inflacionárias e injustas, como tem sido no Brasil. Enfrentar o populismo, no entanto, é hoje indispensável para garantir o futuro do País.

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

Rubens Ricupero entrevistado na TV Brasília - links para os videos

Em Brasília para o lançamento do seu livro "A diplomacia na construção do Brasil, 1750-2016" (Rio de Janeiro: Versal Editores, 2016), o embaixador Rubens Ricupero compareceu, na quarta-feira, 22/11/2017, à TV Brasília, vinculada ao Correio Braziliense (dos Diários Associados), convidado pelos jornalistas Vicente Nunes e Denise Rothenburg, aos quais concedeu, no âmbito do programa CB-Poder, a entrevista constante dos seguintes links:

No dia 23/11, o Correio Braziliense traz uma página inteira com a entrevista ao CB-Poder do dia anterior.
 
Mais abaixo a materia em png.





A Nova Matriz Economica e a Grande Destruicao - Cristiano Romero (Valor)

Cristiano Romero chama a nossa pior recessão de todos os tempos de a Grande Recessão, à qual eu dou o nome de Grande Destruição, pois foi disso que se tratou a partir dos monumentais erros de gestão econômica dos aloprados que tomaram conta do Brasil nos últimos anos. Eles não eram economistas, mas sim o que eu  chamo de keynesianos de botequim.
Eu acho que foi um período de trevas, a nossas "Dark Age", num sentido metafórico.
E acho que foi muito além disso, ou seja, de meros equívocos; eu arriscaria dizer que muitos "equívocos" foram deliberados, para dar vantagns a determinados agentes econômicos que, depois, eram gentilmente convidados a fazer doações "legais" (e também ilegais) ao partido neobolchevique e seus meliantes políticos.
Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 22 de novembro de 2017


Ainda, a Nova Matriz
 Cristiano Romero
Valor Econômico, 22/11/2017



Muitas teses já foram feitas sobre as causas da Grande Recessão, como ficou conhecida a derrocada da economia brasileira entre 2014 e 2017. Poucos analistas duvidam, porém, do fato de que a Nova Matriz Econômica, um conjunto amplo de políticas adotadas pelo governo Dilma Rousseff a partir de agosto de 2011, foi a principal responsável pela ruína. A recessão, segundo o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos da FGV, começou no segundo trimestre de 2014 e terminou em 2016, tendo durado, portanto, quase três anos. Como foi uma tragédia provocada por equívocos de política econômica e não fruto de uma crise externa, seus efeitos devem ser lembrados à exaustão - entre outros, queda acumulada de 8,6% do PIB e de mais de 10% da renda per capita, 14 milhões de desempregados e explosão da dívida pública.
Outros fatores contribuíram para a debacle, mas não foram tão disruptivos para a confiança de empresários e consumidores. A Nova Matriz foi concebida, em meados de 2011, sob a justificativa de que a crise mundial ocorrida entre 2007 e 2009 estava recrudescendo. A economia mundial, de fato, diminuiu o ritmo de crescimento a partir de 2012 e o boom de commodities, puxado pelo forte crescimento da China e fonte relevante da expansão brasileira entre 2004 e 2010, acabou naquela época. Apesar disso, o "fim do mundo" não adveio, como profetizaram os economistas do governo, que, na verdade, já queriam mudar tudo desde o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.
Nunca uma crise foi tão antecipada quanto a que resultou na "Grande Recessão". Dilma Roussef tinha uma obsessão desde que botou os pés em Brasília para assumir o comando do Ministério das Minas e Energia, em janeiro de 2003: reduzir a Taxa Básica de Juros(Selic), que serve de parâmetro para o custo da dívida pública e funciona como referência para toda a economia. Achava que, com isso, o Brasil cresceria de forma acelerada.
Com a Nova Matriz, o PT finalmente fez o que prometeu
Ignorando todas as razões - apontadas por inúmeros estudos acadêmicos - que levam a taxa de Juros de um país chegar a níveis pornográficos, Dilma achava possível diminuir a Selic na marra. Bastava mandar o Banco Central (BC) tomar providência. Nenhum governo fez isso antes, acreditava, nem mesmo Lula, que lhe deu a Presidência da República de presente, porque todos tinham parte com o diabo, isto é, com os rentistas, os que vivem dos Juros altos pagos pelos Títulos públicos.
Começou, assim, no fim de agosto de 2011, a sequência de mudanças da política que, desde meados de 1999, vinha reduzindo a inflação, diminuindo a volatilidade do produto, fortalecendo as finanças públicas e acelerando a taxa de expansão da economia brasileira - e que levou Dilma à Presidência! Naquele mês, contrariando todos os sinais emitidos por seus documentos, além das expectativas do mercado quanto à inflação futura, o BC cortou os Juros, em vez de aumentá-los.
A Nova Matriz cortou a taxa de Juros de 12,50% para 7,25% ao ano no espaço de um ano; o Câmbio se desvalorizou, mas não sem um empurrão do governo, que aplicou IOF numa série de operações de entrada de capitais; o regime de metas para inflação foi flexibilizado, uma vez que o teto do regime (6,5%) passou a ser a meta, que deveria ser 4,5%, conforme decreto presidencial; a disciplina fiscal foi simplesmente abandonada, mas sem que o distinto público fosse informado.
Em 2012, para "cumprir" a meta de Superávit primário prevista em lei, os economistas de Dilma usaram a "contabilidade criativa". Uma das artimanhas era promover troca de ativos entre as estatais para gerar dividendos contábeis que reforçassem o resultado fiscal. O ardil foi logo descoberto pela imprensa e, no ano seguinte e também em 2014, a turma fez algo bem pior: as Pedaladas fiscais - o uso de bancos federais para pagar despesas do governo.
Uma interessante discussão sobre a Nova Matriz está sendo travada neste momento no Blog do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia), um espaço privilegiado do debate econômico, criado pelo presidente do instituto, Luiz Guilherme Schymura. No blog (blogdoibre.fgv.br/), Manoel Pires, pesquisador associado da entidade, diz que o termo Nova Matriz foi utilizado pelos críticos como um "espantalho", uma visão caricatural que trata como uma coisa só todas as iniciativas adotadas pelo governo ao longo de vários anos e não considera fatores não controláveis, como o cenário externo.
Também no blog, Bráulio Borges e Samuel Pessoal, igualmente pesquisadores associados do Ibre, estão protagonizando um debate animado. O primeiro, embora não negue, como observa Schymura na última Carta da Conjuntura do instituto, que a Nova Matriz tenha sido uma causa não desprezível da Grande Recessão, diz que os críticos exageram em demasia ao atribuir todos os males àquele experimento. Ele cita o fim do boom de commodities, as restrições de oferta hídrico-energética, os efeitos da Operação Lava-Jato e problemas na aferição do PIB pelo IBGE - que teriam subestimado o crescimento nos anos anteriores, levando o governo a oferecer estímulos para a economia crescer - como fatores que concorreram com a Nova Matriz para derrubar a atividade.
Economista que muito cedo começou a alertar para os riscos das políticas adotadas pelo governo desde 2008, a três anos do fim do segundo mandato de Lula, Samuel Pessoa lembra que a Nova Matriz foi muito além das políticas monetária, fiscal e cambial.
Além da tolerância com a inflação, da redução da transparência da política fiscal, da diminuição drástica do Superávit primário e da colocação da dívida pública em trajetória explosiva, os economistas de Dilma promoveram as seguintes atrocidades: controle de preços para tentar segurar a inflação, uma vez que o BC foi inibido a não elevar os Juros; aumento do protecionismo; ampliação do papel do Estado na Petrobras e no setor de petróleo; uso de bancos públicos para induzir a redução do spread bancário; imposição de resistências ideológicas que travaram a participação do setor privado na oferta de serviços públicos e na infraestrutura; política de conteúdo nacional e de estímulos à produção local.
Muito importante lembrar que, paralelamente às mudanças da política econômica, Dilma adotou uma série de medidas populistas que não cabiam no orçamento, tanto que o financiamento do Fies e do BNDES foi feito por meio de emissão de dívida.
O desastre foi resultado, portanto, de um projeto, apesar dos improvisos fundados no desespero causado pela falta de resultados positivos. Com a Nova Matriz, o PT finalmente chegou ao poder em matéria econômica.
Cristiano Romero é editor-executivo e escreve às quartas-feiras